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UNE

Instrumento de Subversão

Sonia Seganfreddo

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UNE Instrumento de Subversão
Sonia Seganfreddo

Fonte digital
Digitalização da edição em papel
Ed. GRD - 1963

Seganfreddo, Sonia Maria S (Sonia Maria Saraiva), 1937-     
“Série de quatorze reportagens, publicada sob o título UNE—menina dos olhos do PC ... em O Jornal durante o mês de setembro de 1962” - Dedalus - http://dedalus.usp.br

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© 2008 — Sonia Seganfreddo

USO NÃO COMERCIAL - VEDADO USO COMERCIAL


 

ÍNDICE

Introdução
I — O que é a UNE
II — Pequeno histórico da UNE
III — 1949, ano de definição da UNE
IV — UNE volta a ser notícia em 1956
V — A UNE se declara fundamentalmente política
VI — Ainda a greve do terço e sua fundamentação ideológica
VII — Catequese estudantil comprovada em inquérito
VIII — Congresso de Quitandinha pratica arbitrariedades
IX — Conclaves estudantis internacionais são dirigidos por Moscou
X — ISEB alicia estudantes e orienta a UNE
XI — ...e os poderes da república patrocinam o festival subversivo
Conclusão


 

INTRODUÇÃO

Por que escrevi uma série de reportagens sobre a União Nacional dos Estudantes denunciando-a em suas atividades subversivas? Eis a pergunta a mim dirigida, muitas vezes, por amigos, principalmente colegas e professores, preocupados com a repercussão que minhas afirmações pudessem encontrar mesmo nas esferas governamentais. Escrevi as reportagens, ora apresentadas em livro, por uma questão de responsabilidade, de conhecimento, de vivência e, acima de tudo, com a sadia pretensão de esclarecer, na medida do possível, à grande maioria de estudantes desinteressados e ingênuos que, sem saber por que o fazem, auxiliam as manobras de elementos regiamente pagos para agitarem o panorama universitário em particular e a Nação em geral.

As atividades da UNE me preocupam devido à minha formação democrática autêntica. Democracia é dinamismo, é responsabilidade, é a possibilidade de errarmos, aprendermos e corrigirmos os erros. O Estado Democrático tem as suas obrigações para com o povo e, quando estas obrigações são esquecidas, e uma casta dirigente exorbita em seus direitos, propiciando a miséria e o desespero em seus comandados, a situação torna-se perigosa. Idéias contrárias à formação humanística e cristã de um povo encontram, neste mesmo povo, abrigo seguro e possibilidades de evoluírem, culminando na mudança violenta de uma estrutura estatal e social. Por isso é preciso que tenhamos cuidado. No Brasil o erro está em nossa democracia de fachada, deteriorada por arbitrariedades, desumanismo e ignorância, muita ignorância. É preciso que corrijamos o erro. Tal não encontra solução, entretanto, em doutrinas importadas e, sob certos aspectos, piores que a mais corrupta das democracias. É necessário, isso sim, uma consciência nacional — soma das várias consciências individuais — que desperte do eterno sono em que está mergulhada há muitos anos. À juventude compete a tarefa de lutar e, futuramente, galgar os postos de mando da Nação. E é na juventude, revolucionária por natureza, e desencantada com a irresponsável democracia brasileira, que se incute idéias e técnicas marxistas-leninistas ao invés de esclarecê-la e animá-la para a reconstrução de um Brasil melhor, mais humano, formado por homens dignos e responsáveis. Por homens que compreendam a sua verdadeira situação histórica: viverem livres e serem úteis à comunidade.

A UNE representa uma juventude inconsciente. Suas atividades não preocupam às autoridades do país, que apenas em épocas de agitação ou greve resolvem tomar atitudes de pseudo-autoridade, acabando, logo, por oferecerem, aos líderes estudantis, todas as regalias e proteções. A UNE, esta é a verdade, tornou-se uma das maiores células do comunismo internacional instalada em nosso território, servindo, os seus elementos, aos agentes bolchevistas, de quem, provavelmente, recebem dinheiro, pelos caminhos mais diversos... A entidade estudantil, portanto, constitui-se num problema de segurança nacional. O mais lamentável é a apatia da grande maioria dos estudantes de formação democrática, mas envenenada pelo excesso de propaganda de uma entidade que, de direito, representa os universitários brasileiros. Esta maioria compactua, por desconhecimento ou medo de ser tachada de “reacionária”, com os ideais de um pequeno número de estudantes, muitos dos quais profissionais que passam a vida em universidades, na catequese de jovens ao credo vermelho.

Quando decidi entrar na Faculdade Nacional de Filosofia, outros interesses me moviam. Escolhi o curso de Filosofia por entender que uma formação filosófica possibilitaria a concretização de meus planos, referentes à literatura musical. Assim, em agosto de 1958 me matriculei no Curso Pré-Vestibular da Faculdade Nacional de Filosofia da Universidade do Brasil, quando, imediatamente, passei a sofrer a pressão catequética dos professores do Pré-Vestibular, alunos da Faculdade, liderados pelo Prof. Álvaro Borges Vieira Pinto, o catedrático de História da Filosofia. O grupo de professores, de início, tratava-me muito bem, com o intuito de captar a minha simpatia e introduzir-me na “realidade brasileira”. Confesso que me fascinei um pouco pelas críticas e combates do grupo. Realmente, o Brasil estava, como ainda está, mergulhado na maior anarquia e injustiça social. Analisando, porém, uma série de atitudes, completamente opostas aos meus princípios, cheguei à conclusão de que não poderia dar autoridade moral a quem não apresentava o mínimo de coerência e decência. Mantive-me calada, não compactuando, nem fazendo oposição, pois o meu interesse era o de cursar a Faculdade sem fazer política.

Em novembro de 1958 o grupo participou da invasão ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, cujo Presidente, Embaixador Roberto Campos, era, então, considerado entreguista. A UNE, dirigente do movimento, alegava que o Presidente da República devia ser pressionado a fim de demitir o Sr. Roberto Campos e colocar em seu lugar um elemento nacionalista. Pouco entendia eu de política, e os termos “nacionalista”, “entreguista”, “reacionário”, tão explorados, confundiam-me. Pouco sabia, também, sobre a UNE e sobre suas atividades. Isso, aliás, acontecia e ainda acontece com os estudantes que ingressam em nossas escolas superiores e o grande mal é que a maioria se entusiasma e se deixa levar pelos “ensinamentos” que recebe, não se preocupando em ler, analisar e raciocinar. Nesta época comecei a estudar o problema, chegando à conclusão de que toda a doutrinação da UNE não passava de uma deformação da realidade. Partiam seus militantes de premissas verdadeiras, pois, de fato, há miséria, fome, analfabetismo, grupos econômicos, etc, em nosso país, mas as causas reais dessas situações eram propositadamente ignoradas e arranjadas na conta de chegar com o fito de possibilitarem as teses subversivas.

Mas, obrigada a participar da arruaça contra o BNDE, recusei-me determinantemente, alegando que não era aluna da Faculdade, não conhecia a questão e nem considerava próprio moças participarem de movimentos de rua. A perseguição contra mim começou. Passei a ser “difamada”, conforme supunha o grupo catequisador, através de carimbos próprios dos comunistas: “burguesa decadente”, “reacionária”, “entreguista”, “sem capacidade intelectual para fazer curso superior”, etc... Recebi, ainda, um aviso de que seria eliminada no vestibular, uma vez que o Sr. Vieira Pinto, presidente da banca examinadora, só deixaria ingressar na Faculdade os candidatos “evoluídos”, aqueles que se haviam deixado influenciar pela pregação marxista misturada com a mais completa imoralidade. Após um vestibular desonesto fui “reprovada” junto com outros elementos previamente estudados pelo grupo.

Aí começou o meu combate. Revisões de prova, ameaça de ação judicial, ameaça de denúncias pela imprensa e uma série de outras medidas fizeram com que o caso fosse resolvido imediatamente. O Sr. Vieira Pinto, e seu assistente, contudo, não deixaram de me perseguir em dois anos de curso. Quanto ao caso do vestibular e um inquérito disciplinar levado a efeito na Faculdade Nacional de Filosofia, dedico um capítulo deste trabalho.

Foi assim que entrei na política estudantil. Mais por emoção e sentimento de justiça do que, propriamente, por conhecimento e vontade. Da emoção passei ao estudo sereno dos vários problemas e, usando da pena, durante os quatro anos de curso, colaborei, como pude, para o esclarecimento daqueles que ainda não se entregavam às sórdidas campanhas de corrupção intelectual e moral ministradas em nossas escolas superiores. Neste livro está, pois, um dos últimos trabalhos feitos em minha vida universitária.

Em agosto de 1962, após ter rompido a greve universitária, de objetivo político, decretada pela UNE, em reivindicação a um terço de estudantes nos colegiados universitários, recebi um convite do jornalista Paulo Vial Corrêa, secretário de “O Jornal”, para escrever uma série de reportagens sobre a propaganda e a atividade comunista no meio estudantil. Aceitei o convite, como disse no início, consciente de minha responsabilidade, acreditando ser um dever cívico levar ao público e às autoridades, embora muitas saibam e não queiram agir, as atividades subversivas de estudantes manobrados pelos comunistas. Apesar, porém, de me sentir capacitada para falar do problema, por dois motivos — estar concluindo um curso de Filosofia e ter prática jornalística — senti o peso da grande tarefa e o receio natural de sofrer perseguições, pois os comunistas não têm escrúpulos quando se propõem a aniquilar alguém que atrapalhe e denuncie as suas atividades. Isso, no entanto, logo passou e, pondo mãos à obra, em menos de quinze dias consegui recolher o material necessário para uma série de quatorze reportagens, publicada sob o título “UNE — MENINA DOS OLHOS DO PC”.

A série, publicada em “O Jornal” durante o mês de setembro de 1962, logo foi reproduzida em vários órgãos dos Diários Associados, correndo pelo Brasil a fora. Tive o consolo de ser procurada por várias associações estudantis, colégios e universitários, todos estarrecidos com as denúncias feitas e afirmando que se tornava necessária, com urgência, uma ação democrática consciente em nossas faculdades.

O tempo que tive para compilar o material e escrever as reportagens não foi muito. Mesmo assim creio que apresentei o suficiente para dar uma idéia do que é a União Nacional dos Estudantes. Agora, por convite do editor Gumercindo Rocha Dorea, publico este livro, uma coletânea das reportagens de “O Jornal”, ampliadas em vários pontos com novos fatos e novas pesquisas. As acusações aqui feitas são produtos dos próprios relatórios da UNE e de suas demais publicações que podem ser obtidas na sede da entidade. Recorri, também, aos noticiários de jornais, os mais antagônicos politicamente, e publicações de caráter secreto quanto à sua fonte e pessoas que me auxiliaram em sua obtenção. Por uma questão de ética não posso revelá-las.

Agradeço a todos os que permitiram a realização deste trabalho, principalmente aos entrevistados que me forneceram os dados suficientes para recompor uma pequena história sobre a UNE, suas campanhas, suas glórias, suas quedas, suas misérias. Agradeço, também, antecipadamente àqueles que, verificando falhas neste volume, me remetam sugestões e dados para melhorá-lo numa possível segunda edição.

Estado da Guanabara, janeiro de 1963.

S. S.


 

I - O QUE É A UNE

A União Nacional dos Estudantes é a entidade máxima dos estudantes brasileiros. A ela cabe orientar, planejar, coordenar e executar as tarefas relacionadas com os estudantes universitários, pois a entidade supervisiona as Uniões Estaduais dos Estudantes e os Diretórios Centrais dos Estudantes, entidades que congregam escolas superiores do país. Sua diretoria é eleita anualmente em Congressos Nacionais dos Estudantes, nos quais se fazem representar dois estudantes de cada Faculdade e de cada Diretório com o direito de voto.

A UNE é importante para o comunismo porque se situa no Brasil, país líder da América Latina, e no principal estado da Federação. Qualquer movimento estudantil partindo da Guanabara, mobiliza setores da Nação, especialmente a imprensa que, muitas vezes, sem saber os verdadeiros objetivos de tais movimentos, os noticia com simpatia. A ação da UNE, também, se faz sentir junto ao Governo. Através de manobras bem arquitetadas, sob o pretexto de conseguir melhoria em restaurantes, obtenção de livros ou viagens culturais, a UNE recebe dos poderes Legislativo e Executivo verbas vultosas que são empregadas em propagandas subversivas e em criação de centros culturais (o Centro Popular de Cultura, por exemplo) cuja finalidade é a de difundir o marxismo entre os estudantes e os trabalhadores. O dinheiro obtido do Governo serve, ainda, para alimentar e vestir os estudantes profissionais que não estudam, mas que agitam e atrapalham aqueles que desejam fazer da Universidade uma instituição educacional.

Dada a sua força, a UNE é, no Brasil, o principal instrumento do comunismo internacional que, por meio da União Internacional dos Estudantes (UIE), entidade comunista sediada em Praga, envia agentes, técnicos e planos para os comunistas militantes nas universidades. No Brasil o aliciamento dos universitários, feito pelos agentes da UNE, já assume proporções consideráveis que devem ser reprimidas imediatamente, sob pena de a universidade se transformar em centro político e constante foco de agitação.

A CATEQUESE FEITA PELA UNE

A UNE, recebendo instruções superiores, catequisa jovens universitários. A técnica aplicada é a da “simpatia e amizade”. Os catequisadores, já veteranos nas escolas, convidam os calouros para praias, cinemas, bailes, estudos, etc. Quando a vítima é do sexo oposto ao do catequisador, entra o “golpe do namoro”. Os primeiros contatos são os mais cordiais possíveis e o catequisador vai influenciando e adquirindo a confiança do calouro. Perguntas embaraçosas e de duplo sentido são formuladas aos jovens inexperientes que começam a cair em confusão mental. Aproveitando-se desta confusão e da dúvida, o catequisador vai levando o seu interlocutor para onde quer, expondo teses, habilmente veladas, com segurança e autoridade. Oferece, também, livros marxistas ao jovem, afirmando-lhe que neles está a verdadeira evolução.

Quando a confiança entre mestre e discípulo é absoluta, entra a parte moral. Família, sociedade, casamento são meios de impedir a verdadeira evolução social. São hábitos burgueses que devem ser abolidos. A literatura, agora oferecida, é pornográfica, mas rotulada de “obras avançadas e de grandes concepções”. O jovem, numa fase muito própria para ser revolucionário e reformador, geralmente aceita a doutrinação, convencido de que assim será evoluído.

A catequese varia de acordo com as escolas e os grupos de alunos. Os que têm tendência à liderança são os preferidos. Aos elementos inexpressivos o importante é que votem com os “progressistas”. Quando um aluno se revolta com a catequese que lhe é imposta, imediatamente o serviço de desmoralização entra em ação. Logo a Faculdade conhece o “burguês decadente”, “o fascista”, o “débil mental”, o “reacionário”, o “antinacionalista”, o “entreguista”, etc. E é por isso que muita gente não reage contra os elementos “progressistas da esquerda”...

A aluna esquerdista é de grande importância na escola para a obra de catequese. Quando bonita atrai os rapazes por meio de atitudes masculinas de absoluta independência, concedendo-lhes toda a série de facilidades e participando de noitadas alegres.

O ESTUDANTE PROFISSIONAL

Os elementos comunistas, atuantes nas faculdades, quando conseguem se formar, são encaminhados na vida a fim de executarem a missão catequética em seus setores de atividade. A propósito, atualmente, a pós-graduação dos elementos filiados à UNE é feita no Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB), local onde os ex-acadêmicos “progressistas” encontram, sob a proteção do Governo, o emprego fixo que lhes possibilita ordenado seguro.

Muitos elementos, porém, se perpetuam nas faculdades através de dependências e ausências às provas. Estes elementos, geralmente, estão matriculados em duas escolas superiores, burlando assim a “severa” vigilância do Ministério da Educação. Outros elementos terminam um curso e se matriculam em outro ou em outra faculdade, especialmente na que não lhes exige um exame vestibular.

PREFERÊNCIA DE PROFISSÕES

As faculdades visadas para a catequese são, em primeiro lugar, as de Filosofia. Aí se formam professores que desempenharão importante papel na orientação de secundaristas. Nas faculdades de Filosofia, quase sempre funcionam os cursos de Pré-Vestibular, onde os futuros universitários começam a receber o marxismo em doses controladas. Na Faculdade Nacional de Filosofia, por exemplo, dois elementos freqüentam cada curso a mando da UNE.

Os cursos de Jornalismo, também nas faculdades de Filosofia, oferecem material humano importante para a obra do PC. Os jornalistas, atuando em jornais burgueses, podem forjar notícias que impeçam o trabalho livre dos subversivos e fazer promoções de atividades comunistas, muitas das quais bastante camufladas.

Seguem-se as faculdades de Agronomia, Assistência Social, Artes e Economia, devido às relações humanas que seus diplomados exercem. Papel de relevo têm as faculdades de Direito, devido a oratória que seus alunos desenvolvem, o que é incoerente, uma vez que no regime comunista os advogados perdem a sua razão de ser. E é interessante notar que os que mais se dedicam à agitação estudantil cursam Direito, o que prova o desconhecimento da sociedade e das instituições dos países tidos como socialistas, por parte daqueles acadêmicos. Todos sabem que em países comunistas não há o Direito Civil, pois não há possibilidades de acordos salarial, contratual, etc... O Direito Penal também não existe, pois são as comissões estatais que fazem os “julgamentos”.

A UNIÃO INTERNACIONAL DOS ESTUDANTES

A União da Juventude Comunista (UJC) funciona paralela ao PC, sendo subordinada ao Konsomol Russo. Ela aparece ao público, porém, com o nome de Federação da Juventude Brasileira. Seus diretores são elementos já diplomados em alguma coisa, visto ainda não existirem comitês estudantis nas Faculdades, o que seria arriscado devido ao fato de tal entidade ser bastante visada e confessadamente comunista.

O Konsomol, além de dirigir as Uniões das Juventudes Comunistas existentes em vários países é, também, a dirigente da União Internacional dos Estudantes (UIE), sediada em Praga e organizadora dos diversos conclaves estudantis aos quais comparecem federações de estudantes brasileiros credenciadas pela UNE.

A UIE envia embaixadas em missão especial de espionagem e ensinamento de novas técnicas para diversos países, obtendo bastante êxito nos países subdesenvolvidos. Em 1956, a Polícia prendeu, no Brasil, enviados da UIE, caso que relataremos mais adiante.

TOMADA DOS DIRETÓRIOS ACADÊMICOS

Os Diretórios Acadêmicos são objetivos dos comunistas. Antes estes os conseguiam através de tumultos e coações, indo até à agressão física àqueles que se opunham aos seus planos. Com o tempo, porém, a técnica foi melhorando. As chapas são formadas por “inocentes úteis” ou indivíduos que, suspeitos de serem comunistas, de fato nada apresentam contra si. Os “inocentes úteis” são elementos sem expressão e desconhecidos em suas faculdades, mas facilmente manobráveis, e seguem a orientação dos chefes comunistas. Estes elementos apresentam fabulosos programas a serem postos em prática caso se elejam. Se vencem, porém, passam a agir sob as ordens da cúpula instalada na UNE.

Realizam, tais Diretórios, o programa de desmoralização dos professores, conferências e mesas-redondas com elementos declaradamente de esquerda ou simpatizantes ainda não enquadrados na linha justa, sejam eles deputados, governadores, professores ou artistas.

ASSALTO NAS ASSEMBLÉIAS

Nas assembléias universitárias os elementos comunistas sempre estão presentes e conseguem tomar conta dos trabalhos devido à persistência e “enrolação” que adotam. Acumulam a mesa diretora com propostas e contrapropostas que retardam a votação. Esta só é feita quando o “contador” — elemento da UNE, União Estadual ou da própria Faculdade, que sabe qual é o seu pessoal — após ter contado os presentes dá um sinal à mesa.

Os democratas na hora da votação não estão mais na assembléia, devido ao adiantado da hora, principalmente em se tratando de moças. Assim uma Faculdade com 1.200 alunos tem, em sua assembléia, inicialmente, cerca de 400 elementos. Com o passar do tempo sobram uns 300, dos quais, aproximadamente uns 200 votam com a UNE, e muitos destes por ingenuidade. Duzentos alunos, portanto, são tidos como maioria, numa Faculdade de 1.200 alunos, e é preciso que se diga que os comunistas não faltam, sempre estão presentes, mesmo “carregados em maca”.

A situação, embora exposta rapidamente, mostra que uma minoria de agitadores consegue fazer movimentos fantásticos em nome de todos os estudantes brasileiros. Isso é uma farsa e daí a necessidade que têm os estudantes democratas de se organizar e de agirem. Para tal é necessário que conheçam a filosofia marxista assim como as várias doutrinas sociais. É necessário que tenham confiança naquilo que fazem sem temer as perseguições morais daqueles que não têm autoridade para fazê-las. A posição da democracia, agora, deve ser a ofensiva.


 

II — PEQUENO HISTÓRICO DA UNE

UM ESCLARECIMENTO SOBRE A HISTÓRIA DA UNE

O objetivo deste trabalho não é o de relatar todos os acontecimentos da UNE, ano por ano, em seus mínimos detalhes. Isto seria quase impossível, não comportando a realização de uma série de reportagens, mas um volumoso compêndio. Seguindo o tempo, porém, procuramos trazer fatos, os mais expressivos, os que possam dar uma visão das atitudes públicas assumidas pela UNE.

O pequeno histórico a ser apresentado terá lacunas correspondentes a períodos em que nada houve na entidade que merecesse maior destaque. A UNE, nascida em 1937, pouco antes do Estado Novo, tinha como finalidade congregar os estudantes apolíticamente, desenvolvendo-lhes o verdadeiro espírito de liberdade e incentivo às realizações de suas potencialidades nos terrenos social e profissional. Nascida sob a influência da Casa do Estudante do Brasil, rompeu a UNE com aquela entidade em 1940, passando a ser autônoma em suas ações. A Guerra motivou os grandes movimentos universitários em prol da participação de nosso país contra os ditadores do Eixo. Mas, foi nos anos de 1944 e 1945 que a UNE desempenhou seu grande papel político, participando das conspirações contra a ditadura de Getúlio Vargas. Grandes partidos políticos se formavam ou ressurgiam após quinze anos de silêncio. Entre estes a União Democrática Nacional e o Partido Socialista Brasileiro, cujas primeiras reuniões tiveram efeito no salão da União Nacional dos Estudantes, com a participação de conceituados políticos e universitários, hoje elementos de destaque na vida do país.

