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DELINEAMENTOS DE POLÍTICA LIBERTÁRIA

Teotonio Simões


 

Delineamentos de política libertária
Teotonio Simões
Fontes digitais:
Documentos do autor
www.sembandeiras.org
[geocities.com/Athens/Acropolis/3471]
http://www.teotonio.org/delinea/
Copyright[!?]
Domínio[!?] Público
Créditos
a todos os que me ajudaram a crescer


 

ÍNDICE

Dedicatória
Mensagem do Sol
A Unidade
Poder
Meios
Consenso
Consenso de Primeiro Grau
Consenso de Segundo Grau
Autoridade
Mudança
Posse
Apropriação
Propriedade
Consciência
Contrato
Futuro


 

Aos que passaram por aqui:

“Eu sou a mosca que pousou em sua sopa
Eu sou a mosca que pintou pra lhe abusar
Eu sou a mosca que perturba o seu sono
Eu sou a mosca no seu quarto a zumbizar

E não adianta vir me dedetizar
Pois nem o DDT pode assim me exterminar
Porque cê mata uma e vem outra em meu lugar”


Mosca na Sopa — Raul Seixas


 

 

[imagem]

 

Aos que estão chegando:

O Sol manda uma mensagem todos os dias, iluminando a todos.
A distinção entre os seres não vem dele...

 

 


 

DELINEAMENTOS
DE POLÍTICA
LIBERTÁRIA

A Unidade

A unidade és tu
e sou eu.

Somos todos e cada um de nós.

No que vives e no que vivo
na busca da unidade
do sentir, do pensar e do agir.

A unidade procurada,
que não está no passado selvagem
   de onde viemos
nem no presente
   em que estamos
mas no futuro
   que talvez possamos construir.


 

“Como o peixe na água não tem a noção da água,
mergulhados no cotidiano,
nós também não temos a noção da política em que vivemos.”

Poder

Não um só,
mas três,
como uma trindade.

Poder
   como parece no sentir
   e no falar
   que posso
   viver, pensar,
   até abandonar a vida,
   na medida do meu querer
   na medida da minha coragem.

Poder.
   como aparece no sentir,
   e no falar
   não autônomo, heteronômico,
   como o poder de alguém
   sobre minha vida, meu sentir,
   na medida do meu querer
   no limite da minha coragem.

Poder
   como aparece no viver,
   diariamente,
   institucionalizado,
   como o poder do coletivo,
   usado em nome da alguns,
   na medida do seu querer
   na medida da minha coragem

   Mas a trindade,
   nem metafísica,
   nem etérea,
   baseia-se no ter,
   que limita o ser,
   apesar do querer
   apesar da coragem,
   restringindo a vontade
   impondo ao ser
   o ter,
   ao ser não sendo
   a acreditar que é
   não sendo.

   ...E a trindade pisa em chão firme:

Meios.
   meios escassos,
   não de todos,
   porque na desigualdade dos meios,
   repousa a trindade dourada,
   invertida,
   viciada:
   primeiro, a instituição do poder,
   depois, o poder do outro sobre mim
   e, finalmente, e nem sempre,
   o meu poder sobre mim,
   eu mesmo.

   Tão claro,
   tão simples,
   mas por que se mantém?


 

“Eu posso,
tu podes,
ele pode.
Podemos mesmo?”

Meios

Não basta o querer
se me limitam os passos.
Os limites,
naturais alguns,
outros, que me imponho,
outros, tão impostos.

Poder
   como sinto, como vivo,
   como afirmação do eu,
   como afirmação do posso,
   limita-se
   no limite do meu corpo,
   da minha vida,
   do meu ser sendo.
   Preciso meios,
   para realizar meu querer.

Poder.
   como sinto, como vivo,
   como afirmação heteronômica,
   o poder de outro sobre mim,
   limita-se
   no limite do seu corpo,
   da sua vida,
   do seu ser, dos seus meios.
   Precisa meios,
   para obrigar minha vontade,
   limitar minha coragem.

Poder
   como aparece no viver,
   cotidianamente,
   no uso que fazem do poder coletivo,
   em nome de alguns,
   em proveito de alguns,
   limita a todos.
   Precisa meios,
   para obrigar, à vontade de poucos,
   a vontade de todos.
   Precisa meios,
   para obrigar à vontade de poucos,
   a vontade de todos
   limitando a coragem.


 

“Se todos concordamos, por que discordamos?
Se dicordamos, por que não nos entendemos?”

Consenso

Nem dado, nem passado
feito, fazendo, refazendo.

Outra face do espelho,
que espelha a coação,
nos limites do cotidiano,
justificada pelos meios.

Disenso
   o discordar feito consenso,
   mas nem sempre.
   Porque consenso pode ser
   eliminar o disenso,
   pura e simplesmente.

Autoridade.
   o consenso pré-suposto,
   feito consenso pelo uso,
   tornado natural,
   normal,
   cotidiano.

