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POEMINHAS

para musicar ou não

Mauro Gonçalves Rueda

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Poeminhas para musicar ou não
Mauro Gonçalves Rueda

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maurorueda5@hotmail.com
maurorueda@uchoanet.com

copyright ©2003 — Mauro Gonçalves Rueda


 

POEMINHAS
PARA MUSICAR
OU NÃO

(Poesia infanto-juvenil)

Coleção “Joyceana” — Volume 5

MAURO GONÇALVES RUEDA

São José do Rio Preto — 1.999


 

 

Para Maricy e minha filha, Joyce de Castro Rueda
Para Rita Bertelli, Ana Letícia (Rosa), Eliana Groto Ferreira.
Júlia e Giovani Bolsoni Bertoni e seus pais, Alcíone e Humberto.
Mais: ao casal André e Maria da Graça Bolsoni e seus rebentos.
Ainda, para Fábio, Fabrício, Rafael, Fernanda e Elaine Cristina.

 

 


 

POEMINHAS PARA MUSICAR OU NÃO

 

01

O cachorrinho gania
e chorava noite e dia.
— Pô, que zorra é essa?!
Gritava um que não dormia.
E o cachorrinho chorava
e gania dia e noite.
Um que era esquentado
não suportou nos ouvidos
o açoite:

meteu uma paulada na cabeça
do dono do cãozinho.

Levou o cão para casa
e fez dele um passarinho
E o cachorrinho nunca mais chorou
E o cachorrinho nunca mais ganiu.

O que foi que aconteceu?
Ninguém sabe.
Ninguém viu.


 

02

Era uma vez um macaquinho
piradinho, gozador.

Vivia de galho em galho
sonhando em ser um beija-flor.
Cantava, cantava,
estridente o diabinho.
Até que levou uma estilingada
bem no topo do galhinho.

Deixou as penas de lado
voltou a ser macaquinho.
Cada macaco no seu galho,
ninguém confunde com passarinho


 

03

Matilde a taturana
solta fogo pela venta.
É mentira, pois Matilde,
nem do fogo ela é.
Ela é manduruvá
que vai ser um borboleto.
Foi o Zé quem confundiu
que Matilde era mulher.
Mas Matilde não é ela,
pois Matilde ele é.
Não põe fogo pelas ventas
se nem do fogo ela é!...


 

04

Era uma vez uma barata
uma barata tão menina.
O barato dela era zanzar
muito louca pela noite,
curtindo o embalo legal
de cheirar naftalina.


 

05

Plantei no fundo de casa
um pé de jabuticaba.
Nasceram dois de angicos
e um terceiro de goiaba.
Agora todos os dias
repouso à sombra do abacateiro
e fico a chupar laranjas
— que nunca plantei —,
o dia inteiro!


 

06

Urubulino era um passarinho
esquisito, desengonçado.
Posto um dia na coleira,
não latiu; nem se tocou.
Urubu que é urubu
quer ser livre para voar.
Urubu é bicho doido
e não parece com minhoca!


 

07

Se lingüiça fosse cobra,
sapo era aviador.
Se girafa fosse poste,
morcego era bimotor.
Como uma coisa não é outra
somente bobo para confundir
a perereca lá do brejo
com sapo boi que nunca vi.


 

08

O hipopótamo fez regime
para ficar mais elegante.
Só porque a “hipopótama”
o chamou de elefante.
— Ela toda atrapalhada
mais parece uma baleia.
Dizia o hipopótamo
que não batia das “telhas”.
Era um casal tão estranho,
que parecia uma mistura
de elefante com baleia,
disputando beleza-pura
por volume de gordura!


 

09

O anum voou, voou, voou...
Anum preto, anum branco,
não importa qual a cor.
Se a cor fosse importante,
ia dar o que fazer.
O anum com cor de nada
e o nada com cor de anum.
A cor mais bela é aquela
que não existe quando se vê.
Porque é bela e não importa
quantas penas tem um anum
enquanto a sua vida viver.


 

10

O pirilampo, pobrezinho,
frente ao espelho a indagar:
— Por onde andas, pirilampa?
por favor, onde andarás?

E a pirilampa passeava
na noite a pirilampear.
Até que numa longa noite
de tanto que pirilampeou,
percebeu a pirilampa
que sua pilha se acabou.

E a história assim termina
quando é noite de luar,
um pirilampo pirilampeia
uma pirilampa vive a indagar

— Onde andas, pirilampo?
Por favor, onde andarás?


 

11

Era uma vez uma andorinha
que voava a vagar.
Tão sozinha pelo azul
sem saber para onde voar.

Não sabia a pobrezinha
em que direção ficava
o Norte ou o Sul.
Então, sem se decidir,
conformada voou, voou....

Foi-se embora pelo azul
e nunca mais voltou.


 

12

O pato quêm-quêm,
o boi mu-mu,
o gato miau-miau,
o cachorro au-au,
o sapo fon-fon.....

E o menininho espertinho:
— Sapo não é carro!
Carro é quem buzina.

Menino danado,
quem te ensinou?
Meu sapo é padeiro
por louvável vocação,
entrega nas casas,
bem cedinho o pão.
Meu sapo é moderno:
é um sapo pra frente
é um batuta de bom
e, ali vai o meu sapo
fazendo o seu fon-fon-fon-fon!


 

13

Uma abelhinha abelhuda
vivia de flor em flor,
buscando no pólen o néctar
zunzumbizando o seu motor.

Porém a abelhinha
que era muito abelhuda,
vivia em enrascadas,
enroscando o seu ferrão.

Ferroava toda zangada
quem nela fosse tocar.
Um dia errou na mira
e à si própria ferroou.

Então o zangão teceu
o seu dito popular:
— Quem com ferro fere,
com ferrão será ferido.

E hoje, a abelhinha abelhuda
já não ferroa mais.

Aquele que bole com abelha,
só pode levar ferroada.
Porque abelha nunca aprendeu
como é que se dá um coice.
Ou então, uma patada.


 

14

Era uma borboleta
que vivia a borboletear.
Pairava por sobre os jardins
com suas asas coloridas,
a flanar, flanar, flanar...