Pouco se tem a falar sobre a UNE a partir daquela data até 1949, ano em que o primeiro movimento de rua perturbou a vida da cidade, começando a se caracterizar a infiltração comunista entre os estudantes. De 1956 até os nossos dias, a UNE vem se tornando motivo de sobressalto junto a pessoas responsáveis e de formação realmente democrática.

Todos os relatos dos acontecimentos que marcaram a vida da UNE estão baseados em pesquisas, entrevistas, trabalhos impressos pelas próprias entidades estudantis, jornais universitários, órgãos de nossa imprensa e, especialmente os relatórios de diretoria da própria UNE.

Mas, vamos a história da UNE.

a) ORIGEM DA UNE

Segundo Raymundo Nonato Rodrigues Vilella, Secretário Geral da UNE, em 1954, autor do folheto “Fundação da UNE”, a história da União Nacional dos Estudantes pode ser dividida em três fases: antes, durante e depois da guerra. O período inicial é de grande importância, por ser a fase de organização da entidade e de sua definição.

Algumas escolas isoladas possuíam seus centros representativos de caráter puramente cultural. A primeira entidade estudantil com características nacionais data de 1929 e ainda hoje existe, é a Casa do Estudante do Brasil, nascida por iniciativa da Sra. Ana Amélia Queiroz Carneiro de Mendonça, visando a assistência social ao estudante e promovendo-lhe o espírito de cooperação e solidariedade em torno de seus problemas. A CEB tinha o apoio do Governo e cumpria seus objetivos, determinados em estatuto, mantendo intercâmbios entre as entidades estudantis do país e entre estas e as entidades estrangeiras análogas.

Em 1932 a Casa do Estudante do Brasil recebeu a visita de dois estudantes poloneses, pertencentes à antiga União dos Estudantes Poloneses, que, impressionados com a ação da entidade, sugeriram a sua filiação à Confédération Internationale des Étudiants, sediada em Bruxelas e cúpula de todas as entidades estudantis mundiais. Após entendimentos com o nosso Governo, a CEB, em 1936, enviava a estudante Clotilde Cavalcanti a Sofia, como representante do Brasil no XVIII Congresso da CIE, a fim de propor a nossa filiação ao órgão internacional. Em 1937, o Conselho da CIE, reunido em Viena, aprovou por unanimidade a indicação, determinando “o compromisso de convocar uma assembléia das associações estudantis do Brasil para fundar a entidade máxima de representação dos estudantes brasileiros”, conforme consta no próprio estatuto da UNE.

A Casa do Estudante do Brasil, em conseqüência, cumprindo o artigo 25 de seu estatuto, artigo que previa a convocação de estudantes sob forma de Conselho Nacional, deliberou a sua criação e convocou as entidades estudantis existentes a se reunirem em Conselho Nacional de Estudantes. A primeira convocação do referido Conselho trazia o subtítulo de União Nacional dos Estudantes do Brasil para efeito de filiação à Confédération Internationale des Étudiants. O Conselho, formado de associações estudantis do país, dava direito a dois votos a cada uma das entidades participantes.

PRIMEIROS ANOS DA UNE

A primeira sessão do Conselho Nacional dos Estudantes teve lugar no então Distrito Federal, mas no dia seguinte o Conselho se reunia novamente para deliberar sobre os seus estatutos e regimento. Das várias deliberações, de grande importância era a que proibia, nas reuniões, referências às ideologias político-partidárias e religiosas. Os objetivos da nova entidade seriam tão somente o ensino e os próprios estudantes.

Fizeram o primeiro estatuto da UNE os acadêmicos Luiz Dias Ferreira, de São Paulo; Álvarez da Cruz, do Estado do Rio; Henrique Bonança, do Paraná; Augusto Mascarenhas, da Bahia e Valter Sá Cavalcanti, do Ceará. A primeira assembléia teve grandes méritos, entre eles a fundação de uma entidade nacional e a congregação de estudantes brasileiros para debates de seus problemas. A primeira diretoria do Conselho Nacional de Estudantes (ou UNE) era encabeçada pelo acadêmico José Raimundo Soares. Neste período o CNE tomou parte na “Semana da Siderurgia”, promovendo debates e conferências e na “Campanha de Nacionalização do Ensino”, em colaboração com o Exército, visando levar a língua e os hábitos brasileiros aos núcleos alemães, italianos e japoneses.

Após um ano de funcionamento o CNE, em 1938, preparou-se com a CEB e vários diretórios acadêmicos para a realização do II Congresso Nacional dos Estudantes, sob a presidência de Clotilde Cavalcanti. Este Congresso é tido como segundo e não primeiro porque em 1909 houvera um I Congresso Nacional dos Estudantes realizado em São Paulo.

O temário do II Congresso era estritamente de interesse estudantil. Dos vários assuntos tratados pode-se citar alguns de real competência estudantil: Orientação Universitária, Difusão da Cultura, Estágios Remunerados, Cidade Universitária, Ensino Rural, Assistência Médica e Judiciária ao Estudante, Colônias de Férias, A Mulher estudante frente ao problema do lar, Esportes universitários como intercâmbio estudantil, etc.

Funcionando no Estado Novo, o Conselho Nacional dos Estudantes sentiu o problema político, dele não se omitindo e, por isso mesmo, lutando pelos problemas específicos dos estudantes, reafirmou a esperança em um futuro tranqüilo. É da Circular do II Congresso o trecho que segue: “Numa época de perturbações e incertezas, de esperanças e desilusões, a mocidade das escolas tem o dever e a necessidade de se conhecer, para junta poder melhor trabalhar, orientando a sua ação num sentido comum. Seremos, sem dúvida, felizes, nos reunindo isentos de quaisquer ressentimentos pessoais ou de grupos, desejosos, unicamente, de discutir, dentro da mais estreita camaradagem, os nossos problemas e as nossas necessidades”.

Este II Congresso Nacional dos Estudantes marcado para o período de 12 a 27 de outubro foi transferido, posteriormente, para o de 1 a 15 de novembro, sendo, finalmente, realizado entre 9 e 21 dezembro de 1938, no Teatro Municipal, com a presença de professores universitários e estudantes, sendo, inegavelmente, um dos mais proveitosos dos que até hoje se tem notícia, conforme comenta Raymundo Nonato.

No dia 20 de dezembro o II Congresso recebeu a tese “União Nacional dos Estudantes”, de Antônio Franca, tese em que o autor estabeleceu a autonomia da UNE. Paira, segundo Raymundo Nonato, uma dúvida quanto à data de fundação da UNE. Seria a 11 de agosto de 1937, por iniciativa da Casa do Estudante do Brasil ou a 22 de dezembro de 1938, no Congresso em que Antônio Franca apresentou a tese título da entidade máxima dos estudantes? É difícil responder a esta pergunta, mas o artigo I do estatuto da UNE considera que sua fundação tenha se dado em 1937.

No II Congresso nova diretoria foi eleita, tendo como presidente Waldir Borges. Em fins de 1938, após o Congresso, a UNE surgiu como “órgão máximo de representação dos estudantes brasileiros”, enquanto que no ano anterior a UNE era apenas um subtítulo do Conselho Nacional dos Estudantes. A diretoria do período 1938-1939 criou vários departamentos novos, inclusive o de cultura, que esteve a cargo do conhecido e admirado homem de arte Paschoal Carlos Magno.

FIM DE UMA FASE

Trajano Pupo foi o presidente da UNE, eleito em dezembro de 1939, no III Congresso Nacional dos Estudantes. Em sua gestão realizou-se a I Olimpíada Universitária Nacional e os esportes universitários se coordenaram em torno da Confederação Brasileira de Esportes Estudantis, também criação daquele período.

Os estudantes participaram das comemorações do 50º aniversário da República, promovendo dois concursos, um de oratória e outro de peças teatrais. Neste último foram vencedores, entre outros, Mário Brasini com a peça “Estudantes” e Alfredo Dias Gomes com a “Comédia dos Moralistas”. Brasini mais tarde dirigiu o setor de teatro da UNE.

Em 1939, ainda, a UNE se viu diante de sério problema. A Casa do Estudante do Brasil, acusando-a de estar desvirtuando as suas finalidades, dela se desligou no dia 22 de abril de 1940. Cada entidade, então, passou a ter os seus objetivos. Em julho, o IV Congresso Nacional dos Estudantes introduziu emendas estatutárias passando a UNE a ser um “órgão de representação dos corpos discentes de institutos de ensino superior do país” — o que mudou o espírito inicial da entidade. Criou-se um Conselho Consultivo, formado de antigos presidentes da UNE, que supriria a falta da Casa do Estudante do Brasil, de muita valia devido à sua experiência.

A primeira fase da UNE termina em 1940. O autor do folheto que serviu de consulta a este trabalho, em 1954 tecia o seguinte comentário: “Volte-se a 17 anos e veja-se que os problemas especificamente universitários são os mesmos da atualidade e continuam insolúveis...” Afirmava Raymundo Nonato que fatores negativos impediam a marcha normal da entidade. Dificuldades de toda a ordem e a absoluta falta de recursos acarretavam corridas para as verbas oficiais e prejudicavam as iniciativas estudantis.

Esta foi a União Nacional dos Estudantes até 1940, que, conforme o relato de Raymundo Nonato Rodrigues Vilella, há quase dez anos, carecia de recursos financeiros. A UNE, porém, de tempos para cá, mudou. Hoje ela é poderosa para receber muito dinheiro e não prestar contas, transformando-se num órgão político-social, conforme apregoam seus líderes, e não num órgão estudantil, que atenda às necessidades da classe e possibilite o seu desenvolvimento.

b) A UNE frente à Ditadura e à Guerra

A UNE, fundada na Ditadura, funcionava como sala do Ministério da Educação. As atividades estudantis no campo político, praticamente não existiam, pois a entidade procurava se acomodar ao Governo na esperança de conseguir dele as suas reivindicações. Quanto aos elementos que compunham as diretorias da UNE, no período da Ditadura, discutível foi a sua atuação. Para muitos eles teriam sido omissos face ao regime que esmagava as liberdades individuais. Mas, para outros, se aquelas diretorias não tivessem agido assim, fatalmente a UNE não sobreviveria.

Entre os anos de 1940 e 1942, a UNE empreendeu campanha no sentido de mobilizar a opinião pública e o Governo para a participação do Brasil na guerra contra o nazi-fascismo. Em 1942, pela primeira vez, os estudantes promoveram uma passeata contra os ditadores do Eixo. A passeata, como não poderia deixar de ser, foi tutelada pela Ditadura, que sempre se reservava quanto ao seu real pensamento, ainda mais naquela fase em que o nazismo fascinava governo e intelectuais brasileiros.

As atividades da UNE, nesta fase, com exceção de suas campanhas pró participação do Brasil na guerra, foram bastante limitadas. Registra-se, contudo, a organização de diretórios acadêmicos nas faculdades, produtos de centros culturais. Um exemplo é a criação do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO), da Faculdade Nacional de Direito que, existindo como agremiação literária e jurídica, por eleição, passou a ter as funções de diretório, órgão representativo do corpo discente da Faculdade.

O Brasil entrou na Guerra, em 1942, se definindo, finalmente, pelos aliados. A Rússia, também aliada, lutava pelos mesmos ideais do nosso país, o que repercutia, como não poderia ser de outra forma, na política brasileira e entre os estudantes. Democratas e comunistas, portanto, marchavam juntos nas mesmas campanhas, principalmente nas que iam contra a Ditadura, cujos primeiros movimentos começaram a aparecer entre 1943 e 1944. Era a época de defesa das democracias contra os ditadores do Eixo. No estudante estava o sangue novo, a revolta natural contra as arbitrariedades do regime.

No terreno estudantil, propriamente, continuava a fase de organização dos diretórios acadêmicos, agora com a reivindicação da participação discente nos colegiados universitários. Criou-se, então, o Diretório Central dos Estudantes da Universidade do Brasil, reconhecido como órgão de representação estudantil nos conselhos universitários. Deste período, também, foi a criação da União Metropolitana dos Estudantes que passou a representar os universitários cariocas, a exemplo das entidades estaduais.

Com a vitória dos democratas em 1945, a Ditadura começou a ser desprestigiada. Era inconcebível que o Brasil, participando de uma guerra contra ditadura, mantivesse uma em seu solo. Iniciaram-se as conspirações para a redemocratização do Brasil, nas quais os estudantes desempenharam papel de destaque. Grandes partidos políticos se formaram ou se reorganizaram após quinze anos de silêncio. Assim, por exemplo, a União Democrática Nacional e o Partido Socialista Brasileiro tiveram suas primeiras sessões no salão da União Nacional dos Estudantes, muito bem instalada na Praia do Flamengo no prédio do ex-“Clube Germânia”, desapropriado dos alemães em 1944, por motivo da guerra.

A questão ideológica, em termos de comunismo e democracia não era cogitada. O que interessava era a queda da Ditadura. Neste ideal todos se entendiam e lutavam. Já em 1943, os estudantes reunidos no VIII Congresso Nacional dos Estudantes, patrocinado pela UNE, se haviam manifestado publicamente contra o Estado Novo. Após sérias medidas, o silêncio voltou a imperar entre os estudantes até fins de 1944 quando, cautelosamente, começaram a surgir grupos de reação, culminando com movimentos gerais, em 1945.

Mas, de fato, a primeira luta ideológica estudantil, embora não apresentasse as características de quase guerra, como se verifica hoje, aconteceu, em 1944, no VIII Congresso Nacional dos Estudantes, onde comunistas e democratas disputaram as eleições, cabendo a vitória a estes. De 1944 até 1947 os estudantes democratas dominaram a UNE passando a perder terreno no ano seguinte.

O relato apresentado deve-se à entrevista concedida pelo Dr. Venâncio Igrejas, Ministro do Tribunal de Contas do Estado da Guanabara, um dos fundadores da UDN e Secretário Geral da UNE entre os anos de 1945 e 1947. Afirma o Ministro Venâncio Igrejas que a política não era fator de desunião da classe estudantil: “Nós discutíamos muito sobre os acontecimentos nacionais e internacionais, mas ao sairmos da UNE ou de nossas faculdades íamos para as célebres ”chopadas” no Lamas ou no Bar Recreio, muito em moda naquela época. Havia um espírito universitário, coisa que hoje, creio, está desaparecendo. Por mais divergentes que fossem as nossas idéias políticas, não desrespeitávamos um colega por causa disso. Fazíamos política, e até intensamente, fora das escolas, nos partidos que se formavam. Não havia o político estudante e sim o estudante político. Enfim, cumpríamos as nossas obrigações escolares, não levando para dentro das faculdades as questões que pudessem tumultuar a vida estudantil. Os colegas se respeitavam e o ambiente universitário era de cordialidade”.

A partir de 1945 a UNE voltou às suas atividades normais, uma vez que a campanha de redemocratização lograra êxito. A participação da UNE na política passou a ser moderada e nenhuma intervenção policial se fez necessária em seus movimentos.

Grandes conquistas para os estudantes obteve s UNE no período de 1940 a 1945: a formação de grupos de teatro (Sérgio Cardoso foi um dos que fizeram teatro na UNE), a fundação do Ballet da Juventude e a criação de restaurantes estudantis, além da formação dos vários diretórios de faculdades e do DCE da Universidade do Brasil.


III - 1949, ANO DE DEFINIÇÃO DA UNE

A UNE começa a se definir em 1949. Até então ela seguiu a política da boa vontade, acompanhando o contexto universal, uma vez que a Rússia, unida aos aliados, dera uma trégua à sua doutrinação. Os comunistas marchavam juntos com os democratas nas grandes questões nacionais e internacionais. A luta ideológica, portanto, não existia.

Mas, com o fechamento do Partido Comunista, em 1947, uma de suas células se formava na entidade estudantil. A preparação ideológica, feita habilmente durante os anos de 1947 e 1948, apresentou seus primeiros frutos em 1949, ano em que a UNE foi interditada duas vezes, devido aos sérios tumultos por ela praticados, agitando a vida da cidade.

INTERDIÇÃO DA UNE

O Presidente da UNE, no ano de 1948, era o atual professor Roberto Gusmão, hoje declaradamente de esquerda, e o Vice-Presidente, o atual Procurador do Estado de São Paulo, Dr. Rui Pinho, de linha moderada e pertencente à Juventude Universitária Católica. A JUC, sentindo as tentativas de agitação por parte e vários estudantes filiados à UNE, colocava seus elementos como integrantes nas chapas que concorriam às eleições da entidade. Assim, Rui Pinho, naquele ano, lançou, na chapa encabeçada por Genival Barbosa, o estudante Célio Borja, hoje professor da Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara.

O Prof. Célio Borja relata o primeiro caso ocorrido na UNE, num período em que ele exercia a função de presidente, por ausência de Genival Barbosa. Em princípios de 1949 um estudante foi atropelado na Praia do Flamengo, em frente ao prédio da UNE. Elementos da entidade, em represália, bloquearam a alameda por onde trafegavam os bondes. A Polícia dirigiu-se ao local tentando desfazer as barricadas enquanto os estudantes apedrejavam os carros que passavam.

Célio Borja manteve contatos com o Chefe de Polícia, Gen. Lima Câmara, que parecia já estar prevenido em relação às manobras da UNE, dele conseguindo uma palestra com os estudantes e a promessa de não fechar a sede. A UNE ficou, apenas, interditada por algumas horas, passando a ser severamente vigiada pelo Governo.

CONGRESSO CRIA CONFLITO

Em março de 1949 outro caso, cujas origens são meio confusas, motivou nova interdição na UNE. Ao que parece, devido a fatos posteriores, teriam sido atritos entre estudantes pró e contra a realização de congressos estudantis, trazendo os títulos típicos das realizações comunistas (paz, amor, amizade, liberdade, etc), causadores da grande manifestação estudantil de graves conseqüências. Célio Borja chamou os lideres tidos como comunistas ou socialistas, pediu-lhes que cessassem a agitação e voltassem a considerar a UNE como um órgão de representação estudantil e não de pregação política. Não sendo atendido em sua solicitação, Célio Borja demitiu-se do cargo de vice-presidente, alegando “não poder permanecer num posto que comprometia a sua reputação de universitário”.

A história, segundo várias publicações e documentos, é a seguinte: em princípios de abril daquele ano, elementos conhecidamente comunistas da “Mocidade Pró Paz e Cultura” invadiram o Conselho da UNE impedindo a votação, tida como certa, de diversas moções de repulsa às manobras vermelhas. Entre as moções figurava a do presidente da União Metropolitana dos Estudantes, Zilmar Madeira de Matos, que protestava contra a condenação do Cardeal da Hungria e dos pastores búlgaros. Os agitadores atuantes na sessão eram os mesmos que antes haviam agitado a UME, entidade contrária à submissão da UNE aos esquerdistas.

Os agitadores chegaram às agressões físicas a fim de obterem, pela coação e violência, a realização do “Congresso em Defesa da Paz e Fraternidade”, ao qual a maioria se opunha por considerá-lo extremista. Genival Barbosa, presidente da UNE, passou a ser acusado de inconseqüente por não ter oferecido garantias suficientes aos estudantes e por ter dado livre acesso aos desordeiros, permitindo-lhes, inclusive, a interferência nos órgãos deliberativos da entidade estudantil. Genival, vendo a situação por ele mesmo criada, proibiu a realização do congresso, que se efetuaria no dia 9 de abril, enviando uma nota ao Ministro da Educação para que este não desse, também, a sua permissão.

Mas, mesmo com esta atitude, os estudantes exigiram a renúncia coletiva da diretoria da UNE, sendo, porém, exonerado, apenas, Genival Barbosa. Vários incidentes se registraram entre estudantes, jornalistas e pessoas diversas. Muitos foram os presos. A UNE, desta vez, foi interditada. Quanto ao Congresso pela Paz, seus objetivos se confirmaram. Os congressistas, detidos no Edifício Darke de Matos, onde pretendiam realizá-lo, traziam vasto material de propaganda subversiva, apreendido pela Polícia.

LUTAS ENTRE ESTUDANTES

Enquanto a UNE ia se revelando com esses fatos, na Bahia o acadêmio Evaldo Solano Martins, presidente da União dos Estudantes da Bahia, declarando-se “reformista de Marx”, emitia nota oficial em prol dos trabalhos “pela Paz e Fraternidade”, acusando a grupos ambiciosos de terem impedido a realização do importante conclave que “ajudaria a elucidação dos graves problemas econômicos do país”. Lamentava ainda a falta de firmeza de Genival Barbosa, culpando-o pela não realização do congresso.

A 22 de maio de 1949 surgiu um grupo que teve pouca duração, mas que serviu de reação contra a política da UNE. Era a Coligação Acadêmica Democrática (CAD). Viajando por todo o Brasil, seus dirigentes fundaram associações de estudantes, podendo os mesmos pertencer a qualquer partido, menos aos extremistas. Assim, São Paulo, Rio Grande do Norte, Bahia, Pará, Paraná, Distrito Federal, Pernambuco e Rio Grande do Sul criaram as suas CADs visando “reabilitar a dignidade da UNE, obstruindo a ação agitadora dos estudantes”. O jornal “O Momento”, órgão oficial do PC na Bahia, passou a combater a CAD, afirmando ser a mesma uma organização fascista, formada pelos integralistas do PRP, cuja pretensão era a de assaltar a direção da UNE “no próximo Congresso Nacional dos Estudantes, o décimo segundo, que se realizaria na Bahia”.

O XII Congresso Nacional dos Estudantes, da UNE, realizou-se, em 1949, na Bahia. Nele tomou posse nova diretoria encabeçada por José Frejat. No local da reunião os estudantes não conseguiram que a bandeira brasileira fosse hasteada. Vasculharam a sede da União dos Estudantes da Bahia e só encontraram uma bandeira russa guardada num armário. Os democratas foram acusados de “ministeriais” por não haverem permitido o “Congresso da Paz e da Fraternidade”. Após pressões e tumultos os esquerdistas venceram as eleições e enviaram um telegrama ao Ministro da Educação nestes termos: “Temos grata satisfação comunicar V. Excia. foi mais uma vez derrotado. Desculpe o mau jeito”.

