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A INDÚSTRIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO

A Cultura da Extorsão

Josino Moraes


 

A Indústria da Justiça do Trabalho
A Cultura da Extorsão
Josino Moraes

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[Notas renumeradas e agrupadas para edição em eBook]

Fonte Digital
www.josino.sp13.net
josinomoraes@hotmail.com

© Copyright 2000,2005
Josino Moraes


O Autor

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Josino Moraes, descendente de paulistas, nasceu em Assis, SP, em 1941. Sua formação primária e secundária deu-se em colégios diocesanos, salesianos e escolas comuns. Posteriormente, estudou no Colégio Bandeirantes, de São Paulo, e se graduou em Engenharia Civil pela Universidade Mackenzie, em 1964. Nos anos 60, fascinado pela Revolução Cubana e pelas “novas” idéias, tornou-se marxista (comunista). Arnaldo Madeira, o “Madeirinha”, líder do governo na Câmara durante o segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso e um dos nomes fortes da nomenklatura tucana, foi um de seus camaradas de base, reunião de várias células comunistas das faculdades, então na Rua Maria Antônia, em São Paulo, território também freqüentado, anteriormente, pelo então infante Fernando Henrique Cardoso.

Logo após o movimento militar de 1964, viveu na clandestinidade, viajou a Cuba, com o devido direito a treinamento militar de seis meses, e participou dos preparativos do movimento guerrilheiro pós-64, cuja figura central era Leonel Brizola, herdeiro político de Getúlio Vargas.

Em 1968, exilou-se no Chile, onde permaneceu até a queda de Salvador Allende, em 1973. Lá, trabalhou como engenheiro e deu seus primeiros passos nos estudos de economia. Em 1973, enfrentou seu segundo exílio na Suécia, onde participou, como pesquisador, do Instituto de Estudos Latino-Americanos de Estocolmo e se graduou em Economia pela Universidade de Estocolmo. Lá, iniciou seus estudos de doutoramento, que foram interrompidos pela Anistia, em 1979, quando retornou ao Brasil. No exílio, conviveu com José Serra, Fernando Gabeira e outros tantos desconhecidos brasileiros e latino-americanos, marxistas, filomarxistas, cristãos marxistas, marxistas cristãos (sic) (esses últimos quase sempre padres), ou perfectos idiotas latinoamericanos! Hoje, muitos deles se encontram entrincheirados sob a bandeira do fundamentalismo ecológico e outros temas próprios da agenda de países em que o capitalismo floresceu, prosperou e abriu o caminho para o futuro.

Na sua volta ao Brasil, trabalhou como engenheiro estrutural e, logo mais, arrendou o sítio de seus progenitores, onde plantou trigo e soja. O plantio adverso do trigo lhe causou um derrame na retina (central serosa), que lhe tolheu boa parte da visão. O plantio da soja rendeu aproximadamente US$ 30 mil (dólares de 1983), o que lhe permitiu abrir, em 1983, uma marcenaria, em que trabalhou com a fabricação de móveis sob encomenda — seu hobby, em Campinas, SP. Permaneceu nessa atividade até 2001, quando “vendeu” a empresa — a bem da verdade, quebrou, como a quase totalidade de seus pares do setor mobiliário. Publicou seu livro: A Indústria da Justiça do Trabalho – A Cultura da Extorsão.

Desde 2001, vem aprofundando seus estudos sobre a tragédia nacional e, em menor medida, da América Latina, publicando vários artigos e ensaios a esse respeito.

Campinas, Ano 2000.


A Indústria da Justiça do Trabalho
A Cultura da Extorsão

 

Dedico esta obra à saga de milhões de micro e pequenos empresários, da cidade e do campo; em especial ao meu amigo Arruda, micro-empresário, tapeceiro, que morreu vítima da Justiça do Trabalho e das taxas de juros, num país no qual, infelizmente, o capitalismo não floresceu.

Sem confiança mútua, nenhum sistema pode funcionar” — Alan Greenspan, Presidente do Fed — Banco Central dos EEUU, órgão independente da Presidência.


Sumário


A (IN)JUSTIÇA DO TRABALHO

Cândido Prunes
Vice-Presidente do Instituto Liberal

 

Trata-se de um feito digno de nota constatar que uma das críticas mais lúcidas sobre a Justiça do Trabalho no Brasil foi escrita por um engenheiro e economista. Mesmo tendo suas origens no antigo Partido Comunista e vivido o exílio durante o interregno militar, o autor, Josino Moraes, conseguiu desprender-se dos preconceitos, das idéias prontas e dos lugares-comuns que cercam as análises sobre o Direito e a Justiça do Trabalho brasileiros.

O título da obra já demonstra a coragem do autor: “A indústria da Justiça do Trabalho — a cultura da extorsão”. Advogados e juízes parecem ter, há muito tempo, perdido a noção, em primeiro lugar, das origens do Direito do Trabalho e do seu braço judiciário no Brasil e, em segundo lugar, dos seus efeitos nefastos para com os interesses dos próprios trabalhadores. O autor descreve com precisão o calvário que significa o judiciário trabalhista para os pequenos e médios empresários, que, muitas vezes, chegam diante dos juízes tão “míseros” quanto os reclamantes. As armadilhas da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e das leis processuais colocam todos os empregadores em situação de flagrante desvantagem perante os empregados, desprezando solenemente o princípio da igualdade, “assegurado” pela Constituição Federal de 1988. As grandes corporações, entretanto, dispõem de enormes e sofisticados departamentos jurídicos para fazer frente às demandas trabalhistas. Também conseguem repassar para os seus consumidores os custos decorrentes das reclamatórias trabalhistas. Já os pequenos e médios empresários são, em geral, surpreendidos pelo emaranhado das normas trabalhistas e, mais ainda, pela Justiça do Trabalho, e terminam por sucumbir economicamente, pois não têm como repassar esses custos.

O resultado de todo esse verdadeiro caos já está visível a olho nu: mais da metade dos postos de trabalho no Brasil são “informais”. Poucos empresários conseguem suportar os custos que as leis trabalhistas e o Judiciário impõem. O número crescente de camelôs e ambulantes, especialmente nos grandes centros urbanos, é outro resultado das leis trabalhistas. A “carteira assinada” está inviabilizada economicamente.

Muito feliz é a ênfase que o autor dá às origens da CLT e do Judiciário Trabalhista. Oriundos da Itália fascista, dos tempos de Mussolini, o “Duce”, lá, ambos foram abandonados com o fim da II Guerra Mundial. No Brasil, o modelo fascista foi adotado durante a Ditadura Vargas e, desde então, ele só “evoluiu”, como um tumor, para usar a linguagem de Josino Moraes.

O estilo da obra deixa transparecer em vários momentos a justa indignação do autor. É compreensível, pois ele relata a sua sofrida experiência como pequeno empresário em Campinas – SP. Mas a sua perspectiva de economista e de homem prático colocam a questão numa forma poucas vezes observada em nossos meios jurídicos. A crítica destemida e profunda, por quem conheceu o problema de dentro, são as grandes virtudes dessa obra. Juízes trabalhistas, advogados e, principalmente, a legião de desempregados brasileiros, deveriam ler essa obra para compreender as raízes do drama social representado pela escassez crescente de empregos no mercado formal.


Apresentação

 

Este livro contém o relato da experiência do envolvimento de um pequeno empresário com a Justiça do Trabalho. O tom de desabafo que caracteriza o texto advém do caráter e do desfecho dramáticos daquela experiência.

Na verdade, o choque de Josino Moraes deu-se com uma estrutura mais ampla e mais poderosa, na qual se insere a instituição judiciária: o Estado Patrimonial.

Na Europa, apareceram dois tipos de organização estatal: o supracitado Estado Patrimonial e o Estado Constitucional. Este último correspondeu ao desenvolvimento das relações estabelecidas entre o governante e a sociedade, no sistema feudal, consubstanciadas no contrato de vassalagem: os senhores feudais conservavam sua independência em relação ao monarca, cujo poder vigorava na área territorial em que se reunia o conjunto dos feudos.

O livro A Sociedade Feudal (1939-1940), de Marc Bloch (1886-1944), caracteriza amplamente o regime em causa, surgido na Inglaterra e na Europa Ocidental.

Em contrapartida, o Estado Patrimonial revelou-se mais forte do que a sociedade, sendo dominado pela burocracia. Foi a forma de que se revestiu na Península Ibérica e na Prússia, tendo sido estudado por Max Weber (1864-1920).

Transplantado para o Brasil, não se consolidou de pronto. Porquanto, tivemos, nos primeiros séculos, grupos sociais dotados de poder econômico. É um fenômeno sobretudo do período republicano e justamente o criador da Justiça do Trabalho, Gétulio Vargas (1883-1954) é que lhe deu acabamento.

Sob Vargas, criou-se, entre nós, o Estado Nacional, que se revestiu de características patrimonialistas típicas, subseqüentemente aprofundadas, em especial sob os governos militares. Trata-se do traço essencial da chamada Era Vargas, que se iniciou nos Anos 30 do século passado e ainda não foi superada de todo.

No caso particular da Justiça do Trabalho, combinou-se com outra tradição perversa, a da Contra(?)-Reforma, que nutre até hoje o desapreço pelo empresário e o ódio ao lucro e à riqueza.

Ambos são processos históricos adequadamente estudados.

No nosso caso, sair do patrimonialismo tem se revelado tão complexo quanto sair do comunismo, conforme estamos tendo oportunidade de presenciar nos anos transcorridos desde o fim da União Soviética.

Tanto lá quanto cá, o meio cultural e a moralidade social básica não ajudam. Tal circunstância é que permite avaliar a importância do relato de Josino Moraes. Há de servir para enfraquecer o poder da chamada CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), que se tornou um autêntico obstáculo à modernização das relações trabalhistas.

A proposta do Prof. José Pastore — sem favor, o principal estudioso brasileiro da questão — é no sentido de que se chegue a um acordo com os sindicatos para definir aqueles direitos que seriam de fato fundamentais; por isto mesmo garantidos na Lei. Os demais passariam a ser negociados livremente entre as partes. Os dispositivos da Carta de 88 que procuram estendê-los sem peias têm contribuído sobretudo para fomentar a informalidade, que equivale, de fato, à renúncia a todos os direitos, o que é também uma situação que precisa ser superada.

Ao longo da era republicana, contamos com poucas oportunidades de experimentar a democracia. Assim, tivemos que recomeçar mais uma vez, precedentemente sem sucesso. Desde a última abertura, a partir de 1985, transcorreu muito pouco tempo, mas o suficiente para nos darmos conta de que se trata de um caminho árduo e difícil.

Para trilhá-lo com êxito, cabe-nos saber escolher as prioridades. A reforma econômica e a reforma administrativa do Estado são certamente prioritárias. Mas as dificuldades em completá-las sugerem que deveríamos agora alterná-las, concentrando-nos na reforma política e na flexibilização das relações de trabalho. Espero que este livro venha a constituir-se numa séria advertência quanto à urgência desta última.

Antonio Paim, Rio de Janeiro, Agosto de 2001.


Prefácio

 

O título original deste trabalho seria “A Imundície da Justiça do Trabalho”, a mim sugerido por um pequeno-empresário de quem me tornei amigo devido aos meus artigos sobre o tema, publicados pelo Correio Popular de Campinas – SP. Posteriormente, atinei para o título atual, “A indústria da Justiça do Trabalho” — preferido pelo meu editor, Sérgio Vale, filhos e inúmeros amigos. O objeto de estudo aqui abordado refere-se a ambas facetas: a imundície e a indústria da Justiça do Trabalho, bem como suas trágicas conseqüências para o desenvolvimento sócio-econômico nacional.

De fato, ainda que fatos recentes (1999) possam associar o título original deste trabalho ao juiz trabalhista Nicolau dos Santos Neto (Lalau para os íntimos), o objeto de estudo em questão não guarda nenhuma relação com Lalau e suas estripulias. A imundície dos 169 milhões de reais desviados da obra do Fórum Trabalhista de São Paulo é ficha pequena perto da imundície abordada aqui. Aquela, algo em torno de 100 milhões de dólares de 1999. Converto o montante para dólares para facilitar o trabalho de futuros historiadores, uma vez que o Brasil não dispõe de uma moeda strictu sensu desde 1942, quando Getúlio Vargas deu o pontapé inicial, substituindo os réis por cruzeiros. Desde então, já contabilizamos 8 “moedas”. Não terá o real melhor sorte. O affaire Lalau é pontual, nada significativo, num quadro de corrupção generalizada num Estado em avançado estado de degeneração; vários países latino-americanos são bons paralelos, mas a Colômbia é o caso mais interessante, devido ao seu mais avançado estado de dilaceração — o caso colombiano é mais grave devido à existência das últimas guerrilhas marxistas na face da Terra. O atual “Estado” russo é outro paralelo interessante. Lá, o vazio produzido pela queda do Estado comunista não gerou forças políticas suficientes para a reconstrução de um novo Estado.

A corrupção daqui, como em todo o mundo, guarda uma estreita correlação com a desintegração da saúde do Estado e, portanto, continuará aumentado em gênero, número e grau, independentemente das denúncias sobre escândalos e de suas quase infinitas CPI’s, que tanto divertem nossa mídia e nosso povo(1). Observando este fenômeno a partir de um outro ponto de vista, trata-se de mera diversão — “boi-de-piranha”, na linguagem dos militares e dos nossos antepassados bandeirantes, ou ainda “anodo de sacrifício”, na linguagem dos eletroquímicos. Até o quero-quero, um pássaro, domina este conceito. De fato, um amigo me relatou que, ao passear com sua cachorra pelo cafezal, o quero-quero macho adianta-se e provoca a sua própria perseguição com o intuito de proteger —distrair— sua parceira e os ovos! Na época de Vargas, essa operação era denominada despistamento, área em que o Petiço gaúcho crescia e transformava-se num verdadeiro mestre do Mal — veja-se o magnífico trabalho de Affonso Henriques, aqui citado. Hoje, a idéia central é distrair a sociedade da questão realmente fundamental, a saber, o crescimento econômico e a luta por uma sociedade sem pobres nem miseráveis. E também, obviamente, como simples corolário, a ausência de bandidos, piratas, sicários, assassinos, assaltantes, estupradores e quejandos. Infelizmente, não há forças políticas para deter ou reverter o curso inexorável da degradação do Estado brasileiro nos seus 3 níveis: União, Estados e Municípios.

O objeto de estudo aqui é a imundície institucional, muito mais relevante, evidentemente, pois ela guarda uma relação estreitíssima com o crescimento econômico. Se houvesse a possibilidade de reconstruir um Estado hígido, com instituições saudáveis, enxuto, os Lalaus da vida seriam um mero refresco, objetos de estudo para psicanalistas estudiosos de Melanie Klein e voltados para a questão da voracidade, ou então, simples diversões para distrair e idiotizar o povão e suas elites, tal qual as telenovelas. A legislação trabalhista brasileira — fruto de um fascismo “melhorado” — é tão fantástica que recentemente recebi um convite para participar de um curso sobre como dispensar um funcionário, tal a burocracia e o número de armadilhas da Justiça do Trabalho. Quem sabe, logo mais, teremos um curso de PhD. sobre o tema. Nos Estados Unidos, o país que mais deu certo nos séculos XIX e XX, basta dizer: “You are fired.” e ponto final; sem maiores delongas. Ao tratar desta teratologia institucional, relato parcialmente e explico parte da história e da tragédia nacionais no século XX.

A Lei Camata, bem como a Lei de Responsabilidade Fiscal, de 2000, que limitam os gastos públicos com seus funcionários — 60% das receitas, servirão apenas para inglês ver — Oh! rara e maldita herança do Império! A Lei de Responsabilidade Fiscal passou raspando pelo Supremo Tribunal Federal — 6 votos favoráveis contra 5. Ademais, existe a chicana da terceirização da mão-de-obra!

Uma observação pessoal é que a corrupção, desde 1985, com Tancredo Neves e seus atuais predecessores, “democratizou-se”, descendo aos mais baixos níveis da administração pública(2). Antes, sua principal manifestação era na cúpula, desde os tempos de Adhemar Pereira de Barros e Jânio Quadros. Um colega de turma, engenheiro, contou-me que na época de Adhemar, as “comissões” para obras públicas giravam em torno de 5%. No ciclo militar, era vox populi que elas teriam subido para 10%, e no início do atual período, embasado num sistema de eleições com dezenas de partidos (37) e dois turnos(3), que seus próceres denominam de “Nova Republica”, elas foram bater nos 30%, via Quércia(4) etc. Hoje, este aspecto da corrupção é relativamente pequeno, pois, com a pequena exceção do Fórum do Lalau, praticamente não existem mais obras públicas! O Rodoanel de Campinas, que liga a Via Anhangüera à Via D. Pedro I, com míseros 11 Km de extensão, demandou 30 anos para sua execução! Mas, o melhor sintoma desta tragédia é o trauma no setor elétrico a partir de 2001. Os ínfimos investimentos públicos na área, sobretudo desde 1990, agravados pela escassez de chuvas desde 1996, criaram uma situação insustentável. Trata-se da melhor expressão da falência do Estado brasileiro: um país estrangulado pela falta de energia. Venderam-se algumas distribuidoras de energia, pouquíssimas geradoras e nenhuma linha de transmissão ao setor privado nacional e internacional, mas elas serviram apenas, até aqui, para o financiamento dos insolúveis déficits gêmeos, tanto o interno quanto o externo, alavancando o Plano Real e proporcionando-lhe esplêndidas vitórias eleitorais. Além disso, a inépcia da burocracia brasileira, tão ciosa de regras, leis, decretos, decretos-leis, portarias, regulamentações complicadas, enunciados etc., tolheu a vontade de novos investimentos por parte do tímido e recém-chegado setor privado. Um aspecto hilário da nossa mídia são as notícias sobre o tempo: tempo bom, i.e., sol brilhante, bom para banhistas e surfistas. Milha alma de agricultor, bem como minhas preocupações com energia, ficam indignadas. No passado, quando surgiam algumas nuvens no céu, um sitiante vizinho exclamava: o tempo “embonitou”! Quando estávamos desesperados por falta de chuvas, ele me consolava ironicamente, dizendo: “O fim do sol é a chuva!” Quem sabe, a extrema escassez de energia a partir de 2001 ensinará aos dândis urbanos aficionados pelas nossas praias a importância das chuvas e da água. Até neste aspecto, Getúlio Vargas deixou seu malefício. De fato, observemos estas palavras do Prof. Miguel Reale: “Perguntar-se-á ‘Por que a Light?’ [...] e eu explico que o Código de Águas, de 1934, nacionalista e patrioteiro, praticamente bloqueou a sua expansão como geradora de eletricidade, por ser uma companhia estrangeira...” (O Estado de São Paulo, 21/7/2001, A2).

A leviandade grotesca no trato da res publica no subcapitalismo brasileiro é dantesca. No mês de Junho de 2000, o governo lançou seu Plano Nacional de Segurança Pública, cujo eixo central era a iluminação pública nas grandes cidades, nada menos que 40% das verbas — R$ 300 milhões. Exatamente um ano depois, em Junho de 2001, colocou em vigor seu Plano de Racionamento de Energia Elétrica, para 80% do País! No final de 1999, ao observar o atraso das chuvas de verão, enviei um artigo ao Correio Popular, que não foi publicado, sob o título “Água e desperdício”, onde expressava minhas extremas preocupações sobre a possibilidade de escassez de energia elétrica para nossas indústrias. Minhas preocupações foram reforçadas posteriormente pelo dado do Operador Nacional de Energia Elétrica (ONS), órgão cuja existência só tomei conhecimento no dia 1/3/2000, através d’O Estado, B1. O dado era terrível: para as Regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste, a média de nossos reservatórios estava em míseros 20%! Por que não foram tomadas providências — racionamento — naquela época? Porque hoje, tudo se baseia nos cálculos eleitorais e nos índices de popularidade, sobretudo quando se trata de estadistas com inúmeros títulos de Dr. Honoris Causa, dados por universidades do Primeiro Mundo. Na época de Getúlio Vargas, a coisa era mais fácil. Cabe uma segunda observação a propósito da platitude da nossa mídia escrita: apesar de revisar 3 jornais, diariamente, a dificuldade de obter uma informação relevante é espinhosa. Só mesmo garimpando, aqui, ali e acolá.

Dizem as más línguas que Stefan Zweig, em 1941, teria escrito seu “Brasil, o país do futuro” a mando de Vargas. Não creio. Nos anos 40, tudo levava a crer na possibilidade de futuro do país. A bem da verdade, até os anos 70, tudo sinalizava para um futuro brilhante, apesar das evidentes dificuldades culturais. Até então, pôde-se constatar a existência dos self-made-men, indivíduos que, saindo do nada, construíam suas pequenas-empresas e aqueles que já as possuíam as transformavam em grandes empresas, industriais ou agrícolas. Em termos de história, os tumores cancerígenos demoram para o seu pleno desenvolvimento e metástase. A Contra-Revolução de 1930, sob o comando de Vargas, significou a vitória definitiva do positivismo e foi destruindo piano piano os débeis germens de capitalismo aqui plantados(5). Durante anos, perguntei-me como pôde Paulo Prado, em 1928, no seu monumental “Retrato do Brasil”, apesar de seus pequenos erros (a luxúria, a tristeza), prever o negro futuro. Afinal, tínhamos o vigor de nossas fazendas paulistas exportadoras de café, o ouro negro, capazes até de “importar” culturas superiores à nossa origem portuguesa, sobretudo a italiana e a alemã. Hoje, após o estudo da importância da Inquisição e do Positivismo no Brasil, através da obra do Prof. Antonio Paim, “Momentos Decisivos da História do Brasil”, da Editora Martins Fontes, 2000, pude entender as razões de seu raciocínio. A filosofia positivista — a idéia da ditadura republicana, a intervenção do Estado na economia — teve um peso maior que meus modestos conhecimentos supunham. O peso das idéias da Contra-Reforma foi enorme. O lucro e os empresários sempre foram odiados por todos os segmentos de nossa sociedade. O marxismo, a partir do início do século 20, veio dar mais um sopro de vida ao positivismo. E, essa somatória “positivismo + marxismo”, catalisada levemente pelo catolicismo por Leonardo Boff, o pai da Teologia da Libertação, incrustada na nossa mídia e nas universidades, foi e é fatal. Um dos principais fatores que explicam o sucesso dos Estados Unidos nos séculos XIX e XX foi a ausência do pensamento marxista e essas outras extravagâncias; esta, talvez, a principal razão do relativo atraso econômico europeu em relação ao americano.


Introdução

 

O resultado dos estudos aqui expostos está apresentado na forma de artigos. A idéia me ocorreu porque consegui, na cidade de Campinas, SP — fato único no Brasil até onde vão minhas informações — levantar um debate profícuo com juízes, advogados e com a Associação dos Advogados Trabalhistas de Campinas sobre a Justiça do Trabalho. Pareceu-me interessante a concepção, pois o Monstro, Leviatã tropical ou “tribufu”, é visto por mim como um enorme poliedro composto por inúmeros polígonos que, aparentemente, não guardam relações entre si, mas que perfazem um todo consistente e maléfico. Não encontrei outra forma de abordar esta excrescência. No primeiro artigo, relato meu primeiro contato pessoal com a Justiça do Trabalho; no segundo, faço uma síntese de sua origem e história, e de sua enorme importância na composição do denominado “Custo Brasil”, hoje um fator importantíssimo, na medida em que o Brasil torna-se um país cada vez menos competitivo.

Essa a grande razão do horror de nossos governantes à idéia da ALCA(6). Logo, meus opositores morderam a isca do debate e, a partir daí, foi só nadar de braçadas. O debate se estendeu ao longo de todo o ano de 1999.

Levantar este debate só foi possível graças a 3 condições: 1) a polêmica entre o Senador Antonio Carlos Magalhães (ACM), Presidente do Senado em 1999, e o Sr. Almir Pazzianotto, membro do Tribunal Superior do Trabalho (TST) e seu presidente desde 2000, sobre o escândalo, citado acima, do Fórum de SP(7) — 1999; 2) a grandeza de caráter de um editor do Correio Popular de Campinas, Sr. Roberto do Valle; 3) o fato de juízes, a Associação de Advogados Trabalhistas de Campinas e outros advogados morderem a isca que eu lhes lancei nos meus 2 primeiros artigos. Foi um dos dias mais felizes de minha vida quando vi uma juíza trabalhista me contestando no mesmo espaço do jornal. Por quê? Ora, quando se está munido da razão, o debate é interessantíssimo. Depois, a Associação de Advogados Trabalhistas de Campinas me ameaçou com possíveis ações judiciais. Logo mais, espertamente, silenciaram. Foram 9 os meus artigos publicados durante 1999.

