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A ESCRAVIDÃO NO BRASIL
Vol. II

Agostinho Marques Perdigão Malheiro


www.eBooksBrasil.org


Dr. Agostinho Marques
Perdigão Malheiro

A ESCRAVIDÃO
NO BRASIL

ENSAIO HISTÓRICO-JURÍDICO-SOCIAL

 

PARTE 2ª
ÍNDIOS

 

eBooksBrasil



A Escravidão no Brasil - Vol. II (1867)
Agostinho Marques Perdigão Malheiro (1824 - 1881)


Fonte digital
Digitalização de edição em papel de 1867
Rio de Janeiro - Typografia Nacional - Rua da Guarda Velha
1867

Transcrição para eBook
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© 2008 Agostinho Marques Perdigão Malheiro



Nota do Editor

Francisco de Paula Ferreira de Rezende, primo do Autor, nos dá este testemunho dos sentimentos abolicionistas de Perdigão Malheiro:

“(..) legítimo branco, neto de fazendeiros e ele mesmo senhor de escravos, não duvidou, no entanto, em um tempo em que falar em abolição era mais que um crime e era quase um sacrilégio, de escrever um livro que ele muito bem sabia não havia de ter compradores; e isto unicamente para convencer a quem não queria ser convencido, que a escravidão era a maior de todas as iniqüidades, fosse qual fosse o ponto de vista debaixo do qual se a pudesse considerar.

E como (..) era preciso que ninguém pudesse duvidar da sua própria sinceridade, ele que não dispunha de uma muito grande fortuna, libertou a todos os seus escravos.”

O livro mencionado é o “A Escravidão no Brasil (Ensaio Histório-Jurídico-Social)”, em 3 volumes, editados pela Tipografia Nacional, o primeiro deles em 1866, ano em que Perdigão Malheiro terminava sua gestão à testa do Instituto dos Advogados do Brasil.

É o 2.° volume (Índios), de 1867, que ora coloco nas estantes virtuais eBooksBrasil. E o escolhi porque Perdigão Malheiro tem muito a nos dizer hoje, como o tinha quando o escreveu, sobre questões sobre as quais ainda não encontramos a solução e com as quais continuamos a nos debater.

Espero que o eventual leitor entenda que, originado de uma fonte em cola e papel de 1867, em muitos pontos esvanecida pelo tempo, a fidelidade ao original pode deixar muito a desejar. Mas lhe asseguro que estará lendo exatamente como li, com a ajuda, nos trechos mais esmaecidos, de lupa para poder, na medida do possível, precisar datas, distinguindo os 3 dos 5, os 9 dos 0; tentando atualizar, no melhor do meu possível, para o português hoje corrente, para benefício das novas gerações.

No futuro, talvez, os “órgãos competentes”, providos de mais recursos do que os meus, possam fazer circular uma edição digital mais fidedigna. Até lá, o leitor e eu teremos que nos contentar com o que foi possível.

Boa leitura!



A ESCRAVIDÃO
NO
BRASIL

ENSAIO HISTÓRICO-JURÍDICO-SOCIAL

PELO

Dr. Agostinho Marques Perdigão Malheiro

_______________________________

PARTE 2.ª

_______________________________

ÍNDIOS

RIO DE JANEIRO.
TYPOGRAPHIA NACIONAL,
RUA DA GUARDA VELHA.
____________
1867



ÍNDICE.

INTRODUÇÃO

Parte II. — Título Único. — Escravidão dos índios.— Extinção da mesma. — Catequese e civilização.