Neste Congresso os comunistas, aproveitando os debates sobre Reforma de Ensino, esquematizaram uma nos termos pregados pela UNE de hoje. Os estudantes, liderantes dos debates, criticaram o Projeto Mariani, de Diretrizes e Bases da Educação, por ser “antidemocrático”.

AGENTES COMUNISTAS PRESOS

Em 1950 houve problemas entre estudantes e Polícia. Em abril daquele ano dois estudantes foram presos quando tentavam cometer atos de vandalismo frente à Chancelaria da Espanha. Vários populares assistiram as manobras. Os estudantes, identificados na Divisão de Polícia Política e Social, eram Mayer Camenietzky, acadêmico de medicina preso anteriormente, em janeiro de 1949, quando incendiava um bonde em frente à UNE, e Hélio Block, estudante de arquitetura.

Novo caso foi denunciado e comprovado em julho de 1950. O navio “Pulasky” chegava ao Rio, em maio, trazendo o estudante Fernando Jorge Pedreira, bolsista de nosso Governo na Europa. Pedreira trazia livros editados na Rússia e Tcheco-Eslováquia, em língua espanhola, além de discos, filmes e bilhetes endereçados a Luiz Carlos Prestes. O DOPS apurou o caso e prendeu o estudante. O fato motivou uma série de pesquisas cujos resultados foram amplamente divulgados pela imprensa.


 

IV - UNE VOLTA A SER NOTÍCIA EM 1956

De 1949 a 1951, além dos fatos já narrados, outros de menor importância, sem maiores conseqüências, tumultuaram alguns setores estudantis. Em julho de 1952, no XV Congresso Nacional dos Estudantes, por proposta de Antônio Faustino Porto Sobrinho, líder da Bancada do Distrito Federal e representante do Centro Acadêmico Cândido de Oliveira, da Faculdade Nacional de Direito, a UNE se desligou da União Internacional dos Estudantes, a entidade comunista supervisora das Uniões de Estudantes dos países subdesenvolvidos. Porto Sobrinho, de forte atuação no meio universitário, conseguia neutralizar as investidas esquerdistas e nos dois anos que se seguiram ao seu desligamento da UIE, a UNE ficou meio desarticulada, agindo clandestinamente. Aliás, entre 1952 e 1955, politicamente, a UNE se manteve tranqüila, explorando, apenas, a campanha do petróleo, que, sem entrarmos no mérito da questão, tornou-se bandeira dos comunistas, sempre demagogos no aproveitamento de teses provocadoras da exaltação do patriotismo.

O XVII Congresso Nacional dos Estudantes, realizado na Universidade Rural, em 1954, deu a vitória aos democratas. Os trabalhos daquele Congresso foram feitos pelo sistema de mesas redondas, isto é, por comissões, sistema que impedia a atuação dos agitadores nas assembléias. Alguns elementos da UNE, contudo, procuraram “conversar” os menos esclarecidos, na intenção de fazer com que as forças democráticas se fraccionassem e uma terceira chapa foi apresentada para enfraquecer a chapa democrática. Mas, logo repudiada, o pleito ficou entre as duas chapas, uma democrática e a outra de esquerda. Fracassando em seus planos, os comunistas mudaram de tática, passando a adotar uma atitude cordial para com os democratas, “esquecendo” mágoas passadas. Os comunistas foram ao Congresso com três intenções: 1) anarquisar totalmente o Governo (o que não foi difícil, pois o governo estava totalmente desmoralizado); 2) retomar a UNE (haviam-na perdido havia dois anos); e 3) reatar as relação da UNE com a UIE (coisa que não conseguiram). No Congresso venceu a chapa democrática encabeçada por Cunha Netto.

O XVIII Congresso Nacional dos Estudantes, realizado no ano seguinte, em 1955, elegeu Carlos Veloso para presidente da UNE. Este teve um grande mérito para os comunistas: promoveu uma greve geral de estudantes, culminando em atritos entre estes e a Polícia. O XVIII Congresso teve lugar em Belém do Pará e contou com a presença de autoridades e estudantes locais. O representante piauiense pronunciou um discurso atacando o Presidente da UNE, Cunha Netto que, eleito pelos democratas, conduzia os estudantes através de “slogans” típicos dos comunistas.

GREVE ESTUDANTIL DE 1956

Em maio de 1956, a UNE, pelo seu Presidente Carlos Veloso, deflagrou uma greve geral em protesto ao aumento das passagens de bonde. O movimento, de início pacífico, transformou-se numa baderna, deixando, em conseqüência, muitos feridos e bondes depredados.

As primeira, segunda e última páginas do jornal “Última Hora”, do dia 31 de maio de 1956, estão totalmente ocupadas com relatos e fotografias do movimento estudantil. O mesmo, que começara pacificamente, transformara-se numa verdadeira rebelião, que preocupava as autoridades, principalmente o então Presidente Juscelino Kubitschek de Oliveira que, alarmado com a situação, declarou à “Última Hora” que “o Rio não se transformaria numa nova Bogotá” (pouco antes houvera um tumulto estudantil de caráter comunista naquela cidade).

O mesmo jornal publicou uma entrevista do Coronel Luna Pedrosa, então Diretor de Polícia Política e Social, denunciando a participação de elementos comunistas nos tumultos estudantis registrados no dia 30 de maio.

Na UNE estava instalado o QG do movimento e um choque da Polícia mantinha prontidão em frente ao prédio. Os estudantes, não desejando a Polícia no local, se rebelaram, obrigando os policiais a detonarem suas armas e a lançarem gás lacrimogênio. Em protesto à ação policial foi decretada uma greve universitária nacional. Todas as faculdades, em assembléias (do tipo que descrevemos) resolveram se solidarizar com a UNE (com o termo “solidariedade” o pessoal comunista da UNE sempre consegue tocar o coração dos estudantes). Nos discursos da UNE os estudantes exigiam a demissão do então Prefeito Negrão de Lima, do Ministro da Justiça e, ainda, a extinção da Polícia Especial, como condições para a suspensão da greve. É lógico que nada disso aconteceu e a UNE teve que ordenar a “operação retorno às aulas”.

Ainda como matéria de responsabilidade do jornal, “Última Hora” comentava: “Como não poderia deixar de ocorrer — e “Última Hora” desde ontem noticiou — o movimento estudantil iniciado sob os mais nobres propósitos, foi desde logo infiltrado por agitadores comunistas.”

Enquanto a UNE ditava as instruções às entidades estudantis do país, José Batista de Oliveira Júnior, presidente da União Metropolitana dos Estudantes, supervisionava os diretórios grevistas do então Distrito Federal. O jornal “Tribuna da Imprensa”, de 4 de maio de 1956, fazia um histórico fotográfico da greve, noticiando que nem mesmo os possuidores de imunidades parlamentares escaparam do tumulto, pois os deputados Mário Martins e Aurélio Viana e os vereadores Wilson Leite Passos e Hélio Walkacer sofreram contusões no conflito entre estudantes e policiais. Cumpria-se assim, a finalidade de tais movimentos liderados por comunistas: cometer toda a série de ilegalidades e desrespeitos, subvertendo a ordem, para obrigar a intervenção da Polícia, o que transforma os agitadores em vítimas.

ESTUDANTES PRESOS E NOVA DIRETORIA

Quase toda a imprensa carioca publicou na primeira quinzena de junho de 1956 a prisão, em São Paulo, dos indivíduos Sedhaugahn Chauduri e Hugo Herdozia (ou Heloísa) Herrera, tcheco-eslovaco e equatoriano, respectivamente, denunciados pela Frente da Juventude Democrática como agitadores dos meios estudantis brasileiros. De fato, antes da greve, a ação dos dois era sentida nos meios universitários do Rio e de São Paulo. A União Internacional dos Estudantes os enviara ao Brasil, apesar de a UNE ainda estar dela desligada, como seus agentes. Os “estudantes” mantinham contatos com os dirigentes da UNE, da UME, da UBES (União Brasileira dos Estudantes Secundários) e diretórios acadêmicos de faculdades, onde escolhiam elementos “progressistas” para representarem o Brasil nos congressos estudantis dos países da cortina de ferro.

Os comunistas internacionais, presos pela Polícia paulista, afirmaram que estavam no Brasil “para estreitar os laços de amizade entre os estudantes”. A Polícia, porém, descobriu em suas bagagens vasto material subversivo e documentos que aludiam a um tal de “Carrasco”, elemento que deveria se encontrar com eles na América Latina. Os “estudantes”, sem outra saída, manifestaram desejo de voltar imediatamente à Tcheco-Eslováquia. O Governo Brasileiro expulsou-os do país, embarcando-os rumo ao Uruguai.

Em julho de 1956, José Batista de Oliveira Júnior, o presidente da UME que participara do comando da greve contra o aumento das passagens de bondes, foi eleito presidente da UNE no XIX Congresso Nacional dos Estudantes. José Batista fazia “oposição” à chapa de Carlos Veloso, presidente da entidade e candidato à reeleição. É interessante notar a oposição do presidente da UME que sempre compactuara com a UNE, em todos os seus atos, e surpreendente a adesão dos estudantes democratas à sua candidatura. Ambos, Batista e Veloso, eram idênticos. Ambos haviam liderado os tumultos registrados em maio de 1956. Ambos fizeram um pacto, iludindo os estudantes, com a finalidade de fazer com que a UNE continuasse em sua linha subversiva.

Em setembro daquele ano, na presidência de José Batista, houve uma cisão na diretoria da UNE. O jornal “O Globo”, do dia 20, publicava denúncia dos acadêmicos Carlos Noel, Francisco Ney e Warren Carvalho Lima contra José Batista, acusando-o de enviar delegados a congressos internacionais pelo critério “progressista” da esquerda.


 

V - A UNE SE DECLARA FUNDAMENTALMENTE POLÍTICA

A partir de 1959, após a experiência do curso Pré-Vestibular, no ano anterior, na Faculdade Nacional de Filosofia, caso que relataremos mais adiante, passamos a sentir o problema que a UNE representa para o país. E, justamente, a partir desta data a UNE parece se sentir mais forte, não escondendo mais o seu jogo.

As atividades facciosas da entidade podem set comprovadas pelos seus próprios documentos. Os relatórios de diretoria apresentam páginas e páginas dedicadas às atividades políticas nacionais e internacionais, enquanto que umas poucas abordam problemas educacionais e, assim mesmo, greves ou reformas de ensino em moldes soviéticos.

Todas as citações entre aspas referentes às gestões de presidentes da UNE, são textuais dos Relatórios de Diretoria, documentos que podem ser solicitados à União Nacional dos Estudantes.

GESTÃO EIRADO:

(Julho de 58 a julho de 59)

No período compreendido entre julho de 1958 e julho de 1959, a UNE teve como Presidente o acadêmico Raimundo Eirado, eleito no XXI Congresso Nacional dos Estudantes, realizado em Bauru. Em junho de 1959 registrou-se uma greve universitária de âmbito nacional, motivada pela Faculdade de Ciências Médicas da então Universidade do Rio de Janeiro. A UNE decretou a greve no período das primeiras provas parciais, apelando para a solidariedade dos estudantes aos colegas de medicina, vítimas das arbitrariedades do Diretor Cumplido Santana.

Inicialmente a greve reivindicava a demissão do Diretor da Faculdade de Ciências Médicas, passando, logo depois, a ter como bandeira a “encampação da Faculdade”. Várias manifestações foram feitas pelos estudantes nas escadarias da antiga Câmara dos Vereadores. A greve, que deveria acabar em um dia, acabou em princípios de agosto e serviu, apenas, para retardar a realização das primeiras provas parciais, permanecendo, porém, o Diretor Cumplido Santana em seu posto na Faculdade de Ciências Médicas.

Na gestão Eirado aconteceram coisas interessantes. Seguindo o Relatório da Diretoria da UNE, referente ao período 1958-1959, vamos às suas atividades. Frisamos que as frases entre aspas são textuais.

Eirado se queixava da falta de verba oficial para a UNE e dizia que deveria agir politicamente, embora “aos colegas menos avisados, sempre poderá haver um perigoso desequilíbrio entre as atividades políticas e administrativas de nossa entidade”. E mais adiante: “... a União Nacional dos Estudantes é fundamentalmente uma entidade de representação política da classe universitária”, só podendo arcar com as responsabilidades administrativas quando obtivesse autonomia financeira.

A UNE, acompanhando a transformação estrutural brasileira, constituiu um grupo de trabalhos para lutar pelo “nacionalismo”, esclarecendo ao “povo” e aos “trabalhadores” sobre os “problemas nacionais”. A entidade se manteve contra o “entreguismo do petróleo”, “pois o Brasil queria adotar a fórmula Frondizi, que capitulara ante a pressão estrangeira”. Foster Dulles, Secretário de Estado Americano, em visita ao Brasil, “por causa do petróleo”, foi recebido hostilmente pela UNE, em nome dos estudantes, porque tal manifestação representava “antes de tudo uma menção à política de opressão do Departamento de Estado contra os países latino-americanos do que a tentativa de julgamento daquele titular. E vangloriava-se a UNE de prestar uma valorosa contribuição aos “trabalhadores” e ao “povo” em geral, em relação ao “perigo que representa a pressão exercida, em nosso país, pelo Departamento de Estado”.

Em fins de 1958 os pelegos estudantis andaram pelas faculdades arregimentando alunos para uma passeata e posterior depredação ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico, cujo Presidente, Roberto Campos, se “revelava entreguista”. Os elementos da UNE, contudo, sempre se notabilizaram pela incoerência: enquanto combatiam o “entreguismo” de Roberto Campos enalteciam o Governo de Juscelino Kubitschek, como se este nada tivesse a ver com o “entreguismo” tão explorado nas campanhas estudantis. Seguindo, ainda, o Relatório da UNE, ficamos sabendo que a entidade pseudo estudantil fez o então Ministro da Guerra, Marechal Teixeira Lott, declarar, pela imprensa, ser a Petrobrás intocável.

“PRESSÃO” DA UNE SOBRE O ISEB

A estreita relação entre a UNE e o ISEB será motivo de um dos próximos capítulos. Agora, baseando-nos no mesmo Relatório da Diretoria da gestão Eirado, contemos a atuação da entidade no caso Hélio Jaguaribe, então professor do ISEB.

O Instituto Superior de Estudos Brasileiros é “um órgão empenhado, desde à sua criação, na compreensão crítica da realidade nacional, escopo fundamental à orientação dos quadros diretivos do país”. Por isso o ISEB é merecedor de toda a atenção da UNE, que “mantém estreitas relações com o ISEB, fazendo-se representar em suas conferências e cursos”. Dada essa afinidade, a UNE se ofendeu profundamente quando Hélio Jaguaribe publicou o livro: O Nacionalismo na Atualidade Brasileira, por ela considerado “eminentemente entreguista”. A entidade pseudo-estudantil “exigir dos professores do ISEB uma tomada de posição em face da abrupta mudança ideológica”. O livro, no entender da UNE — e confessamos que não o lemos — era “eminentemente entreguista” por admitir a participação do capital estrangeiro na Petrobrás. Uma comissão de estudos analisou a obra e suas conclusões foram impressas e distribuídas (com que dinheiro?) nas faculdades (para “esclarecimento dos alunos”), na Confederação Nacional dos Trabalhadores da Indústria (entidade dominada pelos comunistas) e aos integrantes da Frente Parlamentar Nacionalista.

Ao mesmo tempo, o amigo fiel da UNE e Presidente do ISEB, Roland Corbisier, era interpelado a respeito do livro. Tornava-se necessário saber se a obra representava a opinião do ISEB. Corbisier respondeu aos estudantes que a entidade por ele dirigida não se responsabilizava pelas publicações assinadas pelo autor, mas que a Congregação iria se reunir para examinar o antinacionalismo do livro.

O Prof. Vieira Pinto, cuja personalidade e ação serão focalizadas mais adiante, na qualidade de Chefe do Departamento de Filosofia do ISEB, recebeu uma carta de interpelação da UNE, tomando-lhe satisfações. Entre outras coisas Vieira Pinto respondeu aos seus atuais discípulos: “... o movimento de protesto a mim dirigido em torno do referido livro é um confortador indício de maturidade da consciência universitária”. Receberam, também, cartas, que foram respondidas com a maior simpatia, os demais integrantes do ISEB: Guerreiro Ramos, Cândido Mendes de Almeida, Ignacio Mourão Rangel e Nelson Werneck Sodré, todos felizes com a “consciência patriótica” da UNE. Um dos membros do ISEB chegou a declarar que os estudantes eram “os únicos aptos a compreenderem a realidade nacional”. Diante de tal bajulação, é evidente que estudantes medíocres se sintam donos da situação.

A coisa poderia ter parado aí, pois a movimentação da UNE foi intensa e o Sr. Hélio Jaguaribe vendeu muitos livros. Mas, também, os parlamentares foram interpelados. O Sr. Sérgio Magalhães, candidato oficial da UNE, agora desbancado com o aparecimento de Brizola, enviou um ofício ao Ministro da Fazenda a fim de saber “quais as relações de Hélio Jaguaribe com o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico”. O resultado de toda esta luta “nacionalista” foi que a UNE retirou o seu precioso apoio ao ISEB, afirmando só voltar a dá-lo quando a instituição não mais mantivesse “tipos como o Sr. Jaguaribe em seus quadros”. Guerreiro Ramos retirou-se da “Sorbone Brasileira” com a dramática afirmação de para lá voltar “quando a instituição estivesse ideologicamente saneada”. O ISEB, imediatamente “se saneou ideologicamente” passando a ser, oficialmente, centro de estudos marxistas.

Ainda na gestão Eirado a UNE, pretensiosamente, tratou de outros temas distantes do imediato interesse estudantil, pelo que se vê em seu relatório. Entre estes temas destacam-se a denúncia do acordo Roboré, a reavaliação dos ativos, o caso Delgado, os comandos nacionalistas (em colaboração com o jornal “O Semanário”, órgão conhecidamente comunista), a encampação da CEERGS (Companhia de Energia Elétrica do Rio Grande do Sul, promovida pelo “nacionalista” Brizola), o rompimento do Governo com o Fundo Monetário Internacional, a reforma cambial, a estabilização da moeda, a liquidação da Petrobrás, além da campanha contra o Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico.

b) GESTÃO CONRADO

(julho de 1959 a julho de 1960)

Depois de Raimundo Eirado, a UNE, em 1959, passou para as mãos de João Manuel Conrado, acadêmico de São Paulo, apoiado pela direção anterior. Sobre Conrado temos um fato interessante, a respeito de um Congresso realizado em Caracas, em que a honestidade e a moral da esquerda dominante na UNE ficam patenteadas. Falaremos deste caso em outro capítulo, dedicado a alguns congressos internacionais, cujos elementos participantes são selecionados pela UNE, mediante o critério de “maturidade política”.

No XXII Congresso Nacional dos Estudantes que elegeu Conrado, a UNE praticou uma série de arbitrariedades, como, por exemplo, ter vedado o restaurante a Leopold Joseph Corbett, Presidente do Diretório Central dos Estudantes da Universidade Católica do Rio de Janeiro. Corbett cometera o crime de entregar aos congressistas uma carta de D. Jaime de Barros Câmara, pedindo aos católicos que não votassem pela refiliação da UNE à União Internacional dos Estudantes (a entidade comunista sediada em Praga, da qual a UNE se desligara, em 1962, por proposta de Porto Sobrinho).

Ricardo Érico Howling, representante da PUC, liderou o movimento de repulsa à refiliação, conseguindo arregimentar elementos democratas e católicos, inclusive parte da Diretoria da UNE que, com o incidente registrado com Corbett, resolveu acordar e fazer oposição. Embora a situação vencesse, a UNE não se refiliou à UIE, coisa que os comunistas conseguiram no ano seguinte.

Na apresentação do Relatório da Diretoria de Conrado, encontramos, de saída, o seguinte: “A UNE, além de ser uma entidade de reivindicação de maiores privilégios para os estudantes, deve ser um movimento, um órgão de manifestação do pensamento político do estudante brasileiro, frente aos magnos problemas que atingem o nosso país e o povo de nossa Terra”. Tal enunciado iniciou a apresentação da chapa situacionista, liderada por Conrado, no XXII Congresso Nacional dos Estudantes. “E foi com esse objetivo — esclarece o relatório — que dirigimos, principalmente, as atividades da diretoria que comparece novamente ao Congresso (XXIII), já agora prestando contas do passado no mais altamente honroso cargo que nos foi confiado”. E a UNE presta as suas contas.

DIRETRIZES E BASES

Entre as várias campanhas e “benefícios” prestados ao povo, a UNE dedicou-se à “defesa da escola pública”. Com a derrota, na Câmara dos Deputados, dos substitutivos Celso Brant e Carlos Lacerda, o problema de Diretrizes e Bases ficou abandonado e uma comissão de congressistas foi organizada para tratar do assunto. A UNE, também, “organizou a sua comissão de educação com o fito de estudar, em suas novas nuances, a questão”. Os elementos da comissão de educação da UNE debateram o problema com os deputados, “constituindo-se numa autêntica assessoria aos parlamentares que se colocaram na posição de defensores da escola pública (esses, aliás, em acentuada minoria na subcomissão privatista), e REPRESENTANDO O ÚNICO APOIO QUE OS DEFENSORES DA EDUCAÇÃO PARA O POVO encontraram na luta contra os advogados (bem assistidos) dos negocistas do ensino”.