Continuei insistindo no tema, mas os editores acharam por bem não publicá-los. Esses outros artigos e novos estudos completam o trabalho. Deram o assunto por encerrado, apesar de que ele não se encerrará jamais, enquanto o Brasil encontrar-se mergulhado nesse fango, assim como a Argentina, desde que Perón, nos anos 50, deu a partida para el cuesta abajo. Vargas e Perón deixaram como herança doenças terríveis; continuar-se-á discutindo, tanto lá quanto aqui, pelo menos, filigranas, questiúnculas, picuinhas a propósito, mas só mesmo uma intervenção cirúrgica séria (profundas reformas ou uma revolução — como se queira chamar) poderia sanar tais enfermidades, e isto não vislumbro no curto ou médio prazos(8). Em Outubro de 2000, James Heckman, Prêmio Nobel de Economia, advogava menos regras, isto é, desregulamentação nas relações de trabalho na América Latina para diminuir a pobreza. Dificilmente ele lerá este livro; portanto, jamais saberá o tamanho deste excremento irremovível aqui tratado. Esta recomendação também tem sido aventada por diversos órgãos internacionais; economistas nacionais especialistas em políticas de emprego acham muito “forte” esta questão da desregulamentação e propõem apenas uma flexibilização (Folha, 14/10/2000, B4). Otários... os estrangeiros muito menos. A flexibilização deu seu primeiro passo com a Constituição de 1946, que permitia greves numa legislação — CLT — cuja ideologia é o fascismo, um contra-senso que só viria a agravar o problema. De lá para cá, cada nova mexida apenas agravou a questão, atingindo seu ápice na Constituição de 1988. Do movimento de uma massa escatológica, não há como fazer exalar nada de agradável.

Previ, com bastante antecedência, apenas a eliminação dos juízes classistas, ex-vogais, e a não-extinção da Justiça do Trabalho, apesar de bravatas e bazófias do Sr. Antônio Carlos Magalhães, então Presidente do Congresso, devido à compreensão de que o environment não apenas continua o mesmo da Contra-Revolução Varguista de 1930 como também bastante depauperado. A indústria e cultura da extorsão proliferou-se consideravelmente ao longo de tantos anos. Isto destruiu o caráter de nossa mão-de-obra — os romanos já dominavam o conceito do homo judicus, homem capaz de direitos e obrigações, aqui definitivamente enterrado. A conseqüência última deste processo foi a destruição da seminal relação capital + trabalho, condição basilar para a eliminação da pobreza e da miséria. Trata-se de um aspecto curioso da cultura nacional: o permanente aprimoramento do ominoso, do nefasto.

A origem de tudo (refiro-me a esta obra), foi meu sofrimento pessoal como microempresário, ao longo dos últimos 17 anos, ao conviver com esta revoltante (In)Justiça do Trabalho, bem como compartilhar o sofrimento de colegas, micro e pequenos empresários, muitos deles menos letrados e, portanto, mais expostos aos danos produzidos por este Monstro. Pensando em muitos deles, sobretudo no meu falecido amigo Arruda, fiel tapeceiro, foi que ganhei forças para concluir esta obra. A Justiça do Trabalho, além das taxas de juros mais escorchantes do mundo, único instrumento de política econômica num Estado semidestruído, vai minando, gradualmente, ao longo dos anos, a saúde desses heróis que geram empregos e riquezas num país sem futuro. Não consigo ter a grandeza de caráter sugerida por Nietzsche: “Viva perigosamente. Ame o destino.” Vivo perigosamente, mas blasfemando, devido às forças adversas, irracionais, exógenas.

Penso como Nietzsche; algumas vezes, caem-me lágrimas ao escrever. Ou, como Freud nos seus melhores momentos de lucidez: “É preciso ser sem escrúpulos, expor-se, arriscar-se, trair-se, comportar-se como o artista que compra tintas com o dinheiro da casa e queima os móveis para que o modelo não sinta frio. Sem alguma dessas ações criminosas, não se pode fazer nada direito.” — carta de Freud a Oscar Pfister em 1910, citada no livro “Freud, pensador da cultura” — de Renato Mezan. Gosto de escrever com a pulsação do sangue que na sístole consegue elevar mais de um metro de coluna d’água! Não suporto “l’art pour l’art”, como dizia Nietzsche; aqueles que, professores universitários, PhDs, livres-docentes, na sua grande maioria editados com gozo quase celestial pela nossa medíocre mídia escrita, escondem-se atrás de suas erudições para iludir suas incapacidades de pensar, raciocinar, analisar, dissecar, refletir, elaborar. “O povo, e não a universidade, é o lar do escritor” — pensamento de Emerson citado por Harold Bloom em seu “Como e por que ler”, Objetiva, pág 21. É claro que há um certo exagero no pensamento, mas para o objeto de estudo de que trato aqui, ele é 100% correto. “Aqui está o busílis. Alinhar palavras é fácil; mais difícil é alinhar idéias” — João Gaspar Simões, Crítica, I, pág. 315, segundo o Aurélio, 2ª edição. Alguns se auto-intitulam modestos servidores públicos, mas, na verdade, eles se aposentam entre 50 e 55 anos na melhor etapa de suas modestas capacidades e com fartas aposentadorias integrais. Para que preocupar-se com o pensar e o futuro do país? Ou sequer com o sonho de trazer o primeiro Prêmio Nobel para o país. Porém, de 4 em 4 anos, eles torcem pelo pentacampeonato, sob a batuta de Galvão Bueno. No caso de juízes, além da aposentadoria, em algumas oportunidades, eles montam escritórios de advocacia, com todo o óbvio para a prosperidade. Só mesmo aqui, no Iraque e em países similares. Não existe um sistema único de aposentadoria que valha tanto para o setor público quanto para o setor privado; tampouco a questão fundamental de uma idade mínima para a aposentadoria, como em todos os países civilizados. Meu estilo é muito duro, como a faca afiada da verdade. Ao mostrar este meu texto a alguns amigos, descobri algo mais que Nietzsche: a verdade cheira mal. Não vivo rodeado de aparelhos de ar-condicionado, mas sim de um barulho ensurdecedor de máquinas e pó de serra. Não sou homem de eufemismos. Além disso, meu escritório transformou-se num verdadeiro almoxarifado, para tentar diminuir o volume de roubos — leia-se, a propósito, o texto “Os Três Mandamentos”, aqui editado.

Que me perdoem os deslizes com o português. Apesar de considerá-lo um idioma em extinção, procurei, nas minhas poucas horas vagas, aperfeiçoar-me neste pré-cadáver. O futuro pertence ao inglês com enxertos de espanhol. A sorte para nossos descendentes é o fato de que o espanhol é a língua latina mais próxima à nossa e, sobretudo, o fato de o inglês erudito sofrer uma enorme influência do latim e do grego. Esta fixação com milhares de regras de acentuação, excesso de artigos, crases, tal qual o francês, é absolutamente ridícula. Recentemente, um jovem professor de português citava um trecho de um poema de Drummond: “O português são dois; o outro, mistérios” (Folha, 7/9/2000, C2). Ocorre que a língua deve ser uma ferramenta a mais lógica possível, para facilitar o desenvolvimento econômico, e não acrescentar mistérios à vida, pois eles, naturalmente, já são excessivos. Akio Morita exaltava a lógica do idioma japonês. Não disponho de elementos para julgar tal tese, mas, de qualquer forma, trata-se de outro esqueleto falante. Essas são algumas das razões, dentre tantas, do porque ser a língua inglesa a grande vencedora.

A bibliografia, excetuando-se a apologética e a que trata do problema do pêlo na casca do ovo, é extremamente escassa. Forneço, de qualquer forma, o que consegui. Livros citados ao longo do texto e não entre as principais obras consultadas, no final do livro, devem-se ao fato de eu não dispor de nenhum exemplar à mão. Meus livros foram ficando pela estrada da vida — me ocorreu esta metáfora sertaneja. A primeira leva (1964) ficou com o DOPS, sob o comando de Adhemar Pereira de Barros, então Governador de São Paulo e bastante cioso, na época, de prestar serviços aos militares recém-chegados ao poder — acabou dançando apesar de seus esforços. A segunda leva (1973) caiu nas mãos dos homens de Pinochet, felizmente, até os 42 volumes da obra completa de Lenin! Minha companheira de então era Angélica Gimpel, arquétipo do marxismo-leninismo e do pensamento de Mao Tse Tung (a ala mais radical dos comunistas da época), colega de turma de José Serra na Escolatina e tradutora de “importantes obras” de Celso Furtado para o espanhol. A terceira leva, na extrema excitação da volta ao Brasil, devido à anistia de 1979, repousa na tranqüila Estocolmo. A quarta leva foi praticamente destruída pela poeira abundante e vermelhíssima — rossa, na linguagem dos italianos; aqui, a palavra foi entendida como “roxa” — na Água do Bugio onde plantei trigo, soja e um pouco de arroz e feijão. Atualmente, disponho de poucas e raras obras deste passado e as que adquiri como microempresário, com a terrível restrição de renda nos tempos bicudos do “Avança Brasil” e do “Plano Nacional de Segurança Pública”.

No princípio, o que me pareceu mais interessante foram os questionamentos em relação ao poder normativo da Justiça do Trabalho, seu poder de gerir normas, legislar, e uma análise sobre a necessidade de flexibilização nas relações de trabalho. Só posteriormente, garimpando aqui e ali, atinei para o cerne da questão. Os jornais Folha de São Paulo e O Estado de São Paulo são citados sucintamente como “Folha” e “O Estado”.

Forneço um pequeno glossário, para palavras obscuras, para facilitar a leitura aos meus colegas, micros e pequenos empresários, burros-de-carga, que não tiveram a oportunidade de freqüentar universidades. Perdoem-me eventuais esquecimentos. Não há como abster-se de expressões latinas e da cultura de nossos antepassados. Alguns raciocínios que requerem um pouco mais de conhecimentos não vi como solucionar.

A apresentação do trabalho está em forma de 16 artigos; os artigos publicados pelo Correio Popular durante 1999 aparecem no sumário com as respectivas datas. Eventualmente, introduzimos pequenas modificações devido a novas informações ou à minha melhor compreensão de certos detalhes. Os três artigos cujos títulos aparecem entre aspas são títulos dados pelos autores e criticados por mim. Posso parecer um pouco repetitivo, mas minha experiência do debate travado em Campinas é que essa é a única forma, dada a dificuldade de assimilação pelas pessoas do cerne do problema. Observo que, quase sempre, equaciona-se um problema sob dezenas de pontos de vista mas apenas um deles é capaz de despertar as pessoas para a compreensão do fenômeno. Que me perdoem os leitores uma apresentação mais rigorosa e, em alguns casos, ilustrada com gráficos, como havia pensado, mas o tempo não a permite, e urge pegar o vácuo do Lalau! Quem sabe numa 2a. edição, embora o Brasil esteja mais para Paulo Coelho e os comunistas(9).


A Justiça do Trabalho

 

Há aproximadamente 17 anos, e a partir de um hobby, fundei uma micro-empresa de marcenaria. Minhas primeiras preocupações após o início das atividades eram as condições de trabalho dos funcionários: possíveis malefícios do pó de serra, níveis exagerados de ruídos, acidentes de trabalho e a procura de harmonia no duro processo do ganha-pão. Uma das minhas primeiras preocupações — a comunicação entre os funcionários e seus familiares — levou-me à aquisição de um sistema KS de telefonia, de tal forma que praticamente toda máquina dispunha de um terminal telefônico próximo. Explico-me: após uma longa estadia de 5 anos na Suécia, havia incorporado, de uma forma sólida e até exagerada, elementos culturais de lá. Aliás, não há mal algum em assimilar o que é bom. Pena que a cultura nos trópicos era outra.

Logo nos primórdios, um primeiro baque. Um funcionário com 7 meses de casa pede a conta e eu, como já havia aprendido certos rudimentos da legislação trabalhista, aconselhei-o a completar um ano para ter direito a férias. Qual nada, estava firmemente decidido pelo seu desligamento. Após um curtíssimo tempo, um envelope timbrado do Poder Judiciário. “Que coisa mais desagradável!” — pensei. Afinal, só havia tido contato com este por questões políticas, num passado distante, jamais por razões criminais ou de qualquer outra natureza. Abri o envelope, joguei-o no lixo (somente depois vim a saber que não deveria fazê-lo) e li o conteúdo. Pela primeira vez, trombei com palavras estranhas: reclamante, reclamada etc. Descobri que aqui, abaixo da Linha do Equador, existia uma justiça específica para o trabalho. Consultei um advogado que, em meio a risos e preocupações, exclama: “Mas isto aqui é indefensável!” Marinheiro de primeira viagem, caí como um patinho nas garras da Justiça do Trabalho. O rapaz era bem treinado e, ao longo de míseros 7 meses, foi colecionando “provas das irregularidades”. Depois, vim a saber que ele já havia colocado em dificuldades uma empresa do ramo em Ribeirão Preto. E depois do depois, vim a saber que existem milhares de especialistas na área. Consultei vários amigos, pequenos-empresários do ramo, e a imensa maioria me respondeu: “Cuidado. Se você cair lá, está frito”, ou então: “É mortal.”, ou ainda: “Não tenha esperanças. Não há defesa”. Pensei: “Que estranha justiça esta na qual uma das partes considera-se irremediavelmente perdida!”(10)

Esta curiosa esfera da vida econômica brasileira, que me pareceu, na época, uma das facetas da extorsão legal vigentes no país, foi-me contra-argumentada por um juiz trabalhista com a singela explicação: “Trata-se de um mecanismo de redistribuição de renda!“ Tratar-se-iam de extravagâncias do Terceiro Mundo? Posteriormente, vim a estudar o problema e perceber as profundezas da questão.

O contato com essas Juntas de Conciliação e Julgamento, hoje denominadas Varas, depois de tão “profundas” reformas, é aterrador. No centro e num plano de nível bastante superior encontra-se o “juiz togado” (leia-se “advogado concursado”). Aos seus lados, os “vogais”, hoje denominados “juízes classistas”. Estes solicitam a identificação da empresa, representantes etc. Hoje, sei que os juízes classistas são indicados por sindicatos patronais ou de empregados, ao seu bel-prazer, sem consideração aos níveis de escolaridade. Soube também que no Rio de Janeiro, foram criados dezenas de sindicatos-fantasmas com o fim precípuo de indicação destes juízes classistas. Dependendo da instância, ganham a mesma quantia que os juízes togados, têm direito a 60 dias de férias anuais e, após 5 longos anos de “árduas” atividades, têm suas aposentadorias garantidas com salário integral. E no Rio de Janeiro, no dia 26 de Fevereiro de 1997, fizeram passeata por melhores salários! Exuberâncias tropicais? O Sr. Alan Greenspan falava há pouco sobre exuberâncias irracionais a propósito do comportamento das bolsas. Aqui, as exuberâncias são de outra ordem e, para piorar nossa sina, estruturais.

O juiz central, o togado, num plano superior, lança a palavrinha mágica: “Há acordo?” — Balbuciam-se algumas palavras de lado a lado e, se naqueles rápidos momentos, nota-se a dificuldade de uma “cifra” comum, inicia-se o processo de tomada de depoimentos. Ali, você, pequeno-empresário, começa a sentir-se espezinhado, um vil explorador da mais-valia, burguês, neoliberal etc. A reclamada deve retirar-se para o depoimento do reclamante. É fantástico: o privilégio tem apenas uma face! Volta-se à palavrinha mágica: “Há acordo entre as partes?” — Afinal, há milhares de processos solicitando leitura, reflexões, decisões (humanamente impossível neste mar de processos). Não seria melhor para todos uma solução rápida, rasteira e ponto final? De fato, 80% dos casos são resolvidos na primeira instância. Propostas e contrapropostas são lançadas. Em algumas ocasiões os valores parecem não guardar nenhuma relação com os números citados nos processos. Se a audiência for realizada em Dezembro, por exemplo, o representante da reclamada pode ser lembrado deste fato com: ”Vamos melhorar um pouco a proposta, afinal, estamos às vésperas do natal!” — Podem ter relação, por exemplo, com os honorários advocatícios, ou seja, o custo, não apenas os monetários, horas de trabalho, que não fosse o caso, estariam sendo dedicadas ao trabalho produtivo, além do desgaste emocional para a empresa de uma segunda audiência. O papel das testemunhas do reclamante é fundamental. Nossa loja abria às 9h da manhã; no entanto, a testemunha afirma que encontrava sua colega às 8h fazendo hora-extra. E o que ela fazia lá às 8 horas? Só para testemunhar num futuro processo trabalhista? Raciocínio zero, irracionalidade, cem. Às vezes, chego a pensar que o ar nos trópicos, além de oxigênio, deve conter algum elemento idiotizante para aumentar nossa tragédia. Não, não. Afinal, a Iugoslávia, antes de sua dilaceração étnica, também tinha Justiça do Trabalho, que cuidava, como a nossa, de conflitos de interesses. Será que a Bósnia, a Sérvia, a Croácia etc. inspirar-se-ão em tão sábios conhecimentos?

Para as pequenas-empresas e nos casos em que os funcionários tenham mais de um ano de casa, as homologações (rescisões contratuais) junto ao sindicato da categoria ou à Delegacia do Trabalho são extremamente custosas. A burocracia é infernal. Depois, descobre-se que já o enunciado 330 do Tribunal Superior do Trabalho (TST) insinua sua eficiência quase nula: “... tem eficiência liberatória em relação às parcelas expressamente consignadas no recibo...” — A verdadeira homologação, em um grande número de casos, é lá, na Justiça do Trabalho. O resto é balela.

Se importantes economistas costumam afirmar que a pequena-empresa é a sementeira do progresso, constituindo-se na principal origem de novas criações, a Justiça do Trabalho no Brasil é para ela mortal. É o principal elemento de destruição da pequena-empresa, ali, no seu nascedouro. Claro! Ela não dispõe de um departamento jurídico para lidar com o Monstro! Imagine se um pequeno-empresário, trabalhador, empreendedor, criativo, gerador de empregos, mas de parca erudição, conhecer os perigos da existência da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), com seus 922 artigos! Admita-se, num cálculo conservativo, duas interpretações por artigo — exegese de excrementos — e atingimos a fantástica cifra de 1844! A grande-empresa dispõe de um departamento jurídico específico para lidar com as milhares de armadilhas da Justiça do Trabalho (que desperdício de recursos!), e ele preocupado com ferramentas, acidentes de trabalho, cálculos econômicos complicados, nestes anos em que se formula a política econômica com evidentes propósitos eleitorais, cheia de mágicas e truques. E agora, mais esta? Não, o país parece não ter vocação para o progresso, apesar do dístico positivista da bandeira: Ordem e Progresso.


História da Justiça do Trabalho

 

Uma das questões de altíssima relevância para nosso país, na atualidade, é o denominado Custo Brasil. Tratarei, no meu entender, dos seus mais importantes componentes: a CLT e a Justiça do Trabalho. Comecemos com o estudo da origem desta excrescência: Getúlio Vargas, aproveitando-se da debilidade de nossos antepassados, fazendeiros paulistas exportadores de café, provocada pela Grande Depressão de 1929, articulou e comandou uma Contra-Revolução em 1930. Eram os anos dourados do nazi-fascismo e, portanto, os ventos internacionais o favoreciam. Aquele promotor público gaúcho “importou” da Itália fascista de Mussolini as idéias fundamentais que iriam configurar as bases da CLT e da Justiça do Trabalho(11).

O fundamento, a raiz do raciocínio de então era o princípio básico do marxismo: as “classes sociais” — burguesia e proletariado, conceitos clássicos do marxismo — estariam inexoravelmente em permanente luta. Paradoxalmente, do ponto de vista das idéias, o fascismo, oposto ao comunismo, assimilava os conceitos marxistas de “compreensão” do processo social. O Estado teria então uma função tutelar, regulando, disciplinando o que era considerado inevitável: o hipotético conflito “capital versus trabalho”. O comunismo florescia ao leste e fazia-se necessária uma forma de combatê-lo internamente. Daí surge a semântica do nacional-socialismo (nazismo e fascismo). O Estado ditatorial exigia um pacto de paz entre os fatores de produção — capital e trabalho — nos seus preparativos, sabe-se hoje, para a guerra. Vargas transladou a Carta del Lavoro de Mussolini — aqui denominada CLT — e introduziu no país esta esquisitice de profundas implicâncias negativas para nosso desenvolvimento econômico. Desde então, todas as modificações introduzidas no espírito original da Carta, desde a Constituição de 1946, só vieram a agravar profundamente o problema. Seu ápice foi a Constituição “Cidadã” de 1988. Os italianos, após sua derrota na 2a. Guerra Mundial sob o comando de Mussolini, jogaram no monturo da história essas idéias estapafúrdias e iniciaram um novo ciclo de progresso social que se estende até os dias de hoje.

Ao analisarmos alguns aspectos da CLT, anotamos, entre outras “pérolas”, o artigo 766: “Nos dissídios sobre estipulação de salários, serão estabelecidas condições que, assegurando justos salários aos trabalhadores, permitam também justa remuneração às empresas interessadas”. Ou seja, salário ou retorno de capital deixam de ser questões econômicas (oferta versus demanda etc.) e passam para a esfera jurídica! Extravagâncias do subcapitalismo brasileiro! Os juízes trabalhistas, municiados de tais premissas, passam a ser economistas onipotentes; inclusive os classistas, sabe-se lá com que níveis de escolaridade. Comparam os salários do Brasil com os da Alemanha ou da Indonésia, independentemente de níveis de produtividade e renda — declarações do Presidente do maior TRT do interior, no Diário do Povo, de Campinas, em 5 de Janeiro de 1997; falam em “poupança interna disponível” — Presidente do TST, este, provavelmente, com muito mais anos de treinamento na área em relação aos juízes de primeira e segunda instância. Ou então filosofam: “o direito do trabalho nunca deixará de ser protecionista porque ele tem de contrabalançar a desigualdade econômica” — Diário do Povo, Campinas, 5 de Janeiro de 1997, ou: “ele deverá sempre estar ao lado dos mais fracos” — juíza Graciela Paula Ferroni, no Correio Popular, no dia 22 de Março de 1999. O raciocínio segue sempre o velho estilo fascista. Este é o lado pitoresco, quando a justiça especializada do trabalho cuida não apenas de conflitos de direito, mas também de conflitos de interesse, como nos casos do Brasil e da Ex-Iugoslávia. Não me refiro aqui à atual União de Sérvia e Montenegro, atualmente denominada Iugoslávia, que nestes dias, parece renascer com a queda de Milosevic (Outubro de 2000) e depois de devidamente bombardeada pelas forças da OTAN, mas sim a anterior, do Marechal Tito — essa informação que diz respeito aos conflitos de interesse me foi proporcionada pelo trabalho de José Pastore, aqui citado.

No início, os entraves para o crescimento econômico criados pela Justiça do Trabalho foram pequenos, a começar pelo fato do desconhecimento da sua nefasta existência, mas a cicuta do conflito, o germe do mal, já estava desde então embutido. Os tumores requerem sempre a ajuda do tempo para seu pleno desenvolvimento. Na maioria dos casos, na vida, o tempo destrói e constrói concomitantemente — é a idéia sensacional da destruição construtiva de Schumpeter na economia capitalista. No caso brasileiro, o tempo teve apenas uma faceta: a destruição do incipiente capitalismo que reinava até os anos 30. De fato, analisemos os dados compilados — tendência, no tempo, do número de reclamações recebidas anualmente desde 1945, dados fornecidos por Roberto Fendt Jr. e Amaury Temporal: de 1945 a 1960, crescimento moderado — 0 a 150 mil; de 1960 a 1985, 150 mil a 750 mil; de 1985 a 1996, 750 mil a 2,5 milhões em apenas 11 anos! Uma média de 10 mil reclamações por dia útil! Vejamos a evolução do número de Juntas de Conciliação e Julgamento criadas em Campinas (dados de minha autoria): 1a.: em 1944; 2a.: em 1979; 3a.: em 1987, 4a., 5a., 6a., 7a. e 8a.: em 1993; 9a.: em 1998. Nos primeiros 35 anos, foi criada apenas uma Junta, nos 10 anos seguintes, mais 2 Juntas, e nos últimos 9 anos, 5 Juntas! Que perfórmance! Se elas gerassem crescimento econômico, com absoluta certeza, seríamos o país de maior sucesso nas últimas décadas, ultrapassando até a Coréia do Sul, mas parece não ser esse o caso.