Cap. I. — Os índios ao tempo da descoberta do Brasil. — Generalidades

Cap. II. — Expedições. — Primeiras relações com os naturais. — Introdução da escravidão dos índios. — Seu desenvolvimento. — Determinações a respeito. — Colonização. — Regime colonial

Cap. III. — Colonização; regime colonial (continuação). — Catequese — Os Jesuítas — Padres Manoel da Nóbrega, José de Anchieta — Missões de índios. — Guerras dos mesmos. — Novas providências sobre o seu cativeiro

Cap. IV. — Leis de escravidão dos índios. — Jesuítas, e colonos. — Leis de liberdade dos gentios. — Novas leis de escravidão. — Caçadas de índios. — Os Paulistas

Cap. V. — Bula do Papa Urbano VIII a favor dos índios. — Oposição do povo. — Expulsão de Jesuítas. — Administração de índios. — Padre Antônio Vieira. — Aldeias. — Entradas nos sertões para descer gentios. — Nova expulsão de Jesuítas. — Novas leis sobre índios e Jesuítas. — Guerra aos índios; destruição de tribos

Cap. VI. — Leis sobre liberdade dos índios. — Missões Jesuíticas. — Regimento das missões. — Novas leis de escravidão. — Descimento de índios. — Guerras dos mesmos. — Novas providências.

Cap. VII — Bula de Benedito XIV a favor dos índios. — Novas providências sobre os mesmos. — Guerra das Missões no Rio da Prata. — Oposição no Amazonas. — Os Jesuítas. — Leis de liberdade absoluta dos índios. — Nova forma do seu governo temporal. — Diretório para o Maranhão e Pará. — Expulsão dos Jesuítas. — Decadência das aldeias; dispersão dos índios. — Abolição do Diretório. — Novas providências

Cap. VIII. — Restauração do sistema do terror contra os índios. — Guerra aos mesmos. — Bandeiras. — Novas providências para a sua catequese e civilização. — Sistema misto

Cap. IX. — Direito novo. — Abolição completa e definitiva do cativeiro e servidão dos índios. — Proteção e favores. — Sistema atual. — Futuro dos índios ante a civilização. — Conclusão.

Notas



INTRODUÇÃO

Nesta 2ª Parte do presente Ensaio vai sucintamente historiada a escravidão dos índios até sua completa e definitiva abolição. Comprende-se que não era possível deixar de entrar no plano desse trabalho semelhante assunto, de cuja importância se fará idéia aproximada com a leitura desta 2.ª Parte.

Mo era possível, também, prescindir de historiar ligeiramente a catequese e civilização dos índios.

E como esta se prendia e prende imediatamente à colonização, e civilização do Brasil, foi alargado um pouco o quadro, dando-se igualmente notícia muito abreviada da povoação, desenvolvimento e progresso do país.

Intimamente ligada, identificada com a dos índios é a história dos Jesuítas. Era absolutamente indispensável acompanhá-los a par e passo com os índios, desde que pisaram em a terra do Santa-Cruz até que foram expulsos.

Por último, havendo ao trabalho uma parte social, são aventadas algumas idéias sobre a catequese e civilização dos indígenas.

Eis em poucas palavras o plano desta 2ª Parte, e os motivos do mesmo plano.

Cumpre-me, porém, declarar alto e bom som que não tenho a vaidosa pretenção de haver escrito obra completa; muito longe disso, apenas um ensaio: outros o farão.

Também não tenho a louca aspiração de instruir pessoa alguma, nem de ver abraçadas algumas de minhas idéias; sobretudo em um país tão rico de elevadas inteligências, de sábios, e de ilustrações:— não é para esses que eu escrevo, que nos meus escritos nada têm que aprender.

Estes meus trabalhos são apenas um protesto que do fundo do meu gabinete e na minha obscuridade desejo fazer a bem de nossa civilização atual, das idéias e sentimentos do povo Brasileiro. A liberdade dos índios é desde 1831 garantida pelas leis do um modo permanente e inconcuso; foi a vitória das idéias liberais, da civilização e humanidade. Resta somente a dos Africanos e seus descendentes, que ainda gemem nos grilhões do cativeiro. Mas tudo se dispõe para esse outro grande triunfo, porque está na consciência de todos a justiça, a conveniência, a necessidade da sua abolição: apenas se diverge quanto ao modo e tempo.

Com o auxílio de Deus (pois que dos homens o não tenho), espero publicar breve a 3.ª Parte deste Ensaio, onde exporei algumas idéias, concorrendo assim com a minha boa vontade em bem da pátria, digna do mais brilhante e venturoso futuro.