Todos devem se lembrar que a UNE fez tudo para impedir a votação do Projeto de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, explorando-o, errada e demagogicamente, em campanha política, contra os democratas que se batiam a favor de uma legislação, há muito exigida, para a educação nacional. Os comunistas afirmavam que o Projeto, se transformado em Lei, eliminaria a escola pública e favoreceria a escola particular. Nada como o tempo para desmascarar certas campanhas. Hoje a UNE não combate a Lei e até a usa para movimentos subversivos, através de argumentos descabidos. Os próprios professores comunistas que se mantinham contrários ao Projeto, com o intuito evidente de entravá-lo e não possibilitarem uma expansão do ensino, são os que, no momento, mais falam dos benefícios da Lei para se agarrarem ao poder. Entre estes podemos citar o ex-Ministro da Educação, Darcy Ribeiro, que instigava os estudantes contra o Projeto e, depois, vendo-se no cargo de Ministro, fez o seguinte pronunciamento quando da instalação de um plano de educação em cumprimento à Lei de Diretrizes e Bases: “Estou perfeitamente capacitado da enorme importância histórica deste momento, que pode ser tido como o segundo momento da educação nacional em nosso tempo. O primeiro foi a promulgação por S. Excia., o Presidente da República, da Lei de Diretrizes e Bases da Educação, que devolveu aos educadores a possibilidade de errar e, com ela, de acertar, também... A situação nova é de plena autonomia e responsabilidade dos educadores, devolvendo-lhes aquilo que o médico e o engenheiro já tinham como profissionais, isto é, a responsabilidade para uma tarefa escolar, humana, filosófica e moral, pela qual eles devem responder, até mesmo de modo individual” (sic).

É claro que o Sr. Darcy Ribeiro não pensava em nada do que dizia e é mais claro ainda que, antes, quando líder mais velho dos estudantes da UNE, não queria que a Lei fosse posta em prática, justamente pelos resultados benéficos que dela adviriam.

O fato é que a UNE não desejava que a Lei entrasse em vigor e, à base de “slogans”, começou a espalhar, principalmente entre as moças estudantes de nossas escolas normais públicas, que o Projeto de Diretrizes e Bases iria acabar com a escola pública, tirando-lhes o emprego. Em união com as normalistas, a UNE se pôs a fazer passeatas em “defesa da escola pública”.

A comissão de educação da UNE propôs supressões e emendas de vários artigos do Projeto, coisa que não foi atendida. Imediatamente passou à ação. Elaborou um “longo trabalho sobre o panorama educacional brasileiro, no qual insistimos — diz o Relatório — na defesa do nosso ponto de vista quanto ao Projeto de Diretrizes e Bases”. Nesse documento que foi enviado a TODAS as entidades universitárias do país, a UNE conclamava os estudantes a “se levantarem em todo o território nacional, em defesa do ensino, exigindo a supressão, no Projeto, dos artigos condenados” pela entidade. O trabalho foi distribuído à imprensa, tendo sido publicado, na íntegra, pelo “O Semanário”.

As justificações e pensamentos dos dirigentes da UNE são de uma petulância a toda prova. Só encontramos imperativos e ameaças, inclusive, a afirmação: “... o movimento de defesa da escola pública ganhou tal incremento que nos sentimos hoje na situação de dizer que o crime contra o povo, em que se constituiria a aprovação do Projeto 2.222-C-1957, não será consumado”. A Lei promulgada em dezembro de 1961 entrou em vigor e o projeto, que sofreu muitas alterações, não se sovietizou, conforme desejavam os adeptos da UNE.

INTERCÂMBIO INTERNACIONAL

A convite da União Internacional dos Estudantes, a UNE participou, como observadora, do Comitê Executivo daquela entidade, com o objetivo de tomar conhecimento das normas para a sua refiliação ao organismo da qual se desligara em 1952. O Comitê reuniu-se em Tunis, e desta cidade a delegação brasileira viajou para a China, passando antes por Praga, onde participou de um seminário de reforma educacional. A UIE prometeu cobrir as despesas de viagem dos membros latino-americanos participantes do conclave.

Em Pequim a comitiva brasileira observou que a reforma educacional, verificada na China, em 1952, “teve o objetivo de eliminar o ensino burguês e imperialista, implantando o ensino nacional”. A Universidade de Pequim, por exemplo, era “ semifeudal, tendo por objetivo exclusivamente, formar intelectuais”. A reforma de 1949 criou escolas secundárias em todo o país “para obreiros e campesinos a fim de instrui-los nos movimentos revolucionários”.

Manoel Conrado integrou a comitiva do então Deputado Jânio Quadros, em sua viagem a Cuba, pois “após discutir o assunto, a UNE concluiu que pelo fato de haver na caravana pessoas contrárias à candidatura do referido deputado a Presidência da República, nenhuma vinculação de caráter político partidário poderia ferir a independência da entidade”. As causas da renúncia de Jânio Quadros, pelo visto, são antigas.

Em Havana, recebidos por Fidel Castro, ao qual levaram sua admiração, a comitiva e Conrado conversaram com o Arcebispo de Havana. O Relatório diz que o Arcebispo declarou estar satisfeito com o novo regime. Seguem-se, no Relatório, as inovações introduzidas, em Cuba, por Fidel Castro e Moscou.

OUTRAS ATIVIDADES

A carestia da vida, a reforma do ensino (em moldes pregados por Vieira Pinto), o capital estrangeiro e as relações internacionais, mereceram os estudos da UNE no mês de reivindicações nacionais. Deputados e educadores compareceram à sua sede, entre os quais os Srs. Temperani Pereira, Celso Brant, Aurélio Viana, Paschoal Lemme, Darcy Ribeiro, San Thiago Dantas e Anísio Teixeira.

A UNE “se uniu à população” no movimento a favor do General Ururay Magalhães, então Presidente da COFAP, “homem que resistia às investidas do Embaixador Americano”, não permitindo o aumento do preço da carne, assim se expressando: “No passado o Gen. Ururay merecera críticas acerbas. Hoje, merecia aplausos. Soubera resistir às pressões dos trustes. A grande imprensa, sim, é que se mostrava incoerente. Enquanto as patas de cavalo atropelavam os estudantes na rua, merecia aplauso quem os comandava. Agora, que a mesma pessoa punha a dignidade de sua farda e a responsabilidade de seu cargo a serviço do povo, era atacada. Paradoxos que somente as polpudas matérias pagas poderão explicar...”

Outros casos preocuparam a UNE: acordo Petrobrás-Esso Export (a UNE participou de debates numa das salas da Câmara dos Deputados), greve dos oficiais de náutica (“os grevistas se asilaram no recinto inviolável da UNE”); episódio de bombas na COFAP (culminando em campanha contra a nomeação, para diretor do órgão, do Coronel Danilo Nunes, ex-diretor do DOPS, tido como carrasco por estudantes subversivos) e visita de Eisenhower ao Brasil. Faixas ornamentaram a fachada da entidade estudantil com os dizeres: “We like Fidel Castro”.

Cuba não poderia deixar de ser enaltecida pelos seus liderados no Brasil. Várias manifestações de apoio às reformas cubanas se registraram. “Dentre todos estes atos — esclarece o relatório — cumpre salientar a recepção oferecida, em nossa sede, ao Sr. Dr. Oswaldo Dorticós Torrado, Presidente da República de Cuba, ocasião em que, perante uma verdadeira multidão que arrebatou todas as dependências do casarão da Praia do Flamengo, os presidentes da UNE e do Diretório Central dos Estudantes da Universidade do Brasil, fizeram chegar às mãos do visitante cartões de prata (notem os leitores o burguesismo) contendo a manifestação de apreço pelo que vem realizando a revolução. Na mesma oportunidade o DCE da UB entregou ao Presidente de Cuba o diploma de Estudante “Honoris Causa” da Universidade do Brasil”.

No terreno estudantil, além da campanha contra o Projeto de Diretrizes e Bases, temos três grandes movimentos de “idealismo” universitário: greve dos estudantes de Arquitetura da Bahia, greve dos estudantes de Arquitetura de Belo Horizonte e greve da Universidade da Bahia.

c) GESTÃO GUANAIS:

(julho de 1960-junho de 1961)

Em julho de 1960 foi eleito, no XXIII Congresso dos Estudantes, Oliveiros Guanais de Aguiar, representante da situação. Guanais era da Juventude Universitária Católica e, seguindo a linha desta juventude, jurava não ser comunista, mas agia sob as ordens do pessoal do PC. Naquele Congresso os católicos da Juventude Universitária Católica foram comprados, para votar em Guanais, por passagens a Cuba.

Em dezembro do mesmo ano, a UNE promoveu uma passeata em solidariedade a Fidel Castro. Atuaram no movimento estudantes que há muito serviam de ligação entre a UNE e o Governo de Cuba. Os cubanos, promotores da passeata foram: Francisco Domingues, encarregado de Negócios; Raul Aparício Nogales, Conselheiro Econômico da Embaixada de Cuba; Venâncio Merino, e José Prado Laballos, diretor da Agência Informativa Prensa Latina. Todos estes eram ligados ao Governo de Fidel, sendo que Merino se encarregava do levantamento de fundos.

Acompanhando o “Relatório da diretoria da UNE”, referente à gestão Guanais, encontramos uma série de informações sobre as suas atividades. O relatório fala da atuação do estudante junto aos operários e camponeses, com o intuito de fortalecer a liga estudante-operária-camponês. Assim a UNE “participou ativamente dos movimentos grevistas dos portuários, marítimos e ferroviários”, sendo que a sede da entidade serviu de abrigo ao comando da greve quando este se viu ameaçado pelo Ministro da Justiça. A mesma diretoria congratulou-se com a escolha de Álvaro Vieira Pinto (o mentor intelectual dos comunistas da UNE, e professor apontado no inquérito da Faculdade Nacional de Filosofia como responsável pela atuação perniciosa de um grupo) para diretor do ISEB, por motivo de vacância do cargo devido à eleição de Roland Corbisier para a Assembléia Legislativa.

As teses que preocuparam os “professores-estudantes” foram: Instrução 204 da SUMOC, Petrobrás, Greve pela paridade, Grupo HANNA Co. e a venda das ações da Petrobrás.

DITADURA, SÓ A RUSSA

No setor internacional a UNE se preocupou com a visita do Presidente Juscelino Kubitschek a Portugal, condenando a amizade luso-brasileira, porque Portugal mantém uma ditadura, não importando a situação do povo português, mas o Governo que “tem que ser repudiado pelo Presidente, não devendo este se identificar com Salazar”. Notem os leitores que, em Cuba, também há uma ditadura, mas deve ser respeitada porque “o povo se autodeterminou e quis o regime”. A ditadura portuguesa, porém, para a UNE é diferente, o povo não se “autodeterminou”.

A UNE definiu sua posição de simpatia e solidariedade à ditadura cubana. Eis alguns trechos do “Relatório da Diretoria”: a) Após o Congresso (refere-se ao XXIII Congresso Nacional dos Estudantes) a UNE dirigiu uma mensagem ao Primeiro Ministro da República de Cuba, Dr. Fidel Castro, subscrevendo com orgulho a Declaração de Havana e enviando seu abraço fraternal aos estudantes e ao povo; b) ... enviamos telegramas ao representante do Brasil na ONU, solicitando a defesa de Cuba, com base no princípio de autodeterminação e soberania dos povos; c) Compreendendo o sentido histórico da Revolução Cubana, que libertou o seu povo da escravidão econômica, da fome e da miséria, promovemos novas manifestações de solidariedade e novas denúncias das forças imperialistas tentadoras da volta ao triste passado de um povo já liberto; d) Certos de que o problema de Cuba não é só dos cubanos, mas de todos os povos subdesenvolvidos e espoliados que lutam pela sua emancipação, inclusive o povo brasileiro, fomos às ruas, protestar e advertir a opinião pública dos perigos que poderiam advir para nós e para os povos latino-americanos com a sufocação do Governo de Fidel Castro...

A UNE se empenhou em uma grande representação internacional, o Fórum Mundial da Juventude, em que “tendo sido eleito o Brasil, em Assembléia Geral, para indicar um membro a fim de compor o Secretariado Permanente do Fórum, designamos o colega Nelson Venuzi, Vice-Presidente de Assistência Universitária (cargo da diretoria da UNE), para a referida representação”. O Fórum teve lugar em Moscou, em julho de 1960.

INTERCÂMBIO SOVIÉTICO-BRASILEIRO

No mesmo ano em que a UNE repudiava Portugal e Espanha, defendendo Cuba, uma delegação de estudantes soviéticos chegou ao Brasil: “Com a finalidade de estreitar os laços de amizade entre os estudantes brasileiros e soviéticos, tivemos a oportunidade de receber, em nosso país, a delegação de estudantes soviéticos, credenciados pelo Conselho Estudantil da URSS. A referida delegação veio composta dos seguintes estudantes: Guenadi Dobrov, Presidente da Delegação e Bóris e Maya Menglet. Fizemos o possível para facilitar aos colegas soviéticos o conhecimento da sociedade brasileira...”

No setor assistencial, segundo a UNE, sua grande conquista foi a obtenção de bolsas de estudos para os seguintes países: República Democrática Alemã (2), Tcheco-Eslováquia (2), Rumânia (4) e Iugoslávia (1). Estas bolsas resultaram dos entendimentos entre a UNE e a União Internacional dos Estudantes. A FAB, conforme consta no relatório, ajudou os estudantes, cedendo seus aviões para viagens pelo Brasil e exterior.

ATIVIDADES “EDUCACIONAIS”

As referências às atividades “educacionais” da UNE no período 60-61 são: greve geral na Bahia, greve na Universidade Mackenzie, greve da Faculdade de Engenharia Industrial e da Politécnica de São Paulo, greve na Paraíba, trote dos calouros criticando as autoridades (em Natal), criação de um Centro Popular de Cultura e do Centro de Estudos Cinematográficos, com a finalidade de “conceber a significação da arte na vida social e na realidade brasileira” (a UNE vem fazendo teatro político, cujas peças são apresentadas em faculdades, fábricas, sindicatos etc). Ainda neste Relatório foi abordado o Projeto de Diretrizes e Bases da Educação, “projeto antidemocrático que significa a eliminação da escola pública”...

A UNE tratou, também, de reforma universitária, mas nestes termos: “os reitores e a classe professoral não compareceram aos trabalhos (refere-se às sessões promovidas pela UNE) porque a eles não interessa a reforma universitária, pois estamos em conflito entre o velho e o novo”.

ENE “ROMPEU” COM A UNE

Em junho de 1961 a Escola Nacional de Engenharia resolveu romper com a UNE e a UME. Naquela ocasião fizemos uma reportagem sobre o caso, denunciando as manobras dos estudantes profissionais e afirmando a necessidade de uma reação por parte dos estudantes democratas.

Os elementos agitadores das entidades estudantis, em junho, dirigiram-se para a escadaria da Escola Nacional de Engenharia e, sem que ninguém soubesse como, pois no Largo de S. Francisco não há pedras, a ENE se viu atingida por uma saraivada de pedras que, evidentemente, estavam nos bolsos dos desordeiros. Chegaram ao local o Reitor, um enviado do Ministro da Educação e estudantes da Escola. Um acadêmico reconheceu, entre os promotores do ataque, dirigentes da UNE e da UME. O vice-diretor desta entidade, Roberto Marchesini, apanhado em flagrante, disse estar ali “para apaziguar os ânimos”.

Tal movimento resultou da coação feita pela UME aos estudantes secundaristas comensais do Calabouço. Se estes não participassem da passeata e depredação teriam suas carteiras cassadas e perderiam o direito de fazer as refeições no restaurante da UME. Já em janeiro daquele ano, a União Metropolitana dos Estudantes tentara depredar a ENE, a pretexto da péssima alimentação oferecida pelo SAPS (o que a ENE tinha com isso?). Os funcionários da ótica situada no Largo de São Francisco, porém, chamaram a Polícia e o movimento não foi adiante.

O Diretório Acadêmico da ENE emitiu nota oficial pela imprensa repudiando as entidades UNE e UME, delas se desligando. Depois, enviou circular a outras faculdades, convidando-as para que fizessem o mesmo. Três faculdades se comprometeram a abandonar a UNE e a UME: a Faculdade Nacional de Filosofia, a Faculdade Nacional de Odontologia e a Faculdade Nacional de Ciências Econômicas. Só esta última manteve a palavra, e a própria Escola Nacional de Engenharia, embora desligada da UNE, apoiou inteiramente seus movimentos grevistas de junho de 1962, prestando-se, inclusive, a ser palco de peças subversivas do Centro Popular de Cultura.

JÂNIO QUADROS E OS ESTUDANTES

Em Brasília o ex-presidente Jânio Quadros, sempre dúbio, enviou o seguinte telegrama ao Ministro da Educação Brígido Tinoco:

“Excia:

1) registro com espanto que dezenas de desordeiros, fazendo-se passar por estudantes, depredam a Escola Nacional de Engenharia, um dos mais altos e beneméritos institutos de ensino superior do país;

2) verifique V. Exa. se é possível identificar todo o bando para que os nomes sejam encaminhados, na hipótese que não aceito, de estudantes, à Reitoria e às respectivas Escolas, a fim de receberem castigo exemplar;

3) verifique ainda se foi aberto inquérito e a conveniência de acompanhar este inquérito membros do Ministério Público.

(as) Jânio Quadros”

O mesmo Jânio Quadros, nas vésperas de sua renúncia, época em que condecorou, pelos “grandes serviços prestados ao Brasil”, Che Guevara, ofereceu apartamento aos estudantes em Brasília, um milhão e meio de cruzeiros para a UNE e colocou à disposição da entidade 18 funcionários da União para trabalharem na sede. Prometeu, ainda, auxílio financeiro ao IV Congresso Latino-Americano de Estudantes.

MINISTÉRIO FINANCIA ELEIÇÕES

Como vimos, a UNE só trata de intercâmbio e amizade com os países soviéticos, mas, afirma, cinicamente, que não é comunista. Realmente, esta afirmação valeria se, além dessas relações, a entidade mantivesse outras com a França, a Inglaterra, a Suíça, a Alemanha Ocidental, etc. — e o próprio Estados Unidos da América do Norte — países desenvolvidos que, pertencentes ao bloco ocidental, se assemelham mais às nossas cultura e tradição. A UNE, porém, em todas as manifestações, enaltece a “democracia” de Fidel Castro e desencadeia violenta campanha antiamericanista, atribuindo todos os males do país aos Estados Unidos, inclusive a inépcia de nossos governantes, pois se não há reformas é porque eles não as querem fazer.

E o Ministério da Educação, já naquela época, financiava as campanhas eleitorais da UNE, conforme denúncias amplamente divulgadas pela imprensa por Emílio Nina Ribeiro, da Faculdade de Direito da PUC do Estado da Guanabara e hoje eleito deputado estadual. Afirmava Nina Ribeiro, em julho de 1961 que, de um lado, existiam os estudantes desonestos, apoiados e prestigiados pelo Governo e, de outro lado, os estudantes que estudavam e não tinham tempo para se dedicar exclusivamente à política. A estes o Ministério não atendia em suas reivindicações.

Emílio Nina Ribeiro ainda denunciava as manobras da Juventude Universitária Católica que, apoiando a UNE, rotulava seus movimentos de católicos para iludir a boa-fé dos estudantes. Hoje a JUC não se esconde mais através da designação absurda com que se apresenta, “católica de esquerda”, agindo subversivamente, chegando a ponto de liderar a invasão do Ministério da Educação em agosto de 1962. E as autoridades religiosas ainda não se manifestaram sobre as atitudes da JUC que, de totalmente dominada pelos esquerdistas, agora está sendo chamada de Juventude Universitária Comunista.

GESTÃO ALDO ARANTES

(julho de 1961 - julho de 1962)

O XXIV Congresso Nacional dos Estudantes, realizado em julho de 1961, em Niterói, deu a Presidencia da UNE a Aldo Arantes, eleito pelos esquerdistas e pelos elementos da Juventude Universitaria Católica, que mais uma vez se venderam em troca de algumas vantagens e por solidariedade ao recém-eleito, um jucista. Arantes já fizera a sua profissão de fé marxista, em 1960, quando presidente do Diretório Central dos Estudantes da Pontifícia Universidade Católica, segundo denúncia de Ricardo Érico Howling, Presidente do Centro Acadêmico Eduardo Lustosa, da Faculdade de Direito daquela Universidade. Usando de seu cargo, sem consultar os diretórios da PUC, Aldo Arantes manifestou-se em seu nome e em nome da Universidade, favorável ao regime de Cuba, solidarizando-se com Fidel Castro. O fato motivou repulsa entre os alunos da PUC, que o desmentiram pelos jornais.

O grande acontecimento da gestão Aldo Arantes foi, sem dúvida, a greve universitária, em reivindicação de um terço de estudantes nos colegiados universitários, episódio que relataremos com detalhes. Arantes revelou-se francamente marxista. No folheto “Resoluções do Conselho da UNE”, de janeiro de 1962, encontramos a seguinte afirmação da Diretoria: “... nossa posição em nada mudou com a profissão de fé marxista-leninista de seu Governo (refere-se a Fidel Castro), pois consideramos que qualquer país tem o direito de adotar o regime que seu povo desejar”. E a UNE naquele ano fez mil e uma manifestações de simpatia ao regime cubano.

Na publicação “Cadernos da UNE — I”, de março de 1962, Aldo Arantes afirmava que os estudantes, “classe privilegiada num país subdesenvolvido, tem papel importante, mais que nos países desenvolvidos. A diretoria — dizia Arantes — se preocupa apenas com a politização das massas, sendo necessária, para isso, a formação de uma secretaria com funcionários que cuidem da administração”. Daí a criação de órgãos ou assessorias com o objetivo de politizar as massas: o Centro Popular de Cultura (CPC), a Editora Universitária e a Procuradoria (na época em estudos) e a preparação de um congresso estudante-operário-camponês.

BOLSAS DE ESTUDO

O Conselho Estudantil da URSS, segundo aquele relatório, ofereceu cinco bolsas de estudos aos estudantes brasileiros por intermédio da UIE: “Com o fechamento da sede, durante a crise política (a de agosto de 1961) não nos foi possível enviar os documentos dos bolsistas dentro do prazo previsto. Não obstante, os documentos estão em poder do Conselho Estudantil da URSS e as vagas estão confirmadas para o corrente ano...”

Continua o relatório: “Mediante acordo firmado na gestão anterior, enviamos delegações para viagens de intercâmbio à União Soviética e à China”. Uma outra delegação enviada a Cuba, teve como representante Vinícius Caldeira Brant, atual presidente da UNE que, provavelmente, fez aquela viagem para receber o plano de ação de sua diretoria.

Em suma, Aldo Arantes tratou de intercambio com os países soviéticos, do fortalecimento da liga estudante-operário camponês, dos contatos da UNE com os sindicatos e associações populares e das instalações do CPC e de um circo. Ainda, com a colaboração da Embaixada de Cuba e do jornal “Última Hora”, organizou um concurso de símbolos e siglas para o Centro Popular de Cultura, cujo vencedor teria uma viagem-prêmio a Havana.