Qual a razão para taxas de crescimento de conflitos tão explosivas? Ora, é a própria Justiça do Trabalho que pressupõe e estimula os conflitos. Melhor seria que estimulasse a produção e o emprego. Visto de outro ponto de vista, é o resultado da cultura que impregnou nossa força de trabalho, e talvez, nada seja mais importante do que a cultura de um povo; leia-se, a propósito, o monumental trabalho de Max Weber “A ética protestante e o espírito do capitalismo”. Essa é a questão fulcral. Em conversas informais com pequenos e médios empresários a respeito de prováveis projetos de investimentos, eles invariavelmente me respondem: “Ah! não! Cuidado com a Justiça do Trabalho!” Se, no mundo atual, os países que deram certo estimulam a harmonia entre o capital e o trabalho, por que não seguir-lhes o exemplo? Ela, a Justiça do Trabalho, tornou-se o principal componente do “Custo Brasil” e o principal obstáculo institucional para o desenvolvimento nacional.


O Mercado da Justiça do Trabalho

 

Por que dificilmente será extinta no Brasil a Justiça do Trabalho? Ou, ainda, a enorme capacidade de resistência da corporação da Justiça do Trabalho? De fato, num sentido amplo da palavra, ela significa um fantástico mercado de proporções inacreditáveis e de privilégios que tentaremos demonstrar neste artigo. Antes de mais nada, uma pequena ressalva, fruto de minhas previsões pessimistas que, infelizmente, sempre se realizaram nesses últimos anos. O mais provável é que a CPI do Judiciário se transforme em mais um espetáculo circense devidamente comandado pela TV Globo e congêneres, sobre questões de corrupção e nepotismo, tão a gosto do país nos últimos tempos. “Isso é uma vergonha!” e coisas do gênero. Ou então, Galvão Bueno, enfático: “Vai, senador! Vai que é sua!”. Há mais de 30 anos, no meu curto exílio em Montevidéu, um uruguaio me dizia com ironia: “El Brasil es el más grande del mundo.” — e acrescentava: “El Maracanã es el más grande del mundo.”. Quando um povo perde a capacidade de raciocínio, de pensar a relação causa-efeito, dos rudimentos da lógica, o circo é um espetáculo anestésico e confortável para os detentores do poder, como na antiga Roma. Pobres cristãos de então. Os escândalos, oh... os escândalos! Sobretudo os político-financeiros. Ora, desenvolvamos o país e eles terminarão. Para mim, o grande escândalo é a falta de empregos e produção ou, em outras palavras, estancar o mais breve possível a geração de pobres e miseráveis. Além, é claro, de diminuir o ritmo alucinante da intensidade da guerra, aqui eufemisticamente denominada de “violência criminal”. Até os bispos percebem isso! Apesar de os pobres e miseráveis constituírem insumo indispensável — se não me falha a memória, devo essa idéia ao Sr. Roberto Campos, ainda que fiel devoto do Senhor — para a pregação das graças divinas. Nesse aspecto, a riqueza material não constitui para eles nada interessante; a pobreza e a miséria são matérias-primas mais promissoras. Na raiz de tudo, sempre encontram-se os fundamentos do Tribunal do Santo Ofício e da Inquisição: o horror à riqueza, ao lucro e ao empresário.

Se insisto no tema da Justiça do Trabalho, é porque estou convencido que ele guarda uma profunda correlação, negativa, com o crescimento econômico. Esse é o âmago do debate. Tudo o que tiver relação com o crescimento econômico deve ser priorizado. Se os senhores senadores e deputados necessitam de luzes, holofotes, câmeras, etc. para as próximas eleições, esse deveria ser um problema à parte. Mas não o é. Essa é a tragédia.

Comecemos, a partir dos dados de que disponho, a estimar a evolução e as dimensões físicas desse particular mercado. A partir dos anos 60-70, os agentes econômicos ligados à esfera jurídica perceberam o enorme potencial que a CLT e a Justiça do Trabalho abriram aos seus negócios: o mercado dos conflitos trabalhistas(12). O primeiro passo foi a abertura de inúmeras faculdades particulares de Direito, sem eira nem beira. Os investimentos eram baixos, cursos noturnos, ausência de laboratórios etc. e o futuro promissor. Os advogados começaram a ser produzidos ao mesmo ritmo que um torno-revólver produz parafusos. De fato, dados de 1996 indicam que dos 350 mil advogados existentes no país, 45% atuavam na área. Essas faculdades de Direito podem ser criadas sem sequer a exigência de um único Philosofical Doctor no seu corpo docente e ainda dispor de um período de carência de 8 anos para a formação de um terço do seu corpo docente na categoria de Masters. Os resultados podem ser bem avaliados nos comentários de uma promotora (O Estado, 31/8/96): “Conta-se do candidato que, ao fazer o exame da OAB para obter a carteira que lhe daria o direito a exercer a advocacia, foi indagado pelo examinador sobre a diferença entre “pessoa física” e “pessoa jurídica”. Respondeu o candidato: “Sei perfeitamente a distinção entre os dois termos. “Pessoa física” é qualquer um, eu, por exemplo. Já “pessoa jurídica”, sem dúvida, é Vossa Excelência”.

Pari passu com a expansão do mercado no setor privado, foi a do setor público. Nascendo do zero em 1943, hoje, a Justiça do Trabalho significa 50% dos gastos do Poder Judiciário. Não haverá um único cérebro nacional para questionar se isso existe em alguma outra parte do mundo? Vasculhem, senhores bacharéis! Eu os desafio! Seja na África ou em Bangladesh; nos países civilizados, nem percam tempo, pois lá, ela sequer existe. De fato, dos 4904 juízes federais existentes no país, 4306 são juízes trabalhistas, dos quais 2819 são juízes classistas, 57% do total geral, portanto (dados de 1996). Os juízes trabalhistas perfazem, assim, a “modesta” cifra de 88% do total de juízes existentes no país (fonte: Banco Nacional de Dados do Poder Judiciário, publicados pela Folha em 26/2/97)!

O último grito da moda na expansão física do mercado da Justiça do Trabalho é o campo. Um amigo me contou que os advogados trabalhistas saem à cata de conflitos rurais. A rotina funciona mais ou menos assim:

— Há quantos anos o senhor mora aqui?
— Ah, sei lá, mais ou menos uns vinte anos.
— A sua mulher faz faxina na casa do patrão?
— Ah, faz! Eles são gente muito boa e nos ajudam em tantas coisas!
— O senhor, por acaso, sabe dos seus direitos?
— Sei não, doutor, e nem quero saber.
— Bem, de qualquer forma, voltarei na próxima semana com os cálculos na mão (com que tentações!).

Nosso pobre sitiante descobre que, após dezenas de anos de labuta, o valor da propriedade não cobre o passivo trabalhista! De fato, uma nota recente do colunista César Giobbi, do Estado (31/3/99) relata o seguinte: “Uma senhora cujo único bem é um sítio em Limeira, onde reside, tem sua propriedade ameaçada de penhora por decisão da Justiça do Trabalho. Foi condenada a pagar R$ 500 mil a um ex-empregado que ganhava salário mínimo e trabalhou para ela durante apenas seis anos...” — Um cauto fazendeiro me relatou que sua fazenda dispõe de 4 casas, em perfeitas condições sanitárias, fechadas! Contou-me ainda que um vizinho seu com importantes contribuições para o desenvolvimento de defensivos no cultivo de tomates — hoje, de utilização em âmbito nacional, mas bastante descuidado com os novos tempos perdeu absolutamente tudo e vive de favor na casa de um dos filhos.

De fato, hoje, muitos fazendeiros optam por não tocar suas fazendas e gerar empregos devido a esse “probleminha”. E depois, muitos se perguntam de onde brotam, depois de 1980, os MST da vida? E a grande maioria, sobretudo os padres e bispos, conclui sobre a necessidade de reforma agrária. E eu os desafio: donde demônios a reforma agrária resolveu o problema da produção agrícola? Na Ex-URSS? O maior clássico do marxismo sobre o tema é: “La cuestión agrária”, de Karl Kaustky. Disponho de um velho exemplar amarelecido pelo tempo e pelas idiotias. Os Estados Unidos, atualmente, com apenas 3% de sua população trabalhadora no campo, são o maior produtor de grãos do mundo! E lá, nunca ninguém falou nesse negócio de reforma agrária.

Façamos uma tentativa grosseira, mas altamente relevante, de estimar a dimensão monetária desse mercado. O custo da Justiça do Trabalho é, hoje, de R$ 3,5 bilhões. As ações trabalhistas contra a União (dados de 1996) foram de R$ 2,4 bilhões. Para o setor privado, adotaremos as seguintes hipóteses: a) 95% das reclamações são contra micro, pequenas e médias empresas; b) o custo médio de cada ação será estimado em R$ 3 mil. O número de ações recebidas em 1998 foi de aproximadamente 3 milhões. Logo, teremos: 3.000.000 x 0,95 x R$ 3.000 = mais ou menos R$ 9 bilhões. Portanto, somando as parcelas, teremos: M = 3,5 + 2,4 + 9 = R$ 15 bilhões. Desprezamos, nesses cálculos, por absoluta falta de estimativa de ordem de grandeza, a parcela devida às ações movidas por altos funcionários de estatais e do setor privado(13). Traduzindo para uma moeda civilizada, algo em torno de US$ 10 bilhões! Trata-se, portanto, de um mercado de considerável dimensão. Alguém se atreverá a enfrentar a AMB e a OAB? Essas são as prosaicas razões pelas quais a Justiça do Trabalho não será extinta e o Brasil, no mínimo, é um país de futuro duvidoso.


Aos Juízes do Trabalho

 

Ao ler os contra-argumentos da juíza Ivani Giuliani (Correio Popular, 14/4/99, pág. 3) aos meus dois primeiros artigos sobre a Justiça do Trabalho, uma dúvida me assaltou: seriam esses contra-argumentos frutos de sua ingenuidade ou apenas uma argumentação pro domo sua, ou seja, uma mera defesa dos seus privilégios? Meus parcos conhecimentos sobre Melanie Klein, psicanalista inglesa, sobre a importância da relação com o seio materno na formação da personalidade e voracidade, sugerem essa segunda hipótese.

Ela, de fato, trabalha em excesso e crê lutar por uma nobre causa em favor dos desprotegidos, descamisados, etc. Ah... velho Perón! Que falta nos hacés! Até o Infante Collor gostou dessa expressão mágica: os descamisados. Pena que o fascismo, no mundo civilizado, morreu. É, até certo ponto, triste afirmar que o melhor para o progresso do país seria que ela não trabalhasse ou, então, mudasse de ramo. De fato, faltam inúmeros juízes em outras áreas críticas do Judiciário. O trabalho dos Srs. juízes trabalhistas não é apenas improdutivo ou inócuo. Ele é de fato nocivo para o futuro do país. Vale o velho aforismo: o caminho do inferno está repleto de boas intenções. Meu pai, com sua parca erudição, já me ensinava anos atrás que: “Errar é fácil, meu filho. O difícil, mesmo, é acertar”. Por outro lado, a Sra. juíza parece não haver entendido o teor do meu discurso. A Justiça do Trabalho crescerá ad infinitum enquanto ela existir. Dobrem o número de Juntas. Logo mais, dobrem novamente. Além da questão central, ou seja, seu aspecto nocivo sobre a produção e o emprego, o déficit público nominal vai de vento em popa; hoje, estamos rodando à “modesta” cifra de 14% do PIB! Acho que nem a Rússia chegou lá. Hoje, até onde vão minhas informações, ela, a Justiça do Trabalho, só existe no Brasil. Nem na Guatemala, no Panamá, em El Salvador, na Venezuela, no Equador etc., ou seja, nesse aspecto, o Brasil, de fato, pertence ao Quarto Mundo.

Pouparíamos tempo e palavras, data venia, se a referida Sra. juíza lesse com mais atenção e menos emoção os nossos argumentos. Em primeiro lugar, cabe precisar, quando afirma que “não sei qual a sua atividade”, que não apenas me defini como microempresário como até o ramo ultraespecífico em que trabalho, i.e., marcenaria, i.e., móveis de madeira sob encomenda. Além disso, eu não me “intitulo” engenheiro e economista. Eu o sou, de fato. Suponho que, pela sua erudição e cargo, a Sra. é advogada, e não apenas uma simples juíza classista. Oh... terra de bacharéis! Pena que os conflitos trabalhistas não gerem nem produção nem empregos! Em segundo lugar, engana-se a Sra. quando pensa que eu desconheço essa excrescência, fruto dos interesses dos atuais detentores do poder, denominada de Constituição da República, de 5/10/88, “a maior do mundo”. Observem bem minha profecia: enquanto ela existir, o Brasil jamais voltará a crescer e gerar empregos e se transformará no principal distribuidor e exportador de drogas do mundo. O futuro dos seus filhos, Sra. juíza, está ligado indissoluvelmente ao dos meus. É por isso que a polêmica nos interessa a ambos e a todos. O câmbio correto, a ausência de truques eleitorais na formulação da política econômica e os juros baixos só nos permitiriam, se realizados, respirar com um pouco menos de dificuldade. De fato, no meu segundo artigo, “A História da Justiça do Trabalho”, em que relato, entre outras coisas, o mecanismo explosivo, exponencial, dos conflitos trabalhistas, afirmei: “Posteriormente, veremos que sua evolução — a dos conflitos, através da Constituição de 1988, continuaria a complicar ainda mais o quadro”. Felizmente, para mim, pelo menos, lá está tudo “preto no branco”, como diziam nossos antepassados portugueses. Em terceiro lugar, relatando minha ingenuidade ao voltar ao trópico, contei que joguei na lata de lixo o envelope da notificação judicial, e não a própria notificação, pois senão, nem faria sentido procurar um advogado. Em quarto lugar, devemos precisar que de fato somos adeptos do “capitalismo selvagem”, aquele mesmo que eliminou a pobreza e a a miséria nos países do Primeiro Mundo e, pasmem, inclusive na Suécia. A História é muito mais importante do que o Direito. Essa sua linguagem filomarxista está démodé. O Muro de Berlim ruiu. Além do mais, se a senhora lesse sobre outros temas sobre os quais escrevo, perceberia que o maravilhoso capitalismo nunca vingou por essas plagas. Vivemos um caso sui generis na história econômica humana, que denomino de “subcapitalismo”, ou “subeconomia de mercado”, em que existe até uma Justiça específica para as relações de trabalho. Esse é o drama.

Os recentes acontecimentos econômicos — o derretimento do congelamento cambial, me permitiram compreender outro aspecto importante do subcapitalismo brasileiro: a relação “Justiça do Trabalho Versus Inflação”. Esta é uma peça fundamental na explicação do mecanismo da insolúvel inflação brasileira. Até então, só havia compreendido a importância da Petrobrás via câmbio — óleo diesel, gás de cozinha e outros insumos derivados de petróleo altamente relevantes na matriz de produção. De fato, aos primeiros e tíbios sinais de retomada inflacionária, juízes de segunda e terceira instância se apressaram em afirmar que, sem dúvida, os salários deveriam ser re-indexados! Será que seus inconscientes estariam preocupados com seus próprios salários ou com os dos descamisados? Evidentemente, a indexação, neste momento, tornar-se-ia lenha de considerável calibre no fogo inflacionário. Um aspecto curioso é que ela é denominada de inflação “inercial” por grande parte dos mais importantes economistas oficiais e oficiosos do país. Abobrinhas locais para ampliar o leque de tautologias nacionais. Já o Sr. Antônio Carlos Magalhães, com seu mero instinto político, foi enfático: “Se re-indexar, aí sim é que a Justiça do Trabalho será definitivamente extinta”. Simples bravata, pois ela jamais será extinta e seguirá livre, saltitante e expansiva como sempre. O tímido tiroteio atual servirá, na melhor das hipóteses, para eliminar os classistas, como parece ser o desejo do príncipe. A tese é simples e direta: além do déficit público, premissa fundamental para a eliminação definitiva da inflação, ela jamais será eliminada sem a criação de um Banco Central independente do Executivo, a eliminação da Petrobrás e da Justiça do Trabalho.


À Associação dos Advogados Trabalhistas

A psique humana é reveladora (traiçoeira?), como nos ensinou o genial Freud. O artigo da advogada Iara Martins, Presidente da referida associação, intitulado “O Mercado da Justiça do Trabalho”, com o mesmo título de um recente artigo assinado por mim, trouxe-me essa idéia ao pensamento. Ela começa dizendo que: “Sem pretensão de alimentar polêmica com o Sr. Josino Moraes...” e termina o artigo dizendo: “... a possibilidade dele próprio sujeitar-se às novas medidas judiciais em face dos danos provocados por suas infundadas acusações”. Traduzindo em miúdos: ela, em nome de sua associação, não tem interesse na polêmica, mas, uma vez que eu a fiz inevitável, o melhor para eles seria eliminar o perigo — eu, no caso. Ora, srs. bacharéis! Não baixem o nível! Nosso debate é político e importantíssimo, se o país fosse sério. A coisa é simples: encontrem argumentos e fundamentem-nos. Por que não lhes interessa a polêmica? É claro, melhor para os srs. que essa questão fétida, o mercado da Justiça do Trabalho, ficasse hermética nos porões da casa. Como não parece ser esse o caso, até aqui, felizmente, os srs. se decidem por ameaçar-me.

Analisemos alguns aspectos de seu texto: em primeiro lugar, não há crise da Justiça do Trabalho. Pelo contrário. Ela, assim como o desemprego e as empresas de segurança, são casos raríssimos de prosperidade no meio da tragédia brasileira, que, realmente, foi acelerada pelo Plano Real, conforme seus argumentos. Sua prosperidade data desde seu início, em 1943, com a criação da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e da Justiça do Trabalho, pelas mãos teratogênicas do ditador Getúlio Vargas, inspirando-se na Carta del Lavoro de Mussolini. Será que os srs. leram meu segundo artigo, sobre o tema intitulado “A História da Justiça do Trabalho”, em que relato sua origem fascista? Aparentemente não, ou bem fazem de conta que não. Ela não é o desaguadouro da crise social. Pelo contrário, ela é o principal fator, do ponto de vista institucional, da crise social. Ela estimula o conflito entre capital e trabalho, e isso é mortal para nossas pequenas e frágeis empresas, que geram mais de 50% de empregos no país. Nossa força de trabalho, hoje, encontra-se totalmente contaminada por idéias como: “vou por ele no ...”, ou então, entram em nossas empresas colecionando documentos para uma posterior reclamação trabalhista, eufemismo, quase sempre, para extorsão. Como gerar empregos e riquezas num imbróglio como esse? Não é que sejamos maus patrões ou maus empresários, (exceções à parte), é que a Justiça do Trabalho tem como premissa que todos os patrões são maus, axioma marxista paradoxalmente assimilado como verdadeiro pelo fascismo. Percebem a diferença?

Perdoem-me se falhei ao não citar determinada fonte. É que meu editor é terrível. Vive me puxando as orelhas pela extensão de meus textos. Mas vamos lá, recapitulo suas palavras a respeito das minhas afirmativas “... que dos 350 mil advogados existentes no Brasil, 45% atuam na Justiça do Trabalho, além desse dado não ser confiável — a fonte sequer foi citada, até porque não deve existir”. Que audácia! E depois, advoga que ainda que 100% dos advogados do país fossem trabalhistas, que teria eu a ver com isso? Há um lado interessante no raciocínio dos srs.: a defesa da livre alocação de recursos. Eu, como liberal radical, achei, em primeira instância, bastante válido o argumento. Porém, refletindo um pouco mais sobre a questão, conclui que a Justiça não deveria ser uma simples questão de alocação de recursos, baseada, entre outros fundamentos, no critério de Pareto. O país já é sui generis, com sua Justiça do Trabalho, mas com 100% dos advogados atuando na área, a coisa chegaria às raias da loucura e da imbecilidade total. Apesar de que a tendência é realmente essa, para agravar nossa infelicidade, pois este mercado continua sendo promissor. A fonte de meus dados foi obtida através de uma brilhante reportagem, “Ação trabalhista vira alternativa de renda”, d’O Estado de 17/2/97. Os dados da reportagem são provenientes de uma pesquisa da OAB realizada em 1996, baseando-se numa amostra feita em 296 municípios. Essa é uma de minhas infundadas acusações. Não creio ter vocação para coprófilo, mas estudo essa excrescência, a Justiça do Trabalho, há anos, por crer que ela e, sobretudo, sua extinção, é peça fundamental para o desenvolvimento do país. Aliás, acho que todos deveríamos estar preocupados, pois, afinal, estamos todos no mesmo barco. Pena que a voracidade, quase sempre, impeça essa compreensão.

Quanto ao aspecto de o “direito inalienável de serem os advogados bem pagos pelos serviços que prestam”, nunca abordei o tema. Mas, a bem da verdade, os srs. não são pagos pelos desserviços que prestam, mas sim vivem de comissões/percentagens sobre extorsões. Aí está o busílis, o X da questão. O negócio não é simplesmente bom, é ótimo. O caso dos advogados das reclamadas é realmente diferente: eles são de fato pagos pelas empresas, donas-de-casa ou associações de bairro que montam cooperativas de segurança privada para preencher o vazio de um Estado malfadado.

Para arrematar, ocorreu-me estender algumas idéias de pensadores do passado: “Se a guerra é uma questão séria demais para deixá-la a cargo apenas de generais”, assim como a economia apenas para os economistas, a Justiça do Trabalho é um tema muito sério para deixá-lo restrito ao círculo dos srs. causídicos.


A Justiça do Trabalho e o Art. 5°

 

Observem bem essas sábias palavras de Maquiavel sobre a antiga Roma, há aproximadamente 500 anos: “Feliz a república à qual o destino outorga um legislador prudente, cujas leis se combinam de modo a assegurar a tranqüilidade de todos, sem que seja necessário reformá-las. É o que se viu em Esparta, onde as leis foram respeitadas durante oito séculos, sem alteração e sem desordens perigosas” (Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio, Editora Universidade de Brasília, pág. 23). É triste lembrar que Francisco Campos, mineiro, pejorativamente denominado de “Chico Ciência” por comunistas e outros, a serviço do ditador Getúlio Vargas, foi capaz, sozinho, de legislar sobre tão grave questão como a relação entre capital e trabalho. Ou melhor, copiar a legislação de um passageiro ditador italiano: Mussolini. Mais triste ainda é pensar que a Corporação do Judiciário consiga transmitir a grande parte do país tratar-se a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e a Justiça do Trabalho de coisas modernas. Quando levanto o debate sobre a origem de ambas, todos fogem assustados.

Um arguto leitor, Lito Galati, nos alertou sobre um dos importantíssimos aspectos da Justiça do Trabalho: sua afronta à Constituição. De fato, no nosso primeiro artigo sobre o tema, lamentávamo-nos sobre o que nos parecia sua parcialidade no trato dos “conflitos trabalhistas”. Felizmente, essa excrementícia carta de 88 incorporou no seu texto um princípio universal do direito, no seu art. 5°: Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza... Ocorre, para nosso augúrio, que essa não é a filosofia da Carta del Lavoro de Mussolini e nem de sua cópia tropical, a CLT. Quando a citada Carta estava moribunda na Itália, a CLT estava sendo plantada aqui, em 1943, onde floresceu tanto a ponto de gerar os paqueiros — profissionais especializados em “agenciar” conflitos trabalhistas, eufemismo para “extorsões”. Curiosamente, o ilustre Sr. Pazzianotto, Vice-Presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), afirmou, no Correio Popular do dia 10/6/99, pág. 3, que: “A legislação trabalhista evitou, por meio século, a luta aberta entre capital e trabalho”. Será que esse energúmeno ainda não percebeu que o capitalismo, que não pressupõe conceitualmente essa luta, foi o que deu certo e eliminou a pobreza e a miséria onde floresceu? Ou seria hoje essa pobre Rússia dilacerada e grande exportadora de prostitutas um exemplo a ser seguido? A razão maior para tamanha falta de percepção é a voracidade do seu estômago e a dos seus parentes.