Rio de Janeiro, 26 de Fevereiro de 1867

O Autor.



A ESCRAVIDÃO NO BRASIL.

PARTE II.

TÍTULO ÚNICO.

ESCRAVIDÃO DOS ÍNDIOS. — EXTINÇÃO DA MESMA.— CATEQUESE E CIVILIZAÇÃO.



CAPÍTULO I.

Os índios ao tempo da descoberta do Brasil. — Generalidades.

Tendo por fim especial nesta segunda parte do presente opúsculo historiar sucintamente a escravidão dos Indígenas até que foi definitiva e realmente extinta, e conseqüentemente tratar também da catequese e civilização dos mesmos não só no ponto de vista histórico mas igualmente no social, pede a boa ordem que alguma notícia se dê dos índios do Brasil ao tempo em que teve lugar a sua descoberta.

Não investigaremos — quando, como, e por quem foi povoado o Brasil antes dela—; são questões, é verdade, de interesse histórico, e principalmente científico(1), mas alheias ao objeto que nos propomos(2).

Pela mesma razão não nos demoraremos com a classificação dos povos que ocupavam então o território que constitui hoje o Império Brasileiro(3).

Pretendem alguns que existiu um tronco comum, d’onde provieram as diversas nações e tribos, concorrendo não pouco para corroborar tal opinião a existência de uma denominada língua geral Guarani ou Tupi, e certa comunhão de tradições, de usos e costumes, e de idéias. Outros, porém, concluem que não há classificação possível(4).

O certo e averiguado é que, ao tempo em que Pedro Álvares Cabral tocou em terra Americana, e engastou na coroa do Rei de Portugal D. Manoel, o Afortunado mais esse precioso diamante, que depois se chamou Brasil, era o país habitado por tribos diversas de índios, que, embora alguns indícios demonstrassem de certa comunhão talvez outr’ora existente de nacionalidade ou de raça, todavia se distinguiam perfeitamente umas das outras pelas suas qualidades físicas, por sua língua, usos e costumes, carácter, índole, e outros elementos(5). Das relações dos primeiros descobridores, dos primeiros povoadores, dos historiógrafos mais antigos das cousas do Brasil, dos Jesuítas e outros, em máxima parte confirmadas pelos estudos posteriores e até contemporâneos, assim como por ilustrados viajantes que têm percorrido diversas partes do Império, alguma cousa se pode dar como exato em relação aos usos e costumes da generalidade dessas tribos, seu estado social, sua indústria, suas habilitações para as ciências e artes, sua disposição enfim para a civilização européia(6).

Entre eles era admitido o casamento como a base da família(7). Em regra dependia do consentimento paterno; mas, recusado este, às vezes era a mulher havida à força. As núpcias eram celebradas com certos ceremoniais, embora afetados da rudimental civilização em que então se achavam; o festim transformava-se em verdadeira bacanal. Das próprias prisioneiras, que reduziam à escravidão, não poucas vezes faziam suas eoncubinas e mulheres. A poligamia era tolerada, conforme os baveres e forças do varão; mas sempre distinguiam uma como a predileta, e verdadeira esposa. O adultério da mulher, porém, era tido em horror, e punido, às vezes, com a morte. A autoridade marital era reconhecida e sancionada, ao ponto exagerado de tratarem, embora não de modo geral, as mulheres antes como escravas, do que como verdadeiras consortes na vida comum que levavam(8).

Sobre os filhos era reconhecido o pátrio poder conquanto se abstivessem de correções corporais(9).

O estado social era imperfeitíssimo, vivendo os índios por grupos mais ou menos numerosos, em aldeias ou tabas, quase sempre em perfeita promiscuidade de homens, mulheres e crianças. Reconheciam, porém, a autoridade de um chefe que denominavam morubixaba; com quanto em negócios de maior monta e gravidade tomasse toda a tribo parte nas deliberações. O comunismo excluía questões de propriedade; o roubo era desconhecido. No sistema penal vingava o do talião(10).