UNE DECRETOU GREVE COM OBJETIVOS POLÍTICOS

A grande realização da diretoria da UNE presidida por Aldo Arantes, sem dúvida alguma, foi a campanha de reivindicação pela participação estudantil nos colegiados universitários.

A greve, decretada em princípios de junho de 1962, veio em má hora e da forma mais absurda possível. Ela apareceu junto com a primeira crise deste último período de crises políticas, tendo a finalidade de agitar, ainda mais, o panorama nacional. Um movimento que, de início, pelo efeito da propaganda, empolgou grande número de estudantes desprevenidos e sinceramente desejosos de reformas, acabou deixando todos os estudantes “na mão”, e revoltados com a politicagem da UNE.

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, em seu artigo 78 diz: “O corpo discente terá representação com direito a voto, nos conselhos universitários, nas congregações e nos conselhos departamentais das universidades e das escolas superiores isoladas, nas formas dos estatutos das referidas entidades”. As universidades, portanto, deveriam reformar seus estatutos, em atendimento à Lei de Diretrizes e Bases, competindo a cada uma delas estabelecer o número de alunos participantes nos colegiados. Neste sentido as faculdades trabalhavam nas reformas de seus estatutos, devendo os mesmos serem entregues ao Conselho Federal de Educação até 27 de junho de 1962. Várias faculdades já tinham seus alunos representados nas congregações através dos presidentes de Diretórios Acadêmicos e os Conselhos Universitários já têm a participação dos Presidentes dos Diretórios Centrais de Estudantes.

Sem esperar o resultado das reformas de estatutos, propostas pelas faculdades, e a sua entrega ao Conselho Federal de Educação, a UNE decretou a greve com o intuito de impedir qualquer reforma e tumultuar os trabalhos, além de prejudicar as atividades discentes em período de provas parciais.

Os líderes da greve não se preocuparam, conforme estabelece a ética, em manter contatos com as direções das faculdades. Ao contrário, gritavam pela reforma, em campanha de desmoralização à classe professoral, tachando-a de “imbecil”, “nazi-fascista”, “retrógrada” e “serviçal do imperialismo ianque”.

GREVE POLÍTICA

O Governo, que naquele momento parecia identificado com a mentalidade subversiva da UNE, omitiu-se publicamente, embora, em conversas com os supostos líderes da classe estudantil, apoiasse, instigasse e prometesse todas as garantias àqueles elementos arrogantes e pretensiosos.

Muita gente que nada tem a ver com os estudantes, veio a público elogiar o movimento. Num programa de televisão debatemos o assunto com o Deputado Paulo Alberto que, sem a menor cerimônia, declarou ser aquela greve “a mais bonita greve estudantil”. O Sr. San Thiago Dantas, então candidato a “premier”, encontrando-se com alguns alunos da Faculdade Nacional de Filosofia, incentivou-os, afirmando que o Ministro da Educação, Oliveira Brito, estava totalmente solidário com a “nobre causa”. Isto foi dito numa assembléia da FNFi, por um membro do Diretório Acadêmico.

Os estudantes, oradores nas assembléias, garantiam que o novo gabinete do Sr. San Thiago aprovaria a reivindicação de um terço de estudantes nos colegiados universitários e, ainda, deixavam claro que a greve estudantil era uma forma de pressão sobre o Congresso para a eleição de San Thiago.

Além deste objetivo político, o “pivot” da greve foi a Faculdade Nacional de Direito. O Centro Acadêmico Cândido de Oliveira (CACO) desta faculdade, estando em mãos de elementos ligados à UNE, promoveu a pregação revolucionária de Leonel Brizola, resolvendo, logo após, promover outra pregação revolucionária, esta com o Embaixador de Cuba. A Congregação da Faculdade barrou a pretensão do CACO, afirmando não permitir a transformação de uma casa educacional em centro de agitação política. Antes que a UNE decretasse a greve, comentava-se, vindo do CACO, que os estudantes entrariam em greve.

MENTIRAS DOS “PROGRESSISTAS”

Surgida de repente, a greve pegou os estudantes de surpresa. Julho passou com as férias e o vergonhoso Congresso de Quitandinha da UNE-PC-JUC. Veio agosto com as provas marcadas pelas faculdades, mas a UNE se manteve firme em seus propósitos de agitação, prometendo aos estudantes grevistas coisas que jamais ela poderia dar.

Várias faculdades começaram a tomar consciência da situação e denunciaram as manobras dos pelegos estudantis que pretendiam subjugar os estudantes aos seus intentos políticos. Nas assembléias de alunos de nossas escolas superiores de todo o país, grandes grupos se dispunham a “furar” a greve. A UNE tentava segurar a situação, enviando seus agentes às assembléias onde afirmavam eles haver o Conselho Federal de Educação deliberado a realização de uma só prova no fim do ano. Como todos sabem, o Conselho Federal de Educação é órgão consultivo e não deliberativo, não podendo determinar medidas que só às universidades (que são autônomas) competem. As universidades já haviam resolvido sobre as primeiras provas, marcando-as para agosto. Segundo o próprio Conselho Federal de Educação, esta declaração da UNE não tinha cabimento, a mesma havia sido “interpretada” de maneira incorreta pelos “progressistas” líderes estudantis.

Diante do número sempre crescente de faculdades que aboliam a greve, a UNE não teve outra alternativa senão a de suspendê-la.

SUSPENSÃO DA GREVE

Diante de seu fracasso confesso, a UNE expediu nota oficial ordenando a “operação retorno às aulas”, justificando a sua atitude pelo “desvirtuamento que seus objetivos sofreram por parte de elementos divisionistas, que deram à greve um cunho político”. A nota ainda afirmava que a entidade continuaria firme em sua reivindicação pelo terço. Mas, apesar destas desculpas, os estudantes ficaram abandonados pela UNE, sem as proteções prometidas, na obrigação de terem aulas extras que preenchessem o número de aulas perdidas durante a greve e tendo que fazer as primeiras provas parciais. A UNE, de fato, fez um bonito papel, ainda mais depois de ter prometido que “todo mundo ia passar por decreto”. Em conseqüência, houve uma reação no meio estudantil e várias faculdades se desligaram da UNE. No Estado da Guanabara, por exemplo, a Escola de Medicina e Cirurgia, a Faculdade de Direito da Universidade do Estado da Guanabara, além das faculdades que já se haviam desligado: Nacional de Odontologia, Nacional de Ciências Econômicas e, por último, desligou-se a Escola de Engenharia da PUC. A PUC, desde os primeiros movimentos da UNE, manteve-se ausente, não tomando conhecimento nem participando da greve.

UNE CONFESSA PRESSÃO

O jornalzinho “O Metropolitano”, do dia 11 de agosto de 1961, explica por que a UNE suspendera a greve. O jornal diz que após vários estudos os elementos da UNE chegaram à conclusão de que a condição indispensável para uma reforma universitária está na participação de um terço de alunos nos colegiados universitários. A UNE tapeia os estudantes com esta afirmação sem explicá-la. O verdadeiro objetivo do terço está exposto pelo ideólogo da UNE no livro A Questão da Universidade.

Em sua exposição “O Metropolitano” diz textualmente: “A princípio dirigiu-se a greve às direções das universidades que deveriam votar seus novos estatutos até à data de 27 de junho. Após aquele prazo, como muitas faculdades não tivessem atendido às reivindicações e como o assunto passasse à alçada do Conselho Federal de Educação, o movimento universitário ratificou a greve nacional e dirigiu a este órgão o movimento paredista. Em vista da indefinição do Congresso, diante da solicitação dos poderes especiais por parte do Gabinete Brochado da Rocha, onde inclui-se a participação de um terço, foi mais uma vez ratificada a greve, desta vez procurando obter do Congresso Nacional a decisão almejada”. A primeira explicação a ser dada está na confusão de datas feitas pelos líderes da UNE. O prazo para a entrega dos novos estatutos, conforme diz o artigo, era o dia 27 de junho e todos se lembram que a greve foi decretada no dia 12 de junho, portanto, houve má-fé. Quem lê aquele pequeno trecho de “O Metropolitano” entende: a) que a UNE decretou a greve muito antes do prazo de entrega dos novos estatutos das faculdades; b) que a UNE pressionou o Conselho Federal de Educação; c) que a UNE pressionou o Congresso Nacional para que este desse poderes especiais ao Sr. Brochado da Rocha e bem claro fica que a UNE decretou greve reivindicando um terço sem que antes houvesse entendimentos entre alunos e diretores. Resumindo: a UNE quer acabar com a autonomia universitária.

“O Metropolitano” prossegue, confessando claramente o objetivo político da greve: “3 — Chegada a época da concessão daqueles poderes especiais, fatos novos vieram alterar o panorama nacional, e também as condições do movimento grevista: por um lado o Congresso Nacional, que marcara inicialmente a data de 6 de agosto para a sua decisão, adiou a mesma data para o dia 8, novamente a transferiu para o dia 14, numa flagrante demonstração que somente a contragosto fará aquela delegação; por outro lado, radicalizaram-se as correntes políticas, ora em choque, podendo-se reconhecer que, de momento, o seu interesse reside em garantir sua própria sobrevivência, mesmo que isso venha a forçar o sufocamento dos que se lhes opõem...”

Com todas as letras o jornalzinho da União Metropolitana dos Estudantes, a UNE particular do Estado da Guanabara, disse isso... A UNE, portanto, integrada num esquema de agitação geral, esperava a concessão de poderes especiais ao Premier e, como tal estivesse demorando a acontecer, ela não teve outra alternativa senão a de suspender a greve, fazendo seus liderados voltarem às aulas e às provas...

“O Metropolitano”, concluindo suas explicações, afirma, ainda, que os estudantes continuariam a reivindicar o terço, ameaçando que “denunciará amplamente aqueles que procuram se opor à representação estudantil”, promovendo movimentos de rua. Finalmente, vem o chavão que qualquer conhecedor de Filosofia sabe em que boca é usado: “A reforma é um imperativo histórico”.

A UNE não falou mais em terço, nem em reforma. Sossegou e tratou de arranjar novas façanhas. Lançou, em fins de 1962, um livro, Cristianismo Hoje, obra que não nos conduz a coisa alguma e traz formulações marxistas. O livro é de Betinho (falaremos dele mais adiante), do Padre Vaz (hegeliano, que bastante explorado pela UNE, por ela se deixou envolver), e do Padre Cardonel (dominicano francês que, de tão explorado pelos comunistas do Brasil, foi chamado de volta ao seu país pelos seus superiores).

As atitudes da UNE, no decorrer da greve, também, não deixaram dúvidas quanto às suas idéias subversivas. O Centro Popular de Cultura fez representar em várias faculdades a peça “Auto dos 99 por Cento”, peça que atenta contra o clero, contra a família e contra a sociedade, além de ser desprovida do mínimo senso estético. Os reformistas da UNE, ainda, invadiram o Ministério da Educação (hoje Palácio da Cultura) ali praticando uma série de ações que chocaram as senhoras que entravam no prédio. Os “reformistas” faziam coisas que bons meninos não fazem... E isso, publicamente, nas dependências do segundo andar, onde se acha o Gabinete do Ministro...


 

VI - AINDA A GREVE DO TERÇO E SUA FUNDAMENTAÇÃO IDEOLÓGICA

 

IDEÓLOGO DA UNE PREGA GREVES POLÍTICAS

Podemos dizer, sem dúvida alguma, que a greve decretada pela UNE, em junho de 1962, teve uma finalidade política, fazendo parte de um esquema preparado pelos intelectuais de esquerda, desejosos de submeterem o Brasil ao jugo da ditadura marxista.

Todos sabem que os estudantes, por pertencerem a uma elite intelectual, exercem papel de destaque diante do público de um país subdesenvolvido. Daí o empenho dos agentes extremistas em escolherem os estudantes, jovens desencantados com a nossa irresponsável democracia e com pouco ou nenhum conhecimento de doutrinas políticas, para servirem de veículos aos seus interesses. A liga estudante-operário-camponês é constante nas pregações marxistas. E sempre frisando a união dos estudantes com os trabalhadores, a UNE, demagogicamente, exerce papel de destaque na política nacional. Sabemos, pela palavra dos agentes “progressistas”, que a entidade pseudo-estudantil teve a força de colocar o seu elemento de confiança no Ministério da Educação, no curto período do pseudo-gabinete Brochado da Rocha, além de fazer de Álvaro Borges Vieira Pinto um ministro sem pasta do mesmo governo.

Quanto à greve, a UNE não teve a inteligência suficiente para esconder os seus verdadeiros objetivos uma vez que seu ideólogo publicara, pouco antes do movimento paredista, um livro que é o ideário reformista da “entidade social”, conforme declaração do autor. Vamos falar deste e do livro. O autor, muito nosso conhecido, por ter sido nosso professor e nos ter oferecido pregações constantes, dentro e fora das salas de aula, visando incutir nos alunos a sua verdadeira filosofia: a esquerda hegeliana.

PROFESSOR POR “PICARETAGEM”

Álvaro Borges Vieira Pinto era médico cancerologista. Descontente com a profissão procurou na Filosofia o lenitivo e a possível explicação para os seus desencantos. Após estudar algum tempo a referida matéria prestou exame de suficiência no Ministério da Educação, ficando apto a ser professor de Filosofia. Por meio de San Thiago Dantas e do Professor Alceu Amoroso Lima, além de outros professores de prestígio na Faculdade Nacional de Filosofia, Vieira entrou para lá ficando como assistente de Frei Damião Berg, então catedrático de História da Filosofia. Frei Berg, porém, gostando de seu assistente, possibilitou-o a fazer o concurso para a cátedra de História da Filosofia na Faculdade recém-criada. Ele, Frei Berg, especialista em Grego, faria o concurso para a cátedra de Grego. Vieira, então, prestou o concurso para a cátedra de História da Filosofia, apresentando uma tese sobre Platão. Segundo várias informações de professores da época, Vieira estudou-a na Sorbone. Mas, de fato, não temos a certeza se sua viagem à Paris se deu antes ou depois do concurso. O certo é que Vieira esteve freqüentando cursos da Sorbone, mas diz que foi dar aulas na Universidade francesa, sendo constantemente convidado a voltar para lá, pelo seu amigo René Poirier.

A sua tese, sobre Platão, deu-lhe o qualificativo de “gênio”... Frei Damião Berg, porém, já catedrático de grego, descobriu que o Timeu, traduzido por Vieira, estava errado. Vieira defendera uma tese apoiada em uma falsa afirmação atribuída a Platão, por erro de tradução. Ora, isto invalidava a tese. O caso foi denunciado, havendo uma certa corrida na Faculdade. Mas Vieira Pinto era amigo de San Thiago Dantas, diretor da Faculdade e homem de prestígio, fator que o conservou como catedrático. E como tal, ele sempre se prevaleceu das regalias da vitaliciedade de cátedra, passando o “conto do culto”, através das várias comissões culturais de que participou, coisas tão criticadas pelo filósofo. Enfim, como diz Hélio Fernandes, a condição para se obter postos de mando no país é a mediocridade e o fracasso.

Álvaro Vieira Pinto era integralista do Grupo de Itatiaia. Naquela época era muito católico, uma vez que a religião servia de capa protetora aos extremistas da direita. Com o fim do integralismo, Vieira foi se acomodando à ditadura, passando a ser platônico. No Governo de Juscelino, o filósofo, juntamente com Corbisier e outros, fez o ISEB, sendo que sua filosofia era a hegeliana, com matizes marxistas. Em 1957 passou a ser “nacionalista” e de esquerda. Do ISEB fez campanha contra Jânio Quadros, mas quando Jânio tornou-se presidente, Vieira passou a ser um dos homens escolhidos para fazer “palestras de esclarecimento sobre a realidade brasileira”. Estas palestras já pertenceram a sua fase bem marxista.

No pseudo-gabinete Brochado, Vieira Pinto governou o Brasil nos bastidores. Aliás, uma de suas características é essa: a de nunca aparecer e mandar os outros fazerem o que ele quer. Até o momento, quando escrevemos esta matéria, Vieira é o assessor de assuntos educacionais do Ministro da Educação Darcy Ribeiro, sendo o responsável por uma série de decretos demagógicos, assinados por este.

A “REFORMA” PREGADA POR VIEIRA E ACEITA PELA UNE

O “filósofo” da UNE escreveu um livrinho de 163 páginas, intitulado A Questão da Universidade, obra inaugural da Editora Universitária, de propriedade da UNE, constituindo-se na homenagem do autor aos vinte e cinco anos de existência da entidade, comemorada em 1962. O opúsculo, segundo o autor, exprime o pensamento dos verdadeiros estudantes, daqueles que desejam promover a revolução e, por isso mesmo, cada vez mais se desinteressam das atividades universitárias. A obra representa o ideal da Reforma Universitária para a mocidade “progressista” da UNE.

Transcrevemos alguns trechos extraídos desse trabalho, verdadeira obra-prima como manual de revolução marxista aplicada à universidade, com a indicação das páginas, a fim de facilitar a pesquisa àqueles que duvidam.

— “Ninguém tenha dúvida, o destino, a forma futura de Universidade brasileira está sendo decidida, neste momento, muito mais nos comícios de camponeses do nordeste do que nas salas de reuniões dos Conselhos de Educação” — pág. 13.

— “... a reforma da universidade não é tarefa de natureza jurídica, institucional e, muito menos, pedagógica, e sim consiste na transformação de sua essência” — pág. 18.

A essência da universidade, segundo Vieira, é política. A universidade, em seu estado atual, é uma das formas de imperialismo, cuja única finalidade é a de alienar alguns privilegiados da realidade político-social brasileira, transformando-se em sustentáculo da classe capitalista. Mas Vieira prossegue:

— “Esta tese tem por corolário outra imediata: a reforma da Universidade do país subdesenvolvido que necessita sacudir o jugo das pressões imperialistas que o entravam e criar com plena liberdade a sua cultura própria, não tem, primordialmente, a finalidade pedagógica, mas visa, antes de tudo, uma finalidade política”. — pág. 17.

— “... aos estudantes cabe, evidentemente, o principal papel neste processo transformador porque eles são os primeiros a entender as idéias como as que estamos enunciando...” — pág. 17.

— “Cometem os pedagogos um engano fundamental: supõem que seu trabalho consiste em organizar, da melhor forma possível, o ensino universitário para aqueles alunos que entram na universidade”. — pág. 24.

O autor aqui, faz um elogio aos professores dizendo que eles são responsáveis em sua missão de ensinar, oferecendo o melhor possível. Vieira Pinto, evidentemente, não pensou no que disse, pois os que querem uma verdadeira reforma universitária reclamam, entre outras coisas, a falta de responsabilidade da maioria dos professores. Vieira, embora pregue a incompetência dos professores, seus colegas de magistério, paradoxalmente, faz-lhes este grande elogio.

— “O tema principal da reforma não consiste na organização do ensino para os elementos que ingressam na universidade. Isso seria o simples aspecto didático.” — pág. 25.

— “A universidade representa o instrumento mais eficiente para assegurar o comando ideológico da classe dirigente (ao lado de outros subsidiários, como a imprensa, o púlpito, etc. . .)” — pág. 30.

— “A universidade luta pelo seu isolamento através de sua “autonomia” que defende ociosamente em seus múltiplos aspectos: administrativos, didáticos, financeiros, mas com isso ela se transforma num fosso...” — pág. 62.

O que o “filósofo da realidade brasileira” quer dizer com isso é que a universidade não é popular, não é democrática. Ela está desligada das massas operárias. É preciso que a universidade se democratize. Todos podem ver na fachada da UNE as faixas com os slogans: “Democratização da Universidade”, “Universidade para o povo”, etc, slogans jogados que não apresentam uma solução sequer, a não ser pregações de greves. Quem pretende reformar alguma coisa traz um plano definido. A UNE fala em reforma, mas não propõe nenhuma.

— “Torna-se necessário que, de vez em quando, um grupo de estudantes se levante em greve...” — pág. 64.

— “A reforma da universidade tem que ser feita de fora para dentro por via política” — pág. 95.

— “Os estudantes que compreendem estes fatos cada vez mais se desinteressam das contendas internas da universidade, isto é, pelo fator pedagógico” — pág. 95.

— “Os estudantes se unem aos proletários mais politizados (certamente o autor quer se referir aos pelegos de sindicatos), uma vez que seus interesses são os mesmos. Os estudantes brasileiros, pela palavra e pela ação de seus líderes mais capacitados, reunidos na entidade social que é a UNE, compreendem que a peleja da reforma universitária só tem sentido e possibilidade de êxito, se for concebida e executada como luta fundamentalmente política”. — pág. 103.

— “Toda a formulação do problema da reforma em termos administrativos ou pedagógicos precisa ser repelida com energia, como mistificação dos serviçais da classe dominante que visam desviar a atenção dos estudantes para o debate de questões reais, não há dúvidas, mas secundárias” — pág. 109.

Com esta última citação podemos dizer que Vieira se propõe, sem sombra de dúvida, a mudar o regime vigente no Brasil, uma democracia falha, mas uma democracia que pode ser corrigida em todos os seus defeitos. O regime proposto pelo reformista é o comunismo. Em conteúdo e forma, Vieira usa a dialética marxista. O livro prega, ainda, a desmoralização dos professores por parte dos alunos. Estes não devem respeitar aqueles porque a classe professoral é “retrógrada” “incompetente” e “ignorante” para fazer alguma coisa.

A revolução, bem revolução, pregada sem armas (por enquanto) está na objetividade de cada greve: “um fim imediato e um meio para alcançar outro fim que à primeira vista não está em jogo, mas que constitui o alvo para toda a operação diária da guerrilha” — pág. 148.

Quando dizemos que a UNE é uma entidade que serve para promover agitações e é uma célula do Partido Comunista, não o dizemos por desconhecimento de causa. O livro do ideólogo da UNE é bem claro e afirma que a entidade representa uma das “forças progressistas do país”, desempenhando, agora, um papel até então inédito na história brasileira, qual seja o de influir na política, pressionando o Governo. E Vieira Pinto é um homem do Governo. . .