Era uma espécie rara
e veio o homem com sua cara
de palhaço colecionador.
Apanhou a pobrezinha
e tuf! ela espetou.
Que coisa mais estúpida!
colecionar-se borboletas!

O bicho mais besta
dos animais é o homem.
Diz ser esperto,
mas é bestalhão.
E, se mantêm as aparências,
há muito perdeu o coração.


 

15

O sono foi-se embora
porque o gato comeu.
Miou e fez algazarra,
até a paciência esgotar.
Levou umas boas palmadas
e foi quietinho ninar.

Mas eu, perdi o meu sono
que o gato comeu no jantar.


 

16

O cata-vento gira, gira,
vai girando em parar.
Porque o vento que assobia
uma cantiga pelo ar,
é um vento morno, amigo,
do tempo a suspirar!


 

17

Uma florinha
no campo floria.
O orvalho caía,
o sol despertava,
e o dia surgia.

Um passarinho pousou
em minha janela.
um galo ensaiou
um “bom-bom-dia!”.
(O galo era gaguinho).


 

18

Estrela, estrelinha
lá no céu a luzir:
ilumina os caminhos
daqueles que estão por vir.

Ilumina o menininho,
a menininha, o passarinho.
Ilumina o cãozinho,
a professora, o presidente.
Ilumina toda a gente
e a natureza a sonhar.

Estrelinha pequenina,
se depois de iluminar
todo, todo o universo,
um raiozinho lhe restar,
— bem clarinho a piscar —,
lembre-se também de mim,
que daqui de minha janela,
estou sempre a te chamar!


 

19

Quem-quem-quem!
Quem-quem-quem-quem,
vai o patinho cantando assim.
Cisca daqui, bica de lá,
lá vai o patinho, feinho a cantar.

Se ele é feio, bonito não é.
Nem vai crescer, para um dia mudar.
Desengonçado, é somente um patinho
nunca foi cisne e jamais o será.

Mas o que importa é que o feio patinho
nunca foi triste e nunca será.
E toda a sua vida,
quem-quem-quem!, vai cantar!


 

20
Poema de Tereza Candolo e Mauro Rueda(*)

Lá vai ela a rebolar
misse galinha bicaqui e bicalá.
Com sua nuvem de penugens
a ciscar.

Lá vai ela a rebolar
empenujando o lugar.
Quando senta, saem debaixo
os pintainhos a pipilar...

Porque o papo da galinha
de tão cheio varre o chão.
E coitado do pintainho
que levar um papadão!

Lá vai ela a rebolar
misse galinha bicaqui e bicalá.
Vai charmosa a ciscar
e os galos sonham a espreitar.

Misse galinha convencida,
ergue o bico para o ar.
E os pintainhos vão atrás,
com cuidado a pipilar.....

(*) – Teresa Candolo ilustrou a revista com letras e acordes do show musical: “O Reino Encantado”.
É formada em Educação Artística e Letras pela PUC-Campinas.


 

21

Mafaldinha a minhoca
já não regulava bem
paquerava um gravetinho
que chamava de “meu bem!”.

Todo dia bem cedinho
Mafaldinha na ilusão
saia de um buraquinho
num canteiro de agrião.

E sorria bonitinho
palpitando o coração.
E o graveto bem quietinho
não dizia sim, nem não..

E com isso, Mafaldinha
vivia na ilusão.
Se pintava, se ajeitava,
rouge, blusch e batom...

A sainha bem rendada
anel, brinco, que paixão!
Mafaldinha, coitadinha,
era feliz na ilusão!

Letra Musicada por Mauro Rueda para a peça infantil “Mafaldinha a Minhoca”.
(Editada pela eBooksBrasil.org).


 

22

Olha o boi!
E a chuva caindo.
O boi vai andando,
contente, vai rindo.

Vai fazendo mú,
mumú, vai mugindo.
O boi pai-de-todos,
o boizinho amigo.

A vaca, o filhote,
deitados no chão.

São todos contentes,
todos estão rindo.
Todos fazem mú,
pra chuva caindo...

São todos felizes
e o sol vai surgindo.
A grama crescendo,
e a boiada carpindo.

Pastando, mugindo
e fazendo mú-mumu:
a boiada sorrindo.


 

23

Eu quero ser um passarinho voando,
a nuvenzinha branquinha lá no céu.
Eu quero ser o riachinho pelo campo,
um menininho desenhado no papel.

Eu quero ser livre como toda a natureza;
ter um caminho de esperança para brincar.
Andar de braços dados com toda essa beleza,
que há na infância de amor para se dar.

Eu quero ser
como Deus me fez
livre e criança
como um rio a correr...

Eu quero ser assim como o vento que passa;
a flor se abrindo em sua cor, sempre bela a sonhar.
Quero abrir os meus braços para a vida —,
como quem abre o coração, por tanto amar.

Quero esse canto de esperança pelos ares,
pairando sobre o planeta com amor.
Poder sentir a paz que juntos semeamos,
cuidar de toda a infância ainda em flor.


 

24

A abelha zumbe-zumbia,
sobre a flor tão pequenina.
Um velhinho e uma menina
passeavam pelo jardim.....

A tarde bem mansinha
vinha caindo docemente.
Os passarinhos chilreavam
pelas árvores, alegremente.

Lá no céu, Jesus sorria,
ao ver toda a natureza:
tão bonita,
tão contente!


 

25

Eu não sou uma sereia
e nem sou um elefante.
Não sou uma limusine
e nem sou um avião.

Não tenho cara de papagaio,
nem me pareço com minhoca.
Nunca fui um porco-espinho
nem pareço um feijão.

Eu sei o que não sou,
eu sei o que não quero ser.
O que sou é o que não sei.
Então me diz, então me diz:
oh Beatriz,
oh Beatriz:
o que serei?

Será que sou uma abelha
pousando num girassol?
Ou serei aquele sapo
que coaxa ao pôr do sol?

Será que serei o que não sou?
Ou já fui o que não serei?
Puxa, mas que baita confusão!
Será que você sou eu?
Ou será que eu sou você?