Essas tribos viviam em quase contínuas guerras, não com o fim de se apoderarem do alheio, mas principalmente para se vingarem de alguma afronta ou injúria recebida, e (sobretudo mais tarde) para fazerem prisioneiros. Muitas vezes os ataques tinham por fim especial raptar as mulheres para se proverem de consortes ou concubinas. Os prisioneiros eram reduzidos à escravidão, principalmente as mulheres. Os varões eram, por via de regra, devorados pelos vencedores em festins extraordinários, com formalidades próprias, e regozijo extremo de toda a tribo; a tanto eram arrastados pelo ódio e vingança contra os seus inimigos, e também por uma errada crença religiosa(11).

Simples, frugais, corajosos, generosos mesmo e hospitaleiros eram, em geral, os índios; sentidos apurados, força física notável, destreza em manejar suas armas, e outros dotes estimáveis, em quase todos se notavam(12).

Da sua indústria dão idéia suficiente os artefatos de barro, de palha, de embira, de madeira, de pedra e de outras substâncias, de que se serviam para os seus usos, embora limitados às suas escassas necessidades; o ouro e pedras preciosas nenhum valor para eles tinham(13).

Tudo neles revelava o povo no estado de atrasadíssima civilização; mas nem por isso deixavam de ter alguma. Se não eram como os do México e Peru, com suas belas cidades, seus Imperadores ou Incas, sua riqueza, suas leis, seus costumes, seus templos, e tudo quanto aí foram encontrar de prodigioso Cortez, Pizarro, e outros(14), seria inexato e injusto dizer que os do Brasil eram absolutamente bárbaros(15).

Se a religião não tinha templos, nem por isto deixavam de reconhecer a existência de um Ente Supremo Tupan, que lhes era manifestado pelo trovão e raio; tinham seus sacerdotes pajés, (que viviam retirados da sociedade, e eram ao mesmo tempo os seus médicos, sendo recebidos na aldeia quando a ela vinham com as demonstrações do mais profundo respeito(16).

Na imortalidade da alma davam indícios de acreditar, como consta das tradições colhidas, e se depreende do estudo dos seus sarcófagos ou sepulturas(17).

Sua aptidão para os diversos trabalhos e indústrias, para as artes, e mesmo para as letras e belas artes, demonstra-se pelos produtos de sua indústria, embora imperfeitos, e dos quais se apropriaram os colonos logo desde os primeiros tempos introduzindo-os na sua indústria e usos; demonstra-se ainda melhor pelo que mais tarde, devido sobretudo aos esforços dos Padres Jesuítas, eles fizeram, e que se pode qualificar de verdadeiros prodígios(18).

Diz-se que eram falsos, infiéis, desconfiados, e até bárbaros(19). Se alguns se mostraram tais, e cometeram mesmo traições, sobretudo em épocas posteriores e diversas, foi antes por vingança, ou por justa desconfiança e represália contra os que já então e desde o começo se fizeram seus opressores e gratuitos perseguidores. Na quase generalidade os índios se mostraram sempre de fácil acesso e trato, desejando mesmo as relações dos estrangeiros; e até foram generosos protetores de muitos, que aliás poderiam ter morto e devorado(20).

Os Indígenas eram, pode-se dizer, nômadas; conquanto em extensão determinada de território se vissem predominar certas tribos. Suas tabas eram de pouca duração. Tribos havia agrícolas; e portanto de costumes mais brandos, de mais sociabilidade. Outros mostraram-se destros cavaleiros(21). O litoral e as margens dos rios eram os lugares mais povoados, de que dão notícia as relações dos descobridores e viajantes; a pesca a isto convidava; eram, portanto, também navegantes. Outros viviam internados pelos sertões; a caça, os frutos silvestres eram o seu principal recurso: mais atrasados e bárbaros deviam naturalmente ser do que aqueles(22).

Tais eram, em rápido esboço, os povos que ocupavam o território brasilíco desde o Prata até o Amazonas, desde o Oceano até o Paraguai, quando os Portugueses a ele aportaram em 1500 da era de Cristo.