Autoridade.
   que aparece como consenso natural,
   sempre, eterno, imutável.
   Mas escudada na coação:
   sempre, eterna, mutável.


 

“Para que nos ponhamos em acordo será que não precisamos de um consenso?
Na falta de consenso... é melhor recorrer à autoridade?”

Consenso de Primeiro Grau

No cotidiano,
as regras somem,
aparecem os atos.
Fatos aceitos,
naturalmente,
porque ninguém presencia
o nascimento dos atos.

O ato da autoridade, discute-se,
porém não a autoridade

O ato da autoridade, não se desconheça.
A autoridade fica brava,
lança mão do arsenal dos meios
[de todos, usados por alguns]
e impõe-se, curva a vontade,
mata a vida dos mais afoitos
subjuga os indecisos
cala os mais falantes.

Mas a autoridade,
por que se mantém?


 

“Quem deu autoridade à autoridade?
Quem dá autoridade à autoridade?”

Consenso de Segundo Grau

E sejam convidados
para o nascimento
da autoridade.

Nas regras da sociedade,
a mãe.
No abdicar da vontade,
o pai.
Na ausência dos meios,
o padrinho,
No abdicar dos meios,
testemunha.

Regras que não se refazem:
imobilizam o consenso,
apesar das vontades,
apesar dos consensos no tempo,
apesar dos meios.

Regras tornam-se meios,
à disposição das vontades.

Regras que se refazem:
imobilizam o disenso,
mas não matam,
apesar das vontades,
apesar dos consensos que morrerão
apesar dos meios de alguns
impondo-se ao consenso de todos.

As regras têm agentes:
gente que tem autoridade.


 

“Gerada a autoridade, como se livrar dela?
É melhor disciplinar,
não deixar que nasça ou eliminá-la?”

Autoridade

Afirmada, engorda.
Avoluma-se,
cresce com o bom adubo
dos corpos,
das vontades
do pensamento
que se submete
afirma e faz crescer
a autoridade.

Negada, protesta.
Lembra que existe,
lembra que pode se impor
aos corpos
às vontades
ao pensamento,
à vida
que, se não se submeter,
morre,
perde-se
desvia-se
mutila-se
se não se submeter.

Ignorada,
ressurge, em sua verdadeira roupa,
impondo
aos corpos
às vontades
ao pensamento
à vida
seu poder, baseado nos meios de todos
a serviço da vontade de alguns
sobre todos.

Mas por que aceitam?


 

“Quiseram deter o passado e se fez presente.
Querem deter o presente, se fará o futuro.”

Mudança

Um limite natural,
um limite incontrolável,
Limite.

O tempo, por mais que sonhem os poderosos
               por mais que deseje o fraco
               por mais que não aceite o ambicioso
passa.

A vida procura ser feliz
apesar de tudo
acima de tudo
por tudo.

Ignorando as regras, normas,
com elas
apesar delas
à margem delas
vive-se.

E no correr das águas
deste rio imenso
História
o homem faz sua vida
apesar das regras, das normas.

Mudando regras, normas, vida.
No avolumar das opiniões incontroláveis
que encontra barragens
mas derrubam
que encontram muros
mas não se detêm.


 

“Ter a posse, ganhar a posse, defender a posse.
Usufruir a posse, usufruir da vida.
Mas não se apropriar-se.”

Posse

Aquilo que se tem,
mas que não se detém.
Aquilo que se usa,
mas que não o usa.
Aquilo que é necessário,
mas nunca além do precário.

               Mesmo a vida,
               posse precária do tempo
               porque passageira
               porque se tem,
               não se detém
               se usa,
               não o usa,
               necessária, dada,
               porém nada mais do que precária.

               Mesmo o que se tem,
               mas que não se detém,
               porque a vida,
               posse precária do tempo,
               torna precária a posse das coisas.

               Posse das coisas,
               nunca das pessoas.
               Porque as coisas podem ser usadas,
               e as pessoas têm vontade
               e a posse de si mesmas.


 

“A posse, ao virar apropriação, se torna propriedade.
Com papel passado e tudo.”

Apropriação

O que apenas é,
e sendo existe
torna-se de alguém
e alguém da coisa.

O que é precário,
transitório
livre
passa a ser
“meu, teu, de alguém”
[até do “público”].
A posse deixa de existir
e surge a propriedade.


 

“Nós criamos nossas próprias amarras.
E as coisas são proprietárias de nós.”

Propriedade

Aquilo que se tem,
mas que se quer deter,
que se detém.
Aquilo que se usa,
e não se usa
aquilo que é necessário,
e desnecessário,
mas sempre além do precário,
tornado definitivo,
transmissível,
como se fosse de alguém
e não simplesmente fosse.

               Mesmo a vida,
               posse precária do tempo,
               porque passageira,
               torna-se eterna,
               embora passageira,
               e procuram detê-la
               e procuram usá-la
               [quando são usados por ela].
               Mas, necessária, dada,
               porém nada mais do que precária,
               a vida vence,
               como posse precária
               afirmando-se na morte.