 

26

Era uma vez, um menino só;
era uma vez, uma fada e só..
Quem não conhece essa história
preste atenção, vou contar agora:

Era uma vez um belo leão,
era uma vez um pato, atenção:
a fada, o pato, o menino, o leão,
brincando de roda no meu coração.

Um dia o menino, cresceu e se foi
levando a fada, o pato, o leão.
Hoje envelheço, mas tenho a canção,
trazendo o menino, para o meu coração.

E novamente eu brinco a sonhar
se tenho uma fada, um pato, um leão,
agora não sou, mais sozinho não......


 

27

Um, dois, um, dois....
vai marchando o batalhão.
Faz um caminho no chão,
carregando muitas folhas,
vai para casa o batalhão.

São duzentos mil formigas,
trabalhando sem cessar.
Correm, correm formiguinhas,
que o inverno vai chegar.

Um, dois, um, dois...
Vai marchando o batalhão...

E no sol do meio-dia
a cigarra a cantar:
muito alegre e afinada,
canta, canta sem parar....

Canta, canta cigarrinha
para o dia alegrar.
Canta que a vida é boa
para quem vive a cantar.

Um, dois, um, dois..
canta canta a cigarrinha....
Um, dois, um, dois,
vai marchando o batalhão....


 

28

Se sou meio pirado
desengonçado e trapalhão:
não, não tenho culpa,
não tenho culpa, tenho não!

Eu vivo num mundo louco!
Eu tô correndo, tô atrasado.
Será que eu alcanço, mãe,
alcanço aquele lotação?

É guerra, é violência,
tanta política, exploração.
O pai tá sempre preocupado,
a mãe sem tempo e eu, na mão.

Eu cresço assim todo neurótico,
a cara pregada na televisão.
Fico paquerando a “Mara”
que “Maravilha”, que ilusão!

Será que quando eu crescer
vou ser famoso, vou ser bom?
Vou ser “Rock-Man”, pirado,
desligado e “trapalhão”?


 

29

Canta, canta canarinho:
na goiabeira a chamar,
seu amiguinho pousado,
na laranjeira, o sabiá!

Lá no alto, bem distante,
paira a gaivota a cantar.
Vai voando docemente,
o beija-flor sempre a beijar.

Em meu peito um passarinho,
sonha sempre em voar
pra ganhar o céu, as nuvens
e ser livre a brincar...


 

30

Cadê você?
Cadê meu boi,
pra brincar de roda
num tempo que foi:
de nossos pais,
de nossos avós?
Eu faço ciranda
você vem rodar.

Quem traz um sorriso,
tem sempre pra dar.
Quem entra na roda,
aprende a cantar.
Quem canta é contente
e aprender a sonhar.....
Quem canta é contente
e aprende a sonhar.....

Cadê a lua
me dando a mão?
Cadê as crianças,
cadê meu pião?
Cadê fogueirinha,
e o belo balão:
subindo, sumindo,
lá na imensidão!?

Letra Musicada por Mauro Rueda para o show musical “Roda-Ciranda”


 

31

Todo dia de manhã,
ainda cedinho ia trabalhar.
Era só um passarinho
que voou um dia
para nunca mais voltar.

Tinha ainda o sol poente,
uma esperança em seu fundo olhar.
E ele assim, tão tristemente,
no seu cantinho sempre a sonhar:

Rever um dia a sua terra,
onde cantava o amigo sabiá —,
por entre as folhas de uma palmeira:
chuva de prata, raio de luar..

E é só, só solidão
dentro do seu coração.....


 

32

Já é tão tarde, vou me deitar.
Faço uma prece e fico a olhar:
lá no infinito, uma estrela a brilhar
e num segundo, me pego a sonhar...

Vejo Jesus, sorrindo a pensar,
em ser criança, para poder brincar.
Cantando ele apanha, a luz do luar
e ensina aos anjos, o verbo amar.

Quando amanhece, me faz acordar.
O sol entrando, mansinho no ar,
pela janela que dá bem para lá
onde Jesus me disse a cantar:
— Só é feliz aquele que amar
e feito criança, sorrir e sonhar!


 

33

Quá-quá...quaquaquaquá!
Quá-quá...quaquaquaquá!

Eu sou dona pata
com muito prazer;
e sou a modelo
mais bela da TV.

Requebro com charme,
sou muito dengosa.
Canto em verso e prosa
e quem quiser me ver,
precisa marcar
entrevista bem antes
com o meu empresário:
sou muito importante

Pelas passarelas
coração a fremir,
meu compasso certinho
todo o mundo quer ver.

Eu sou a mais bela:
a mais-mais elegante.
Até posso ser burra
e só falar besteiras;
mas possuo meus dotes:
sou toda fricotes,
sou toda certinha
no vídeo da TV.


 

34

Que belas flores
há nos canteiros
daquela casinha!
O jardim bem cuidado,
com todo carinho,
floresce, floresce,
o ano inteirinho.

Da rua modesta,
a velha casinha —,
dentre todas a mais bela,
pertence à vovozinha.

Dizem que ela anda
o dia todo a caducar.
Só porque conversa
com as plantinhas
que ela passa
todo o tempo a cuidar!

Caducando ou não,
a vovózinha vai plantando:
regando, cuidando,
como se fosse o jardim,
o seu próprio coração!


 

35

Cristovinho, o cachorrinho,
era todo desengonçado.
Vivia fazendo festas,
e era muito engraçado.

Corria atrás das crianças
mas só queria brincar.
Latia para o vizinho,
com sua cauda a abanar.

Serelepe e manhoso
antes mesmo de apanhar,
já gania e chorava.
E a gente com dó o deixava,
sem ao menos o tocar.

E com isso ele folgava,
até mesmo no sofá.


 

36

Vinha uma centopéia
caminhando lentamente.
Encontrou-se com um besouro
que zunia alegremente.
Intrigada a centopéia
perguntou ao besourinho:
— Porquê não alças vôo,
e ficas aí a zunir?
E o besouro respondeu:
— Tenho medo de cair.
A centopéia coçou uma orelha
com quase cinqüenta mãos,
e pôs-se a seguir caminho
intrigada com o fato.

E o besourinho, malandro,
logo pôs-se a sorrir.
Alçou vôo para longe,
pensando lá com seu tato:
— Já pensaram se a centopéia
tivesse que usar sapatos?