COMO SERIA FEITA A REFORMA

A universidade, no entender de Vieira e da UNE, deve se “democratizar”, isto é, ficar aberta ao povo. Mas o processo preconizado para que isso aconteça é o seguinte:

a) Suprimir os vestibulares nas faculdades (o que não seria condenável), para que todos possam ter acesso à universidade, cuja função exclusiva é a de “politizar” os alunos;

b) após um ano de experiência nas faculdades, os alunos seriam “examinados”, só permanecendo nas mesmas aqueles que assimilassem a doutrina política ensinada pelos professores “progressistas”, o marxismo.

Quanto a este último item os leitores verão no próximo capítulo o que aconteceu na Faculdade Nacional de Filosofia, em 1959. Naquele ano o filósofo fizera exatamente isso, submetendo-se pró-forma ao vestibular, cujo critério de admissão dos alunos na faculdade foi o político, não importando a sua competência.

A reforma da universidade não deve ser tratada entre professores e alunos. Os professores não estão à altura de promover uma reforma porque são “serviçais do capitalismo espoliador”. Os estudantes da UNE são os únicos com possibilidades para tal tarefa, devendo os mesmos pressionar o Governo para conseguirem a representação de metade nos órgãos colegiados das faculdades e universidades. É interessante notar que enquanto os elementos da UNE pedem um terço o “mestre” se adianta pedindo metade. A representação maciça de alunos nos órgãos colegiados possibilitará que alunos marxistas, unidos aos professores marxistas, expulsem os professores que não aceitem a doutrina “popular” da esquerda.

Quanto a parte pedagógica, sem nenhuma importância para a reforma, a única coisa a fazer seria suprimir as humanidades. Artes, letras clássicas, filosofia (menos, e claro, a marxista) são coisas do passado. A nossa época só exige técnica e aprendizado de coisas materiais que proporcionem o desenvolvimento econômico. Arrematando sua tese, Vieira Pinto afirma que moral é coisa do passado e seus princípios servem, apenas, para entravar o progresso da humanidade.

UNE DESMENTE, MAS AGE

A UNE nega com veemência que seus movimentos pró reforma sejam inspirados nas teses de Vieira Pinto. Mas este atribui à entidade estudantil a compreensão das idéias que expõe, frisando ser a UNE “a única que compreende a peleja da reforma universitária”. A UNE, enquanto nega em palavras, age exatamente de acordo com as determinações de seu filósofo, promovendo-o a “manifestante legítimo dos anseios estudantis”.

Pelo exposto, torna-se dispensável qualquer comentário. O próprio livro, A Questão da Universidade, se encarrega de ser claro e objetivo quanto à sua finalidade. Mas cumpre-nos fazer um comentário. A UNE, sem base alguma, prega a reforma da universidade antes que a reforma política se efetue no país. Em Cuba, país exemplo para a mocidade reunida na Praia do Flamengo, houve a reforma universitária quase nestes termos, mas depois que a revolução mudou a política do país. O que deseja esta juventude, parte corrompida moral e intelectualmente e parte idealista, mas totalmente cega, é absurdo. Seria o mesmo que colocarmos a carroça antes dos bois e fazê-los andar. O pior, em tudo isso, é a liderança exercida pela personagem sinistra (não é trocadilho), irresponsável, que, em qualquer país civilizado, há muito teria sido eliminada do magistério.

Ultimamente, depois da greve, a UNE sossegou. Não exige mais um terço, nem coisa nenhuma. Não fala mais nisso. Acreditamos que a queda do comunismo no plano internacional e, principalmente, a desmoralização de Kruchev em relação ao caso de Cuba, tenha dado uma trégua aos intentos da UNE.


 

VII - CATEQUESE ESTUDANTIL COMPROVADA EM INQUÉRITO

 

Falamos, no primeiro capítulo, da técnica adotada na catequese promovida pela UNE, a da “simpatia e amizade”. Quando elementos catequisadores têm como mentor intelectual um professor com as imunidades da cátedra vitalícia, a coisa muda de figura. Aí a catequese é ostensiva e protegida, assegurando a liberdade de ação dos catequisadores. Os alunos que não aceitam a “evolução” ou as aulas a que são submetidos, passam a ser perseguidos e, de certo modo, expulsos da Faculdade, uma vez que são, sistematicamente, reprovados na cadeira do mestre “progressista”.

Estudantes ligados à UNE, em 1958, na Faculdade Nacional de Filosofia, puseram em prática uma idéia que, hoje, é enunciada, cinicamente e com todas as garantias, na cartilha da reforma universitária de Álvaro Borges Vieira Pinto, assessor de assuntos de abastecimento e educação do Governo João Goulart, na fase em que o nome do Sr. Brochado da Rocha aparecia como Primeiro Ministro, e assessor de assuntos educacionais do Ministro da Educação, Darcy Ribeiro, homem que encomenda, com o dinheiro público, panfletos subversivos ao ISEB. O que o “grupo do Vieira”, como são conhecidos os elementos de confiança do Sr. Vieira Pinto, fez na Faculdade Nacional de Filosofia, chegou ao auge da arbitrariedade e, por que não dizer, da sordidez. Tudo que aqui for dito poderá ser averiguado no Conselho Universitário da Universidade do Brasil e na Faculdade Nacional de Filosofia, cujo diretor, Prof. Eremildo Luiz Viana, por uma questão de responsabilidade, não se oporá a prestar esclarecimentos e a fornecer os depoimentos e a conclusão do inquérito que, “para não comprometer o bom nome da Faculdade”, foi arquivado. Os senhores deputados que apuram as atividades da UNE, numa justa satisfação ao povo brasileiro, contribuinte da mazela nacional, no dizer do Deputado Raimundo Padilha, poderão recorrer ao referido inquérito, solicitando-o ao Prof. Eremildo Viana ou ao Prof. Sílvio Júlio de Albuquerque Lima, presidente da comissão instalada pela Congregação da Faculdade, a fim de apurar responsabilidades de alunos e professores nos vergonhosos incidentes que ocorreram naquela casa de ensino.

Resumamos o célebre “caso do vestibular”, suas conseqüências, e o inquérito disciplinar pedido pela Congregação da Faculdade Nacional de Filosofia.

GRUPO CATEQUISANDO O PRÉ-VESTIBULAR

Em 1958 chegou ao apogeu um movimento ditatorial promovido por alguns alunos do curso de Filosofia da Faculdade. Nacional de Filosofia, prestigiados e fomentados pelo seu catedrático de História da Filosofia, Álvaro Borges Vieira Pinto. Este professor, entre outras coisas, incutia em seus alunos idéias avançadas de “disciplina”. Preocupado com a realidade nacional, afirmava ser necessária uma mudança de ordem. Para tal fazia os seus discípulos desrespeitarem os outros professores, aconselhando-os a colarem nas provas, permanecerem de livros e revistas abertas nas aulas (que não fossem as suas) e a não aceitarem nada do que os professores dissessem, por serem estes “reacionários e serviçais da classe dominante”. O Sr. Vieira Pinto fazia um levantamento das tendências de seus alunos. Aqueles que não se metiam em política, eram religiosos ou antimarxistas, sistematicamente não logravam nota em sua matéria. Não apenas os estudantes de Filosofia que apresentassem estas características eram reprovados, mas, também, os alunos de outros cursos que tinham a sua cátedra (Pedagogia e Ciências Sociais). O Sr. Vieira Pinto passou a ser temido, era a “dureza” da Faculdade e todos tremiam só em ouvir o seu nome.

A Faculdade Nacional de Filosofia mantém cursos de Pré-Vestibular, cujas aulas são ministradas pelos alunos das últimas séries dos cursos da Faculdade. O Pré-Vestibular de Filosofia, em 1958, era dirigido por alunos filiados à UNE e ao ISEB. Os professores pregavam uma doutrina que, só depois de algumas aulas, nos foi possível entendê-la bem. Era o marxismo, incluindo a prática de atitudes antifamiliares. A catequese, seguindo a técnica da “simpatia e amizade”, apresentava resultados proveitosos, devido à inexperiência de jovens recém-saídos de escolas secundárias, que se sentiam com a responsabilidade de aprender a “dominar as massas”, conforme diziam os elementos do grupo do Vieira. O diretor da Faculdade, Professor Eremildo Viana, desconfiava da atuação do grupo, mas, em declaração feita mais tarde, disse que nada podia fazer por não ter as provas suficientes.

O chefe do grupo naquele ano exigiu do Diretor que o próximo vestibular de Filosofia, a se realizar em fevereiro de 1959, fosse examinado apenas por ele, Vieira Pinto, e seus assistentes. O Diretor concordou, embora houvesse muitos professores no curso de Filosofia, e seja de hábito professores das diferentes cadeiras do curso examinarem. Mas Vieira queria ficar só.

Os professores do Curso Pré-Vestibular, à medida que conseguiam catequisar os alunos, os anotavam numa listinha a ser apresentada ao examinador, a fim de poderem entrar na Faculdade. O critério do vestibular não foi o da competência, mas o da assimilação da doutrina. A banca realizou as provas orais com as escritas na frente para que não houvesse o descuido de algum aluno indesejável entrar na Faculdade. Apenas quatro elementos estranhos ao grupo, que não haviam feito o Pré-Vestibular na Faculdade, foram aprovados e, isto porque, antes, houvera uma sondagem sobre cada um. Três eram amigos de amigos do Sr. Vieira Pinto e uma moça, muito inteligente, bastante católica e filha de um professor, poderia “criar caso”.

O vestibular foi tão imoral que os elementos professores dos vestibulandos trocavam sinais com os examinadores. Uma das moças aprovadas no vestibular, ganhou o apelido de “Maria Muda”, porque passou sem abrir a boca. Outro vestibulando, integrado no grupo, consultado sobre se fazia questão de entrar na Faculdade, respondeu que não, porque preferia cursar direito e assim poderia servir de testemunha à “honestidade” do exame, caso alguém reclamasse, o que de fato aconteceu. Alguns alunos aprovados mais tarde declararam que procuraram tapear, aceitando a doutrinação, por não quererem barulho.

Com as notas absurdas distribuídas pelo Sr. Vieira Pinto e sua gang, quatro alunos pediram revisão de provas. Depois de muita luta e da obstinada recusa de Vieira em revisar as provas fazendo, inclusive, com que seus adeptos assinassem uma lista em solidariedade à sua pessoa e à sua “honestidade”, a Congregação da Faculdade decidiu levar a questão ao Conselho Universitário da Universidade do Brasil. Lá, após muitos debates, ficou resolvida a formação de uma nova banca examinadora para revisar as provas.

Dos quatro requerentes, dois entraram na Faculdade, inclusive a autora do presente trabalho, que teve a sua nota da prova escrita majorada em quase quatro pontos. Ficava assim comprovada a desonestidade da banca examinadora formada por Álvaro Borges Vieira Pinto e seus dois assistentes. O diretor da Faculdade chegou a declarar que se tal atitude não criasse mais confusão, ele teria anulado aquele vestibular e aberto outro, pois não houvera nenhum critério na atribuição das notas, em geral. Isso parece incrível, mas acontece em nosso país.

O INQUÉRITO

O caso poderia ter parado aí. Comprovada a sua desonestidade, o Sr. Vieira Pinto não mais examinou nos vestibulares da Faculdade Nacional de Filosofia e passou a dar sete, oito, nove e dez a todos os alunos, apregoando que esta era uma forma de desmoralizar a Faculdade, pois ele fora vítima das “infâmias burguesas de serviçais do capitalismo”.

Naquela mesma época um fato, paralelo ao narrado, veio comprovar a série de acusações que se faziam contra Vieira Pinto e seu grupo. Na véspera do exame oral do vestibular de Filosofia, a mãe de uma menor aluna do Pré-Vestibular, foi à Faculdade e criou um escândalo, noticiado em todos os jornais da cidade. Sua filha resolvera viver com Fausto Cupertino Guimarães (hoje nos quadros do ISEB), elemento do grupo do Vieira e professor do Pré-Vestibular. A mãe da menor encontrou, ainda, em poder desta, um diário de outra moça do grupo, aluna da Faculdade, entregando-o ao diretor, peça que se constituiu, mais tarde, na prova material do inquérito. A “visita” da senhora, acompanhada de um advogado, à Faculdade, teve o objetivo de pegar Fausto e dar-lhe uma surra. Durante mais de duas horas o prédio da Avenida Presidente Antônio Carlos se tornou alvo da curiosidade pública, devido à permanência da polícia e de repórteres no local. Diante de tal acontecimento era necessário, mesmo, a abertura de um inquérito.

Deste caso particular veio à tona toda uma trama. O diário da aluna da Faculdade, autenticado na Polícia, relatava as maiores barbaridades e imoralidades praticadas pelo grupo, inclusive referências a moças que davam pensões aos rapazes do grupo. Este grupo era o mesmo que atuara na catequese do vestibular, liderado pela intelectualidade de Vieira Pinto. Após dois anos de trabalhos o inquérito concluiu eximindo os professores de culpa e, segundo comentários, seus nomes foram riscados com nanquim no processo. O Diretor publicou, contudo, a expulsão de seis alunos. Face a isso o Diretório Acadêmico da Faculdade enviou um ofício ao Diretor pedindo a apuração da responsabilidade dos professores implicados no caso. A solicitação não foi atendida e os alunos não foram expulsos (o que foi justo, uma vez que eles agiam sob a proteção de catedráticos), com excessão de Fausto Cupertino Guimarães e da menor, pois o caso de ambos era flagrante.

Vamos transcrever a íntegra de um documento, assinado pelo Presidente do Diretório Acadêmico da época — dezembro de 1960, data em que o inquérito teve sua conclusão — ofício enviado ao Diretório Central dos Estudantes da Universidade do Brasil:

“Do Presidente do Diretório Acadêmico
Ao Presidente do Diretório Central dos Estudantes
Assunto: inquérito disciplinar
Colega Presidente

Acaba de ter fim um ciclo de ocorrências que convulsionou a Faculdade Nacional de Filosofia. Não quero rememorar os fatos que deram inicio a estes incidentes desagradáveis.

Cabe-me informá-lo de que, por esses dias entrará no Conselho Universitário uma recomendação de expulsão de vários alunos desta faculdade:

1 — Fausto Cupertino Guimarães.
2 — H.J.B.C.
3 — M.S.
4 — H.H.
5 — F.N.C.
6 — V.P.

À professora primária R.M., foi recomendada a proibição de matrícula nesta faculdade, a que teria direito, por ter sido aprovada em exame vestibular.

Foi recomendada, também, a proibição da entrada no recinto da Faculdade, dos senhores Wanderley Guilherme dos Santos, Carlos Estevam e Alberto Coelho de Souza, licenciados pela Faculdade Nacional de Filosofia (anotação nossa: professores do Pré-Vestibular de Curso de Filosofia no ano de 1958).

Anexo a este ofício segue relatório circunstanciado sobre este fato, em caráter reservado. Peço ao colega que, por questão de ética universitária, valha-se deste relatório no Conselho Universitário, como lhe parecer melhor, mas não permita a divulgação destes fatos, sem conhecimento do D.A. da F.N.Fi.. Isso porque consideramos que a divulgação externa de ângulos isolados desse fato só poderia prejudicar os alunos desta Faculdade.

Aceite nossas saudações universitárias.

(as) José Augusto Guillon de Albuquerque”.

Eis alguns informes sobre os elementos do grupo, hoje atuantes no ISEB, na UNE e em outros setores da vida nacional:

Fausto Cupertino Guimarães — desquitado de Abigail Pereira Nunes (a “mocinha” guerrilheira presa há um ano no Equador), vivia com outra do grupo, H. H., deixando-a pela menor R. M., sua aluna no Pré-Vestibular;

M. S. — Milionária dona do carro que servia às bacanais do grupo;

F. N. C. — aluno desligado da Escola Naval;

Carlos Estevam Martins — apelidado de “Cavalo” (ele mesmo gostava de ser chamado assim), Presidente do Centro Popular de Cultura da UNE;

Wanderley Guilherme dos Santos — ex-presidente do Diretório Acadêmico da Faculdade Nacional de Filosofia, eleito pelos democratas, traindo-os imediatamente. Em sua gestão começaram as anormalidades na Faculdade. Representante, juntamente com Alberto Coelho de Souza e Abigail Pereira Nunes, da Faculdade Nacional de Filosofia no I Seminário da Reforma de Ensino promovido pela UNE. Atualmente escreve sobre política e golpes na série “Cadernos do Povo”, editados pela Civilização Brasileira, acompanhando seu mestre Vieira Pinto, também autor nos “Cadernos do Povo”.

Alberto Coelho de Souza — representante da Faculdade Nacional de Filosofia no I Seminário de Reforma de Ensino da UNE, orador dos diplomandos da mesma Faculdade, em 1958. Seu discurso causou repulsa a vários alunos e professores, devido ao conteúdo subversivo, valendo-lhe a publicação no jornal “O Semanário”, órgão conhecidamente comunista. Alberto hoje é um bom burguês.

Vários destes elementos, enquanto o inquérito prosseguia, adotaram a “operação casamento”, cumprindo ordens superiores para melhorar a situação.

Mas que fatos seriam aqueles, tão comprometedores para a Faculdade Nacional de Filosofia, caso caíssem no conhecimento do público? Eram as atitudes imorais daqueles alunos, auxiliados por professores, dentro da Faculdade, onde tinham livre acesso por serem ligados ao Diretório Acadêmico. Basta dizer, e só isso já basta, que o Diretor da Faculdade, durante o inquérito, ordenou que as salas só fossem abertas para as aulas, pois estas serviam para encontros amorosos, dos mais extravagantes.


 

VIII — CONGRESSO DE QUITANDINHA PRATICA ARBITRARIEDADES

 Em junho de 1962 realizou-se o XXV Congresso Nacional de Estudantes, em Quitandinha, tendo aberto a sessão o patrono Leonel Brizola, que proferiu um discurso revolucionário, semelhante aos pronunciados no CACO e nas emissoras sob a responsabilidade do Governo Federal. Afirmou Brizola que as desgraças do Brasil deviam-se ao “imperialismo ianque”. O nosso país, para ele, é formado por uma maioria não comprometida com os americanos — da qual ele faria parte — que precisa acordar para a realidade nacional, e por uma minoria ativa — da qual os elementos que compõem o Governo Federal fazem parte — comprometida com os trustes que dominam aquela maioria.

Ao mesmo tempo, enquanto falava do imperialismo ianque, provando suas limitações intelectuais, Brizola disse que admirava o modo de vida do povo americano e gostaria que o mesmo fosse possível no Brasil. Nesse momento, a assembléia ficou muda, não aprovando as palavras de seu patrono. O discurso do novo “líder”, de fato, externou sua mágoa para com os governos americanos, “pois estes são causadores dos males brasileiros devido ao abandono a que nos deixaram, enviando, depois da guerra, recursos só para a Europa”.

ARBITRARIEDADES EM QUITANDINHA

Nas sessões plenárias os oradores representantes da situação (UNE, JUC e PC), principalmente o Presidente da UNE, Aldo Arantes, atacaram os demais congressistas por discordarem da orientação da entidade. Os problemas tratados nas sessões foram os políticos, pois a UNE não podia se justificar dos desmandos que vinha praticando e da aplicação das verbas recebidas, nunca revertendo em benefício dos estudantes, mas em propagandas políticas e na manutenção de 500 elementos num Festival comunista dirigido por Moscou.

O Congresso caracterizou-se pelos entendimentos de cúpula, encontrando, seus dirigentes, dificuldades em penetrar no sul do país, região onde os estudantes estudam e dificilmente se afinam com os esquemas da UNE. As arbitrariedades praticadas foram várias. Os comunistas dirigentes do conclave impediram a circulação do “Jornal Universitário” e das publicações da Frente da Juventude Democrática. Os elementos da F.J.D. foram presos porque se atreveram a reclamar os desmandos de Aldo Arantes e seus apaniguados. Funcionou o Congresso com uma “Comissão de Segurança” ou “Polícia Popular”, semelhante à Gestapo, responsável pela implantação do estado policial em Quitandinha, impedindo a manifestação da oposição e promovendo a prisão de seus elementos.

JUC NA POLITIZAÇÃO DAS MASSAS

Amplamente divulgada — e agora rememoramos — foi a carta assinada por um tal de Betinho (Herbert de Souza), carta que trata da ação política da JUC e de seu objetivo em cooperar com a UNE. Publicamos o documento, repleto de erros, na íntegra:


“Finalmente podemos definir alguns elementos concretos de nosso encontro de Belo Horizonte:

1) A data será de 31 de maio a 1, 2, 3 de junho.

2) O temário será constituído de quatro temas fundamentais:

a) Fundamentos ideológicos do grupo. Apresentação de teses e direção dos trabalhos a cargo do Padre Vaz.

b) Caracterização sócio-econômica do Brasil, a cargo da equipe do Recife. Direção dos debates de Germano Coelho.

c) Organização de um plano de ação política. Exposição e direção dos debates a cargo de Almino Afonso.

d) Plano financeiro e sustentação do grupo a cargo da equipe de São Paulo. Direção dos debates a cargo de Paulo de Tarso.

3) Para esses debates solicitamos de cada grupo estadual a preparação para as exposições orais, como também documentos escritos a serem examinados como contribuição aos debates. Acreditamos que para todos os quatro itens da reunião cada grupo estadual poderia levar também de forma sistematizada suas contribuições por escrito. Lembramos que todas as decisões serão tomadas de comum acordo, após os debates. Cabe a cada grupo preparar-se com a antecedência possível para esse trabalho.

4) Pedimos também que antes do encontro a decisão dos representantes de cada grupo seja tomada em reunião em que se decidirá a respeito de nomes, posições a serem tomadas, sugestões, etc.

5) Lembramos mais uma vez a característica fundamental de ser o nosso grupo um movimento político ideológico, fundamentado numa ideologia própria, numa visão do homem e do universo, que sendo universal aspira ser um ponto de convergência e união de todas as forças para trabalhar pelo desenvolvimento integral do homem.

6) O secretariado provisório do encontro está em Belo Horizonte:

Vinícius Caldeira Brant
Rua São Paulo, 348, apto. 1003
Fone 2-0103 — Belo Horizonte

Betinho, continuando, fala da linha política a ser adotada no referido encontro secretariado pelo atual presidente da UNE:

7) Para efeito de discussão inicial, provisória portanto, submetemos aos companheiros algumas proposições que se localizariam ao nível de ideologia definidora de nosso grupo.