Que destino tiveram? Por que revoluções passaram depois da descoberta? Acaso aproveitaram eles da civilização européia? Qual o seu estado presente? Qual o seu futuro ante a civilização?

Tais são as questões que nos vão suecessivamente ocupar.



CAPÍTULO II.

Expedições. — Primeiras relações com os naturais. — Introdução da escravidão dos índios. — Seu desenvolvimento. — Determinações a respeito. — Colonização. — Regime colonial.

É um fato, infelizmente confirmado pela história, que desde a mais remota antigüidade o vencedor ou conquistador, quando não matava o vencido ou o prisioneiro, reduzia-o à escravidão. Pretendeu-se mesmo que fosse esta última regra um progresso no Direito das gentes, um ato de humanidade; no entanto que era realmente de maior ferocidade por afetar já não exclusivamente o prisioneiro, e sim indefinidamente toda a sua descendência.

Entre os índios acontecia que, em vez de devorarem os prisioneiros, reduziam-os ao seu cativeiro, sobretudo as mulheres que não houvessem tomado parte ativa na guerra; das quais não raras vezes faziam suas consortes. Os filhos, porém, eram livres, se livre o pai; porque entre eles seguia o filho a condição do pai e não a da mãe(23): do que há exemplo também em povos do velho mundo, quais foram os Visigodos(24).

Quando Cabral, depois da sua feliz descoberta, resolveu seguir sua viagem para a Índia, conforme as instruções que recebera, expediu ao Rei de Portugal, como devia, um emissário, Gaspar de Lemos, a instruí-lo de tal achado; e, em troca de dois criminosos que deixou na terra, fez embarcar, entre outras cousas, dois dos seus naturais como amostra dos novos súditos d’El-Rei(25).—Os índios (Tupininquins) mostraram-se dóceis e bondosos; assistindo mesmo com reverência à missa que se celebrou(26).

Em o ano seguinte 1501 teve lugar a primeira expedição de exploração da costa do Brasil, vindo como piloto e cosmógrafo Américo Vespucio, o qual percorreu o litoral desde o cabo de S. Roque até o de Santa Maria; desta expedição ficou na Cananéia para cumprir a pena de degredo um bacharel, que 30 anos mais tarde ainda aí foi encontrado(27).

Em 15003 veio nova expedição, com o mesmo Américo. Fundou-se nesta época a primeira feitoria portuguesa no Brasil, próximo de Porto Seguro, onde fundeara a esquadrilha de Cabral, e à qual se deu o nome de Santa Cruz, composta do pessoal de 24 homens(28).

É provável que de outras armadas que por este tempo se dirigiam à Índia, alguns navios que aportaram ao Brasil tivessem deixado colonos, mas não é isto bem averiguado(29).

A atenção do Governo Português estava absorvida pelas conquistas na Índia e África, para onde se expediam grandes armadas, e grandes capitães quais os Almeidas, os Albuquerques. De sorte que houve intermitência de explorações das costas e território do Brasil por parte do mesmo Governo(30).

Mas, havendo começado o tráfico de certos gêneros do país e sobretudo do pau brasil d’onde veio o nome que lhe ficou), os contratadores mandavam navios de conta própria a esse comércio. Do número destes foi a nau Bretoa, que, saindo de Lisboa em 22 de Fevereiro de 1511, aí voltou no fim de 8 meses, levando, além do pau brasil e outros gêneros, para cima de 30 índios cativos.(31).

No entanto havia expressa recomendação do Rei para que se tratasse bem aos naturais da terra, e nenhum fosse levado para a Europa inda que o quisesse, afim de que não pensassem os outros que os matavam para serem devorados(32).

Ao contrário disto, em Espanha se havia declarado por uma lei de 1504 legítima a escravidão dos Caraibes por antropófagos e bestiais; o que deu lugar a que para as partes do Norte do Brasil aparecesse navio a carregar escravos(33).

Outras expedições, anteriores mesmo à de Cabral, tiveram lugar pelo Amazonas ou Maranhão, e costa do Norte, quais as de Alonso de Hojeda, Vicente Yanes Pinzon, e Diogo de Lepe(34). Mas serviram apenas de prevenir os Indígenas contra os descobridores pelas lutas travadas entre os mesmos e esses primeiros navegantes(35).