Vejamos alguns aspectos da rotina das Juntas de Conciliação e Julgamento (elas não são necessariamente assim, pois, em algumas oportunidades, dependem da decisão pessoal do Juiz que preside a Junta:

a) Se a reclamada não comparece à primeira audiência, ela é condenada à revelia, além da confissão quanto à matéria de fato (CLT, art. 844). Se o reclamante não o faz, ainda terá várias chances para desarquivar o processo, com a restrição do limite dos 2 anos. Soube que, em algumas oportunidades, o reclamante se encontra presente, mas, se por alguma razão cabalística, seu advogado não gostar do número da Junta, eles não comparecem, pois ainda terão outras chances, do ponto de vista da teoria da probabilidade, de cair em outros números. E o art. 5°?

b) Se a reclamada não está assistida de advogado, a audiência não se realiza e a mesma é condenada — caso oposto ao do reclamante: o juiz o argui e o processo segue em frente. E o art. 5°? Vivemos um caso em que os juizes condenaram o reclamante por litígio de má-fé, mas, para compensar o “coitadinho”, encontraram horas-extras numa empresa em que elas são proibidas exceto em situações inevitáveis, o que não era o caso. Interessantíssima, nesse aspecto, a reportagem da revista Exame de 19/5/99. O caso mais pitoresco é o de um sujeito que trabalhava 24 horas por dia! Que fenômeno!

c) Se a reclamada acha injusta a sentença na primeira instância, terá que recolher determinada quantia para recorrer à instância superior, caso contrário ao do reclamante, para quem a farra é grátis(14). E o art. 5°?

d) Vivemos um caso em que o reclamante presenciou nosso depoimento, ao passo que nós fomos convidados a retirar-nos durante o seu. Aparentemente, houve um erro do juiz, pois isso não deveria ter ocorrido, segundo o Código Civil. A razão pode ter sido a força do seu inconsciente a favor dos descamisados.

Na visão fascista da CLT, todos os empregados são hipossuficientes, isto é, indivíduos economicamente fracos e que, portanto, necessitam da proteção do Estado, mesmo no caso de altos executivos (!), ao passo que todas as empresas são culpadas, salvo prova em contrário. Que princípios jurídicos! Cabe bem a pergunta, nessas últimas décadas de estagnação econômica: “Quem é o mais fraco? O especialista em extorsões ou a pequena-empresa à beira da quebradeira?” A Justiça do Trabalho é um dos principais fatores nesse processo de quebradeira. E depois da quebradeira, bons funcionários irão aumentar o já indigesto estoque — exército de desempregados! O problema central é a geração de empregos e o bem-estar social. Como a Consolidação das Leis do Trabalho e a Justiça do Trabalho não serão extintas, o mais racional, mesmo, data venia, neste país de irracionalidades, seria eliminar o art. 5°.


A Justiça do Trabalho e o Emprego

 

Em primeiro lugar, devo agradecer alguns assíduos leitores de meus “insidiosos” artigos sobre a Justiça do Trabalho, mediante o Correio do Leitor, do nosso prezadíssimo Correio Popular. Que me perdoem os leitores se, em algumas oportunidades, utilizo duras palavras, com o intuito de provocar o debate, pois ele interessa apenas a uma mínima parcela lúcida do país. De fato, uma recentíssima pesquisa, encomendada pela Força Sindical (O Estado, 26/6/99), descobriu que 89% dos entrevistados são contrários à sua extinção. Ora, no atual ciclo da nossa vida política, embasada num sistema de votos obrigatórios, quais os políticos que tomariam como bandeira um “abacaxi” como esse? Devo agradecer, também, a outras inúmeras manifestações de apoio no Correio do Leitor, dentre elas a do Sr. Sebastião Rabelo Queiroz Filho, que, afetuosamente, referiu-se a mim como “Prof. Moraes”.

Um leitor, o Sr. Edilberto Chaves, acredita que dirijo a polêmica ao desemprego dos atuais juízes, e afirma: “Mudem os juízes... extinguir a Justiça do Trabalho... nunca!” Realmente, ele não entendeu o cerne da argumentação. O problema central é ela como instituição. De fato, concordo com sua percepção de que ela não será extinta, não nunca, claro, pois sempre resta uma tênue esperança, como afirmei em vários de meus artigos, pois o país, no curto e médio prazos, não tem futuro. Sua segunda linha de raciocínio é que a extinção da Justiça do Trabalho significaria retroagir à escravidão. Já ouvi isso de algum juiz classista. Lá vai bala: como que o Brasil de 1889 a 1930, a hoje denominada Velha República, teve um dos períodos mais férteis, senão o mais fértil da sua história, sem absolutamente nenhuma regulamentação trabalhista? Governos democráticos, ausência de intervenções militares, favelas, assaltantes, assassinos, ocupações de sem-terra e sem-teto e prosperidade econômica, com nosso brilhante setor de exportação de café na linha de frente. Depois, graças à Grande Depressão de 1929, veio Vargas com seus princípios fascistas e suas famigeradas CLT e Justiça do Trabalho. Aos fatos, srs., ou então, reescrevam a história. Nossa paixão é a verdade, ainda que, como precisou Nietzsche, ela seja sempre tão dolorosa.

O segundo caso é muito mais interessante: trata-se do caso de “uma simples trabalhadora”, coitadinha, de nome Joaquina Veiga. Mal sabe ela que ser trabalhadora neste país da farsa do Real é um privilégio. Ela simplesmente me pede, com duras palavras, que eu me cale! Ela se sente cansada de ler meus artigos sobre a Justiça do Trabalho; não os outros, quando escrevo sobre economia ou violência. Além de tudo, minha imperfeita erudição a incomoda: “cansada da sua sabedoria... seus sábios conhecimentos”. Ora, Dona Joaquina, o debate realmente cansa, como toda atividade humana, mas faz-se necessário contra-argumentar o oposto e não exigir o seu silêncio, pois isso me parece muita deselegância entre civilizados. A primeira idéia que me ocorreu é tratar-se o seu caso de uma manifestação extrema de masoquismo, pois, afinal, a senhora não é obrigada a ler meus artigos. A segunda idéia foi de que o assunto lhe era realmente significativo. Farejei nas suas palavras tratar-se de uma reclamante trabalhista. De fato, como os processos são públicos, tive a pachorra de averiguar rapidamente, via telefone, seu caso. A senhora, provavelmente, deu uma mãozinha no processo de falência do Banco Auxiliar, através de uma reclamação trabalhista. Não consigo precisar a data, pois são muitos os anos; sequer me recordo se estava no país. E, junto com o banco, foram suas empresas coligadas, algumas, parece-me até, do setor produtivo, e com elas a geração de centenas de desempregados. Aí está esta relação, aparentemente distante, entre a Justiça do Trabalho e o emprego. A outra é o medo que pequenos-empresários têm de empregar, devido às centenas de armadilhas criadas pela CLT e pela Justiça do Trabalho. Se até a um banco os srs. reclamantes conseguem contribuir para sua quebradeira, imaginem o que não fazem entre as micro e pequenas-empresas! O efeito é devastador! E mais desemprego! Quem era o lado fraco (hipossuficiente) da relação? Os srs. ou o banco? A senhora está vivinha da Silva, mas e o banco e as outras empresas? Tão falidos que nem me lembrava de suas existências. Os bancos, no Brasil, também são responsáveis pela destruição de nossas empresas, mas a culpa não é propriamente deles, mas sim do governo, com seus megadéficits públicos. Eles não existem, aqui no Brasil, para financiar a produção e o comércio, como o fazem no bem-sucedido mundo capitalista. Mas essa é uma outra história.

Tenho insistido que a filosofia marxista, incorporada pelo fascismo, é o cerne da nossa Justiça do Trabalho. De fato, observem algumas de suas palavras: “Deixe a Justiça do Trabalho para o tão sofrido e explorado trabalhador”. Só faltou mesmo acrescentar a mais-valia. Por que cargas d’água o Muro de Berlim não caiu sobre a cabeça de tantos aqui no Trópico? Oh! infelicidade! Fidel, el del paredón, é a “estrela” na Cimeira do Rio.

Não me calarei sobre as mazelas nacionais, pois não há causa maior do que a luta pelo bem público, e se essa não fosse razão suficiente, por alguma estranha força, pareço ser uma nova manifestação de Dom Quixote. E, para meu drama pessoal, sequer conto com a ajuda de Sancho Panza para alertar-me: “De que vale o governo das armas sem o governo das tripas?


O Seguro-Desemprego e os 40%

 

Uma das maiores mazelas nacionais geradas nesses últimos anos, além de outros aperfeiçoamentos das nefastas CLT e Justiça do Trabalho, é o seguro-desemprego e os 40% de multa sobre o FGTS. O altruísmo amador quase sempre gera “pequenas” tragédias, como no caso. Vou relatar o que tenho vivido pessoalmente e o que outros amigos, pequenos-empresários, relatam-me. Mas antes, um pouco de história:

O seguro-desemprego tem origem, basicamente, na social-democracia européia, tão ciosa dos princípios do Estado do Bem-Estar Social que hoje, nesse mundo terrivelmente competitivo, estão sendo revistos, até na Suécia. Os níveis de desemprego, hoje, nos países europeus, são mais do que o dobro de nos Estados Unidos, apesar de milhões de hispânicos (denominação errônea utilizada nos Estados Unidos para os latino-americanos), dentre eles, quase um milhão de brasileiros, que ingressaram no seu mercado de trabalho nos últimos anos. A memória me traz à lembrança a história de um pobre brasileiro que morreu tentando atravessar a nado o Rio Grande, que delimita a fronteira entre o México e os Estados Unidos, à procura de trabalho. E lá não existe uma Justiça específica para as relações de trabalho!

Os Estados Unidos são o país de maior sucesso nestes últimos séculos. Recentemente, ganharam uma guerra, praticamente sozinhos, sem sequer perder um único homem no campo de batalha. O valor de uma única empresa, a Microsoft, equivale ao PIB do Brasil! Esses são os fatos, apesar de nosso histórico anti-americanismo, cultivado após a ascensão da teratogênica figura de Getúlio Vargas, em 1930, que, com a ajuda dos comunistas, deu o pontapé inicial à tragédia nacional. Antes, Ruy Barbosa, inspirando-se na nobre Constituição Americana, que já dura 2 séculos, elaborou nossa Constituição da República. Que saudades do bom senso! Seguiram-se 40 anos de reinado do liberalismo, com enorme progresso social. Além de Vargas e dos comunistas, desempenharam um grande papel os militares positivistas (Getúlio também sofria uma forte influência dessas idéias). O nacionalismo getulista se unia ao anti-imperialismo leninista dos comunistas locais. Não foi apenas um fenômeno brasileiro, mas sim de todo o Terceiro Mundo, sobretudo na América Latina. Não é à toa que somos o último baluarte do comunismo, com Cuba, as FARC e o ELN colombianos, o Sendero Luminoso no Peru (hoje, aparentemente destruído por Fujimori), o MST rural e urbano no Brasil etc. Poderíamos dizer que do ponto de vista universal, o comunismo morreu. Porém, o comunismo, aqui na América Latina, com a exceção honrosa do Chile, continua mais vivo do que nunca. Vide Lula, a única oposição de peso à aliança PMDB-PFL-PPB-PSDB, que sustenta o Presidente Fernando Henrique, além de nossas universidades. Nós, liberais, partidários da implantação definitiva do capitalismo como meio para eliminar a pobreza e a miséria, podemos ser contados nos dedos da mão. Os Estados Unidos deram certo, e nós não... até aqui — oh... sublime esperança! Alguns sábios do passado já afirmaram que fica mais barato aprender com a experiência alheia. Parece-me um ensinamento de rara sabedoria.

O Senador José Serra, eterno cor-de-rosa, ex-JUC, ex-AP, ex-MDB, ex-PMDB e hoje do PSDB, Ministro de incontáveis áreas e velho conhecido, foi o grande batalhador da idéia do seguro-desemprego, hoje incorporada aos quase infinitos despautérios da Carta de 88, artigo 7, inciso II. Nos nossos anos de exílio, doutorou-se em economia no Canadá. O grave senão é que essa idéia, aqui no trópico, acelerou a volta para trás. Coisas da vida. Recordo-me vagamente de que quando o mesmo foi candidato à prefeitura de São Paulo, os benefícios do salário-desemprego foram alongados ali. Que horror a política feita nesses termos! A grande vantagem para os políticos nacionais é que o povo, inclusive as chamadas “elites”, não tem capacidade de raciocínio; muito menos de memória. Até os gregos já sabiam que sem esses pré-requisitos, não há a mínima possibilidade de democracia. Exagerando um pouco, como nos modelos econômicos, a fim de estimular o raciocínio, seria algo assim como afirmar que se a Etiópia realizasse eleições e contasse com um sistema de votos obrigatórios, tratar-se-ia de um novo exemplo para democracia, e o mundo civilizado deveria aplaudir esse fato, apesar de inúmeras mortes por inanição por lá... A democracia hodierna está intimamente ligada à livre economia de mercado.

Quais as conseqüências de tão nobres idéias para as pequenas-empresas? Um novo adendo ao velho Inferno da CLT e da Justiça do Trabalho. Funcionários com mais de 6 meses de casa e, portanto, com direito ao famigerado benefício do salário-desemprego, passaram a exigir suas demissões. Além do seguro-desemprego, existe a tentação da retirada do FGTS e os 40% de multa sobre o mesmo, outra das pérolas de 1988. Na melhor das hipóteses, eles o convidam para um acordo, ou seja, você fica dispensado dos 40%. O artifício é elementar: eles assinam um vale no valor correspondente(15). O terrível é que, muitas vezes, a microempresa não dispõe de caixa para enfrentar a situação. Ou, em outras situações mais críticas, você sabe que o funcionário está roubando a empresa e não têm meios para dispensá-lo. É isso mesmo! Vocês leram corretamente! Nas pequenas-empresas, ainda com um profundo caráter artesanal, quem dá o ritmo à produção é o homem, e não a máquina, como na grande indústria; lá, se bobear, a mão “vai pras cucuias”. Então, baixa o espírito do “não tá contente, manda embora”. E aí? Como sair dessa? Ele reduz sua produção e a da equipe. É mortal. E se a empresa não o mandar embora com todos seus “direitos”, ele insinua: “Veja lá com a Justiça do Trabalho!” — ou então, como aconteceu com um amigo, ele se dirige a uma delegacia próxima dizendo-se ameaçado de morte pelo encarregado e por você! O delegado o intima e o “processo” vai para o Judiciário (Lei das Pequenas Causas); lá, o promotor pede sua condenação e pena sem absolutamente nenhum elemento de prova: fornecer X cestas básicas para determinada instituição de caridade. Se você não aceita a “condenação”, o “processo” é arquivado, mas você perde a condição de réu primário durante 2 anos! Não existe a possibilidade de absolvição. Haverá algo de mais excrementício debaixo dos céus do que o Judiciário brasileiro? Ele é a verdadeira cornucópia de horrores, mar de sargaços.

O seguro-desemprego e os 40% tornaram-se, nestas paragens, um grande incentivo à informalidade. Recebe-se o salário-desemprego e trabalha-se sem carteira assinada. Ou então, perde-se a velha carteira, tira-se uma nova e recebe-se dos 2 lados. Os social-democratas tropicais precisam, antes de mais nada, assimilar a cultura local para evitar tamanhas asneiras.

Outro aspecto pitoresco é que estudiosos do problema do desemprego e da rotatividade, analisando apenas os frios números, como o jovem Prof. Pochman (“Equívocos da flexibilização trabalhista”, Folha, 8/12/99, 2-2), concluam sobre a falta de rigidez ou alta flexibilidade do mercado em questão, elogiando-o. A Academia ajuda a compreender parte dos fenômenos da vida, mas, às vezes, apenas ela nos conduz a conclusões tolas. É preciso, também, viver o calor da realidade, o barulho infernal de máquinas que nos ensurdecem, conviver com os paqueiros dos advogados trabalhistas, para entender que os frios números não significam, em si, absolutamente nada. Desçam às nossas fabriquetas, perguntem as razões a esses rudes homens de produção e talvez os srs. possam aprender algo de útil.

O seguro-desemprego e os 40%, espero, foram a última metástase da CLT e da Justiça do Trabalho. Consolo de pouca valia, dado o estado de septicemia e estiolamento do corpo social.


A Fiesp e a Justiça do Trabalho

 

Depois que o Senador Antônio Carlos Magalhães, num simples repente de ira, absolutamente passageiro, fruto de indelicadezas horrorosas por parte do Sr. Almir Pazzianotto, permitiu-nos trazer à baila o resultado de vivências e pesquisas sobre a Justiça do Trabalho, pareceu-me chocante o comportamento da FIESP — Federação das Indústrias do Estado de São Paulo. Como membro dessa Federação, enviei ao seu Presidente e ao departamento jurídico meus primeiros artigos sobre o tema. Responderam-me estar interessados na questão e nos subsídios (sic) fornecidos para uma eventual reforma da nossa legislação trabalhista. Que coisa mais ridícula! Minha tese, exposta exaustivamente através de inúmeros artigos no Correio Popular de Campinas, é claríssima: advogo, enfaticamente, a total extinção da Justiça do Trabalho e uma nova cultura nas relações de trabalho, que permita a total implantação do capitalismo no país; não sua reestruturação. A “extinção” proposta pelo Deputado Aloysio Nunes Ferreira, em 1999, que consiste na incorporação da Justiça do Trabalho pela Justiça Federal, é absolutamente ridícula. Algo assim como a tentativa hercúlea de colocar um dinossauro numa caixa de fósforos. Demonstrei por a mais b a excrementícia origem fascista-marxista da Justiça do Trabalho. Parece-me que não se dignaram sequer a consultar os manuais de história para averiguar a veracidade de minhas assertivas. A FIESP sequer descobriu, depois de 70 anos, que foi Vargas o algoz do futuro de suas empresas! Que pena para eles e para todos!

Por que os grandes industriais paulistas, as multinacionais do ramo, bem como outras grandes empresas de serviços — bancos, telefonia, grandes redes de supermercados — não aproveitaram a deixa do Senador Antônio Carlos Magalhães?

Em primeiro lugar, porque eles se sentem membros da “Instituição Brasil”, esse Brasil cujas pessoas incultas do Primeiro Mundo pensam ser a capital Buenos Aires! E, como tal, qualquer membro dessa grande Instituição deve ser preservado. Trata-se, num sentido primário, do espírito de corporação. De fato, em algum jantar de confraternização do CIESP-Campinas, deparei-me, a contragosto, com membros do TRT. Adulações na expectativa de bons acórdãos? O TRT da 15ª Região de Campinas, o segundo maior do país, é tão mecenas que, no ano 2000, inaugurou uma galeria de arte com todos os seus conformes, inclusive vernissages (Correio Popular, 30/11/00, C). Em vez de se respirar extorsões, respirar-se-á arte daqui para a frente!

Em segundo lugar, porque eles já assimilaram os custos da Justiça do Trabalho. Eles dispõem de departamentos jurídicos específicos para lidar com o Leviatã. Que desperdício de recursos! Quem paga a conta? Nós, como consumidores de seus produtos e serviços. O Banco Itaú, por exemplo, dispõe de todo um andar para seus advogados trabalhistas cuidarem de mais de 100.000 processos em andamento, segundo reportagem da revista Exame (19/5/99). E nós, pequenos empresários do comércio, da indústria, assim como esses pequenos agricultores e pecuaristas, endividados até o pescoço, sem capital de giro, que pagamos 10% de juros ao mês com inflação próxima a zero, uma verdadeira extorsão legal, própria do subcapitalismo, sobre nossos cheques especiais e cartões de crédito? Nas cidades, geramos o MST (sem-teto) e no campo, o MST (sem-terra). A situação dos pequenos agricultores é mais grave ainda, pois, em alguns casos, sitiantes, depois de perderem suas propriedades para o Banco do Brasil — Previ? — também vão engrossar os acampamentos do MST, conforme relatos recentes.

Em terceiro lugar, trata-se de um fenômeno de simples e sesquipedal ignorância. Afinal, os MST’s da vida não interessam nem para nós, nem para os grandes, pois o barco é o mesmo para todos, excetuando-se os estrangeiros e ainda assim com ressalvas, pois recordo-me do caso de uma jovem, filha de um executivo escocês, que foi aqui estuprada. Gostaria de deixar claro que meu sucinto discurso não está eivado de sentimentos pequenos (marxistas?) de inveja para com os grandes. Simplesmente relato os fatos. Grandes ou pequenos empresários, isso pouco importa. O que realmente importa é o futuro do país.

Em quarto lugar, por falta de percepção, a FIESP não compreendeu a importância do efeito da Justiça do Trabalho no Custo-Brasil e, conseqüentemente, na nossa competitividade internacional, cada dia mais rebaixada por institutos internacionais especializados na área. Há poucos anos, figuras bastante conhecedoras da nossa economia, como os Srs. Delfim Neto e Roberto Campos, orgulhavam-se do fato de sermos a oitava economia do mundo. Dados recentes, de meados de 2001, já nos classificam como a décima primeira. Logo, seremos a décima terceira e assim por diante. Por que a FIESP não estuda as relações de trabalho em países pobres como os do sudeste da Ásia que estão dando certo, apesar de seus pequenos percalços? Mas... talvez, o real leitmotiv seja o temor de ter que remover instituições embasadas no raciocínio: “Se assim está bom para ganhar dinheiro, apesar dos riscos de seqüestros e da companhia indigesta de exércitos particulares, ainda assim, com a vetusta preocupação de Platão: Quis custodiet ipsos custodes? (Quem guardará os guardas?), prá que mexer?” Afinal, a máxima da sabedoria popular local sentencia que: “Em time que está ganhando não se mexe”. Qual o valor de construir impérios sobre a lama? Ser rico entre miseráveis não é bom negócio. Assim não dá. Qual o valor da História, de seu estudo e compreensão do curso das coisas? A paúra nos deixa catatônicos, parados, mas ela em si não conduz a nada. Tampouco o ufanismo no interior do Titanic impediu a tragédia. Al fín y al cabo, uma revolução capitalista não seria contra os senhores, mas sim a favor, apesar das dores naturais próprias do parto. O drama não é apenas Lula. Essa é a tragédia.

Este piccolo discorso não está endereçado apenas aos grandes empresários, mas sim a todos os grandes vencedores, v.g., atores, atrizes, autores de novelas, cantores, Ratinhos e outros apresentadores das grandes redes de TV. Os exércitos particulares aumentarão consideravelmente para seus filhos e netos. E não entrem nesse discurso superficial de “violência urbana”. A coisa é muito mais séria do que aparenta à primeira vista.

E nós, pequenos empresários da indústria e do comércio, caminhoneiros, pequenos agricultores e pecuaristas? Sem dúvida, jogamos um papel fundamental na produção de bens e serviços e na geração de empregos. Nós não dispomos de departamentos jurídicos. Sequer dispomos de meios para contratar bons advogados. E quando as sentenças de primeira instância ultrapassam nossos níveis de indignação, tampouco dispomos de meios para recorrer à segunda instância, caso oposto ao dos reclamantes, os “hipossuficientes”, para os quais o recurso é gratuito. Pela minha parca experiência, em certo sentido, talvez isso pouco importe, pois os recursos raramente são lidos. Aprendi isso com um médio empresário que me contou que, certa feita, enviou um recurso ao TRT com duas páginas grampeadas e elas voltaram tais quais! Pobre país com um Judiciário como esse.

O recente e tímido debate sobre os malefícios da nossa Justiça do Trabalho, fascista-marxista, em que aflorou a necessidade de ventos democráticos sobre as importantíssimas relações de trabalho, para que estas funcionem como estímulos à seminal relação capital + trabalho, como as que se realizaram nos países democráticos que deram certo, revelou-me um novo e interessante aspecto da realidade nacional: a FIESP constitui um importante segmento da miopia nacional.