               Propriedade das coisas
                                        das pessoas.
               Pensando-se que as coisas
                                         as pessoas
               podem ser usadas.
               Mas as pessoas têm vontade
               e a posse de si mesmas.


 

“A consciência é o ser inteiro em comunhão com o Universo.
Um só ser sendo.”

Consciência

Nada tão abstrato,
nem catalogável
nem analisável
quanto julgam alguns.

Apenas consciência,
ter ciência do que é
o mundo exterior,
ao ser,
o mundo interior,
do ser.

Impressão do exterior,
processada pela cabeça
                         pelo coração
                         pela inteligência
                         pela intuição.

Análise do exterior
e também sonho
do que poderá ser
do que será possível
do que poderia ser, se.


 

“Podemos nos entender e combinar os nossos termos.
Confio na tua palavra. Confias na minha palavra.
Mas se alguém romper o combinado, onde a confiança?”

Contrato

Tua vontade, minha vontade,
nada mais,
nada menos.
E nada mais é necessário.
E nada menos é desejável.

Revogável,
pois passageira,
como tudo,
a vontade não se congela no tempo
nas pessoas
na vontade de um momento.

Responsável
perante as vontades
expressas livremente
expostas
uma à outra
dispostas.

Tua vontade que encontra a minha
na disposição do ato
na expressão do fato
na contingência do existir.

Livre disposição das vontades
só e porque os meios se equivalem
e as vontades se expressam.

[E não há um ele.
Cada ele é um eu e um tu.
E o nós somos um eu e um tu
com ciência de um nós.]


 

“Você pode dizer que eu sou um sonhador.
Pode dizer que o sonho morreu.
Mas ele é velho como a humanidade.
Cada geração realiza parte do sonho e acorda dele.
Novas gerações aparecem e continuam sonhando o velho sonho.
Um dia acordaremos no sonho.”

Futuro

A afirmação da redução:
Poder, só poder
no limite natural da vida.

Os meios,
               tão naturais quanto o ar,
               tão naturais quanto a água
               tão naturais quanto o Universo.

A vida, tão efêmera quanto é
           tão passageira quanto o tempo
           tão plena quanto o possível de cada um.

O consenso, espontâneo,
               no limite da soma das vontades
               no limite da vontade de cada um
               na expansão do ser que não ofende,
convence
               no limite do tempo
               no limite da vida
               no limite da vida
               na expansão do sentir
                                       do pensar
                                       do sonhar
                                       do existir.

A autoridade de cada um sobre si mesmo
A autoridade, impensável,
                    negada dentro de cada um
A autoridade, enterrada.
A propriedade, some
A consciência, existe.
A propriedade, o que era mesmo isto?


 

AOS QUE VIRÃO

Por que Delineamentos? Porque, originalmente, foi escrito como um roteiro para o que supunha viria a ser uma tese de pós-doutoramento, bonitinha, com embasamento de cada enunciado e afirmação que o eventual leitor encontrou nas linhas acima. Tinha então o título de “Delineamentos de Política”.

E teve, como ponto inicial, a leitura do “Da Dignidade do Homem” de Pico de la Mirandola, que atualizava antigas verdades no século XV.

Depois, com meu encontro com o Movimento Humanista, desenterrei os Delineamentos, e ficou “Delineamentos de uma Política Humanista”.

Tempos depois, olhando de novo, achei que era um tanto limitativo, pensando que “Delineamentos de uma Política Libertária” ficaria melhor e mais abrangente. Foi assim que foi colocada em um cantinho em www.sembandeiras.org. e lá ficou.

Até o Tito, que não conhecia pessoalmente, me mostrar que o que estava escrito tinha alguma relevância. (Obrigado, Tito).

Agora, ao publicar em eBook, descobri que o “uma” poderia dar a impressão de que existem diversas “políticas libertárias” possíveis. Não é o que penso. Podem haver diversos caminhos para praticá-la, diversas maneiras de expô-la, mas penso que há uma e somente uma política libertária possível: a norteada pelos valores de igualdade, liberdade e solidariedade entre todos os viventes (note que não falei em homens, nem em seres humanos).

Em resumo: alicerçada em um único fato básico — o da unidade do universo. Há universos nos momentos mais diversos, mas todos os universos compõem um só Universo, que cada um encontra dentro de si mesmo, na unidade e descoberta do Eu Sou.

Para quem tem ouvidos para ouvir, basta o que foi dito. Para quem não tem ouvidos para ouvir, nem mil palavras seriam ouvidas. E o que foi dito nem sequer espelha o que é. Mas pode, espero, ser o gatilho para que a voz que já estava te dizendo muitas coisas que contrariam os que falam as verdades e as palavras oficiais seja ouvida. Se você já ouviu alguma vez esta vozinha, o Delineamentos poderá ser continuado por você. Na prática.

Aceite meu abraço, quando e onde estiver. Eu estarei sempre por aí, a cada raiar do sol, com ele, ele.


 

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Fevereiro 2006

 

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