Ainda outras se seguiram por parte da Espanha, quais de João Dias Solis em 1508 e 1815, de Fernando de Magalhães e Ruy Falleiro em 1519. — Nada, porém, de notável quanto aos Indígenas em relação ao Brasil.

Parcialmente sucedeu que navios naufragassem em diversas paragens, e que alguns indivíduos se aventurassem em viagens fluviais e terrestres. A muitos coube a triste sorte de serem mortos e devorados pelos índios. Outros, porém, eram por eles recebidos e tratados com a maior fidelidade e amizade. Não poucos são os exemplos; de que basta referir o de Diogo Álvares, denominado o Caramuru: naufragado pela altura da Bahia em 1510, foi poupado pelos índios, entre os quais veio a ter tal predomínio e estima, que se constituiu, para bem dizer, seu Chefe, e se casou com a célebre Paraguassú; a ele deveram mais tarde os Portugueses relevantes serviços(36). É assim que outros Portugueses, e mesmo Espanhóis e Franceses foram encontrados estabelecidos em diversos lugares do tão extenso território, em plena paz e harmonia com os naturais(37); sendo digno de notar que Portugueses dos navios da Índia e de contratadores procedessem por semelhante forma deixando-se ficar em terra, contra a proibição da lei.

Outras expedições tiveram lugar em datas posteriores por parte de navegadores Franceses, estimulados pelos lucros prodigiosos que retiravam dos gêneros do Brasil mais estimados e procurados nos mercados europeus(38). Bem como por parte de Espanhóis, distinguindo-se as do Diego Garcia, D. Rodrigo d’Acuna, e Sebaslião Cabot em 1525 e 1526. Por eles foram encontrados Castelhanos, de longa data aí estabelecidos; e muitos dos seus também se deixaram ficar por a isto os convidar a terra(39).

Pela mesma época, fins de 1526, aportava Cristovão Jacques com a sua esquadrilha destinada a defender a costa do Brasil contra invasões estrangeiras. Tendo fundado em Igarassú a feitoria de Pernambuco, e feito uma excursão ao Sul, retirou-se para Portugal. Vindo-lhe a idéia e desejo de ser donatário no Brasil, obrigando-se a introduzir aí mil colonos, comunicou-o a Diogo de Gouvêa, que o transmitiu com empenho ao Rei D. João III, que desde 1521, por morte de D. Manoel, governava o Reino. Desde então começou a germinar a idéia de estabelecer na terra de Santa Cruz um núcleo forte de colonização, visto a quase improficuidade das esquadras, o grande despesa que importava este gênero de guarda e defesa(40).

Preparada a frota, foi o seu comando confiado a Martim Afonso de Souza; ao qual se deram poderes extraordinários, com alçada no crime e civel, tanto para o mar como para a terra; assim como de dar sesmarias, mas por uma só vida(41). Em 31 de Janeiroo de 1531 alcançou o Cabo de Santo Agostinho; e, depois de destroçar e aprisionar navios Franceses que aí encontrou, seguiu para a feitoria de Pernambuco; da qual saindo para o Sul, entrou na Bahia de Todos os Santos, onde encontrou o Português Diogo Álvares o Caramuru, em cuja companhia deixou dois homens(42). Obrigado a arribar, voltou de novo à Bahia; e aí achou uma caravela, que tomou a seu serviço, depois de fazer desembarcar os escravos que ela transportava(43). Descendo para o Sul entrou no Rio de Janeiro, onde se demorou três meses, bem tratado pelos da terra, a quem igualmente tratou bem(44). Proseguindo, ancorou junto à Cananéia, onde encontrou o bacharel Português Francisco de Chaves e vários Espanhóis. Já então os escravos se contavam por centenas, pois que o dito bacharel ofereceu-se-lhe trazer dentro de dez meses 400 escravos carregados de prata e ouro(45).