É um grupo ideológico, não confessional, visando a atuação política em sentido amplo definido:

A) A história humana como um processo evolutivo de superação dos determinismos e dos obstáculos ao seu desenvolvimento.

A História é tarefa do povo evoluído para a sua consciência concreta de sua situação concreta, é portanto, a dialética da libertação em busca da humanização total.

O sujeito da história é o povo universal não podendo ser identificado com caráter exclusivo a forças, partidos ou organizadas.

O homem como ser concreto, é consciência dos determinismos e da liberdade. Não pode ser concebido mutilado ou dividido em sua existência. Os valores humanos são universalmente dirigidos e atribuídos a todos os homens, tendo como condições básicas a reciprocidade e igualdade.

O atendimento das necessidades humanas é condição básica para seu desenvolvimento integral. São realizados ao nível do desenvolvimento das forças produtivas e das potencialidades de cada um e de todos.

Toda a consciência puramente idealista é omissão contra a realização concreta dos homens concretos.

Nessa posição diante da evolução humana se considera os determinismos específicos das forças materiais, os condicionamentos econômicos e sociais, considera também a especificidade da realidade humana, sua capacidade criadora, sua evolução permanente à libertação dos obstáculos ao seu desenvolvimento total.

Finalmente definimos o trabalho humano como fundamento primeiro da história humana. O capital é assim instrumento do trabalho não podendo jamais tê-lo como objeto de exploração.

Consideramos para a realidade brasileira:

B) A necessidade inadiável da luta pela superação da estrutura capitalista e de todos os seus efeitos na estrutura sócio-econômica. Causa histórica do subdesenvolvimento e dos entraves à emancipação econômico-social do nosso povo.

A falência dos partidos políticos como instrumento de promoção do povo e o compromisso de uma falsa democracia representativa, colocada a serviço de uma aristocracia econômica.

A necessidade da denúncia de grupos econômicos nacionais e internacionais que manipulam o poder.

A necessidade da denúncia imediata dos ideólogos reacionários e conservadores que tentam neutralizar o despertar do povo.

A necessidade imediata de revelar ao povo o alcance e a extensão de nossa realidade, dos obstáculos ao seu desenvolvimento e dos caminhos para a solução que a nosso ver só serão possível se nascidas do próprio povo, promovendo face a anarquia do capitalismo a planificação do socialismo, face a exploração do trabalho pelo capital a aplicação de recursos e capitais segundo os interesses das forças produtoras. Frente a falsa democracia das eleições “compradas” a verdadeira emancipação política do povo nas decisões políticas e econômicas.

Face a cultura privilégio de uns poucos a democratização real do ensino para todos, sem distinção e discriminações.

Postula ainda além de outros pontos importantes relacionados aos problemas da empresa, estatização etc. a necessidade imperiosa de uma reforma agrária sem soluções de compromisso com a classe dominante, que atenda aos reais interesses dos que trabalham na terra, os camponeses.

Finalmente considera a urgência de uma política externa independente concreta e definitiva com o mundo subdesenvolvido na condenação expressa ao imperialismo e ao colonialismo, geradores do conflito e do permanente clima de guerra mundial.

Nesse sentido e visando ao aprofundamento destes pontos e a concretização desta luta julgamos inadiável a formação de um movimento político nacional que se caracterize por:

C) Ser movimento amplo, com ideologia definida, englobando todos os setores de atividades visando a se constituir uma expressão de um pensamento organicamente definido e orientadores da luta revolucionária pela emancipação nacional.

Ser movimento organizado e disciplinado capaz de responder aos desafios da realidade nacional.

Ser movimento voltado para a nossa realidade em constante evolução, identificado com a luta do proletariado e do campesinato.

Como ponto de partida de uma exposição que será realizada pelo Padre Vaz submetemos aos companheiros estas teses para discussão. Ê evidente que não definimos de modo algum com isto a ideologia do movimento, simplesmente colocamos para discussão prévia, inclusive para facilitar o debate ainda nos estados, alguns pontos que a nosso ver são fundamentais. Com isso queremos iniciar um debate que se concretizará em Belo Horizonte.

HERBERT SOUZA
BETINHO


(assinatura a máquina)

Inicialmente, em matéria de português, grau zero. A redação de Betinho talvez se inclua no espírito novo, na nova visão da realidade. Ideologicamente, vemos uma mistura de lugares comuns e slogans marxistas que não conduzem a nada. Notamos uma incoerência marcante, aliás, característica dos líderes esquerdistas de hoje. Combatem eles o imperialismo, a classe dominante, o capitalismo, mas se esquecem de dizer que imperialismo, classe dominante e capitalismo estão no governo que eles defendem e que sempre tiveram o poder político nas mãos. A carta esclarece que a Juventude Universitária Católica é um grupo político, não confessional e no último parágrafo declara que não definiu sua ideologia. Evidentemente, a JUC não poderia se declarar marxista embora aja dentro da “praxis” determinada pelos agentes bolchevistas.

A JUC, quando entramos para a Faculdade, dizia-se apolítica e voltada para o apostolado católico. Atualmente ela apresenta esta linha de ação, declarando-se política e “católica de esquerda”. De Florianópolis, Francisco Mastella, jucista democrata, também denunciou, em entrevista publicada no “Jornal Universitário”, as manobras políticas da agremiação e a sua ação subversiva durante o Congresso de Quitandinha e na gestão do jucista Marcílio Krieger quando presidente da União dos Estudantes de Santa Catarina. Krieger deixou esta entidade depenada, com uma conta fabulosa para o novo Presidente, Mastella, pagar e, ainda, traiu os estudantes catarinenses, apoiando a candidatura Aldo Arantes no ano anterior, sem ouvir antes as bancadas de seu estado.

DENÚNCIAS MOTIVAM ABERTURA DE INQUÉRITO

No capitalista Congresso de Quitandinha, em que os congressistas beberam uísque, dançaram “twist” e viveram a “dolce vita” nos quartos, corredores e salões do Hotel, foi apresentado o filme “Cinco Vezes Favela” produção da UNE, no qual os “preocupados com a realidade brasileira gastaram Cr$ 2.600.000,00, quantia que poderia ter ido para uma obra social em ajuda à recuperação de alguma favela.

A Frente da Juventude Democrática, pelo seu Presidente J. Batista Gabriel, entrou com um mandado de segurança no Estado do Rio, justificando sua atitude com as seguintes denúncias: 1) ingerência declarada do Governo Federal nas eleições, através de Brizola que deu, dos cofres do Rio Grande do Sul, cerca de Cr$ 13 milhões para estudantes extremistas de outros estados participarem do Congresso (Brizola não negou o fato depois que o Sr. Rubem Berta negou que as passagens da VARIG tivessem sido ofertadas); 2) inexistência de segurança ao estudante, confirmado pela UNE, perante as autoridades de Petrópolis, pois a Polícia seviciou e coagiu elementos da oposição em plenário; 3) aparecimento de forças estranhas ao Congresso, representadas por organizações internacionais (Havana, Budapeste, Praga) que influíram nas decisões de cúpula; 4) falta de garantia aos estudantes que ficaram impedidos de falar por pressões e ameaças de “tropas de choque”, formada por elementos não-estudantes, como Jacob Gorender, homem de destaque do PC.

EMISSÁRIOS DE MOSCOU

Concluindo este capítulo vamos falar dos emissários enviados pela União Internacional dos Estudantes (a entidade comunista sediada em Praga) à Quitandinha que, ao regressarem a Paris, soltaram a língua e fizeram várias declarações referentes à comunização da América Latina e, principalmente, do Brasil.

Os objetivos do Konsomol são: 1) instalar solidamente a estrutura de seu “aparelho” (o Aparat) de propaganda e ação no seio da UNE; 2) tomar as alavancas do comando; 3) assegurar com meios monetários, provindos do Governo, certos núcleos “burgueses”; 4) formar “brigadas de choque” assegurando a proteção dos dirigentes comunistas e a eliminação eventual dos opositores; 5) obter apoio incondicional do Governo por meio de homens de confiança, colocados pelo Partido Comunista em importantes cargos públicos. Os agentes comunistas afirmaram que, no Brasil, há facilidade para a instalação deste plano, estando o mesmo em franco progresso.

A parte mais importante da exposição é a que se refere à estratégia e a tática da UIE nos países subdesenvolvidos com relativa industrialização, dos quais faz parte o Brasil. Infelizmente, no dizer dos agentes, a URSS não possui número suficiente de elementos especializados que possam, realmente, atuar no Brasil e demais países subdesenvolvidos. Neste caso, a finalidade não é de acelerar e sim de frear o progresso a que aspiram os países “capitalistas”. O grande empenho da URSS é o de entravar a formação de uma elite intelectual e técnica nas universidades. A tática da UNE, sob as ordens da UIE, consiste em sabotar o ensino superior para retardar a formação de novos grupos intelectuais. O objetivo da UNE vem sendo conseguido através das greves que, em algumas faculdades, poderão retardar a formatura de novos profissionais. Nesta manobra segundo ainda os emissários soviéticos, há uma tríplice vantagem para o comunismo: 1) permitir a sabotagem metódica do ensino superior em todos os países subdesenvolvidos; 2) a utilização dos estudantes grevistas nas manobras dos movimentos revolucionários, como se verifica no Brasil (lembramos as várias denúncias feitas relativas às aulas de guerrilha, para as quais a UNE vem arregimentando estudantes) e 3) esta tática favorece o recrutamento dos jovens universitários para os cursos especiais comunistas.

O problema para a URSS está no fato de o Brasil ser um país católico. Para contornar esta dificuldade, a UIE ordenou que se apresentassem os militantes como “católicos de esquerda”. Assim, há uma dupla vantagem para os comunistas: adquirem um campo mais vasto para as manobras e “comprometem” os católicos.

A prova do que dizemos está no espetáculo que nos oferece a situação nacional, incluindo o problema universitário, suas constantes greves, a atuação da JUC, etc.


 

IX — CONCLAVES ESTUDANTIS INTERNACIONAIS SÃO DIRIGIDOS POR MOSCOU

Os conclaves estudantis internacionais, sejam eles congressos, fóruns ou festivais, são realizados sob a orientação de Moscou, que dita as ordens à União Internacional dos Estudantes. A UIE, como já vimos, é uma entidade comunista sediada em Praga e encarregada de supervisionar as Uniões de Estudantes a ela filiadas.

Estudantes comunistas, com a finalidade de receberem instruções para a ação em seus países, participam dos congressos. Os festivais são feitos, exclusivamente, para agradar estudantes que, através da técnica da “simpatia e amizade” se transformam em novos soldados da causa revolucionária marxista. Por ocasião de um Festival da Juventude Sul-Americana, realizado em Moscou, no ano de 1954, o jornal chileno “El Mercúrio” assim se expressou: “O Festival, uma nova armadilha para atrair a juventude a serviço do imperialismo soviético, sob o pretexto de bailes, jogos e exposições, politiza, principalmente, jovens sul-americanos”.

São famosos estes festivais. Os comunistas corrompem a mocidade com gentilezas, como viagens, passeios e dinheiro. Em 1951, estudantes brasileiros foram obrigados a fugir de Berlim Oriental por terem protestado contra a doutrinação a que estavam sendo submetidos pelos líderes do conclave. Os jovens haviam ido ao Festival, ingenuamente, pensando que o mesmo se tratasse de um encontro fraternal, conforme anunciava a propaganda.

Os congressos e festivais são feitos em países satélites da URSS ou em cidades sul-americanas, no caso específico de ser um conclave ínter-americano. A UNE escolhe seus elementos representantes, obedecendo ao critério da “maturidade política”, reservando-se ao direito de vetar credenciais a estudantes católicos ou democratas, mesmo que estes sejam credenciados pelas suas universidades.

A título de ilustração, vamos falar de alguns conclaves, de poucos, mas que servem de esclarecimento sobre a ação subversiva da UNE e entidades congêneres da América Latina.

FESTIVAIS

No XX Congresso da UNE a Frente Nacionalista Brasileira (agremiação comunista) arquitetou um plano para fazer “imbecis burgueses” contribuírem para a representação brasileira num Festival a ser realizado em Moscou. Usando o nome do Professor Irineu de Albuquerque Melo, como Presidente da embaixada, a UNE conseguiu grande soma em dinheiro de várias firmas, entre as quais Coca-Cola(Cr$ 50 mil), Light (Cr$ 200 mil) e a Livraria Civilização Brasileira (Cr$ 50 mil). O Festival, realizado em agosto de 1957, trazia o pomposo título de VI Festival Mundial da Juventude e dos Estudantes pela Paz e Amizade, tendo como representante brasileiro, em sua preparação, Orlando Gomes, e como Secretário Geral, Chauduri Suganau, o estrangeiro expulso do Brasil em 1956.

Entre 27 de julho e 7 de agosto de 1962 teve lugar em Helsinque o VII Festival Internacional da Juventude e dos Estudantes. Alguns festivais, como este, são realizados em países neutros, isto é, em países cujas entidades estudantis não estão filiadas a nenhuma outra entidade de caráter político (por exemplo, à UIE). Anteriormente houvera um Festival em Viena e agora este em Helsinque, ambos à revelia dos estudantes austríacos e filandeses, sendo que 97% dos estudantes filandeses repudiaram a idéia de um conclave político-partidário ter abrigo em seu país. Mas a UIE e a Federação Mundial da Juventude Democrática, entidade comunista sediada em Moscou, fizeram realizar o festival em Helsinque, não respeitando a autodeterminação dos estudantes filandeses.

A esse festival comunista o Brasil enviou uma delegação de 250 representantes, para uns e 500 para outros (não se sabe ao certo o número de participantes), incluindo elementos de sindicatos e artistas que desfilaram pelas ruas da capital filandesa fazendo propaganda do Brasil. Resta-nos saber quem pagou viagens e estadas, pois não sabemos da existência de nenhuma verba especial dada pelo Governo, à delegação brasileira. Se houve a verba, não sabemos qual o montante.

CONGRESSO DA UIE EM PEQUIM

Baseando-nos no relatório apresentado pela UNE no V Congresso da União Internacional dos Estudantes, realizado em Pequim, no periodo de 4 a 14 de setembro de 1958, sabemos que a organização do Congresso foi perfeita e deveria servir de exemplo aos congressos nacionais. A delegação brasileira foi muito bem tratada pela Federação Chinesa de Estudantes e pela UIE que lhe ofereceu as passagens até Pequim, não tendo a UNE nenhuma despesa com os seus enviados.

Os problemas tratados no Congresso foram muitos e entre eles a luta nacionalista, afirmando que os estudantes brasileiros muito trabalhavam neste sentido, pois “a marcha do colonialismo sobre a América Latina se fazia sentir acentuadamente”. O representante da UNE em seu discurso abordou a sua corajosa luta contra o subdesenvolvimento e o colonialismo do país, fazendo com que a UIE enaltecesse a UNE pelos seus méritos. Eis como se referiu a UIE em relação à UNE: “Considerando, a) que a luta vitoriosa dos estudantes brasileiros para arrancar o país do subdesenvolvimento; b) que a campanha de nacionalização nos diversos setores da economia nacional é um dos aspectos dessa luta; c) que a vitória obtida pelo povo brasileiro pela nacionalização do petróleo achava-se ameaçada pelas forças imperialistas; d) que a atuação de “trusts” e forças nefastas impediam a nacionalização do setor de energia e reformas, como a agrária, que mantém o povo na miserabilidade; e) que a UNE, por sua ação contra as manobras do imperialismo americano, consubstanciado na recente visita do Secretário de Estado ianque ao Brasil com o fim de fazer pressão sobre o Governo Brasileiro, para que este modificasse a sua política do petróleo, foi vítima de uma campanha caluniosa por parte da imprensa vendida aos interesses do imperialismo, a fim de que o povo brasileiro lhe retirasse o apoio” a UIE resolvia apoiar os estudantes brasileiros pela sua “justa luta anti-americanista e denunciar as manobras do imperialismo, visando impedir a emancipação econômica do Brasil”.

A UIE prometeu ajudar a UNE na obtenção de sua gráfica, o que nos leva a crer que a Editora Universitária tenha sido possível graças ao dinheiro russo, muito bem aplicado no Brasil, pois a referida editora só vem publicando livros marxistas. A UNE, que se diz “nacionalista”, leva os problemas do Brasil para congressos promovidos pela Rússia, de onde recebe elogios, dinheiro e conselhos. Mas que “nacionalismo” é este?...

CONGRESSOS SUL-AMERICANOS

Em 1959 houve o III Congresso Latino-Americano em Caracas. Um fato, digno de nota, prova as atitudes serviçais da UNE ao comunismo e a categoria de seus presidentes. A PUC do Rio de Janeiro se fazia representar pelo acadêmico Emílio Nina Ribeiro, credenciado pelo Diretório Central dos Estudantes de sua Universidade. Sua credencial, porém, para valer no Congresso de Caracas, deveria ter um visto da UNE. O presidente da entidade, Manuel Conrado, inicialmente, negou-se a dar a validade alegando que Nina Ribeiro “não tinha idoneidade ideológica para representar uma universidade brasileira”. O estudante ameaçou ir aos jornais denunciar o acontecido. Conrado, então, com medo, deu a sua permissão, credenciando Nina Ribeiro a participar do Congresso.

Emílio Nina Ribeiro viajou rumo a Caracas e logo depois da sua chegada à capital venezuelana, recebeu a visita de um estudante paulista, Mastruobono que, cumprindo determinações de Conrado, revogou o reconhecimento da credencial concedida no Rio. Oficialmente, em conseqüência, Emílio Nina Ribeiro não participou do conclave, mas deu entrevista aos jornais denunciando a manobra da UNE. A delegação da Colômbia, também, não foi reconhecida pelo mesmo motivo: ser católico e democrata.

O Congresso de Caracas votou as seguintes teses: 1) Supressão das universidades católicas, por serem formas de “trusts”; 2) Controle absoluto dos meios de produção; e 3) Supressão da família. Este último item foi tão grave em suas teses atentatórias à moral e, principalmente à dignidade feminina, que a própria delegada cubana retirou-se do recinto em prantos. No Congresso circulou uma revista pornográfica, No nos tiente, contendo o pensamento dos congressistas sobre a moral e o casamento. Aliás, é preciso que se diga: revistas pornográficas são obrigatórias em todos os conclaves estudantis e, não só as revistas, mas, também, as práticas.

CONGRESSO TEM QUE SER POLÍTICO

Os festivais e congressos aqui relatados são exemplos dos muitos que se efetuam todos os anos sob os mais variados títulos. A característica fundamental dos conclaves estudantis, participados pelo Brasil, é a política e a própria UNE o confirma.

Em 1959 houve a VIII Conferência Internacional de Estudantes em Lima. O Congresso contou com estudantes ingleses, americanos e escandinavos, todos pertencentes a países onde os estudantes desempenham a sua verdadeira missão. Os referidos estudantes foram acusados pela UNE de não terem se dedicado a problemas de importância, isto é, a problemas políticos, questões de imperialismo, colonialismo, etc. É a UNE, em seu relatório, que reconhece haver duas entidades de estudantes e, conseqüentemente, duas formas de estudantes, ambas representativas: “Filiar-se a uma seria negar a existência de outra e, seria, antes de resolver, aguçar ainda mais a separação e as contradições entre elas”. A UNE quis dizer com isso que seus congressos têm que ser políticos, de pregação e práticas marxistas e quando outros países se fazem representar, países livres, os congressistas subdesenvolvidos, que professam ideologias que não admitem o debate, não se sentem à vontade para mostrar a sua pseudo-sabedoria.


 

X - ISEB ALICIA ESTUDANTES E ORIENTA A UNE

As universidades brasileiras sempre foram insuficientes nos trabalhos de pesquisas sociais. Intelectuais brasileiros, das mais variadas tendências, desejavam a criação de um centro de estudos brasileiros a exemplo dos existentes na Europa e nos Estados Unidos. Aproveitando esta idéia apareceram em cena o Sr. Roland Corbisier e um grupo de oportunistas que, auxiliados pelo Fórum Roberto Simonsen, criaram o Instituto Superior de Estudos Brasileiros (ISEB).

O ISEB nasceu de repente, enganando a muita gente. Homens de fortuna, inclusive, contribuíam para a formação de um centro de estudos marxistas. Corbisier, enriquecendo e tirando o maior proveito possível do ISEB, apesar de toda a sua confusão mental, levava a sua “Sorbone brasileira” para onde queria. O Prof. Almeida Sales, mestre integralista de Corbisier e um dos idealizadores do ISEB, traído pelo aluno, portador de visíveis sintomas de daltonismo ideológico, percebeu a manobra, declarando que o ISEB “nascia como um verdadeiro partido político” a serviço de um grupo oportunista.

ORIGEM DO ISEB

O Instituto Superior de Estudos Brasileiros foi instituído pelo Ministério da Educação e Cultura, por decreto n° 37.808, de 14 de julho de 1955, com a finalidade de ser um centro de altos estudos políticos e sociais. A entidade era dirigida por um Conselho Consultivo, composto de 50 membros, ao qual competia a orientação e o planejamento dos cursos e publicações a serem realizadas. Pelo decreto 41.500 de 15 de maio de 1956, o Conselho Consultivo foi extinto, sendo substituído por uma Congregação formada pelos cinco professores da época, responsáveis pelos departamentos culturais. Assim, cinco elementos, em vez de cinqüenta, passaram a dirigir o ISEB, o que possibilitou levar a instituição para uma determinada direção.

Apoiado e prestigiado pelo Governo do Sr. Juscelino Kubitschek, o ISEB se propôs a adotar uma filosofia desenvolvimentista que encobria, grosseiramente, o confuso marxismo de seus dirigentes. O “desenvolvimento” do ISEB era e ainda é tão sinistro que, não fosse a seriedade do assunto, tornar-se-ia engraçado. A instituição nascida com Corbisier e seus amigos do “grupo de Itatiaia” (o grupo intelectual integralista) criou uma linguagem própria: a terminologia marxista-leninista adaptada ao desenvolvimentismo de Kubitschek. O ISEB, em sua fase inicial, então, passou a funcionar com comunistas, homens ambiciosos de poder pessoal, racistas, conservadores, industriais, homens de “trusts”, etc, todos “criando” uma cultura “especificamente” brasileira. Estes ingredientes misturados e batidos na vasilha da Rua das Palmeiras davam um bolo de gosto sui-gêneres, comido normalmente por uns e causando engasgos a outros. Quem lesse as publicações do ISEB, por mais que quisesse, não conseguia atinar com a sua doutrina. Os mais esclarecidos, contudo, afirmavam que aquele comuno-nacionalismo-desenvolvimentismo, se vingasse, traria sérios problemas à Nação.