 

37

As nuvens brincavam
e desenhavam coisas.
Animais, montanhas,
arvores, caminhão.

Depois se apagavam,
desmanchando lentamente
as figuras que formavam
do amanhecer ao sol poente.

Diziam os meninos,
que era São Pedro escultor
quem esculpia com as nuvens,
suas fantasias de ator.


 

38

Mariazinha plantou
um pé de sonhos sob a janela.
Um pé-de-sonhos bonito
que cresceu rapidamente.
Florido, na noite clara,
feito a luz de uma estrela,
entrou por uma fresta
pequenina da janela.

De mansinho pulou a cerca,
do sono de Mariazinha
e lhe deu tão lindos sonhos
que ela nem quis despertar.

— Desperta Mariazinha!
Vinha seu vovô chamar.

E lá vai Mariazinha,
para a escola estudar.
“Avoada” com seus sonhos,
que jamais vão lhe deixar.


 

39

Dormia a princesinha
no castelo a sonhar.
Com um reino encantado,
e que fosse só amar.

Sem leis ou injustiças,
sem guerras, ou fome, ou dor.
E crianças, saltitantes,
pelos jardins sempre em flor.

Sonhava com passarinhos,
cantigas de bem-querer.
Um reino sem ter intrigas,
gostoso de bem-viver.

Sonhava a princesinha
que era muito pobrezinha.
Era somente uma menininha,
que morava em uma casinha.

Uma casinha bem pobre
que abrigava o seu viver.
Seu sonhar era tão doce,
tão bonito de se querer...


 

40

Tinha uma paixão de menino.
Que descobre o amor de repente
e corre a vestir a calça comprida
(a única — uma rancheira. Hoje
elas são chamadas de jeans).

Amor pela amiguinha das irmãs:
rostinho corado de maçãs.
Tão doce que eu sonhava,
ao seu lado sempre estar.

Foi a primeira namorada.
E ela jamais ficou sabendo.
Lucéia Botini que fugiu e casou
e nunca mais a vi.

Também não importa
se ela envelheceu
e eu, menino, jamais
cresci!


 

41

A garotada correndo,
a bola quicando no campinho esburacado.
Pernas finas, nos calções
encardidos, esfarrapados...

E a gente que sonhava
e sonhava, nem imaginava
que crescer, ser adulto,
era renunciar à felicidade.

A felicidade que, correndo atrás da bola,
estava sempre,
sempre ao nosso lado.


 

42
(Para Manuel Bandeira)

Rondozinho de estrela
brincando lá no céu:
ilumina o meu caminho,
no branquinho do papel.

E faz oh! meu rondozinho,
bonitinho a brilhar:
como os olhos do anjinho,
em meu peito a cantar.


 

43

Uma rosa bonitinha
outro dia me nasceu.
Bem pertinho da janela e,
da janela eu vejo o céu.

Colorida e bonitinha,
ela vive a sonhar.
O orvalho vem caindo,
estrelinha a brilhar.

— Ei! (Me chama a roseira).
Um beija-flor sempre a beijar.
— Olha que linda esta rosa,
que floriu pra te agradar?

— Oh!, rosinha, que gracinha!
Eu também vivo a te ver.
Porque és a mais bonita
das flores que já vi nascer!


 

44

Estrela, estrelinha,
brilhando lá no céu!
Estrela ilumina,
o meu sonho de papel.

De papel picadinho,
que o vento vem soprar.
E vai sempre girando,
brincando pelo ar.

Meu sonho pequenino,
na palma da tua mão.
Vai pousar, vovozinho,
— qual fosse um passarinho —,
que fugiu bem mansinho
e levou um carinho,
que eu guardava há muito,
dentro do meu coração.


 

45

Oh João, oh Joãozinho!,
me diga que peixe é,
esse peixe na areia,
a andar de marcha-à-ré?

Maria, Mariazinha,
isso não é peixe, não!
É somente um caranguejo
andando na contra mão.


 

46

Lá vai o Jaburu tão desgastado
porque ele já nasceu muito cansado.
Lá vai o Jaburu a resmungar,
porque hoje vai ter que trabalhar.

Lá vai o Jaburu desengonçado
com cara de sono e todo invocado.
O nosso Jaburu nasceu sem asas,
parece um passarinho mas não é.

Porque Jaburu também não é peixe,
mesmo sendo escamoso como é..
Mas nosso jaburu é um bom menino,
embora tenha cara de ladino.

O Jaburu é um cara inteligente,
embora seja assim, meio demente.
Willian o Jaburu vive a sonhar,
que nunca mais vai ter que trabalhar.


 

47

Mil estrelinhas eu via
luzindo na imensidão,
sentado sobre a calçada,
a palpitar o coração.

Colecionava figurinhas,
gibis, sonhos e então,
um dia eu percebi
que havia trocado tudo,
por uma nova coleção...

Era uma coleção estranha
que fazia a infância minguar.
Era um baú repleto
de ilusões que eu vi juntar..

Aos montes, com o passar
dos anos. E tudo ficou
lá atrás: estrelinhas, figurinhas,
sonhos...Sentados numa calçada
que já nem existe mais......


 

48

Humildezinho o passarinho,
a menininha, o vovôzinho,
abençoados sempre serão.
Porque são puros de coração.

Abençoados os pequeninos,
frágeis, tementes a Nosso Senhor.
Mansos e justos, abençoados
por Deus que, os guarda com o Seu Amor.


 

49

Eu vi um riachinho
correndo a cantarolar:
cantigas de bem-querer,
cantigas de bem-amar!

Distante fez uma curva
sonhando a se encrespar.
Era a brisa que docemente,
seu dorso ia acariciar.

E o riachinho se foi
correndo pelas campinas.
Cantando e crescendo, um rio
se fez, a mirar o mar.

O mar lhe abria os braços:
— Bem-vindo, amiguinho! — Pôs-se a troar.
E o riachinho que fez-se rio,
rindo foi juntar-se ao mar.

E o mar batendo na praia
alegre a cantarolar:
cantigas de bem-querer,
cantigas de bem-amar.