Reformar a Justiça do Trabalho?

“Apud finum odores spargere” — “Espargir perfume na esterqueira”

 

Quando surge um tumor numa parte de um corpo vivo, o que ensina o conhecimento humano? Manuseá-lo ou extirpá-lo? Na medicina, há consenso: eliminá-lo o mais rápido possível e torcer para que não haja formação de metástases — mensagens enviadas pelas células doentias para outras partes do corpo. Haveria outra alternativa quando ocorre o mesmo no corpo social? Não creio. Recentemente, um juiz trabalhista (Correio Popular 7/7/99, pág. 3) formulou a pergunta: “Justiça do Trabalho: Paranóia ou Mistificação?” — Nem uma coisa nem outra. O objeto de estudo está mais para a “oncologia social”. Quanto à insinuação do magistrado de que as reclamações trabalhistas aumentam na estagnação econômica, como a que vivemos há duas décadas, trata-se de algo duvidoso, no longo prazo. O que corresponde é que em períodos de altos índices de crescimento econômico, como o do “milagre econômico”, elas diminuem seu ritmo de crescimento, mas sua tendência de longo prazo continua sendo a de uma assíntota, isto é, algo que tende ao infinito, como já o demonstramos em artigos anteriores. Durmam tranqüilos, srs. juízes e advogados que “militam” (velho jargão marxista de minha juventude) na área. Ela não será a bola da vez, segundo suas apreensões, pois suas corporações são muito mais fortes do que a lógica num país sem futuro.

Depois de uma simples altercação entre o Sr. Antônio Carlos Magalhães e o Sr. Almir Pazzianotto, foi permitido ao país abrir um debate, ainda que tímido, sobre a Justiça do Trabalho. Obrigado, Sr. Pazzianotto, pela sua garrulice e indelicadezas para com o Sr. Senador, recordando-lhe inclusive a morte de seu filho, coisa inimaginável entre civilizados. Isso não se faz ao pior dos adversários. Não fosse esse o caso, não poderíamos estar debatendo tão crucial tema para o futuro da nação. Que país!

O Deputado Federal Aloysio Nunes Ferreira, que, segundo informações da mídia, teria sido comunista na juventude (PCB; hoje PPS, de Roberto Freire e Ciro Gomes, logo, qüercista (Folha, 17/7/99)) e que hoje é um fiel servidor do Planalto como Secretário-Geral da Presidência, foi o relator, na Câmara Federal, de uma proposta sobre a “extinção” da Justiça do Trabalho. Esta consistiria na eliminação de tribunais regionais e superiores, criação de juizados especiais de pequenas causas e sua incorporação à Justiça Federal. Sua proposta trata-se simplesmente de uma reestruturação da Justiça de Trabalho fascista-varguista. Que imbróglio! O ilustre Saulo local, não o perseguidor da estrada de Damasco (Atos 9:1-4, Novo Testamento), mas sim o de sobrenome Ramos, ilustre advogado, de rara erudição, excelente escriba, ex-servidor do autor-poeta de “Marimbondos de Fogo” e da célebre expressão “Brasileiros e Brasileiras”, nos seus momentos de bravatas, na sua “heróica” luta (farsa!) contra a inflação, protestou violentamente contra tal proposta, e com razão. Se não me falha a memória, utilizou a imagem, para ilustrar a inserção da Justiça do Trabalho na Justiça Federal, num artigo recente, como a de colocar um “fenemê” dentro de um “fusca”. Pessoalmente, creio ter uma imagem melhor: seria a tentativa de colocar o maior dos dinossauros dentro de uma caixa de fósforos. Tarefa absolutamente impossível. Apontem-me, srs. juízes e advogados, um outro país no mundo, mesmo tratando-se de países africanos, que gaste praticamente metade do seu orçamento com um judiciário específico para as relações de trabalho!

Um ilustre e bem-sucedido advogado trabalhista, com uma “carteira” de milhares de processos trabalhistas, afirmou, no Correio Popular (29/6/99), no seu primeiro parágrafo: “O TRT da 15ª Região é um dos maiores do país. Um congresso para discutir... já era necessário. A importância desse evento é inquestionável, merecendo a atenção de toda a comunidade jurídica, pois conhecemos a capacidade e a cultura de todos os painelistas.” — Não sei se se referia a mim ou a seus pares. É fantástico, pois não entendi absolutamente nada, simplesmente por não entender o significado da palavra painelista. Procurei ajuda no Aurélio, no magnífico Napoleão Mendes de Almeida e até no Caldas Aulete, sem nenhum resultado; só não o fiz no velho Morais porque não disponho de sua obra, até aqui. No nosso artigo: “O Mercado da Justiça do Trabalho” (Correio, 15/4/99, pág. 3), já comentávamos sobre tão horrorosos aspectos de tão particular mercado.

Outro advogado, criminalista, aludindo claramente a mim (Correio, 23/7/99, pág. 3), a respeito de meu artigo “A Justiça do Trabalho e o Artigo 5°”, afirmou: “Um dia desses, li um artigo muito bem elaborado de um cidadão (obrigado!) em que ele criticava, tenaz e inteligentemente, a observância da eqüidade nas causas trabalhistas, já que a mentalidade protecionista...” — e advoga a retificação de tais despropósitos. Que tolice! O mais correto, como afirmei no referido artigo, é eliminar o Artigo 5°, princípio universal de direito entre civilizados, enquanto existir a Justiça do Trabalho marxista-fascista, que absolutamente não condiz com tal princípio.

O que o mercado da Justiça do Trabalho brasileira gerou é algo monstruoso e fétido, como já o demonstramos nos nossos estudos e vivências, relatados em artigos anteriores. Não há como reformá-la nem maquiá-la. Ou se a elimina, como o fizeram os sábios democratas italianos pós-Mussolini, ou então, melhor deixá-la como está e ter o firme propósito de que o país realmente não tem futuro. Eliminar os juízes classistas significará uma mínima redução nos gastos públicos e uma mini-reforma tão a gosto dos social-democratas tropicais, absolutamente inócua. O importante, realmente, é que a Justiça do Trabalho destrói a harmonia da seminal relação “capital + trabalho”, impossibilitando o crescimento, elevando o Custo-Brasil e contribuindo para a destruição do setor hígido da economia: o setor privado.


Zulaiê, Greenspan e a Justiça do Trabalho

 

À primeira vista, pode parecer estranha essa associação de idéias. No entanto, procurarei demonstrar, ao longo desse texto, o quão profícua é essa associação de idéias. Ela me ocorreu ao ler a íntegra do discurso do Sr. Alan Greenspan, Presidente do Fed, Banco Central dos Estados Unidos, na Universidade Estadual Grand Valley, publicado pel’O Estado no dia 12/9/99. Ali, ele traçou, com sua monumental inteligência de cabelos brancos, as razões pelas quais os EEUU deram certo e eu associei no ato, pois saltava à vista, o seu raciocínio para o extremo oposto, i. e., o Brasil. Referi-me aos cabelos brancos porque nossos Presidentes do BC são jovens bonitos, quase sempre treinados em universidades americanas, mas que ainda não “blanquearon sus cabellos”, como diz um velho tango; vide Franco e Fraga. Jovens e simples subalternos do Planalto. Ah... se os marxistas vencerem as eleições de 2002, que farra não farão com o Banco Central! Remember Allende e o Chile em 1970.

Logo no início, ele afirma: “Pode-se dizer, com segurança, que estamos testemunhando, nesta década, nos Estados Unidos, a demonstração histórica mais estimulante da capacidade produtiva de povos livres atuando em mercados livres”. — Ora, o Brasil, em sua brutal estagnação, nestas últimas duas décadas, é o exemplo cabal da subemergência econômica e social, bem como a antítese dos mercados livres — vide Petrobrás, Banco do Brasil (BB), Caixa Econômica Federal (CEF), além de inúmeros monopólios, oligopólios, da pirataria generalizada e, “voilà, monsieur”, de uma Justiça do Trabalho única no mundo, que impede a livre negociação entre as partes, com seus quase infinitos regulamentos, inspirados no fascismo italiano de Mussolini e modificados, in pejus, ao longo do último meio-século. E logo emenda: “A economia americana, sensivelmente mais do que outras economias, está presa ao que o ilustre Prof. de Harvard Joseph Schumpeter qualificou, há muitos anos atrás, como “destruição criativa”: o processo contínuo pelo qual as novas tecnologias expulsam as velhas”. Ora, o Brasil ainda é um país que detém a figura do cobrador de ônibus e, recentemente, por determinação do atual Ministro do Trabalho, ficará proibida, durante o próximo ano, a venda de combustíveis via self-service, com a finalidade explícita de evitar o aumento do indigesto nível de desemprego. Proponho duas saídas, com o objetivo de aumentar o nível de emprego. Primeira: a criação da figura de um fiscal nos ônibus, além do cobrador; segunda: que se eliminem as atuais bombas, com seus tanques e bombas de recalque de combustíveis, e que se retorne às latas e galões, para gerarmos mais empregos! O Sr. Greenspan fala, entre outros aspectos, do enriquecimento da inteligência. Aqui, ao contrário, caminhamos no sentido da corrosão da inteligência. Mas, se aqui existe o “direito ao trabalho”, por que demônios não existe o direito à inteligência?

Observem bem a importância dessas frases do Sr. Greenspan, que é essencial para essa nossa exposição: “A confiança é a base de qualquer sistema econômico baseado em trocas mútuas de benefícios. Em quase todas as transações, dependemos da palavra das pessoas com que fazemos negócios. Sem confiança mútua, nenhum sistema pode funcionar”. Curioso, não? A grande potência do século ainda crê na ética do fio do bigode. Ela ainda crê na época em que nossos ascendentes portugueses utilizavam o verbo apalavrar, ou seja, dar a palavra, para selar acordos. Essa é a questão central da nossa Justiça do Trabalho varguista: ela destruiu essa harmonia baseada na confiança mútua e, em seu lugar, instituiu a extorsão como norma por parte dos empregados devidamente açulados pelos paqueiros e advogados trabalhistas. Não há (bem sei da gravidade do que afirmo!) possibilidade de futuro enquanto ela, a Justiça do Trabalho, existir. Um amigo meu relatou-me que, ao conhecer um pequeno granjeiro, este, ao lamentar-se da impossibilidade de manter saudável seu pequeno negócio, contou-lhe a seguinte história: “Outro dia, apareceu aqui uma família, com dois filhos pequenos, quase morrendo de fome e pedindo trabalho. Eu os agasalhei, mas depois de dois anos, quase tive que vender o sítio para pagar a despesa”. Qual será o sentimento desse senhor para com a próxima família? Pequenos empresários urbanos mais experientes e espertos aconselham: “No momento da admissão, nada mais saudável do que um papel assinado em branco”. Que horror a falta de confiança mútua!

O Sr. João Mellão Neto, no seu artigo “O dilema da confiança” (O Estado, 10/12/99, A-2), ainda que não associando diretamente seus argumentos ao objeto de estudo aqui tratado, relata-nos a seguinte e interessantíssima parábola de Hume, do Século XVIII: “Teu milho está maduro, hoje. O meu estará amanhã. É vantajoso para ambos que eu te ajude a colhê-lo hoje e que você me ajude amanhã. Ocorre que sequer amigos somos. Quem me garante que, tendo eu te ajudado hoje, você, de fato, me ajudará amanhã? É... o mais sensato a fazer é eu deixar de ajudá-lo e você me pagar na mesma moeda. Nós dois iremos perder parte de nossa colheita, mas que fazer? Eu não tenho nada que me leve a confiar em você...” — Logo, na elaboração de seu raciocínio, cita Thomas Hobbes, autor de “Leviatã” (pes­so­al­men­te, desconheço a obra), que conclui que para situações de completa desconfiança mútua, como no caso brasileiro, é inevitável a existência de um terceiro elemento: um Estado totalitário, como o de Hitler ou o de Stalin. No caso brasileiro, a matriz foi mais suave do ponto de vista sanguinário, pois tratava-se de um latino, l’amore Mussolini.

A nova relatora da “Reforma” do Judiciário, incluindo a Justiça do Trabalho, a Deputada Federal Zulaiê Cobra, membro da família dos ranfastídeos, além das propostas de caráter geral que envolvem a Justiça do Trabalho, como o teto salarial e a eliminação do privilégio de férias duplas (60 dias ao ano(16)) etc., propõe especificamente para a Justiça do Trabalho as seguintes maquiagens: a eliminação dos juízes classistas e a extinção de 8 TRT’s! E ainda afirma que pode voltar atrás nesses seus pareceres (O Estado, 17/9/99). Não é à toa que o economista brasileiro José Scheinkman, Prof. da Universidade de Princeton, afirmou, em 7/10/99, a’O Estado: “País não tem condições de crescer”. Mas, sem crescimento, o que será do futuro dos filhos dos que não moram nas Princetons? As mini-propostas da Deputada Federal tucana não passam de um grão de areia para o insolúvel e horroroso déficit público. O cerne, o âmago, o fundamental da questão seria uma mudança radical, como a que houve, por exemplo, na Itália, que depois do fascismo, soube corrigir o rumo do espírito das relações de trabalho. O problema central, Sra. Zulaiê Cobra, é o veneno que foi injetado nessa seminal relação “capital + trabalho” pelo marxismo-fascismo-varguismo. A máxima do Sr. Greenspan é fundamental: “Sem confiança mútua, nenhum sistema funciona”.(17)


“O Direito do Trabalho”

 

Êta, expressãozinha marota e safada! Traduzindo-a aos racionais, significa: “Os direitos (jamais os deveres!) dos trabalhadores assalariados, sob a batuta de um Estado inspirado na cultura fascista”. Ao fustigar um jovem advogado trabalhista, amigo meu, sobre a ignorância de sua área a respeito da etiologia e da história do Leviatã, a Justiça do Trabalho, recebi, de presente (deixo aqui os mais profundos agradecimentos de um depauperado micro-empresário à beira da falência), um livro intitulado: “História do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho”, editado pela LTr em Março de 1998, em homenagem a Armando Costa. Que visão extraordinária de mercado a do Sr. Costa, que, há mais de meio século, em 1937, vislumbrou o promissor mercado da Justiça do Trabalho e criou uma editora para explorá-lo. O único “senão” é que isso contribuiu significativamente para o princípio do fim da possibilidade de futuro do país. Meu consolo, in extremis, é que a maioria dos que ali se alimentam têm seus filhos, netos e bisnetos no mesmo país que eu e meus descendentes. A economia de mercado não é perfeita porque não existe o perfeito; nem Deus. O que existe é o melhor. Os grandes fabricantes de cigarro exploram esse lado da vida com enorme sucesso, assim como os “militantes” da Justiça do Trabalho.

Passarei a analisar a obra. A primeira parte do título me pareceu chocante: “História do Trabalho” — de Irany Ferrari, juiz trabalhista, que, segundo me informaram, trata-se de um “juiz classista patronal”, cargo extinto recentemente pela emenda constitucional n°. 24. O primeiro pensamento que me ocorreu ao ler o título foi: “Como pode alguém propor-se a escrever a história humana, desde os primatas, em apenas setenta míseras páginas?” O autor precisa, logo no início de seu “estudo”, que sua obra se vinculará ao trabalho humano. Essa restrição é útil, pois já ficamos cientes, desde o princípio, de que o trabalho dos bois-de-carro, dos burros-de-carga etc. fica excluído. Creio até que também o trabalho de parto, ainda que humano. Logo, procura esclarecer, no seu primeiro subtítulo, o sentido etmológico (sic) do trabalho. Errar talvez constitua a parte mais significativa de nossas vidas, mas há limites. Grafar incorretamente “etimologia” parece ser norma no nosso Judiciário, pois, dia desses, observei um conhecido juiz aposentado de Campinas (Correio 19/6/00, pág. 3) cometendo o mesmo erro. Uma longínqua professora de sueco me dizia que: “Erro é erro, independente da magnitude do mesmo”. Eu discordo. Há radicais do grego e do latim que não se deve errar. Além disso, observem o sentido do título: “a et(i)mologia do trabalho, e não da palavra trabalho. Que fantástica a sabedoria jurídica nacional! Viva o Sr. Pazzianotto e seus 14 parentes que, segundo o Sr. Antônio Carlos Magalhães, são funcionários da Justiça do Trabalho! Aqui, o nepotismo é um “tumorzinho maligno metastático” de menor importância. Além do mais, um amigo me relatou que esse problema está sendo devidamente sanado: o juiz nomeia a mulher do colega e vice-versa! Que perfeição a da terra de Macunaíma! Aqui, de agora em diante, não mais existirá o nepotismo. As sinecuras públicas atingiram aqui um grau inacreditável e essa é a razão fundamental do lastimável estado do Estado brasileiro. O Sr. Irany logo entra realmente na origem latina da palavra: trabis. Logo mais, chega a Marx, ao trabalho assalariado e à mais-valia. Finalmente, atingimos o busílis do objeto de estudo. Uma pequena curiosidade é a que se refere ao trabalho em domicílio de forma assalariada, conforme o art. 7 da CLT, pág. 44 da obra em questão: essa forma de trabalho nunca existiu de forma significativa nestas plagas. Quando se copia, corre-se esse risco. Isso teve alguma importância na Itália fascista de Mussolini, assim como em outros países em que o capitalismo vingou e eliminou a pobreza e a miséria.

A questão central é a história do trabalho assalariado e “explorado”, de acordo com o velho conceito marxista, excetuando-se alguns momentos de salada mista, que logo mais abordarei; nunca o trabalho das donas-de-casa, na sua labuta diária de limpeza e cozinha, ou então, o dos carpinteiros, marceneiros, pintores, eletricistas, mecânicos etc., que se locomovem com suas Variantes, Brasílias, Opalas e Caravans na sua luta pelo pão. Ou até mesmo o trabalho de escritores, como os citados aqui, que não são assalariados. Lá, o sentido da palavra trabalho é outro. E é por isso que o Brasil, assim como quase toda a América Latina, não tem futuro. O marxismo penetrou muito fundo nas mentes nacional e latino-americana, sobretudo nas universidades e na mídia. Eu, ex-marxista e bastante conhecedor das teses marxistas, posso observar, nas entrelinhas dos jornais, até os dias de hoje, após a queda do Muro de Berlim, quão profunda foi e é sua influência na mente do escol nacional. Uma grande pena! Ao ler o editorial d’O Estado intitulado “Nonsense chauvinista” (13/8/00, A3) sobre um projeto de lei do Sr. Aldo Rabelo, do PC do B, pró-chino, velho conhecido, proibindo a utilização de “estrangeirismos” (eufemismo para “anglicismos de origem americana ligados à era da Internet”), prevendo inclusive multas com o preciosismo de centavos, lembrei-me de um aforismo de Nietzsche “A serpente que não pode livrar-se de sua pele morre. Assim são os espíritos impedidos de mudar suas opiniões: eles cessam de ser espíritos.

Logo, ele entra com o “trabalho” nas Constituições do Brasil desde a de 1824, do tempo do Império. Aí, há um pouco de salada, pois, na época, não havia essa forma de trabalho. Marx, que, com o poder de suas idéias, praticamente destruiu um século da possibilidade de futuro do mundo civilizado e levou milhões de vítimas ao sacrifício (vide Stalin, Hitler, Mao e o nosso minúsculo Fidel, com seu paredón, tão admirado pelo nosso sambista Chico Buarque), era, teoricamente, mais cuidadoso, pois entendia que havia diferentes formas de trabalho. Porém, não há muito que se esperar de nossos juízes trabalhistas. Eles apenas decoram essa excrescência fascista: “Tutto nello Stato, niente contro lo Stato, nulla al di fuori dello Stato” (Tudo no Estado, nada contra o Estado, nada fora do Estado) e crêem estar no topo do status social. Pudera, com 60 dias de férias anuais, Montepio Civil da União, aposentadoria integral e mais um terço de acréscimo pecuniário, por que preocupar-se com a História e com as suas implicações? Ainda bem que nossos bandidos, gerados basicamente por esse perverso processo sócio-econômico, pelo qual a Justiça do Trabalho possui um considerável grau de responsabilidade, são democráticos: atacam a todos por igual; nenhuma é a valia de ser membro do tão ilustre Poder Judiciário. Nesse aspecto, somos uma democracia perfeita, e não quando somos obrigados a votar! A profecia orwelliana do livro 1984, evidentemente, com algumas modificações, veio cristalizar-se aqui, abaixo da Linha do Equador, e não onde o autor a havia imaginado, com esse Estado totalitário e as TV’s ao seu serviço “The Big Brother is watching (and manipulating) you”. O manipulating é minha inserção ao raciocínio. Os lemas do subcapitalismo, tal qual os imaginou Orwell, são:

Guerra é Paz!
Liberdade é escravidão!
Ignorância é força!

Aqui, ainda existem os planos trienais, qüinqüenais, como na Ex-URSS, mas aperfeiçoados com nomes que insinuam a vitória, como “Avança Brasil”, “Plano Nacional de Segurança Pública” etc. Que malta a dos políticos nacionais! Cabe acrescentar um quarto lema às profecias de Orwell: “Positivismo é o mesmo que Liberalismo!“. A idéia me ocorreu porque a Contra-Revolução de 1930 foi levada a cabo com o nome de “Aliança Liberal”... É demais! No subcapitalismo, as palavras são, quase sempre, desprovidas de conceitos universais. A palavra “liberal”, aqui, não significa absolutamente nada!

A Constituição de 1891, elaborada basicamente por Ruy Barbosa e inspirada na americana, estabelecia, no seu art. 72, inciso 24 (dados do autor, curto e grosso): “É garantido livre exercício de qualquer profissão moral, intelectual e industrial”. Ah, se ela vigorasse até hoje, quão brilhante teria sido nosso futuro! Os americanos têm a mesma Constituição há mais de duzentos anos. Porém, logo veio a Contra-Revolução de Vargas, em 1930, e a Constituição de 1934, introduzindo todo um capítulo à Ordem Econômica e Social. Era o começo do fim, a vitória definitiva do pensamento positivista. No seu art. 115, rezava: “A ordem... deve ser organizada... conforme... as necessidades da vida nacional, de modo que possibilite a todos existência digna”. Vai ver que foi por isso que depois de mais de meio século desde então, geramos, em progressão geométrica, os sem-terra, os sem-teto, ocupações, favelados, assassinos, estupradores etc. A Constituição de 1937, do Estado Novo, sob a batuta de Chico Campos, seguiu aperfeiçoando todos esses despautérios: “O trabalho é dever social...” etc. Hoje, quando convivemos com os maiores índices de desemprego dos últimos 500 anos, isso soa bizarro. A atual Constituição colombiana vai ainda mais longe, pois afirma o direito ao lazer! Recentemente, no ano 2000, observei um professor de História da Arte da “colenda” UNICAMP, petista, Secretário de Cultura de Campinas, articulista notório do caderno de cultura da Folha, o Sr. Jorge Coli, advogando o direito de todo cidadão à cultura. Ambas idéias, tanto a colombiana quanto a do professor, poderiam gerar novas emendas constitucionais — afinal, aqui, elas nascem como a luz do dia — para o aperfeiçoamento do onírico. Adendos maravilhosos ao espírito da “magnífica” Carta de 1988.

Além dessas esquisitices no tocante às relações de trabalho, o varguismo introduziu no país o Código Penal de 1940, também de origem fascista, como reconhece o Sr. Irany, e vigente até os dias de hoje, que, dentre outros dos mais ridículos aspectos, introduziu a defesa da honra, no seu art. 25, e o crime de adultério, com pena de 15 dias a seis meses de prisão, no seu art. 240. Gabeira, no Congresso, além de preocupar-se com o verde, poderia dedicar-se a essas questiúnculas(18). Há muitos anos, em 1969, nesta cidade de Campinas, o Sr. Gallo, promotor público como Getúlio, pai de uma famosa atriz global, Maitê Proença, matou sua mulher a facadas em defesa da honra e foi absolvido! Apenas como uma curiosidade histórica light, devo lembrar que o Vocabulário Ortográfico de 1943, com todos os seus infinitos acentos e esquisitices, vigente até os dias de hoje, também provém do período getulista.