O que se passava, de fato, no ISEB, durante o Governo Juscelino, era mais lamentável do que pode parecer. Justamente, ao pensarem os seus membros em desenvolvimento, procuravam fazer do ISEB um núcleo contra o desenvolvimento. Por um lado os comunistas procuravam impedir através de seus “altos estudos” um possível desenvolvimento e, por outro lado, os homens de fortuna e ligados a indústrias e “trusts”, procuravam uma forma de não promover a riqueza em novos setores, o que propiciaria a outras pessoas a sua situação econômica. Para estes homens era necessário que o poder econômico se restringisse a uma pequena minoria da qual eles faziam parte. Mais tarde, pelo desenrolar dos fatos, pôde-se comprovar o intuito dos isebianos.

DENÚNCIAS AO ISEB

O jornal “O Globo”, em 25 de março de 1960, publicou um suplemento sobre o ISEB. Várias denúncias foram feitas aos cursos ali ministrados.

Em 1956, o Comandante Aristides Pereira Campos Filho, cumprindo ordens do Estado-Maior das Forças Armadas, estagiou no ISEB. Para a conclusão de seu curso apresentou a tese de que o comunismo era fator de entrave ao desenvolvimento nacional. Seu trabalho foi recusado pela direção do ISEB. O comandante Aristides Pereira Campos Filho levou ao conhecimento da EMFA o ocorrido. O Gal. Otávio Mazza mandou que os fatos fossem apurados, ficando tal encargo sob a responsabilidade do Brigadeiro Clóvis Travasso. A conclusão, após pesquisas e interrogatórios, foi enviada ao Gabinete Civil da Presidência da República e depois ninguém mais soube o que aconteceu.

Antônio Carlos Villaça escrevia, no dia 8 de novembro de 1959, no “Jornal do Brasil”, que o ISEB poderia ter professores marxistas, pois isso era uma questão pessoal que merecia respeito. Mas, grave era o fato de o ISEB ser órgão do Governo e sustentado pelo país. “A questão — escrevia Antônio Carlos Villaça — ganha assim um outro aspecto que interessa a Nação inteira: um órgão do Governo mantido por verbas do Governo e por generosa (e talvez assustadora) subvenção de industriais... está a serviço da filosofia marxista de vida. É grave.” O artigo ainda fazia um apelo aos padres jesuítas, convidados a fazerem conferências no ISEB, que não as fizessem, que agissem como os professores Alceu Amoroso Lima e Gustavo Corção. Ambos convidados do ISEB haviam se negado a dar cobertura, com os seus nomes, àquela “vigarice”.

REFORMAS NO ISEB?

Muita gente se movimentou para reformar o ISEB. O Boletim Cambial de 29 de dezembro de 1959, em sua seção “Confidencial” trazia o seguinte parágrafo: “Fontes ligadas à Presidência da República adiantam que estão quase concluídos os estudos que determinarão uma completa reforma da estrutura do ISEB, elaborados sobre os dados e informações fornecidos pelo Conselho de Segurança Nacional e por determinação do Presidente1 da República. O Ministro Clóvis Salgado tem envidado todos os esforços para emular aquele trabalho, pois é um dos mais ardorosos defensores daquele instituto e de suas ideologias.”

Na época sondamos várias pessoas ligadas ao Gabinete do Ministro da Educação. Todos comentavam os desmandos do ISEB e o trabalho que seus dirigentes davam ao MEC. Mas o Sr. Clóvis Salgado, de acordo com a regra bem brasileira — um ministro da Educação no Brasil poderá conhecer tudo, menos educação — não admitia que o ISEB, a “Sorbone Brasileira”, fosse atingida. A criação da entidade, não importando para o que fosse, era uma conquista sua, de seu ministério.

Em resumo, o ISEB tem um corpo de professores admitidos sem concurso e escolhidos ao gosto de seus dirigentes. Todo o pessoal do ISEB ganha muito bem, às custas do povo e, demagogicamente, reclama que o Brasil não tem escolas, que a universidade é privilégio, que os professores precisam fazer concursos, etc. O Brasil está nesta situação mas ostenta um Instituto de Estudos Brasileiros que em nada colabora para a resolução dos sérios problemas brasileiros e difunde e aprimora a extrema-esquerda, cumprindo assim o seu grande papel: arregimentar estudantes para as suas aulas, ministrando-lhes a doutrina marxista-leninista.

FAMA DO ISEB NO ESTRANGEIRO

Convém lembrar que a fama do ISEB ultrapassou as fronteiras brasileiras. O “Diário Ilustrado” de Santiago do Chile, a 5 de outubro de 1959, publicou um artigo sobre a importancia do ISEB como órgão de orientação política no Brasil e afirmou: “Infelizmente foi criticado com razão que o ISEB carece de uma verdadeira unidade ideológica. Seus integrantes professam ideologias diferentes que não chegam a integrar-se na forma do todo harmonioso na fachada de nacionalismo com que se apresenta o Instituto. O mais grave de tudo, ainda mais numa entidade de tanta influência, é a tentativa que desempenha nela elementos de idéias marxistas que, com hábil pretexto de nacionalismo e estudos sociológicos, difundem dissociadoras ideologias comunistas.”

E no Brasil não há comunismo... Os que o combatem o fazem emocionalmente, têm fobia, conforme dizem certos elementos de má-fé ou profundamente ignorantes. Estas denúncias e comentários datam de algum tempo. Agora o ISEB está muito mais poderoso. O Sr. Darcy Ribeiro, Ministro da Educação na época do plebiscito, por exemplo, encomendou ao ISEB um planfleto “cultural” sobre os males do parlamentarismo, panfleto que, segundo declaração do “premier” Hermes de Lima, não foi caro, nem atentou contra a dignidade de ninguém, pois custou Cr$ 300 mil. O panfleto, “inocente”, entre uma série de erros históricos e ofensas a pessoas do Estado da Guanabara e das Forças Armadas, afirmava que o reacionarismo liquidava com o Brasil, sendo preciso voltar ao presidencialismo para que nosso país “pudesse ser” maravilhoso.

RELAÇÕES DO ISEB COM A UNE

Pode parecer estranha a nossa acusação ao ISEB quando o que nos interessa é a UNE. O ISEB, porém, não foi aqui jogado ao acaso. Esta instituição congrega e alicia para os seus cursos alunos universitários, sob a justificação de “ampliação de cultura”. A UNE considera o ISEB a entidade mais evoluída do país e a única capaz de equacionar os problemas nacionais. A literatura político-social brasileira e internacional da UNE é expedida pelo ISEB. São as publicações isebianas, as mesmas que, alguém, com espírito, já as classificou de “isebestas”.

O ex-diretor do ISEB, deputado Roland Corbisier, está em todas as manifestações dos estudantes da UNE. O atual diretor da instituição, Álvaro Borges Vieira Pinto, é o que nós já conhecemos. O Sr. Jacob Gorender, militante comunista da UNE, não sabemos há quanto tempo, já em 1959 dava um ciclo de conferências sobre “Materialismo Dialético” no ISEB. Gorender, ao que supomos, para atuar na UNE deve ser estudante e, no entanto, há quatro anos aparecia como conferencista de um centro de estudos superiores...

Há dúvidas quanto as relações ISEB-UNE?


 

XI — ...E OS PODERES DA REPÚBLICA PATROCINAM O FESTIVAL SUBVERSIVO

CENTRO POPULAR DE CULTURA

Trazemos, agora, alguma coisa da “arte” dirigida, empreendimento da UNE, que conta com o auxílio do Governo. Através de uma pseudo-arte, rotulada de democrática e popular, a UNE faz sua catequese, não só nas universidades, mas em fábricas, favelas, escolas secundárias, centros agrícolas, sindicatos, etc.

A União Nacional dos Estudantes, conforme ficou provado no decorrer destes capítulos, tornou-se uma entidade político-social, empenhada em promover a revolução “democrática” no país. Tudo que ela faz tem o objetivo político, inclusive a arte, “arte política”, visando “esclarecer as massas”. E o Governo contribuiu, generosamente, para a criação do Centro Popular de Cultura, órgão da entidade pseudo-estudantil que, entre outras figuras, conta com a direção de Carlos Estevam Martins, o mesmo envolvido no inquérito de 1959 da Faculdade Nacional de Filosofia e proibido de lá pôr os pés.

O CPC da UNE se propõe a levar a arte ao povo. Diz-se formado por intelectuais de vanguarda que procuram transmitir a “verdadeira arte” ao povo, indo às faculdades e aos sindicatos. Os fundamentos e objetivos do CPC estão expostos no jornal “O Metropolitano”, do dia 11 de agosto de 1962. Afirma o jornal que esta arte “é de caráter popular e revolucionário, afastando-se da arte de elite, por não possuir conteúdo intelectual apurado nem esmeradas formas estilísticas”. Fazer arte com o povo e para o povo é conscientizar as massas. É fazê-las ver que o poder está nas mãos de poucos. A arte torna-se uma forma de exprimir a necessidade de uma revolução. É a arte popular.

O teatro feito pelo CPC representa, segundo o mesmo jornal, “a arte política de agitação social”. Para aumentar a agitação social a UNE criou a UNE-VOLANTE, o que permitiu a fundação de vários CPCs pelo Brasil, “dando maiores possibilidades de organização positiva à arte revolucionária”.

Vejamos algumas peças do CPC:

AUTO DOS 99 POR CENTO — peça anticlerical, contra as instituições, cuja mensagem é incutir nos jovens o desrespeito às autoridades, a subversão da ordem e promover uma péssima e de muito mau gosto crítica à situação universitária,

AUTO DOS CASSETETES ~ peça que “traduz os argumentos das forças retrógradas que se contrapõem à argumentação estudantil”;

AUTO DO TUTU ESTÁ NO FIM - o problema do abastecimento, “criado” pelo Governador Carlos Lacerda, é colocado após “sérios” estudos feitos com elementos dos sindicatos (Roberto Morena, Dante Pelacani, Hércules Correia, etc).

A UNE, é preciso esclarecer, fracassou redondamente na apresentação de suas “peças populares” em meios operários. A primeira e única peça apresentada numa fábrica, revoltou os trabalhadores que, imediatamente, trataram de retirar suas famílias do local, escandalizados com os palavrões e a pornografia da “arte política”. É um erro pensar que as classes menos favorecidas do Brasil participem de imoralidades e aceitem determinado vocabulário.

Além das “peças teatrais”, a UNE fez representar em Quitandinha e, recentemente em vários cinemas da cidade, o filme “Cinco Vezes Favela”, cujas críticas os especialistas em cinema já se encarregaram de fazê-las. Filme que explora os aspectos negativos da vida brasileira, é vazio em conclusões. Como toda a dialética marxista, parte de denúncias reais, mas alterando a História, incute a revolta, ao invés de trazer soluções condizentes com a autêntica democracia.

Recentemente ainda, a UNE lançou o LP “O Povo Canta”, com músicas que pretendem ser “bossa nova”, nas quais vozes esganiçadas berram (é este o termo certo) que o povo quer educação, quer comida, mas o americano não deixa. O disco foi vendido nas faculdades ao preço de Cr$ 500; é um disco muito popular, como vemos.

A UNE mesma confessa que esta arte popular não possui conteúdo intelectual nem formas estilísticas. Concluímos que a entidade criou uma “arte” que exprime a ignorância e, seguindo o raciocínio comunista, se o povo é ignorante é preciso oferecer-lhe algo que se adapte à sua condição. É preciso oferecer ignorância ao povo. O lamentável em tudo isso é que, no ex-Distrito Federal, a capital da política, da cultura e não sabemos de mais de quê, existem coisas assim, feitas abertamente, com a cobertura de políticos, usuários das regalias capitalistas, que extorquem quantias fabulosas da Nação para agradar uma turma que mal sabe se dirigir a si própria, mas pretende dirigir “as massas e o país”.

AS VERBAS DA UNE

O Deputado Raimundo Padilha, em 10 de agosto de 1962, pronunciou na Câmara dos Deputados um excelente discurso sobre a UNE. Declarou o Deputado que qualquer pessoa de responsabilidade deseja a existência de uma associação de estudantes que zele pela Constituição e pelos anseios de liberdade e cultura do povo. Mas “o que temos diante de nós, é uma juventude que se desintegra através de um processo psicológico, de um delírio ideológico, no qual parece que a mocidade quer desertar de nosso país”. Acentuou o parlamentar que falava em nome dos novos novos e não em nome dos novos velhos, “dos novos esclerosados, uma minoria de agentes do bolchevismo internacional, uma minoria que não sabe pensar por si mesmo e escreve a infâmia que é a Carta do Paraná”.

Não mencionamos a “Carta do Paraná” anteriormente porque falamos de A Questão da Universidade, no momento o que há de “mais avançado” em matéria de “reforma” universitária. A Carta do Paraná, porém, é a cópia do que foi feito em Cuba, onde a Federação Estudantil Universitária, até 1959, conseguiu atribuir-se ao direito de aprovar e vetar professores (manobra do terço no Brasil), criando uma Junta Superior de Governo em substituição à Congregação Universitária e exercendo a reforma universitária no sentido bolchevista, recebendo as instruções da UIE de Praga.

Grave em tudo isso é o fato de a UNE ter muito dinheiro e ser bastante poderosa para não prestar contas de sua atividade e da aplicação de verbas. No sentido de apurar as atividades da UNE em relação à aplicação de dinheiro, o Deputado Raimundo Padilha pediu uma comissão parlamentar de inquérito.

Segundo as declarações do Deputado Raimundo Padilha, a verba recebida pela UNE e instituições congêneres a ela filiadas, somente na proposta atual para o exercício de 1963, é de 2 BILHÕES, 146 MILHÕES E 450 MIL CRUZEIROS. No orçamento de 1962, a verba reservada e autorizada para a UNE e anexos atingiu a 1 BILHÃO, 726 MILHÕES E 9 MIL CRUZEIROS. A distribuição da verba, em alguns casos específicos é a seguinte: viagens a Praga, Moscou, Havana, etc, CR$ 5 MILHÕES; manutenção da sede CR$ 2 MILHÕES E MEIO; restaurante, CR$ 382 MILHÕES E 950 MIL; e a UNE, especificamente, tem mais de CR$ 15 MILHÕES, sendo que CR$ 3 MILHÕES são para o CPC e CR$ 4 MILHÕES para as obras de “orientação estudantil”. Paira uma dúvida: se a UNE tem apenas Cr$ 15 milhões, como manteve seu pessoal em Quitandinha onde, em poucos dias, gastou cerca de Cr$ 30 milhões da entidade?

Mas a UNE não recebe dinheiro só do Governo. Várias são as firmas (até americanas) que contribuem para a célula do PC, rotulada de União Nacional dos Estudantes. E muito dinheiro vem da Rússia, pago em dólares, aos burguesíssimos militantes da entidade e aos seus instrutores nas escolas superiores.

APENAS ALGUMAS PERGUNTAS

Depois de tudo que observamos e contamos, o que não constitui o todo mas apenas parte das atividades e propagandas da UNE, perguntamos, uma vez que a entidade diz não ter verba:

— Quem financia seus elementos nas viagens e estadas em hotéis luxuosos, como presenciamos em Quitandinha?

— Como foi possível a aquisição da Editora Universitária, cujas máquinas custaram Cr$ 7 milhões e foram adquiridas da Gráfica Leal Ltda., e qual a real transação que possibilitou esta compra?

— De que maneira a União Metropolitana dos Estudantes, até a gestão passada, intimamente ligada à UNE, pode manter, a partir de 1962, o jornal “O Metropolitano” em circulação independente?

— Qual a lei que possibilitou à mesma UME, através de seu ex-Presidente José de Souza, vetar o Restaurante do Calabouço aos alunos da Escola de Medicina e Cirurgia do Rio de Janeiro, só porque seus alunos resolveram não mais reconhecer, na UNE e na UME, entidades suas representantes? O restaurante não é sustentado pelo Ministério da Educação?

— Por que os elementos da Diretoria da UNE e seus apaniguados recebem salários? E por que estes mesmos elementos, quando deixam a UNE, geralmente se empregam em repartições do Governo, percebendo ordenados altíssimos?

A UNE, esta é a realidade, não se preocupa com os estudantes e provoca o divisionismo entre eles. Existe para fazer política, conforme a confissão de seus dirigentes. A entidade é tão “evoluída” e “democrática” que recebe estudantes de países comunistas alegando “estreitar laços de amizade”, mas, em combinação com a União Brasileira de Estudantes Secundários, convida o Coral “Palm Beach School Choir” para uma apresentação em sua sede, não distribuindo, porém, os convites, e fazendo os jovens americanos esperar mais de duas horas no auditório vazio. Estes são os evoluídos da UNE, os “neo-humanistas” que praticam baixezas deste gênero porque os jovens cantores são de nacionalidade americana e, provavelmente, responsáveis pelo “imperialismo ianque que escraviza o Brasil”.

Tudo isso é grave. Sabemos que todas as revoluções comunistas tiveram a orientação dos intelectuais e de jovens formados em universidades. Sob a falsa pregação de externarem o desejo das massas, os intelectuais de esquerda preparam a juventude universitária, bajulando-a e encantando-a, com a promessa de que altos postos lhe serão dados no “novo regime”. Nas escolas superiores arregimentam-se estudantes sob a alegação de ser necessária “a formação de uma elite intelectual que domine as massas”. E as autoridades assistem a tudo, mudas, tranqüilas, oferecendo, ainda, vantagens e dinheiro...


 

CONCLUSÃO

Concluo este trabalho dando uma explicação aos leitores. Não compete ao repórter fazer análises profundas ou apresentar as suas teses sobre os assuntos que expõe. É evidente que ao fazer um levantamento das atividades da União Nacional dos Estudantes e denunciá-las, movia-me o desejo de expor ao público a importância negativa da entidade em relação ao progresso, à ordem, enfim, à vida do país. A UNE, hoje, é um simples instrumento de subversão. Não é instrumento de uma revolução necessária, humana, progressista, mas de uma subversão inspirada em moldes soviéticos, que encontrou em Cuba o seu primeiro passo para a pretendida ocupação da América Latina. Mas, mesmo não interpretando os fatos narrados, claros em si mesmos, permiti-me criticar, em poucas linhas, acontecimentos marcadamente facciosos que têm contado, em diversos momentos, e incompreensivelmente, com o apoio do Governo Brasileiro, através de seus principais dirigentes e responsáveis.

Aos que me interpelaram, considerando um tanto violentas as minhas reportagens, esclareço que não houve violência, a mínima sequer, da minha parte. Violência houve e há, por sinal, muita, como puderam ver os leitores. A violência, porém, existe, por parte da própria UNE. Tudo que escrevi aconteceu e os relatórios da entidade estão mais completos e mais minuciosos do que meus escritos.

Não me interessava, como repórter, atacar diretamente pessoas, salvo as que, de fato, estão bastante comprometidas com as pregações e práticas da UNE. Falei de ações ocorridas públicamente e, por negligência ou propósito, não levadas a sério e esquecidas. É de competência das comissões do Governo, da Polícia e do Departamento de Segurança, investigarem os nomes e tomarem as medidas previstas em Lei.

Quando resolvi, por uma questão de fidelidade aos meus princípios, romper a greve universitária em prol de um terço de alunos nos colegiados universitários, em agosto de 1962, tive a maior prova de minha convicção: grande parte dos movimentos grevistas brasileiros de reivindicações (e especialmente aquele), têm a cobertura do comunismo internacional. Sim, porque um jornal de Havana estampou em sua primeira página a minha fotografia, acompanhada de um comentário, referindo-se a mim como uma “estudante reacionária, paga pelo Departamento de Estado Americano para prejudicar movimentos nacionalistas do Brasil”. Ora, pergunto, mesmo que tal fosse verdade; — e se é gostaria que o Departamento de Estado me enviasse os honorários pelo serviço prestado — o que Cuba e Fidel Castro têm a ver com isso? Qual o interesse de Fidel Castro, marxista-leninista confesso, em certos movimentos internos do Brasil? E quem envia a Havana noticiários “tão completos” sobre fatos tão simples, como aquele de uma desconhecida universitária “furar” uma greve?

A situação é essa. E minha maior angústia, igual à daqueles que sonham com um Brasil melhor e mais responsável, reside na incoerência e no absurdo que, diariamente, lançam-se sobre nós. Pertenço à geração nascida na ditadura e só conheço os mesmos políticos fabricados em seu período, não sendo poucos, entre eles, os que falam em pretensos golpes e compactuam com o comunismo. São eles os responsáveis pela situação brasileira e são eles que incutem em nossa juventude idéias superadas ou subversivas. São eles que, donos do poder econômico e propiciadores da miséria do povo, demagogicamente, mais atacam o poder econômico e mais falam em miséria do povo. Os estudantes, a falada classe privilegiada, principalmente em intelectualidade, deixam-se levar pela conversa e, sem explicação plausível, se curvam ao domínio de uma atuante minoria, militante das hostes de um partido internacional, que é instrumento de uma forte e aguerrida nação, que está disposta a dominar o mundo pela força e que sabe, mais do que ninguém, se utilizar da democracia para destruí-la totalmente. Não me cabe fazer a análise aqui destes problemas, pois outro livro teria de ser escrito, e este não é o momento oportuno para tal.

Deixo, apenas, os fatos. Cada um de nós, democratas e revolucionários de verdade, temos uma missão a cumprir. Um pouco de minha missão, sem falsa modéstia, está neste livro, obra despretensiosa mas séria. Porque sério é o perigo que correrá a Nação quando os doutrinados pela UNE dela se apossarem, coisa que, para eles, parece estar começando a acontecer com êxito.


 

©2008 — Sonia Seganfreddo

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Maio 2008

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