 

50

Tique-taque, tique-taque!
o relógio sem parar,
vai marcando, vai marcando,
as horas do meu sonhar...

Quando eu era bem pequeno
quase um nada eu nadava
na barriga da mamãe.

E, feito um reloginho
fazia meu tique-taque,
tique-taque sem parar.
Reloginho que mamãe,
não cansava de escutar:
orgulhosa e feliz,
na barriga a carregar.


 

51

Fiz um poeminha
todo, todo atrapalhado.
Desses que, meio sem jeito,
caminham desengonçados.

A professora disfarçou
um sorriso encantado...
Meu poema se escondeu,
todo, todo envergonhado.

E nunca mais confessou,
o amor que ele sentia,
pelo sorriso disfarçado
que a professora tinha.
Que era meigo e encantado.


 

52

Possuíamos mil sonhos
de cavaleiros armados,
princezinhas encantadas,
castelos assombrados,
dragões fumegantes,
gigantes iracundos,
que um vovô amado
(Que nem percebíamos alado)
nos contava todas as noites.


 

53

Quando crescemos
nos damos conta
de um sonho perdido.

Por isso é difícil
escrever para crianças,
se já não temos sequer,
no peito aquela dança....

que havia um dia
— na pureza inocente —,
de nosso coração.

E a vida, de repente,
de soslaio nos observa,
por uma fresta das memórias.

A infância foi-se embora.
Agora sim, sinto medo,
um medo terrível
do bicho papão.

Pois sei que ele passa
o tempo todo rondando,
rondando, rondando,
o meu coração!


 

54

O que será de mim,
meu pé de aipim?
O que será da infância,
com tanta modernidade?

Com cara de tacho,
observo o espaço
por onde trafegam
naves e nuvens.....

O que será de nós
que ainda cremos
no velho amor?

Ligaremos tomadas;
zupt, sintonizaremos
o amor descartável
e faremos inveja
aos sonhos passados?

O que será de mim
em meio à tanta, tola
confusão?
Eu que ainda guardo,
da infância, as sementes,
nalgum canteiro em um canto
do meu pobre coração...?!


 

55

Meu São João da fogueirinha
crepitando ao luar:
traz estrelas pro terreiro,
nos empresta um sonhar.

Meu São João do busca pé
da batata na brasa, no chão,
vem nos dar a sua mão;
ensina os caminhos do coração.

Meu São João-Xangô, menino
do brasileirinho popular,
vem proteger as criancinhas
que só fazem por amar!

Meu São João já bem velhinho,
cofiando as barbas lá no céu;
lá se vai meu balãozinho
— todo feito de esperanças —,
nas dobrinhas do papel!


 

56

Um sábio sonhava
sozinho sentado
sob um céu súbito
sabendo semente
seus sonhos sonhados.

O sábio sozinho
singrava em silêncio...
Súbito céu,
se abre solene...

E o sábio se espanta
e freme temente.
Descobre, entrementes,
que sua sabedoria
é quase nada.

Contrito faz reverência
para o incognoscível.
Para o infinito que há
para lá do infinito que se sente.


 

57

Ia pelos prados
pastoreando o pastorzinho.
Apascentando ovelhinhas
que ninguém podia ver.

Sob outeiros o pastorzinho
sentava-se para beber.
Divisando as colinas
que ficavam mais para lá.

Com suas roupas já puídas,
cantarolava o pastorzinho;
dizendo bom dia ao sol,
acarinhando os passarinhos.

Cantando sua cantiga,
que ninguém podia ouvir;
arrebanhando as ovelhinhas
desgarradas, sob o luar.

Ninguém podia ouvir,
ninguém podia ver,
as ovelhinhas são os meus sonhos,
que apascento até o sol nascer.


 

58

Cavalinho, cavalinho,
cavalinho alazão!
Relincha na estrebaria,
bate as patinhas no chão.

— Tá com fome, cavalinho?
— Tá com sede, ou será
que divisando as campinas,
sonha, sonha em trotar?

Cavalinho fiz arreio
de camurça e de prata;
ou será que é de lata
essa prata a brilhar?

Não importa, cavalinho!
Quero ver você trotar;
e, num trote bem mansinho,
chegar em nenhum lugar!


 

59

Palhacinho engraçado
deu uma cambalhota e caiu.
Ele fez TUM! No tablado
seu pulo saiu errado.

Olhou, mediu e tentou
outro salto executar.
E foram tantas as risadas
da menininha a zombar.

Tão teimoso o palhacinho
revidou com uma pirueta;
foi um tombo esborrachado
que ele fez uma careta.

A garotada encantada
em meio à risada aplaudiu:
o palhacinho fez reverência
e atrás da cortina sumiu.


 

60

Lá vai o menininho
procotó, procotó, procotó!
Num cabo de vassoura,
veloz assim não há.

Eia! Eia! Cavalinho!
Lá vai ele a galopar.
Vai salvar uma donzela,
na tribo dos “Cataplás”.

Antes que sua beleza
da tribo vire o manjar,
procotó, ele tropeça
e no chão, põe-se a chorar!


 

61

Uma bruxinha era uma vez
danadinha que ela só
sua vassoura tem motor
de aspirador de pó.

Alakazim, paratibum
uma magia ela fez...
Mas sua magia é descartável
e não dura nem um mês.

Katipumba! Cataplam!
Vapt-zupt! Brocotó!
Suas palavras quase mágicas
em sua língua dão um nó.

Tizumpá! Isso é magia?
De varinha encantada?
Qual o quê! Isso é vassoura
quando sofre uma trombada!

Letra Musicada por Mauro Rueda para o show “Roda-Ciranda” e transformada em conto infantil no volume I de “Histórias da Infância”.


 

62

Eu vi um garnisé
ciscando lá no terreiro
e daquele tamaninho
quer ser dono do puleiro.

Um dia, eu vou contar
o que foi que aconteceu:
um galo índio, bravo,
no terreiro apareceu.

O garnisé cantou,
estridente e ardido;
o galo índio, doido,
bateu forte e decidido.

E o garnisé, coitadinho,
ficou todo encolhido.

E passou a tomar fermento
para um dia então crescer.