A progressista (que horror esse adjetivo marxista!) Folha de São Paulo, do Otavico Frias, aboliu o trema. “A Lei? Ora a Lei!” — como nos ensinou Getúlio... nuances do subcapitalismo! A Petrobrás, com a devida ajuda dos comunistas, em 1953 (“O petróleo é nosso!”) foi outra de suas “grandes obras”; é por isso que, até hoje, importamos petróleo e tememos o câmbio, devido ao seu fulminante papel no quesito inflação. Pensando bem, 99% do que aqui está hoje, em 2001, é obra de Getúlio; até o PSDB, filho do PSD, de tantos ilustres mineiros, sobretudo o Sr. Tancredo Neves, Ministro da Justiça de Getúlio, morto num 21 de Abril, como corresponde a todo herói nacional. Neste último caso, o detalhe foi a ajuda do desligamento dos tubos numa UTI. A Contra-Revolução de 1930 foi absolutamente vitoriosa, e sabe lá Deus quando será enterrada.

A Constituição “democrática” de 1946 só veio piorar essa situação, incluindo a Justiça do Trabalho como órgão do Poder Judiciário e introduzindo o direito à greve numa Carta fascista. Melhor teria sido manter o espírito original, ou seja, a proibição total de greves.

A Carta de 1967, no período militar, introduziu o FGTS como barganha ao direito à estabilidade após dez anos de casa. O subcapitalismo brasileiro é fantástico: engessava o mercado de trabalho, há mais de meio século, proibindo a dispensa de funcionários com mais de dez anos de empresa. Qual o país capitalista que pensou em tão estapafúrdia idéia? E a liberdade de contratar e dispensar visando à eficiência, princípio fundamental numa economia de mercado? Amigos aposentados me relatam que desde então, surgem os famigerados “acordos”, isto é, “acertos por fora da lei”, para propiciar o melhor para as partes. Que Estado miserável o inspirado no fascismo! Até então, além da estabilidade aos dez anos, o funcionário tinha direito a um mês de salário de indenização por cada ano trabalhado no caso de dispensa sem justa causa. A barganha foi feita na base de 8% ao mês para o FGTS (8% x 12 = 96%; mais correção + — = 100%). Outros importantíssimos apanágios do subcapitalismo são: os direitos adquiridos e as cláusulas pétreas! Além disso, ficou estabelecida uma multa de 10% sobre o montante do FGTS, em caso de dispensa sem justa causa, para tentar ainda mais o optante pelo FGTS. Que grande “avanço”! Só hoje posso perceber quão tolo foi o Sr. Roberto Campos ao vangloriar-se do seu FGTS. Aqui, até os raríssimos liberais não conseguem ver a floresta, tamanha a neblina. Que descanse em paz. Deixou-nos informações e considerações valiosas sobre nosso passado recente. Sua condição de diplomata o impediu de ver, apesar de sua vasta erudição, a triste realidade dos que vivem na base da produção. Só o sofrimento nos conduz a enfrentar a faca afiada da verdade. Apesar de tudo, o Sr. Campos foi uma raridade no cenário político nacional, pois tratava-se de um político preocupado com o bem público. Hoje, a imensa maioria dedica-se à política pro domo sua, dos familiares e amigos; alimentam-se de um Estado em avançado estado de putrefação, deliqüescente, mas que ainda tem muito para ser sugado. O único mérito da Carta de 67 foi reduzir a idade mínima para o trabalho assalariado para 12 anos. Isso me parece excelente num país onde feras bípedes (a mídia os chama de garotos) de 12 anos freqüentemente tornam-se assassinos profissionais. Hoje, o magnânimo governo só o permite aos 16 anos, de acordo com a emenda constitucional n°. 20, de 16 de Dezembro de 1998.

A Carta de 1988 introduziu milhares de novas regalias: 40% de multa sobre o FGTS em caso de dispensa, seguro-desemprego (Oh, Serra, que grande sois vós!), 1/3 a mais de salário nas férias, aposentadorias por insalubridade e periculosidade sensivelmente melhoradas (coeficiente de 1,2 elevado para 1,4 para cada ano trabalhado), redução da jornada de trabalho de 48 para 44 horas semanais etc. Excelentes receitas para Hugo Chávez, da Venezuela. Definitivamente, foi dado, em 1988, o tiro de misericórdia na possibilidade de futuro do país.

O direito do trabalho deveria ser substituído pelo direito à intelliguentsia!


“História do Direito do Trabalho”

 

Passarei a analisar a segunda parte da obra “História do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho”, de autoria de Amauri Mascaro Nascimento. Como esclareci anteriormente, a palavra trabalho deve ser entendida como trabalho assalariado. Se bem que, no início de seu trabalho, o autor se refere às formas anteriores de trabalhos comerciais (século XX) e à Constituição de 1824, influenciada pela Revolução Francesa (1789), com seus esplêndidos ventos liberais. O curioso é que há revoluções, ou guerras civis, como a americana, por exemplo, que dão certo, e outras não — vide a Revolução Russa, de 1917, marco da vitória do marxismo-leninismo. Até as corporações de ofício, que, numa linguagem atual, corresponderiam aos artesãos, autônomos, trabalhadores por conta própria que, naquela época, associavam-se, foram proibidas por lei. Logo mais, entra na forma assalariada, no final do século XIX e no início do século XX. Então, surgem as primeiras Ligas Operárias: Liga Operária de Socorros Mútuos, 1872; Liga de Resistência dos Trabalhadores em Madeira, 1901 etc.

Os europeus, basicamente nossos antepassados italianos, trazidos por nossos fazendeiros paulistas, descendentes de portugueses (não me refiro à primeira leva de italianos e alemães trazidos por D. Pedro II para o sul), trouxeram, junto com suas habilidades manuais e técnicas, frutos de uma cultura superior, o vírus do marxismo. Compensação ruim e exagerada. Eles traziam o adubo para o incipiente capitalismo embasado nas fazendas paulistas exportadoras de café, mas, com ele, vinha também a semente da tiririca. Na verdade, talvez isso não tenha sido tão grave, quando se constata que nossos vizinhos da Argentina, onde a cultura italiana teve uma influência ainda maior, desenvolveram um capitalismo brilhante desde o final do século XIX até a primeira metade do século XX, e o tango, a música mais sofisticada da primeira metade do século XX, a meu ver. De fato, a Argentina, caso único na história humana, já foi um país de Primeiro Mundo e faz cinqüenta anos que caminha a passos acelerados para o Terceiro. Hoje, já começam a surgir os primeiros assaltos e outros sinais tênues de guerra. Muitos descendentes de italianos, mais espertos, graças à Constituição Italiana de 1948, pós-Mussolini, que ampliou as possibilidades de obtenção da cidadania italiana, retomam o caminho de volta; no primeiro semestre de 2000, a embaixada italiana em Buenos Aires concedeu uma “ninharia” de sete mil passaportes. (O Estado, 25/11/00). Uma pesquisa recente mostra que, se pudessem, 43% dos argentinos emigrariam! (O Estado, 11/12/00, B16)

A tragédia realmente foi Getúlio Vargas, vítima da influência positivista de Auguste Comte, via Júlio de Castilhos. Além de Vargas, os outros contaminados foram os Tenentes de 1922 e, sobretudo, Prestes, que, posteriormente, desabrocharia como o mais importante prócer comunista do país e que um escritor de grande sucesso nacional, Jorge Amado, esposo de Zélia Gattai, deu-lhe o codinome glorioso de O Cavaleiro da Esperança, aquela esperança gloriosa que, no ano de 2000, expressou-se tão bem na tragédia dos marinheiros do Kursk, submarino russo acidentado no Mar de Barents. A tragédia Argentina foi posterior, com Juán Domingo Perón, quinze anos depois. Naquele então, 1947, Evita Perón dizia pérolas como estas: ”Mañana, San Perón, que labore el patrón”, ou então, “He viajado por Europa; allí, todo son antigüedades. El futuro esta en la Argentina de Perón”. Hoje, depois de meio século, é muito triste ver essas cenas horrorosas (com mortes etc.) de massas de desempregados em Tartagal, na Província de Salta. E o pior é que a maioria dos governadores das províncias são peronistas! Que o FMI continue enterrando seu dinheiro lá e cá. O Mercosul não passa de um abraço de afogados. Os portugueses dizem que “Fadas há, lá e cá”. De fato, às vezes, a ingenuidade é um fenômeno universal, “globalizado”.

Os europeus conheciam tornos, ferramentas e assentaram os fulcros para o nosso desenvolvimento manufatureiro, sobretudo em São Paulo, em Santa Catarina e no Rio Grande do Sul; os japoneses tiveram uma influência maior no Paraná. Hoje, quando se caminha pelos antigos e quase abandonados barracões do bairro do Brás, na cidade de São Paulo, respira-se esse ar nostálgico de um passado brilhante.

Retornemos ao nosso Professor “d’A História do Direito do Trabalho”. Relata as greves do início deste século e logo entra na questão central: Vargas, a Contra-Revolução de 1930 e a intervenção do Estado nas relações de trabalho. Inicia essa parte de sua peroração com eufemismos como princípios políticos autoritários, corporativismo peninsular etc., mas, piano piano, não consegue evitar a palavra correta, isto é, fascismo. Logo de partida, uma semana após tomar o poder, Vargas instituiu a Lei n°. 19398, que permite ao Executivo legislar (este esclarecimento é meu). Hoje, temos as Medidas Provisórias (MP’s), ainda mais nefastas do que seu decreto-lei. Logo mais, bem municiado, Vargas criou o “... Ministério do Trabalho, Indústria e Comércio, com a função de pôr em prática sua política trabalhista e administrar o procedimento de formação do proletariado como força orgânica de cooperação com o Estado” (palavras do autor; negrito sobre “proletariado” de minha autoria). Não cita a burguesia. Oh, velho Marx, da Westfália, Alemanha, que poder deletério tiveram suas asneiras neste século XX! Hoje, sabe-se que foram milhões e milhões de assassinatos. Na América Latina, suas idéias parecem eternas, como uma maldição dos deuses! Ainda em 1930, foi promulgada a Lei dos Dois Terços, segundo o autor. Tratava-se de uma defesa da “nacionalização do trabalho”, ou seja, para coibir a quantidade de europeus na nossa força de trabalho de então. Um sábio e experiente marceneiro amigo, descendente de italianos, contou-me que os velhos marceneiros italianos se referiam aos aprendizes de marcenaria, naquela época, como brasilianos, como se fala realmente em italiano, mas com ares e entonação de desprezo, devido às dificuldades de aprendizagem da população local.

Em 1931, veio a Lei dos Sindicatos, através do Decreto n°. 19.770, sacramentando a intervenção do Estado como um novo Zeus (na mitologia grega, o Deus dos Deuses). Logo mais, fala na integração das classes produtoras: burguesia e proletariado. A inteligência do marxismo foi fantástica: o mundo se dividia em duas classes — burguesia e proletariado, e a inexorável luta entre ambas seria o motor da história e do progresso humano! Não é fantástico? O fascismo deu por assentada a veracidade dessa tese e criou o nacional-socialismo, como defesa ante tão trágica realidade, através de Mussolini e Hitler. E pensar que, até hoje, essa tese central domina quase toda a América Latina, sobretudo as Universidades, questão fulcral.

O Estado, supremo redentor dos “conflitos”, subordinaria os sindicatos para criar a paz social. Daí vem a expressão, cunhada pelos comunistas, da figura do pelego: líder sindical, segundo eles, serviçal do Governo Vargas. Hoje, como citamos anteriormente, mutatis mutandis, temos os paqueiros: agenciadores de extorsões.

Apesar de estudar a Justiça do trabalho há tantos anos, só agora tive a percepção, tal qual o estalo do Padre Vieira, da origem da expressão juízes classistas, extintos há pouco: eles representariam as classes sociais, que, em sua luta permanente e benéfica, seriam o motor da história. A eliminação desses classistas não tem a menor importância. O espírito da coisa continua o mesmo. O problema só continuará aumentando — vide os textos “A Extorsão Sumária” e “A Conciliação Prévia”, aqui editados.

O decreto de 1931 dá início a uma série de engessamentos nas relações de trabalho, tais como a inamovibilidade dos diretores dos sindicatos e uma indenização correspondente a seis meses de salários para os empregados demitidos por causa da sua atuação sindical. De lá para cá, a coisa agravou-se tanto que hoje, eles são “indespedíveis”, como diria o Ex-Ministro Rogério Magri. Se os antigos já diziam que tudo aquilo que se pode resolver com dinheiro é fácil, eis aí um bom exemplo. De 1932 a 1937, incluindo a Constituição de 1934, houve um período confuso, em que se falava em contrato coletivo (?), pluralismo sindical, autonomia dos sindicatos etc., coisas paradoxais do espírito varguista-mussoliniano e que não prosperam. Dever-se-ia aprofundar nesse período para compreender as razões, mas o tempo não o permite e trata-se de algo nada essencial ao meu discurso. O autor atribui essas propostas à influência do pensamento católico. Apesar disso, a partir de 1932, foi instituída uma série de leis ultra-minuciosas como: a carteira profissional, a duração da jornada de trabalho no comércio e na indústria, nas farmácias, nas casas de diversões, nas casas de penhores, nos bancos e nas casas bancárias, nos transportes terrestres, nos hotéis etc. Parece-me que só mesmo os bordéis escaparam de tantas regulamentações, para a felicidade de nossos antepassados de então. Se as leis, por si só, gerassem riquezas, seríamos mais ricos e poderosos do que os americanos!

A Constituição de 1937 recolocou, de forma enfática, o carro na linha do despenhadeiro, reforçando, inclusive, o monturo de despautérios: sindicato único, base territorial, imposto sindical compulsório etc(19). De lá para cá, o aperfeiçoamento do nefasto foi tamanho que hoje, temos férias anuais compulsórias e horário eleitoral compulsório — este último, o eufemismo local o denomina de gratuito(20). A propósito, vale a pena citar um pensamento da tese de cátedra de Evaristo de Moraes Filho, em 1952, pós-Constituição “democrática” de 1946, em que ele afirma: “... e isso constitui um fato deveras curioso: a sobrevivência de uma lei promulgada para um regime corporativo fascistizante em pleno quadro democrático de uma nação”. Ele não entendeu que a democracia só existiu aqui, relativamente, até 1930. Minha observação do “relativamente” deve-se à lembrança, dentre tantas outras coisas, da figura do Sr. Júlio de Castilho, positivista fanático que queria ser Governador “perpétuo” do Rio Grande do Sul. Democracia pressupõe, antes de mais nada, liberdade econômica. Não se deve confundir democracia com eleições e votos, como fazem todos, inclusive os americanos; como curiosidade, a mais longa “democracia” latino-americana gerou a atual Colômbia, uma das principais preocupações mundiais. A Venezuela de Hugo Chávez teve, recentemente, oito eleições em apenas dois anos. Que exemplo de “democracia”! No ano de 2000, e a propósito da divertida trapalhada da cédula eleitoral por parte do Governo da Flórida, ele declarou (O Estado, 15/11/00, A24) que “confia na democracia americana e não intervirá nos assuntos internos do país”. Que sorte! Com toda aquela sua força militar, ele poderia pôr em risco a paz mundial! O Sr. Néri, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), foi mais modesto e afirmou que achou o sistema de votação “arcaico e defeituoso”, e acrescentou: “eles usam desde urnas tradicionais até urnas eletrônicas enormes, máquinas perfuradoras e outras máquinas obsoletas. A urna eletrônica de lá é do tamanho de uma sorveteria.” Será que esse senhor sabe a altura do seu umbigo, ou melhor, do seu país? Ou então, será que algum membro do TSE inventou os computadores, a Internet e sou eu que estou mal-informado? Que divertido esse mingau asnático!

A última etapa de seu trabalho, creio, basicamente, haver tocado aqui, ali ou acolá.

Através de uma matéria intitulada “Rigidez trabalhista aumenta custo dos Bancos” (O Estado, 6/5/2001, B3), que consistia numa entrevista com o Sr. Michael Geoghegan, Presidente do HSBC e executivo financeiro internacional, aprendi duas coisas. Primeira: foi Getúlio que, já em 1933, através de decreto, legislava sobre a jornada trabalhista dos bancários: seis horas diárias. Atentem, não era o mercado quem resolvia a questão, mas sim o ditador de turno. Segunda: esta questão é altamente relevante para o futuro do país. Textualmente, ele afirma: “Já morei em doze ou treze países, e somente no Brasil encontrei este sistema rígido de horário de trabalho. Muitos me perguntam porque os bancos são tão caros no Brasil. É, principalmente, por causa da falta de flexibilidade da jornada de trabalho.” — Além da CPMF, existente apenas aqui, na Colômbia e na Argentina. E depois, muitos se perguntam porque caímos sistematicamente no ranking (desculpe-me, nobre Deputado Federal Aldo Rabelo, por esse estrangeirismo!) de competitividade internacional. Aí está uma questão que a FIESP, ainda que não lhe diga respeito diretamente, deveria ter a coragem de enfrentar. Esqueçam, srs. industriais da FIESP, as instituições e pensem no futuro do país.


“História da Justiça do Trabalho”

 

Passo a analisar a terceira parte da obra citada, de autoria de Yves Gandra da Silva Martins Filho, Subprocurador-Geral do Trabalho, que suponho ser filho de um ilustre advogado tributarista de mesmo nome, mackenzista como eu. Digo “ilustre” porque se trata de uma raridade no cenário nacional, pois seus artigos “Imposto sobre o prejuízo e privilégios” (O Estado, 19/7/99), “Sociedade a serviço do governo” (Folha, 7/10/99, 1-3) e “Radiografia do poder” (Folha, 3/6/99, 1-3) impressionaram-me pela lucidez. Ele percebe a tragédia nacional, devido ao avanço das corporações oficiais, que se apoderaram do aparelho do Estado. A bem da verdade, esse processo macabro teve início com Vargas em 1930(21). De qualquer forma, vejamos os estudos do infante Yves Filho.

Na introdução ao seu trabalho, ele filosofa sobre a importância da História e de Deus. Para a maioria dos mortais, nenhuma ciência é tão importante quanto a História, mas essa miscelânea (mistureba?) com a idéia de Deus me pareceu fantástica. Talvez, ele não perceba, mas seu caminho natural seria a Igreja Universal do Reino de Deus, do “ilustre” bispo Edir Macedo: quando um povo caminha para o despenhadeiro, até essas novas pragas aparecem e, em alguns casos, entram até na pauta de exportação, como nos últimos anos. Observem esta frase: ”O trabalho, segundo as Escrituras, não é um castigo de Deus pelo pecado original, mas uma participação humana na obra criadora de Deus: transformar e implementar todas as potencialidades que Deus colocou originariamente na Natureza”. Quem sabe foi Deus, e não Mussolini, quem criou a Justiça do Trabalho, com seu espírito fàscio, tal qual ela ainda existe, no Brasil de hoje! O trabalho, segundo o autor, não seria nada tão prosaico quanto o ato de ganhar o simples pão de cada dia. O espaço não me permite estender-me sobre sua propedêutica, o papel do historiador etc.

Na segunda parte de seu trabalho, ele cita sucintamente a Justiça do Trabalho no mundo, embasado nos “estudos” do Prof. Mascaro. O que mais impressiona no jovem historiador é a abstração do tempo, ou seja, não fornece datas nem períodos históricos. As legislações trabalhistas da Itália de Mussolini, da Espanha de Franco e do Portugal de Salazar certamente foram completamente diferentes das atuais, pois ditaduras habitualmente estabelecem legislações para as relações de trabalho completamente diferentes das legislações das democracias plenas. Ao longo de todo o seu trabalho, ele cita uma única vez o fascismo, questão crucial do ponto de vista histórico e, ainda assim, grafa mal a palavra, i. e., facismo, pág. 187. Só mesmo o Brasil poderia manter o mesmo espírito fàscio de 1922 até os dias de hoje, e é isso que parece estranho ao Prof. Evaristo de Moraes Filho, citado anteriormente, que me esforço por explicar. Apesar de a TV Globo estimular a idiotia nacional com essa asneira de virada histórica do milênio, persiste esse “probleminha”. E as corporações civis que se apoderaram definitivamente do poder desde 1985 se vangloriam dessa “democracia” com voto obrigatório desde os 16 anos, congelamentos de preços freqüentes, ameaças aos produtores, congelamento cambial para sanar o insolúvel problema inflacionário, horário eleitoral gratuito e compulsório, confiscos, Justiça do Trabalho regendo índices de reajustes salariais, irredutibilidade de salários e a Presidência da República legislando através de Medidas Provisórias — para que serve essa figura bizarra do Congresso Nacional, além de criar CPI’s e Impeachments? Que tem isso a ver com o livre mercado e a democracia? Um amigo, aposentado da CPFL, recentemente privatizada, contou-me o seguinte caso: a nova direção, no seu afã de eficiência, decidiu reduzir ao máximo o quadro de funcionários e determinou, entre outras medidas, suponho, que todos os eletricistas que ganhassem acima de R$ 1500,00 deveriam ser despedidos. Ao ser despedido, um desses funcionários argumentou, chorando: “Que culpa tenho eu se, ao longo de dez anos, ganhei todos os prêmios que a antiga diretoria estabelecia para os funcionários mais eficientes e dedicados à empresa? Foi esse o meu erro? Pois então, reduzam meu salário!” — suplicou. Mas como? E a “Constituição Cidadã”, lex legum, de Ulysses, Tancredo, Covas, Serra, Fernando Henrique e tantos outros da grei dos preocupados com o “social”? Num recente discurso, o Sr. Lawrence H. Summers, Secretário do Tesouro dos EEUU, afirmou, a propósito da nova economia e da geração de empregos: “Um modo de atingir esse objetivo é manter nossa economia forte, porque uma economia forte é a melhor política social já inventada. (O Estado, 1/10/00, B11). Não dá para aprender isso, srs. social-democratas tropicais e marxistas plenos do Partido dos Trabalhadores? Esse Partido dos Trabalhadores nasceu com as montadoras de automóveis em São Bernardo do Campo, foi batizado no Colégio Sion, da alta classe média paulistana, católica, em 1980 (vide Marta Suplicy etc.), mas hoje, seu esteio fundamental são os funcionários federais, estaduais, municipais e das estatais. A Rússia também acabou assim.

A terceira parte de seu trabalho refere-se à história da Justiça do Trabalho na sua fase embrionária. A única informação que me pareceu deveras interessante nessa parte de seu trabalho foi a de conhecer a existência do Conselho Nacional do Trabalho (CNT), que surgiu em 1923, no âmbito do então Ministério da Agricultura, Indústria e Comércio. Suas funções principais estavam voltadas para a questão previdenciária, recém-surgida através dos ferroviários, e para a estabilidade no serviço público. A Caixa de Previdência dos ferroviários era uma manifestação da riqueza criada pelos nossos antepassados — fazendeiros paulistas — que criaram, sozinhos, sem a ajuda do Estado, toda a nossa malha ferroviária: Paulista, Mogiana, Araraquarense, Sorocabana, São Paulo-Minas etc. A informação que me pareceu deveras interessante foi a confirmação de que Getúlio não nasceu no vácuo, pelo contrário, tratava-se do mais lídimo representante do pensamento predominante na época: o positivismo. Já surgia, então, a estabilidade após dois anos de serviço para os ferroviários e, posteriormente, em 1926, o privilégio fora estendido aos marítimos, além da estabilidade no serviço público. Eram os primeiros passos para o início da tragédia. Era a negação da economia de mercado e o batismo do subcapitalismo brasileiro.

Permito-me intercalar um texto do Sr. Pazzianotto, atual Presidente do Tribunal Superior do Trabalho (TST), obtido recentemente via Internet, em que ele afirma: ”Quando Getúlio Vargas lançou, em seu Diário, no dia 1o de maio de 1939, que havia assinado um decreto criando a Justiça do Trabalho, não estava em condições de avaliar o extraordinário alcance dessa decisão, das mais importantes e duradouras do seu prolongado primeiro período de governo. A singeleza do registro feito pelo Presidente (leia-se Ditador), ao lado de outros de menor relevo, parece indicar que supunha estar praticando um ato a mais de governo, quando, na verdade, havia acabado de gerar uma instituição fascista que se agigantaria na esfera das relações de trabalho, tornando-se mais presente e atuante na vida de empregados e empregadores do que as respectivas entidades sindicais(negrito e itálico em “Ditador” e “fascista” de minha autoria). Pode-se perceber que, através da expressão ”o extraordinário alcance”, ele constata, hoje, a dimensão do Monstro. Monstro para nós, micro, pequenos e médios empresários. No seu caso pessoal, e de seus parentes, trata-se de um enorme e farto privilégio, verdadeira cornucópia, até que seus corpos descansem em paz, após fartas aposentadorias.

O infante Yves logo mais precisa ”... no dia 1o de maio de 1941, quando o Presidente-Ditador Vargas, em pleno campo de futebol do Vasco da Gama, na Capital Federal, declarava instalada a Justiça do Trabalho, esta já pudesse, no dia seguinte, estar efetivamente funcionando, com seu Conselho Nacional do Trabalho (CNT), seus 8 Conselhos Regionais do Trabalho e suas 36 Juntas de Conciliação e Julgamento, compostas por magistrados idealistas cuja média etária não atingia os 30 anos”. Vargas inovava sempre num aspecto: o papai-noel era antecipado, sempre num 1° de maio, Dia do Trabalho! Precisar o Presidente como “Ditador” é de minha autoria. Logo mais, essas Juntas, agora com a “revolução” da extinção dos classistas, denominadas Varas, multiplicar-se-iam à enésima potência, como no milagre dos pães, junto ao Mar da Galiléia, quando cinco pães de cevada e dois peixinhos alimentaram quase cinco mil pessoas e Jesus, ao final, disse aos seus discípulos: “Recolhei os pedaços que sobejaram, para que nada se perca.” Não disponho de dados nacionais atuais, mas, com certeza, hoje, elas são dezenas de milhares. Mais adiante, ele entra no campo da apologética à LTr: “A Revista, que começou “paulista”, alcançou dimensão nacional e internacional (sic)...” Que Deus abençoe a fortuna amealhada pelo Dr. Armando e por outros Drs. em prol de seus descendentes, criando essa editora em detrimento do futuro do país! Há um lado a respeitar-se: a extraordinária visão de mercado desses senhores, para nós, liberais, partidários de um mercado livre.


A Extorsão Sumária

 

Eufemisticamente denominada de rito ou procedimento sumaríssimo por advogados, magistrados e pessoas afins à área da Justiça do Trabalho; inclusive pela a própria lei. Refiro-me à Lei 9957, de 12 de janeiro de 2000, decretada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo então Presidente-sociólogo. Ela afirma, basicamente, que os dissídios individuais cujo valor não exceda a quarenta vezes o salário mínimo vigente na data do ajuizamento ficam submetidos ao procedimento sumaríssimo, modificação ao artigo 852 do decreto-lei 5.452, de 1o de maio de 1943, inspirado na Carta del Lavoro, do “brilhante” Mussolini, e assinada, aqui no trópico, pelo promotor público e ditador Getúlio Vargas. O objetivo central da lei seria o de desafogar a Justiça do Trabalho. O ideal, mesmo, para nós, micro e pequenos empresários, seria que ela literalmente se afogasse. Mas esse sonho só seria possível via revolução, coisa aparentemente inviável, dado o peso da TV Globo, similares e outros fatores, dentre os quais a própria Justiça do Trabalho, que conseguiu dividir o setor produtivo privado em explorados e exploradores, ao melhor estilo marxista-leninista.

Minha primeira impressão, ao tomar conhecimento dessa modificação na decrépita CLT, foi a de tratar-se de uma tentativa com o objetivo de separar o filé-mignon da carne de segunda no mercado da Justiça do Trabalho. Explico-me: acelerando-se o grosso das ações — extorsões — contra as micro e pequenas empresas, de pequena monta para as comissões dos advogados trabalhistas, as ações — extorsões — de valores expressivos contra as grandes empresas se tornariam mais céleres e, portanto, melhores negócios adviriam para esse particular mercado. Fiquei surpreso ao saber que essa não é a opinião das associações de advogados trabalhistas. Por diferentes razões, evidentemente, nossos pontos de vista coincidiram. Eles, os trabalhistas, sentiram tratar-se o novo remendo de uma tentativa de contrair seu mercado.

Na sua profundidade, trata-se de uma lei ao estilo brasileiro, sempre de marcha-à-ré. Roberto Campos fala (falava?) do aperfeiçoamento do obsoleto como mania nacional. A verdadeira mania é o aperfeiçoamento do nefasto. Cada vez que se mexe na fascista CLT, o caldo engrossa, desde a Constituição de 1946. Melhor teria sido manter o espírito fascista da Carta del Lavoro, proibindo as greves, do que aquele primeiro “conserto” democrático do pós-guerra. O simples movimento, ou remendos, do nocivo não pode trazer à tona nada de útil. Pelo contrário. O nefasto deve ser eliminado, como fizeram os italianos, após o fuzilamento de Mussolini. De fato, desde 1946, cada novo manchão (na linguagem de nossos queridos amigos borracheiros) tende a piorar as leis que regem as relações de trabalho. O ápice foi atingido, recentemente, com a Constituição de 1988, que elevou a multa por dispensa sem justa causa para modestos 40% do FGTS e criou o famigerado seguro-desemprego. Desde então, piano piano, o imbróglio piorou consideravelmente. Um novo fenômeno surge e vem agravando-se: jovens funcionários com mais de seis meses de casa exigem sua dispensa. Na melhor das hipóteses, isso pode demorar de três a quatro anos para tal exigência. Ai daquele que não entender o recado!

Vejamos alguns dos aspectos mais hilários da Lei. O art. 852-A, no seu parágrafo único, estabelece que “estão excluídas do procedimento sumaríssimo as demandas em que é parte a Administração Pública direta, autárquica e fundacional”. Por quê? As extorsões sumárias só valerão para nós, os pequenos, do setor privado? O art. 852-B afirma que “a apreciação da reclamação deverá ocorrer no prazo máximo de 15 dias do seu ajuizamento” (sic!). O art. 895, § 1, inciso II, reza que “o recurso ordinário será imediatamente distribuído... devendo o relator liberá-lo no prazo máximo de 10 dias sem revisor” (sic!). Os que já leram as barbaridades de algum acórdão podem imaginar o que virá pela frente, se é que algum dia isso se materializará. O art. 896, § 6, restringe o recurso de revista. Abstraindo-se do trágico aspecto da realidade, não deixará de ser divertido, para os sobreviventes, saborear as esquisitices do futuro.


Da Conciliação Prévia

 

Ou, numa linguagem mais clara e real, da extorsão prévia. Refiro-me à lei federal 9.958, sancionada pelo então Presidente FHC, arauto da “democracia”, Dr. Honoris Causa por várias universidades do Primeiro Mundo, em 12 de janeiro de 2000. Trata-se de um remendico, tão a gosto dos social-democratas tropicais, a uma lei importantíssima: a CLT, cópia fidedigna da Carta del Lavoro, fascista, assinada por Mussolini em 1927 na Itália. Aqui, ela foi proclamada efusivamente em praça pública, obviamente num 1° de maio, Dia do Trabalho, pelo então ditador, promotor público gaúcho, contra-revolucionário de 1930, Ministro da Fazenda de Washington Luiz, a quem posteriormente veio a depor, Pai dos Pobres (oh! sacrossanta e eterna idiotia nacional) Getúlio Vargas. Isso deu-se em 1943, poucos anos antes de a Carta de Mussolini ser eliminada, em 1948. Vargas, fascinado pelo fascismo, trouxe essa excrescência para cá, a qual, até hoje, continua sendo aperfeiçoada, piano piano. A grande paixão nacional não é a cerveja, mas sim o aperfeiçoamento do nefasto. Que pena!

Esse novo manchão (remendo) à CLT reza que empresas e sindicatos poderão criar comissões paritárias de conciliação prévia para os “conflitos” individuais. Que linguagem mais fàscio essa de conciliação! Ora, só se conciliam interesses contraditórios. O fulcro da ideologia do Estado fascista, paradoxalmente inspirado nas idéias marxistas, era esse: há um inexorável conflito entre o capital e o trabalho (no seu duro linguajar, uma verdadeira luta de classes), e o Estado, como deus ex machina, deveria intervir, obrigando-os a um final feliz. A palavra fascismo, em italiano, provém de fàscio (feixe, união), porém, neste caso, sob a batuta de um Estado que, então, se preparava para a guerra. Um amigo italiano, ex-balilla, me relatou que Mussolini ilustrava a importância da união da seguinte forma: uma, duas, três varas flexíveis podem ser vergadas e quebradas, mas jamais uma grande quantidade. Obviamente, com esse raciocínio, a união interna era condição sine qua non para a possibilidade de sucesso na guerra. Felizmente, para a humanidade, ela sozinha, mesmo somando forças com o nazismo de Hitler, não o foi.

Contrariamente a essas idéias estapafúrdias, as relações de trabalho nos Estados Unidos, o mais bem-sucedido país nestes últimos séculos, sempre foram pautadas pela idéia de que capital e trabalho devem ser solidários e unidos, com o mesmo objetivo comum: crescer juntos, enriquecer. E, sobretudo, com a premissa de confiança mútua, livre negociação entre as partes e ausência quase total de leis regulatórias; como no velho sistema de nossos antepassados: o fio do bigode, o apalavrar, até 1930. Essa idéia do Estado regulador, que se intromete nos mínimos detalhes da vida econômica, impedindo o funcionamento de um livre mercado, em conjunção com o avanço das corporações oficiais no interior do aparelho do Estado brasileiro, são as razões fundamentais da destruição parcial, até aqui, do Estado de Direito no Brasil. É o leitmotiv do porquê de nós não termos dado certo e eles, os Estados Unidos, sim. A Itália também, depois do fuzilamento de Mussolini, se libertou dessa asneira fascista e retornou ao seu caminho rumo a um futuro brilhante. Pobres de nós que já fomos tão poderosos, a ponto de, há pouco mais de um século, trazermos nossos também antepassados italianos para substituir a força de trabalho escrava. As chances de um futuro brilhante pareciam existir.

Retornemos ao varejo. As modificações centrais à CLT são em relação ao artigo 625 dessa extensíssima lei de 922 artigos! O art. 625-B, inciso I, III, §1° e §2°, diz que a metade eleita pelos empregados nessas comissões paritárias, titulares e suplentes, em escrutínio secreto (oh! paixão pela democracia) terão estabilidade de um ano após o final de seus mandatos. O representante dos empregados, quando atuar como conciliador, terá suas horas de trabalho devidamente remuneradas! Nossos funcionários, quando trabalharem como mesários nas eleições, aos domingos, terão dois dias úteis livres devidamente remunerados pelas empresas! Haverá, debaixo dos céus, “democracia” mais perfeita do que essa? Os “acordos” ali arbitrados não terão caráter definitivo, pois, em última instância, sempre estará a abominável Justiça do Trabalho.

Essa nova perfumaria à hipóstase, essência, não foi evidentemente pensada para as pequenas e médias empresas, como o foi a lei 9.957 (da extorsão sumária), assinada no mesmo dia. Apesar de ambas terem o mesmo objetivo — desafogar a Justiça do Trabalho, o ideal mesmo seria que ela se afogasse! De fato, pessoas da área me informam que ela está sendo útil para os grandes bancos e para as grandes redes de supermercados. Além disso, notícias posteriores à elaboração desse texto (O Estado, 17/6/2001, A3) confirmam essa realidade e tendência: “o Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, Mogi das Cruzes e Região, ligado à Força Sindical, e o denominado “Grupo dos 8”, ligado à Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (FIESP), criaram a primeira câmara de conciliação prévia do país”. Trata-se, obviamente, de uma questão de conveniência para as partes: o reclamante quer o dinheiro da extorsão o mais rápido possível, e as grandes empresas, o menor custo possível. Pela lógica, a maior das armas que conheço, é que embaso minha explicação. Nada significativo do ponto de vista da cultura nacional. É a velha história da hipóstase: aquilo que sempre muda, porém, na essência, sempre permanece o mesmo. A essência não muda. O importante é o espírito da coisa: sem confiança mútua, nenhum sistema funciona. A inteligência nacional é parca de fosfato!

A ignorância de Vargas, nosso “herói” absolutamente sem nenhum caráter, era estupenda. Ele chegou a criar as férias de julho como se estivéssemos no hemisfério norte. Duas férias anuais num país de analfabetos, como bem precisou o gênio Napoleão Mendes de Almeida, é demais. Talvez, a razão central tenha sido a de que seus pingos só o conduziram até a latitude máxima do Rio de Janeiro. Minha mulher me corrigiu, pois, de fato, em torno de 1944, ele foi até Natal — RN, contrariado, é claro, coisas da realpolitik(22), inaugurar uma base militar americana, às vésperas da grande vitória sobre o nazi-fascismo; e, segundo ela me conta, os americanos criaram, então, locais de dança chamados free for all, o que, semanticamente, suponho, deu origem às palavras friforró e, posteriormente, forró — nuances do passado, nobre deputado Aldo Rabelo, preocupadíssimo com esses aspectos da vida. De qualquer forma, la nave va, com nossos novos comandantes, narcisos, treinadíssimos em universidades francesas, para piorar nossa sina. E sempre obstinados no aprimoramento do nefasto, do ominoso.


Os Três Mandamentos

 

Primeiro: odeia a tua empresa como odeias aos teus piores inimigos, pois ela te explora; segundo: rouba a tua empresa, na medida do possível, para compensar o roubo que ela faz, extraindo de ti a mais-valia” (conceito marxista segundo o qual a empresa paga apenas uma parte do trabalho realizado, e que os países que deram certo jogaram na lata do lixo da história). Assim, o roubo se torna ético. Esses são os dois mandamentos básicos dos empregados do setor privado brasileiro, nos dias de hoje. Um aspecto curioso é que os empregados não percebem que seus destinos estão inexoravelmente ligados ao bem-estar de suas empresas. O segundo mandamento guarda alguma relação com o sentimento antediluviano da inveja. A meu ver, a inveja, um dos sete pecados capitais, é natural nos homens, após o surgimento da propriedade privada, mas há níveis e níveis. Absolutamente todos temos momentos de inveja; no entanto, esse sentimento catalisado, turbinado pelo marxismo, o elevou a níveis estratosféricos aqui na América Latina, último bastião do marxismo-leninismo(23). Um sábio amigo, ao observar meu comportamento no trabalho, sentenciou: “Você só vai pra frente quando aprender a odiar seus funcionários”. Mas como? É tão difícil odiar o semelhante, ainda mais com a lucidez de quem sabe que o futuro só será bom se for bom para todos!

Para os altos funcionários do setor público, inclusive das estatais, há um terceiro mandamento: “Locupletai-vos, refestelai-vos nos fartos seios estatais, sobretudo através de aposentadorias integrais e fundos de pensão(24)”. Nesse caso, a memória me traz à lembrança as raízes dessa filosofia, captada por uma antiga e sábia marchinha:

Maria Candelária é alta funcionária
Saltou de pára-quedas e caiu na letra ó, ó ,ó
Começa ao meio-dia
Coitada da Maria
Trabalha, trabalha, trabalha de fazer dó, ó, ó
À uma, vai ao dentista
Às duas, vai ao café
Às três, vai à modista
Às quatro, assina o ponto e dá no pé
Que grande vigarista que ela é!

Essa sábia marchinha, fruto da sabedoria popular da época, reflete os primeiros resultados da semente (vírus, tumor?) plantada por Vargas desde 1930, via CLT e Justiça do Trabalho.

Depois de setenta anos da lógica varguista, embasada nas idéias fascistas de Mussolini e sua notável Carta del Lavoro, essas são as trágicas heranças culturais assimiladas pela nossa força de trabalho. Para os do setor privado, os mandamentos são odiai e roubai, e para os altos funcionários do setor público, locupletai-vos.

Parte dessas idéias me ocorreu ao conhecer um senhor idoso, às 5 da madrugada, quando cumpria minha dura obrigação diária para com a saúde: a caminhada. Encontrei-o no portão 8 da Lagoa do Taquaral, em Campinas. Os “lépidos” guardinhas do Prefeito Chico Amaral e de seu sobrinho Ruyrillo, delegado, jovem, bonito, aposentado público com salário integral, como manda o figurino, em 1999, somado ao seu modesto numerário como Secretário de Segurança, não abriam o portão, e eu, na minha ânsia de aprender, percebi que ali havia algo de interessante. Perguntei-lhe de supetão: “—O Sr. é aposentado? — Ah sim!” — com um sotaque curioso, mistura de caboclo e italiano. “—Onde o Sr. se aposentou? — Na Indústria e Comércio Dako do Brasil”. Percebi, pela voz, o orgulho que sentia pela sua empresa. “—O que o Sr. fazia lá? — Fui chefe de esmaltação durante 27 anos e ganhei muito dinheiro lá”. Eu, com o intuito de provocá-lo, disse: “—É... mas hoje ela foi vendida à GE”. E recebi na lata: “—É, mas se o velho Joaquim Gabriel Penteado estivesse vivo, isso não teria acontecido”. Disse com emoção. Ele não só amava sua ex-empresa, mas também seu falecido patrão. E contou ainda mais: “Nas épocas difíceis, ele nos chamava e dizia que não haveria aumento e nós entendíamos. Depois, veio o sindicato e estragou tudo. Nós já não falávamos mais com ele”.

Ao relatar minha recente vivência a um parceiro de bocha, também aposentado da Dako, ele me respondeu no ato: “É o Sr. Pedro Filetti! Você sabia que ele tem um olho de vidro? Não!” Respondi. Logo, passou a contar-me o fatídico acidente de trabalho. As peças, ao serem retiradas do forno de esmaltação, sofriam uma violenta diferença de temperatura e, em algumas oportunidades, pigmentos que não haviam aderido completamente à sua base saltavam, e foi assim que o Sr. Pedro perdeu uma das vistas. O Sr. Penteado levou-o pessoalmente ao hospital.

Na grandeza de seu caráter, o Sr. Pedro me havia omitido esse “detalhe”. Pensei, ipso facto: ah! se isso fosse hoje, com tantos advogados especializados na área, o que teria sido da Dako nos seus primórdios? Hoje, ela é grande, estagnada, apesar dos americanos, e com uma freqüência enorme de greves. E mais greves ocorrerão nos próximos anos, turbinadas, envenenadas por essa fase terminal do Real. Que difícil será o futuro com essa cultura nas relações de trabalho, assimilada ao longo das últimas décadas! Recentemente, o Sr. Alan Greenspan, com sua monumental inteligência de cabelos brancos, num discurso para jovens formandos da Universidade Estadual de Grand Valley, raciocinava sobre as razões do sucesso econômico dos EEUU e concluía: Sem confiança mútua, nenhum sistema funciona. Esse é o cerne da questão e do porquê de o Brasil não ter futuro.


GLOSSÁRIO

 

Às esconsas – Às ocultas, nebulosamente

Apanágio – atributo, característica

Abjeta – desprezível, vil, repugnante

Affaire – caso

Amealhar – juntar, poupar, abiscoitar

Ápice – ponto mais alto

Âmago – cerne, bojo, centro, fulcro

Arquétipo – padrão, exemplar, modelo

Asnático – próprio de asnos, burros

Axioma – premissa, máxima sentença

Ad infinitum – ao infinito

Auguridesejo de felicidade

Balilla – criança italiana que, a partir dos 7 anos, era catequizada para o fascismo. A que ponto chegam os ditadores!

Bazófia – fanfarrice

Bicudo – duro, difícil

Big Brother – “Grande Irmão”, criação do escritor inglês George Orwell, no seu fabuloso romance 1984. Este, o Big Brother, consistia numa emissora de TV capaz de vigiar, manipular, comandar e idiotizar a população via vozes e imagens. Aqui, a idéia é associada às grandes redes de TV.

Bizarro – fanfarrão, grotesco

Blasfemar – xingar, ofender

Bojo – cerne, âmago

Bolcheviques e Mencheviques – as duas alas da III Internacional (Comunista), filha da II Internacional (Social-Democrata, o SD de PSDB). Os bolcheviques eram os mais radicais, leninistas; assassinaram a família do Czar e tomaram o poder na Rússia, em outubro de 1917.

Busílis – principal dificuldade, X da questão

Chicana – tramóia, ardil

Cripto – escondido, oculto, esconso

Coprologia – estudo das fezes

Coprófilo – escatófilo, o que gosta-amigo-de excrementos

Coprófago – escatófago, que se nutre de excrementos

Causídico – advogado, operador do direito

Cicuta – tipo de veneno, mais conhecido como “chá da meia-noite”

Colenda – respeitável

Concomitantemente – ao mesmo tempo

Concupiscível – que desperta o apetite sexual ou o desejo intenso de gozos materiais

Corolário – decorrência, conseqüência

Cornucópia – abundância

Dândi – homem que se veste com extremo apuro

Dantesca – horrorosa

Deletério – destrutivo

Deliqüescente – em desagregação, decadente

Dilacerado – arrebentado, esgarçado

Dístico – grupo de dois versos, parelha

Data venia – com a devida licença

Démodé – fora de moda, ultrapassado

Desídia – indolência, falta de apetite para o trabalho, ergofobia

Despautério – enorme asneira

Dislexia – dificuldade de ler, escrever, aprender

Deus ex machinasolução milagrosa

Discorso – discurso, idéia, tese, teoria

Espécime – modelo, indivíduo representativo de uma classe, de um gênero, de uma espécie

Estapafúrdio – extravagante, esquisito, esdrúxulo

Estiolamento – na botânica, falta de luz, fraqueza, definhamento

Eufemisticamente – forma adverbial que me permiti criar para o substantivo eufemismo: suavizar a palavra, “dourar a pílula”

Excrescência – tumor

Excremento – tudo quanto os animais expelem do corpo pelas vias naturais

Excrementoso, excrementício, excrementicial – adjetivos relativos a excrementos

Exegese – interpretação ou análise minuciosa

Exógena – de origem externa, não embutida diretamente no processo

Eufemismo – ato de suavizar a expressão de uma idéia

Energúmeno – idiota, imbecil

Environment – entorno, ambiente, “clima”, num sentido amplo

Escol – elite intelectual

Etimologia – estudo da origem das palavras

Etiologia – estudo da origem das coisas

Fàsciofeixe; aqui empregado no sentido de fascista

Fango – lama, brejo

Filo – amigo

Fétido – mal cheiroso, fedido

Fiaca – preguiça

Filigrana – coisa sem importância, bagatela, minúcia

Free for all – livre para todos

Fulcro – fundamento, pilar, cerne

Garrulice – qualidade de gárrula, terrível tagarela

Grei – partido, grupo

Hegemonia – preponderância, domínio

Hermético – fechado, bem-vedado

Hígido – saudável, asseado

Hilário – que produz risos

Hipossuficiente – indivíduo de baixa renda, pobre

Hodierna – atual, contemporânea

Homo ridiculus – homem ridículo, farsante

Homo judicus – homem capaz de direitos e deveres

Imbroglio – confusão

Id est i.e., isto é, a saber

In pejus – para pior

In extremis – no momento da morte

Inépcia – ausência de aptidão

Infanda – nefanda, nefária, nefasta, execrável, horrorosa etc., adjetivos próprios para a Justiça do Trabalho

Infante – criança, jovem

Ipso facto – pelo mesmo fato

Jus sperneandis – brincadeira brasileira para o “direito de esperneio”. Não existe

Latu sensu – num sentido amplo, em linhas gerais

Leitmotivmotivo principal, motivo condutor

Leviatã – monstro da mitologia fenícia

Lídimo – legítimo, autêntico

Locupletar, refestelar – saciar, fartar(-se)

Malta – bando de malfeitores

Mazela – ferida, doença

Monturo – montão de lixo, lixão, entulho

Metástase – formação de tumores secundários

Mutatis mutandis – mudando o que deve ser mudado

Nepotismo – nomeação de parentes para cargos públicos

Ominoso – funesto, nefasto, agourento

Oncologia – estudo dos tumores

Oligofrenia – escassez de desenvolvimento mental

Óbice – obstáculo

Oligopólio – poucas empresas que dominam (dividem?) o mesmo mercado

Onírico – próprio dos sonhos

Parca – pequena

Paúra – medo

Pari passu – ao mesmo tempo

Petiço – apelido de Getúlio Vargas: cavalo pequeno, curto e baixo

Pro domo sua – pensando em si próprio e/ou nos seus

Pecuniário – relativo a dinheiro

Peroração – pequeno discurso

Piano piano – devagarzinho

Piccolo – pequeno

Philosophical Doctor (Ph.D.) – título, aprimoramento de estudos universitários

Pingo – cavalo

Platitude – mediocridade

Príncipe – apelido de FHC. Não sei precisar se a origem se deve às suas citações de Maquiavel ou à sua excessiva vaidade: “Príncipe dos Sociólogos

Primórdio – princípio

Profícuo – útil

Pelego – jargão comunista para designar os líderes sindicais supostamente a serviço de Vargas. Para os mais jovens, devo esclarecer que pelego, na sua acepção original, era uma manta que se colocava sobre o lombo do cavalo para receber o arreio, com o objetivo de amaciá-lo e evitar ferimentos.