Cisca, cisca, resmungando:
— Um dia ele vai ver!
Vou crescer e ficar forte
e boto esse animal para correr!


 

63

Oh pirata, piratinha
levado como ele só
toc-toc-toc-toc.....
vai batendo o seu sambinha
com uma perninha só.

Se uma perna é de pau,
mentira que ele inventou.
O gancho em sua mão,
também é de brincadeira...

Danadinho, com cabo de vassoura,
e a cueca do papai,
inventou sua bandeira
de pirata na banheira.

Mais tarde leva uma coça
e apronta um pampeiro.
Desenterra o seu tesouro:
— facas, garfos, alicate —
num canto do galinheiro.


 

64

Malaquias é maluco
mas maluco de dar nó.
É o que diz a vovozinha,
tão velhinha a bocejar,
sentadinha na varanda
dizendo “eu não tô gagá!”.

Malaquias todos dizem,
tem um parafuso solto.
E escapa algumas marchas,
só anda em ponto morto.

Foi vovô quem inventou
que Malaquias é qual gente;
mas Malaquias não é ele,
Malaquias ela é.

Vovô diz que é Fordinho
Vovó diz que é Chimbica:
Chimbica ou Fordinho,
só anda mesmo de marcha-à-ré.

Malaquias desligado
não esquenta, nem se dá
ao trabalho de mover-se.
Vai pra mais de vinte anos
que ele nem sai do lugar.

Pra andar só empurrado,
ou puxado por um boi.
E é por isso que ele ia:
mas não vai e, nunca foi.

Vai ficar ali encostado,
bem juntinho ao portão.
Enferrujado para sempre,
vendo o mundo mudar.


 

65

Ora vejam, crianças!
Um arco-íris no céu.
No fim há um pote de ouro,
no começo um anjinho a pintar.
O fim, fica atrás lá da serra,
o começo é bem mais para lá.
Daquela nuvem branquinha,
que mais parece algodão...

É lá também que os anjos
brincando, dançando, cantando,
inventam uma nova canção,
misturam em sete as cores
do arco-íris, num só coração.


 

66

Porquê vive o gatinho
o tempo todo a brincar?
Saltitante, serelepe, o gatinho
correndo para lá e para cá...

Ora, ora, mas vejam:
quanta algazarra aprontou!
Pulando sobre a mesa
uma xícara derrubou.

Foram caquinhos que voaram
pela cozinha toda limpinha.
Por isso o gatinho
merece umas palmadinhas.


 

67

Pula, pula a pulguinha
tão sedenta a espreitar,
um pedaço da canela
onde sonha ir picar.

E no lombo do Totó,
faz sua ronda matinal;
cobiçando do bebê,
gordurinha sem igual.

Da vovó uma pancinha
do vovô o barrigão,
a pulguinha seleciona,
seu almoço, seu jantar.....

Da empregada na cintura,
pretende se deleitar;
na mamãe não se arrisca,
que ela sabe exterminar.

Uma pulga tão pelintra,
uma pulga saltitante,
uma pulguinha malandra,
a mamãe sabe apanhar......


 

68

Um tatu-bola
rola estrada
afora.
Bola, um tatu,
a estrada rola
afora.
Afora
um tatu
a bola rola
a estrada
e vai s’imbora.


 

69

A íris do arco
íris
em sete
cores
mergulhava
no riachinho
sôfrega.

As cores
do arco
tragavam
íris
num canto
do olhar.


 

70

Oh que riozinho
corre a cantarolar!
Manso, um menininho
parece sonhar.

Meu Jesus Cristinho,
como vou contar
aos filhos que não tive
como era belo
o rio menininho
que de tão sozinho
meu coraçãozinho
pobre, fragilzinho,
faz sempre brotar?!


 

71

Cantiguinha de roda
da infância perdida.
São Francisco pobrezinho
meu coraçãozinho passarinho
traz uma asa ferida:
já não pode mais voar!


 

72

Um dia reizinho
sem castelo ou reinado
montei em cavalo alado
e fui m’imbora pelai.

Que me chamem
os adultos e os heróis;
nem dragões
ou bicho papão temerei!

Não perceberam ainda
que minha história
nunca finda?
E todo o segredo,
de meu sonho
é outro sonho
que um dia desses, sonhei!.....


 

73

Quem quer um coração?
Moderninho a esquiar,
por entre nuvens de algodão,
que nas barbas de São João,
Jesus ensinou-me a sonhar.

Quem quer um coração?
Cansadinho, atrapalhado,
que bate-bate apressado,
sem ter onde chegar.

Quer quer um coração?
De melão, de alecrim.
Que, embora nem saiba,
de tão grande, tão fundo,
parece não ter mais fim.

Quem quer um coração?
Bobinho a saltitar..
não sabe se chora ou ri
nem me cabe cá dentro do peito
de tanto e tanto amar!


 

74

Meu Deus, me deixa
voltar no tempo...
No tempo, um tantinho só,
para que eu possa,
sonhar outra vez,
quietinho ouvindo historinhas
no colinho da vovó!


 

75

Queria ser a eterna criança
para não ter que jamais
sair dessa dança.

Andar por ai, todo lugar,
e da esperança
uma trança apanhar.

Fazer fogueirinha
nas noites de São João,
e ter passarinho cá no coração.

Ser criança sempre a brincar
na roda do tempo e nunca passar.
Para o outro lado que existe
quando a criança desiste
e se vai para sempre
para não mais voltar.


 

76

Uma estrela vai brilhar
bem no alto, lá no céu,
e há que derramar seu brilho
num cantinho do papel.

E por um caminho longo
um carro de bois vou desenhar;
borboletas pelos campos,
e o passaredo a cantar.

Mas eis que amanhece
e por entre nuvens já desperta,
resplendente o sol amigo
e a estrela a se apagar.

Sabiá na laranjeira,
um menino pra brincar,
na porteira da fazenda,
eu também sei desenhar.
E no meio da paisagem
quase sem perceber,
eu desenho um girassol
que nos chama pra viver!


 

77

Toquinho de gente,
o que estás a dizer?
Com tantos gestos,
e esse enrolado linguajar?