Prócer – líder

Propedêutica – introdução, ciência preliminar, didática

Quejandos – que tais

Quelle choix mensieurs? Qual escolha, meus senhores?

Questiúncula – pequena questão, assunto de importância questionável

Realpolitik – exigência do pragmatismo político

Res pubblica – coisa pública

Rossa – vermelha

Riscossa – insurreição

Ranfastídeos – aves de bicos curvos e grossos e plumagens de cores vivas, tucanos

Saga – história

Sargaço – Algas marinhas enormes

Semântica – arte da significação, da linguagem

Sistêmico – que envolve todo o organismo

Septicemia – infecção generalizada

Sic – assim mesmo, tal qual, por incrível que pareça

Sicários – matadores de aluguel

Sine qua non – sem a qual, não: condição indispensável

Sui generis – espécie particular, original, especial, peculiar

Sesquipedal – um e meio, enorme

Seminal – produtivo, fértil

Sinecura – salário, holerite sem trabalho

Sobejar – sobrar

Tautologia – vício de linguagem que consiste em dizer, por formas diversas, sempre a mesma coisa

Teratologia – estudo das monstruosidades

Teratogenia – criação de monstruosidades

Tribufu – coisa feia

Vetusto – velhíssimo

Verbi gratia (v.g.) – por exemplo

Watching – cuidando, zelando, observando


Índice de principais obras consultadas

 

A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo — Max Weber, Biblioteca Pioneira de Ciências Sociais

A Crise do Poder Normativo da JT — Luís Carlos Amorim Rubustella, Ed. LTr, vol. 56, n.03, março de 1992

Ascensão e Queda de Getúlio Vargas — obra em três volumes de Affonso Henriques, Distribuidora Record de Serviços de Imprensa Ltda., 1966

Benjamin Constant, vida e história — Renato Lemos, TopBooks Editora, 1999

Brasil, País do Futuro — Stefan Zweig, Ed. Nova Fronteira, 1990

Comentários sobre a Primeira Década de Tito Lívio — “Discorsi” — Nicolau Maquiavel, Ed. Universidade de Brasília (UniB)

Custos de Transação no Mercado de Trabalho Brasileiro — Roberto Fendt Junior e Amaury Temporal, Seminário patrocinado pelo Instituto Liberal/SP e pela Fundação Armando Álvares Penteado, setembro de 1996

Dicionário de Questões Vernáculas — Napoleão Mendes de Almeida, Ed. Ática, 1966

Do Poder Normativo da Justiça do Trabalho — Irany Ferrari, Revista LTr, vol. 57, n. 03, março de 1993

Flexibilização dos Mercados de Trabalho e Contratação Coletiva — José Pastore, Ed. LTr, 2a. tiragem, 1995

Historia del Análisis Económico — Joseph A. Schumpeter, Ediciones Ariel, Barcelona

História do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho — Irany Ferrari, Amaury Mascaro Nascimento, Yves Gandra da Silva Martins Filho, Ed. Ltr, 1988

História do Brasil — Boris Fausto, Ed. Universidade de São Paulo (USP), 1996

La cuestión agrária — Karl Kautsky, Ruedo Ibérico, 1970

Legislação do Trabalho e Previdência Social — Revista Ltr, vol. 53, n. 11, novembro de 1989

Limite Único do Poder Normativo da Justiça do Trabalho — Joaquim Silva, Suplemento Trabalhista, 1992

Macunaíma — Mário de Andrade, Villa Rica Editoras Reunidas Ltda.

Manual del Perfecto Idiota Latinoamericano — Carlos Alberto Montaner et alii., Atlantida. Já existe, no mercado nacional, uma versão em português

Momentos Decisivos da História do Brasil — Antônio Paim, Martins Fontes, 2000

Plataforma Política do Positivismo Ilustrado — organização de Antônio Paim, Ed. Universidade de Brasília (UniB), 1980

Poder Normativo: Momento de Reflexão — Paulo de Tarso G. Vellozo, Ed. Ltr, Suplemento Trabalhista, 077/92, pág. 455, SP, 1992

Poder Normativo da Justiça do Trabalho — Pedro Vidal Neto, Revista Ltr, vol. 53, no. 2, fevereiro de 1989

Porque me ufano do meu país — Affonso Celso, Livraria Garnier, Rio de Janeiro

Retrato do Brasil — Paulo Prado, Cia. das Letras, 8ª Edição, organização de Carlos Augusto Khalil

The World Economy in the 20th Century — Angus Maddison, Ed. OCDE, Paris, 1989


Notas

(1) — De fato, resumos de uma recente pesquisa internacional sobre percepções de níveis de corrupção, feita pela Transparência Internacional, publicados aqui pel’O Estado (A9) e pela Folha (A10) no dia 14/9/2000 reforçam minha tese e permitem algumas observações importantes. Em primeiro lugar, entre os 90 países pesquisados, o Brasil passa da 36ª posição para a 49ª entre 1995 e 2000. Que perfórmance! Infelizmente, não existem séries históricas sobre o tema para reforçar ainda mais minha tese, mas as evidências são muitas, a começar pela quase completa ausência da questão nos jornais da primeira metade deste século. Em segundo lugar, os países capitalistas, com Estados hígidos, obviamente, e alguns países emergentes do sudeste da Ásia, onde floresce hoje o capitalismo, a corrupção é praticamente insignificante. Em terceiro lugar, o Chile, único país da América Latina com alguma possibilidade de futuro, ocupa a honrosa 18ª posição, à frente de países como Irlanda, Espanha, França etc. Terá Pinochet conseguido implantar o capitalismo no Chile? Talvez, mas as adversidades são muitas, pois além de Baltasar Garzón, o Chile se encontra situado (sitiado?) na estagnada América Latina. Como explicar o fato de um general e ditador, com o auxílio de sua corporação militar, ter conseguido implantar tão profundas reformas, a começar pela reforma da previdência, e abrir caminho para o futuro? Creio tratar-se de um caso único na história política contemporânea.

(2) — Meu raciocínio para explicar o agravamento deste fenômeno é o seguinte: a mídia amplifica à enésima potência a existência desses escândalos na cúpula; na maior parte das vezes, coloca pizza no forno e, obviamente, obtém pizza como resultado. A mídia e a sociedade se excitam e exclamam indignadas: “Deu em pizza!” — O servidor público do mais baixo escalão conclui: “Se todos roubam à beça, por que não o faria eu, que estou muito mais necessitado?” — No subcapitalismo brasileiro, quem julga é a mídia, não o Judiciário. Ai daqueles que, como meu adversário político e teórico, Francisco Lopes, caiam na sua malha. Ao salvar o Brasil de um colapso econômico, em Janeiro de 1999, com seu socorro a bancos, tal como o banco Marka, acabou crucificado.

(3) — A Venezuela teve, recentemente – 2000, 8 eleições em apenas 2 anos! E, infelizmente, na terra do Tio Sam, devido à falta de compreensão do fenômeno, eles deliram com tanta “democracia”, para júbilo de Hugo Chávez.

(4) — Ele elegeu-se Governador de SP quando José Sarney, então Presidente da República, que “lutou” bravamente pelo seu quinto ano de mandato, poeta, autor de “Marimbondos do fogo”, membro da Academia Brasileira de Letras (ABL), pai de Zequinha e Roseana, e seus assessores bolaram o Plano Cruzado — o fim definitivo da inflação via congelamento de preços, como na antiga Roma — para vencer as eleições de 1986 e fazer governadores do PMDB de ponta a ponta. Naquela época, ele laçava bois no pasto e seu mote era: ”O sol nasceu para todos e também para você! Vote Quércia! Vote Quércia! PMDB!”. Ao cantarolar esses versos, de madrugada, amigos me ensinaram que o povo concorda com essa idéia. Porém, fazem a seguinte e relevante ressalva: “Mas a sombra é para poucos.” — Eram os primórdios da Nova República.

(5) — Ao contrário de todos os historiadores, defino o movimento de 1930 como uma contra-revolução, pois ele significou um profundo retrocesso para o futuro do país. As revoluções ou contra-revoluções se definem, no meu entender, pelas suas implicações na configuração institucional; a questão militar é absolutamente secundária. De qualquer forma, neste aspecto, o movimento de 1930, segundo minhas informações, não significou sequer a morte de um único homem. Houve sim, a posteriori, os covardes assassinatos, a mando de Vargas, de João Dantas, sua namorada e o restante de sua família. Não há nada mais importante para o futuro de um país do que as instituições, e foi nisto que a Contra-Revolução de 1930 foi destrutiva. A Revolução Francesa de 1789 foi decisiva para a compreensão do fenômeno. O movimento militar de 1964 não teve nada de revolucionário, pois não significou absolutamente nada do ponto de vista das instituições brasileiras.

(6) — Em Agosto de 2001, o presidente FHC, praticamente sem mais ativos públicos para vender e financiar seus mega-déficits externos, com a finalidade precípua de controlar a inflação via câmbio (a vetusta e até aqui eterna farsa latino-americana) e manter seus altos índices de popularidade, lançou mão do brado de guerra: “Exportar ou morrer”, logo “melhorado” (coisa de assessores, obviamente) para “Exportar para viver”. Puro desespero e retórica. Como confiar em quem sempre destruiu o setor exportador, sobretudo os setores manufatureiro e semi-manufatureiro, em função da voracidade de sua família — ranfastídeos e aliados — pelo poder? Esta tentativa de reviravolta, além de falsa, é tardia. Melhor preparar-se para a próxima moratória! Seja esta sob a batuta de um de seus pares ou pelas mãos dos neobolchevique (os petistas), em 2003... Obviamente, a questão central é o câmbio. Porém, a Justiça do Trabalho joga aqui um papel estrutural altamente relevante neste contexto.

(7) — O Sr. Antônio Carlos Magalhães (ACM) ameaçou extinguir a Justiça do Trabalho em 1999. O presidente FHC, em Setembro de 2000, e a propósito de sua discussão com o Governador de MG Itamar Franco que, quando Presidente da República, exigiu a retomada da produção de Fuscas refrigerados a ar! — nuances do subcapitalismo, em que o Presidente goza de poderes imperiais — lembrou-me de outro aspecto curioso da trágica cultura nacional: não passamos de uma República de bazófias, isto é, de fanfarrices e fanfarrões! A propósito, o Governador mineiro executou “manobras militares” com sua Polícia Militar contra a privatização de Furnas! Como pode alguém com um cérebro desta envergadura ter alcançado a Presidência da República? E, como se isso não bastasse, ele continua forte concorrente às eleições presidenciais de 2002. Só mesmo o lamentável estado mental de nossa população pode explicar este fenômeno! Que trabalho perfeito têm logrado, às vezes sem o querer, os Big Brothers!

(8) — Além da Lei do Contrato Temporário de Trabalho, aqui não analisada, recentemente (2000), foram sancionadas as Leis do Rito Sumário e da Conciliação Prévia, aqui tratadas. Nenhuma das 3 Leis tem alguma relevância. Próximas virão. Bullshit!

(9) — Ao ver tantas bandeiras vermelhas vitoriosas nas eleições municipais de 2000, a memória me trouxe ao presente o velho hino comunista italiano dos anos 20/30: “Avanti Popolo/ De la Riscossa/ Bandera Rossa/ Bandera Rossa/ ... Avanti Popolo de la Riscossa/ Bandera Rossa/ La triunfera!/ E Viva il Comunismo e la Libertà!/ ... Avanti Popolo a la Stazione/ Revoluzione noi vogliamo fa.” E isto no ano 2000 e depois da queda do Muro de Berlim! O Brasil de hoje se pende entre duas fórmulas dissimuladas — light — da Revolução Russa: os bolcheviques (petistas), com suas bandeiras vermelhas e alguma tintura cristã, e os mencheviques (tucanos), com suas bandeiras cor-de-rosa. Quelle choix monsieur! O marxismo penetrou fundo no cérebro latino-americano. Não existe uma opção pela economia de mercado. Ao ver a figura de Ciro Gomes ao lado de César Maia e esta concupiscível atriz global, Patrícia Pillar, nas primeiras páginas dos jornais propondo uma frente popular — união dos marxistas “mais puros” — para 2002, pressagiei, se a empreitada vingar — difícil, pois o PT se sente tão forte a ponto de querer correr sozinho, as enormes dificuldades que nosso sistema financeiro, TV Globo e congêneres (os Big Brothers), monopólios, oligopólios, grupos hegemônicos e o Planalto terão para enfrentá-los em 2002.

(10) — De fato, o único caso que ganhei foi o de uma diarista (faxineira). O advogado que me acompanhava na ocasião cochichou: “Eles (os juízes) também dispõem deste serviço.” — Que sorte!

(11) — O espírito de vitória do fascismo nos anos 30 era total. O Sr. Francisco Campos, advogado mineiro, dava as cartas e jogava de mão. Era o braço direito, jurídico, da ditadura. Atente-se a essas palavras do Sr. Affonso Henriques, pág. 133, volume I: da obra cit. “O Sr. Francisco Campos, por sua vez, fez, em Maio de 1931, um discurso em Juiz de Fora em que se declarou francamente fascista e advogou a implantação do fascismo no Brasil, sustentando idêntico ponto de vista ao do Sr. Oswaldo Aranha, no tocante as legiões revolucionárias, que julga imprescindíveis à educação do povo.” Essas legiões revolucionárias eram uma simplificação da hierarquia fascista: figlio de la lupa, balilla, moschettieri, avanguardista, giovane fascista e fascista. Esses detalhes devo a Francesco Nucci, amigo, imigrante italiano, ex-balilla.

(12) — Posteriormente, descobri a figura de um visionário, Armando Costa, que, já em 1937, farejou esse particular e farto mercado, criando uma editora para explorá-lo: a LTr. Forneço maiores detalhes no texto “A História do Trabalho”. Não disponho de dados sobre o faturamento da LTr, mas, certamente, trata-se de algo nada desprezível. Minhas estimativas ficam, portanto, subestimadas. Notícias de Novembro de 2000 (O Estado, 23/11/00) informam um novo horizonte de expansão: “Jogadores de futebol estão entrando na Justiça para cobrar pagamento extra quando os jogos forem realizados à noite e aos domingos!” — Exclamação por minha conta.

(13) — Aparentemente, esse componente não é nada insignificante. De fato, uma reportagem da Veja de 2 de Abril de 1997, intitulada “Ganhando dinheiro com a CUT”, relata o caso do advogado Ulisses Riedel, que receberia 37,5 milhões de reais de um grupo de 450 médicos de Brasília, que, por sua vez, embolsariam meio milhão cada um.

(14) — A quantia retida é para suprir o “acerto” final. No caso rememorado aqui, a segunda instância, o TRT, arbitrou um número mínimo de horas-extras (claro, como não encontrá-las!) cujo valor era inferior em muito às custas do recurso. E o troco? O dinheiro deve ter ido parar nas burras desse insaciável Judiciário.

(15) — Felizmente, alguns economistas locais já atinam (que rápidos!) para o problema, segundo declarações à Folha no dia 14/10/00, B4. Eles, para descrever a situação, utilizam um verbo simpático: os funcionários “cavam” suas demissões. E depois, algum professorzinho da Unicamp irá elogiar a alta rotatividade no mercado de trabalho brasileiro. Para piorar a situação, a Caixa envia aos funcionários os extratos do FGTS. A cada 3 ou 4 anos, no máximo, a tentação é enorme. Aí, então, o funcionário é “dispensado” e continua trabalhando sem registro em carteira (recebendo o seguro-desemprego) até o próximo ciclo: voltar a registrá-lo etc... Y la nave va. Na verdade, ela vai é pro precipício!

(16) — Nesses dias de Novembro de 2000, através de uma reportagem d’O Estado (14/11/00, A4), descobri que as filhas de juízes solteiras (em alguns casos, até suas irmãs), bem como as dos militares, têm direito a uma pensão vitalícia, através de um Montepio Civil da União. Para tanto, basta que os magistrados tenham contribuído com “enormes” 4% do salário bruto ao longo de um período “gigantesco” de 15 meses. Essas filhas vão parir e parir sempre solteiras, pois não têm vocação para otárias! Interessantíssimo o caso de Flavinha, filha do Presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), Carlos Velloso, que se recusou a tal benefício. Textualmente, o “Ministro” afirmou: “No fim da cerimônia de casamento, até brinquei com a Flavinha, dizendo que ela tinha acabado de perder uma pensão vitalícia de Ministro do Supremo”, ou seja, a maior autoridade do Judiciário nacional aconselha a própria filha a burlar o espírito da Lei! Será que um país com um Judiciário como este pode ter alguma possibilidade de futuro? A ilustre deputada federal poderia adicionar à sua profunda “reforma” a extinção desse privilégio adicional. O que me pareceu mais bizarro é que o quantum da pensão depende da causa mortis, e 100% é atribuído a ataques cardíacos, câncer, diabetes, nefropatia e tantas outras causas raras!

(17) — Foi chocante ler um artigo de José Pastore, “Como descongestionar a Justiça do Trabalho?” (O Estado, 26/10/99, B2), elogiando a “profunda” reforma de Zulaiê. Ele, Prof. da USP, é considerado o grande especialista nacional no tema. Que falta faz à vida o estudo e a compreensão da história universal! Para enxergar a floresta, é preciso sair de dentro dela. Brecht, aquele velho dramaturgo alemão, marxista, chamava isso de distanciamento.

(18) — Foi muito divertido ler uma nota d’O Estado de 1/10/97, que dizia: “A Justiça do Trabalho determinou a penhora da sigla PV a pedido da Ex-Secretária... que pede R$6,3 milhões (R$6,3 milhões? Que ninharia!) de indenização trabalhista”. Provavelmente, o PV se safou, na linguagem de nossos velhos amigos marinheiros e comunistas, companheiros de besteiras e exílio. É indigesto ver, no meio dessa tremenda guerra brasileira, problemas do Primeiro Mundo, como ecologia, por exemplo, na agenda nacional. Esses “verdes” continuam verdadeiras “melancias”, na linguagem dos antigos militares: Verdes por fora e vermelhos por dentro! Homo ridiculus?

(19) — A “democracia” aqui se aperfeiçoa tanto que, recentemente (30/7/97), gerou uma nova Lei, de número 9504, que, no seu artigo 98, afirma aproximadamente o seguinte: “os eleitores nomeados para compor as mesas receptadoras ou Juntas Eleitorais... são dispensados dos serviços... sem prejuízo de salário... pelo dobro dos dias...” — Ou seja, o funcionário que atuar como mesário etc. (e isso quase sempre acontece aos domingos), terá dois dias livres, e nós, pequenos empresários, teremos que pagar-lhes dois dias como horas-extras! Que perfeição humana! Que bom fazer cortesia com chapéu alheio! Será que isso existe em algum país democrático do Primeiro Mundo? Quando essa lei se propagar, haverá excesso de oferta para o cargo de mesário! Um amigo aposentado me precisou que já haveria uma lei ou regulamentação anterior com esse espírito.

(20) — Deputados petistas (O Estado, 21/8/2001, A3) querem estender essa excrescência aos canais fechados de TV — pagos. Eu me pergunto: “Existe algo similar nos países democráticos e capitalistas do Primeiro Mundo?” O subcapitalismo é de uma imaginação extraordinária!

(21) — Outra faceta da Contra-Revolução de 1930 é que ela deu início ao processo de corrupção como fator significativo na vida política nacional. Nos anos em que o liberalismo floresceu, de 1822 a 1930, apesar de inúmeras tentativas golpistas por parte de positivistas, esse aspecto foi totalmente irrelevante. Vargas, com poderes ditatoriais, sobretudo sobre verbas, foi demolidor: seus medíocres textos eram “solicitados” por todos os municípios e ele alcançou até uma cadeira na, até então, seríssima Academia Brasileira de Letras (ABL)! A melhor descrição de seu caráter está nessas palavras do sr. Affonso Henriques: “Getúlio foi anticaudilhista e caudilho, inimigo das ditaduras e ditador, pró-nazista e democrata, anticomunista e aliado dos comunistas, procurando sempre tirar o melhor partido político da situação de cada momento.” Além disso, podemos acrescentar uma outra passagem do estudo citado. A um interlocutor, Vargas afirmou: “nunca fiz amigos dos quais não me pudesse afastar, nem inimigos dos quais não me pudesse aproximar.” (pág. 39 da obra citada).

(22) — “Enquanto o Sr. Oswaldo Aranha, embaixador em Washington, amigo íntimo de Vargas e companheiro na Contra-Revolução de 1930, se esforçava em enfatizar o sentido democrático do governo brasileiro (por influência, talvez, dos ares do norte), o Sr. Getúlio Vargas, a bordo de nosso navio Capitânea, em 11 de junho de 1941, fazia profissão de fé nazi-fascista (Affonso Henriques, vol. I, pág. 59)”. O Sr. Vargas só caiu, em 1945, porque o nazi-fascismo ruiu. Não tínhamos forças internas para destroná-lo. De fato, ele retornou em 1950: “Getúlio Vargas não é candidato de partidos; é um candidato do Povo! Trabalhadores do Brasil, vocês subirão comigo os degraus do Palácio do Catete; haverá carne com fartura; o custo de vida será reduzido de 30 a 40 por cento... (obra citada, pág. 49)”. Nietzsche afirmava que o cristianismo, provavelmente, predominará por mais um milênio. E eu me pergunto: os dois próximos milênios serão suficientes para a eliminação do lamentável estado mental nacional?

(23) — Uma recente reportagem da revista Veja, de 8/12/99, intitulada “Vândalos no hangar”, sobre a Embraer, a menina-dos-olhos do nosso setor exportador (altamente subsidiada), me induziu a pensar num terceiro mandamento para os trabalhadores do setor privado: “Sabotai vossas empresas para demonstrar o poder do sindicato quando este luta por aumentos salariais”. Pouco importa a segurança de vidas humanas e a saúde do vital setor exportador do país. A que ponto chegamos!

(24) — Jânio Quadros dizia que um dos últimos heróis tucanos mortos recentemente, Franco Montoro, gozava de nada menos que oito aposentadorias públicas! Notícias recentes me informam que um velho conhecido, Flávio Tavares, publicou um livro, intitulado “Memórias do Esquecimento”, no qual, às esconsas, me cita. Ali, há mais esquecimentos e mágoas do que memórias. Não vejo porque misturar questões íntimas e pessoais à história do país. Para que serve isso? Não me rebaixarei a contar a verdade de coisas tão íntimas e absolutamente desnecessárias para o país. Tampouco relatarei a verdade sobre Imperatriz e Uberlândia, por considerá-los aspectos ridículos de um passado de erros. O passado, basicamente, só interessa na medida em que possa contribuir para um futuro melhor. Ao receber a notícia de seu livro, pensei que a maturidade pudesse dar caráter às pessoas. Ledo engano! Terra de Macunaímas! Sua obra é, sobretudo, uma apologia da guerrilha castrista no Brasil, nos dias de hoje! Pudera, com duas aposentadorias públicas, uma da Universidade de Brasília e a outra da Procuradoria do RS, e uma terceira aposentadoria (retroativa?), que constitui-se num verdadeiro achaque ao convalido INSS, através da Lei da Anistia, fruto do atual período “democrático”, tão preocupado com as “injustiças” do passado, nada mais agradável do que dedicar-se a futilidades. Trata-se, o autor, de um bom e exuberante espécime, bem nutrido, da classe dos perfectos idiotas latinoamericanos.


 

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Fevereiro 2005

 

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