Falas tanto pelos cotovelos,
entre um sorriso e um olhar.
O que dizes oh! pequenina,
que mais pareces sonhar?

Que importa se não aprendestes
ainda as palavras e que sons,
seriam mais belos que tropeços
da língua em teu te expressar?

Fala, fala, Toquinho de gente!
Que meu coração está a escutar,
e, se ainda nada pronuncias,
vêm-me de teus lábios o que de mais belo
eu posso na vida escutar!


 

78

Que menininha dengosa,
tímida no cantinho a cismar!
Com sua cartilha da escola,
parece um anjo a sonhar!

Transborda-me o coração,
em festa, que vive a chamar:
— por ti, oh doce menina,
quietinha, num canto a sonhar.

Segura uma flor nesta mão,
com a outra acena no ar;
depois me sorria mansinho,
um carinho que vive a brincar.

Brinca de roda, filhinha,
num sonho que vivo a sonhar...
Enquanto eu faço essas tranças,
de um pai que vive a esperar!


 

79

Um tão alegre,
outro tão triste.
Um que tem tanto,
outro nada tem.

Um viaja pela estrada,
outro de avião ou de trem.
Um tem banquete, cerveja,
outro nada tem sobre a mesa.

Um tem fé e esperança
outro tem dinheiro, abastança.
Um traz a paz no semblante,
outro traz a cor da ilusão.

A ilusão é o poder e a riqueza.
E a paz é o amor.
A grandeza,
que habita em cada coração!


 

80

A rosa, o cravo.
O cravo, a rosa.
A prosa, o prazo.
O prazo, a prosa.

O homem e o bicho
o homem é o bicho
do bicho homem.
O bicho papão
do homem
é o homem.


 

81

— Você viu o passarinho
que voava por ai?

— Passarinho, passarinho...
Passarinho eu vi não!
O que vi foi um menino
viajando numa nuvem,
boléia de caminhão.

— Você viu o menininho
que andava por ai?

— Menininho, menininho...
Menininho eu vi não!
O que vi foi passarinho,
viajando numa nuvem
ao redor de um caminhão.


 

82

Era uma vez
um reizinho poderoso.
Mas vivia desgostoso
de ter tudo e não ter nada.

O reizinho enfastiado
tinha tudo o que queria.
O que queria, o que sonhava.
Até sonhar não mais podia,
pois os sonhos já eram seus.

Tinha reinos e poderes,
tinha rios e montanhas,
tinha dólares e vassalos,
tinha tudo o que se apanha.
Por isso o reizinho,
vivia sempre tristonho.
Por descobrir que
nem mesmo em sonhos,
um sonho podia ter.


 

83

O que vem do abacateiro
é abacate, seu Filó.
Não é sarça ou espinheiro,
não é pedra, nem jiló.

O que vem do coração
são sentimentos, Mariquinha.
Não são nuvens, nem palavras,
nem são penas de galinhas.

O que vem do ombro amigo
é amizade, seu Tomás.
Não é favor, não é guerra,
mas sim, respeito e paz.

O que vem da honestidade
não é fome de poder.
Vem junto a sabedoria,
vem junto a dignidade,
vem tudo o que um homem precisa ter
para a sua vida bem viver!


 

84

O sapo não assobia, sabia?
O sapo coaxa: croac!
E a cotovia não bale, sabia?
A cotovia chilreia, chip, chip!
E o carneiro não muge, sabia?
O carneiro bale: Bé..é..!

E o homem não grita, sabia?
Ele é educado e fala baixinho!


 

85
(Para Mário Quintana)

Ai que poeminha mais chato!
um pé de anta,
outro de pato.

Ai que poeminha mais torto!
Um lado vivo,
outro já roto.

Ai que poeminha mais sem graça!
Que vive ao relento,
e dorme na praça!

Ai que poeminha mais bobão!
Brincando de roda,
parece pião.

Ai que poeminha mais engraçado!
Que dá cambalhota,
em tempo errado.

Ai que poeminha mais ligeiro!
Nasceu em São Paulo,
correu pro estrangeiro.

Ai que poeminha mais maluco!
Brotando da alma,
de um poeta caduco.

Ai que poeminha sem fim!
Esticando, crescendo,
e rindo de mim.

Ai que poeminha mais dentudo!
Escrito com frases,
sem nexo, em desuso.
Ai que poeminha mais sem ter par
Parece que nunca
vai se acabar!


 

86

Roc-roc-roc-roc!
Vai o rato a roer.
O que rói o rato?
Roc-roc?
Isso eu não sei dizer!

Plam, plam, rata-plam!
vai o bumbo a bater.
O que bate o bumbo,
plam?
Isso eu não sei dizer!

Mu-mu-Mumumu!
Vai o gado a mugir.
O que muge o gado.
múu?
Isso eu não sei dizer!

Búuuu-buá-áa!
Vai o bebê a balir.
O que bale o bebê,
buá?
É o leitinho que demora
a vir!


 

87

Vovô, vovozinho,
num cantinho a cismar...
Esquece a preguiça
e vamos brincar.

Eu tenho um cavalo,
de vassoura, alazão.
Cavalga as planícies
que se estendem ao coração.

Vovô, vovozinho,
vamos juntos planar.
Por sobre todo o mundo
e ensiná-lo a sonhar.
Vovô, vovozinho
deixa de ser sonolento.
A vida nos espera,
para que nós a tomemos
nas asas do vento.


 

88

“Cai, chuva, cai,
lá do céu!
Cai, chuva, cai,
no meu chapéu!”.

A chuva caiu,
a chuva rolou,
molhou o meu sonho,
a chuva passou.

O que ainda resta,
ficou lá atrás...
Num tempo já ido,
não volta jamais.

A chuva caía
riscos no papel.
Caía mansinha,
do alto, do céu.

Lavava a rua,
lavava a canção.
Levava a infância,
do meu coração.

A chuva caía
corria, corria.
Levando o que havia.

Mas restou
a lembrança:
dançando, girando,
cantando assim:

“Cai chuva, cai,
lá do céu!
Cai, chuva, cai,
no meu chapéu!”.


 

89

A lua lívida
vinha ao lago.
Lavar a louça.

A lua louçã
limpava, limpava.
E lépida lá se ia.

A lua lívida,
em lã vestida,
a cantarolar:
laiálá, lalaiá...


 

90

Luzes pequeninas
brilhavam no véu da noite
Pirilampos-astros,
pelos campos em cordões
multibrilhantes.
Intermitente “lusco-fusco”
da imaginação:
— O que será?
Pergunta ao avô o menininho.
E o avô responde:
— São as batidas
(pura imaginação)
do céu em meu coração!


 

91

O Cotô
não era um cãozinho cotó.
Não era a cotovia,
sabia?

O Cotô
não era côto de lápis.
Não era capim lá do campo,
nem colega estrangeiro.

O Cotô
era somente um neguinho manhoso
que um dia me delatou:
contou para o meu pai
que eu nadava no rio.
Levei uma baita surra.

Mas, tirante isso,
o Cotô foi o meu
melhor amigo de infância.


 

92

A porquinha
filha de um “cachaço”
foi batizada.
Ficou: “CHIQUINHA”.

Brincava com a meninada.
Era tão desligada,
não ligava para nada,
a porquinha Chiquinha.

Nem crescer a porquinha queria.
No chiqueiro não ficava,
ficava sim, rondando a casa.

Ouvia o barulho das panelas
e lá vinha ela:
Oinc! Oinc! Oinc!
reclamar o seu almoço
e um carinho da família.

Quando cresceu,
engordou....
meu pai vendeu.
E a garotada toda
chorou.


 

93

Marcha soldadinho
de chumbo ou de latão.
Marcha direitinho,
que eu te promovo a capitão.

Um dois, feijão com arroz.
Um dois, feijão com arroz.

Marcha soldadinho,
depois faz meia-volta
se não fizer direito,
te deixo atrás da porta.

Um dois, feijão com arroz.
Um dois, feijão com arroz.

Marcha soldadinho
atrás do pelotão.
Cabeça de papel,
coração de melão.

Um dois, feijão com arroz.
Um dois, feijão com arroz.


 

94

A menina parece
uma fada encantada.
Ou será uma fada
que parece uma menina
encantada?

Para se sincero,
não sei
Será o sapo,
um rei?
Ou será o rei,
um sapo,
encantado?

É meio confuso
se a porca é quem torce
ou quem é torcido
é o parafuso....


 

95

Carneirinho, carneirão..
onde foste te esconder,
em que prado ou descampado,
dentro do meu coração?!

Carneirinho, carneirão..
Que eu tangia a sonhar,
na infância tão distante,
que perdi nalgum lugar.

Um lugar em que um dia
eu me peguei a crescer...
Por quê fui então perder,
para nunca mais me encontrar?

Onde foi que perdi,
o meu jeito de sonhar?
Salpicando de estrelas,
todo claro de luar....

Lá deixei a minha infância,
entre avencas e jasmins.
Lá restou minha esperança
(tão criança)
entre ternos querubins!


 

96

Luzia no alto céu,
uma pequenina estrela....
Luzia e, todo o meu sonho,
uma fogueirinha de papel.

Que o vento soprava
qual fosse um balão.
E, lá se foi meu coração,
ardente, ganhar a imensidão.

Eu menino do mato,
que corri pelos campos,
que nadei pelos rios,
que trotei pelo vento...

Eu tão franzino,
pequenino, nem sabia
que o vento que soprava
o balão de meus sonhos,

soprava toda a infância!

O balão subiu, se perdeu.
A infância também se perdeu...
— O que restou.. —,
Ah esse! Esse nem sou eu!


 

97

D. Maria pitava
acocorada lá no terreiro.
Uma baforada, uma cusparada.
O cigarro de fumo de corda
no papel de pão.

D. Maria no batedouro,
na tina d’água;
D. Maria no milharal;
passando o café
pra tomar na caneca de alumínio...
Num canto catando
lêndeas dos “mininu”.
Cuspindo, fumando..
Fumando, cuspindo..
Vez em quando,
D. Maria tomava
“umas cachaça”
e ficava molinha
zanzando pela casa
e cantarolando umas músicas
lá dela, só pra ela.
Que somente ela entendia.

D. Maria já morreu, acho.
Uma baforada, uma cusparada.
D. Maria deve tá lá no céu:
acocorada, dando risada!


 

98

Tinha meu avô João
que empurrava um carrinho de laranjas.
Que era espírita,
que era tão bom.

Tuberculoso, morreu.
Foi pro céu.

Tinha meu avô Ermínio
que foi “Puliça da Bahia”.
Também era espírita.
Também era tão bom.

Morreu velhinho.
Também foi pro céu.

Fiquei sem avô nenhum.
E agora?


 

99

Dói-não-dói.
Dói-não-dói.
Meia hora de discussão.
Um quarto de hora de choro.
Vinte minutos de birra.
E lá ia eu desembestado
pelas ruas de terra.

E a família atrás:
pega-não-pega.
pega-não-pega.
Pegavam.
Sempre achavam um marmanjo
que corria mais do que eu.
Daí,
daí eu acabava
tomando a injeção.
Berrando, é claro!


 

100

A molecada
no campo corria
atrás da bola.

Iam para as caçadas,
faziam cabanas
(com as meninas).

Contavam vantagens,
jogavam birosca,
colecionavam figurinhas....

E eu,
não sei porque,
preferia ficar sozinho:

com meus gibis
e os meninos
que eu ia arrancando
de algum lugar
dentro de mim.....

 

MAURO GONÇALVES RUEDA
São José do Rio Preto/Barretos,1.989

________________///////_________________

 

PROIBIDA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DA OBRA.
DIREITOS RESERVADOS PARA MARICY REGINA DE CASTRO RUEDA E JOYCE DE CASTRO RUEDA.
REGISTRADO NO EDA DE ACORDO COM A LEI N.° 9.610/98.
FUNDAÇÃO BIBLIOTECA NACIONAL. BY: MAURO GONÇALVES RUEDA.


 

©2003 — Mauro Gonçalves Rueda
maurorueda@uchoanet.com
maurorueda5@hotmail.com

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__________________
Fevereiro 2003

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