Continuando na sua viagem, cujo fim era o estabelecimento no Rio da Prata, e sofrendo grande temporal, despachou seu irmão Pero Lopes de Souza a continuar a assentar padrões de posse. De volta, entrou Martim Afnso, em Janeiro de 1532, no porto de S. Vicente, onde encontrando o Português João Ramalho, que aí vivia entre os índios há vinte anos, se deliberou a fundar uma colônia, a primeira regular que no Brasil se levantou, não existindo até então senão as pequenas feitorias de Santa Cruz, Igarassú, e Santa Catarina. De acordo com Ramalho, e para maior auxílio da colônia marítima, fundou ao mesmo tempo outra em Serra-acima junto a Piratininga, d’onde veio o nome à aldeia, e é hoje S. Paulo; cujo governo confiou do mesmo João Ramalho, nomeado guarda-mor(46).

No entanto o governo da Metrópole ocupava-se agora com mais interesse de promover a colonização da possessão Americana; e resolveu-se a dividi-la em grandes capitanias, que seriam distribuídas, como foram(47), por pessoas dignas por seus serviços e fidalguia, ou riqueza, com obrigação de trazerem gente e navios à sua custa(48).

Essas doações eram de juroe herdade, e já não simples sesmarias por uma só vida, como a principio se tinha assentado: e acompanhadas de concessões extraordinárias aos donatários, com alçada até morte natural aos peães, escravos, e índios, atribuições judiciais, nomeação de autoridades e empregados, distribuição de sesmarias conforme as leis do Reino, assim como de cativar gentios para o seu serviço e dos navios, e de mandá-los vender à Lisboa até certo número cada ano livres de sisa, a que eram aliás sujeitos os escravos que ali entravam(49); doações confirmadas pelos forais de cada capitania(50).

O governo reconhecia e legalizava assim com a sua autoridade soberana e onipotente o fato abusivo e odioso da escravidão dos Indígenas; e, longe de reprovar e punir, quase se diria que o acoroçoava.

É verdade que os Espanhóis haviam dado o exemplo perverso de cativarem os desgraçados índios logo desde a primeira descoberta (1402) por Cristovão Colombo; a história das conquistas por eles feitas o demonstra para opróbio eterno dos descobridores e sua gente(51). É verdade que a Espanha fazia o comércio de escravos Africanos, que de Sevilha saíam para diversas partes. É verdade que leis de Espanha autorizaram o cativeiro de alguns índios, v. g. os Caraibes, e que até os mandavam marcar com ferro quente para se não confundirem se fugissem(52). É verdade que mesmo em Portugal se mantinha a escravidão dos Mouros e dos Africanos negros; e que destes já se fazia grande comércio(53). Não é, pois, muito de admirar, que esse ato de perversidade de povos, que se diziam civilizados e cristãos, se fizesse extensivo ao pobre e mesquinho gentio do Brasil; tanto mais, quanto faltavam os braços para os misteres dos donatários e dos colonos.

Refere igualmente a História que chegou-se naquela época até a pôr em dúvida que os índios pertencessem à espécie humana! pretendendo-se que eram escravos por natureza! A tamanho desvario foram arrastados os Espanhóis, seus mais atrozes perseguidores, pela sede e ambição de riquezas(54), e a seu exemplo os Portugueses(55).

Mas também, desde logo, e como fato providêncial, apareceu o incansável Dominicano Padre Bartholomeu Las Casas, Bispo de Chiapa, que tomou constantemente na América e na Europa a defesa dos índios, convenceu de falsas e anti-cristãs aquelas doutrinas, obteve do Regente de Espanha o Cardeal Ximenes e do Imperador Carlos V medidas a bem da liberdade desses infelizes nas possessões espanholas, e mostrou-se um seu acérrimo protetor, um verdadeiro apóstolo(56).

Por oulro lado, reconhecido naqueles tempos em os Sumos Pontífices o poder de resolver questões temporais de grande alcance(57), não podiam eles deixar de intervir em objeto tão melindroso; muito mais porque de algum modo afetava o espiritual, quer dos pretendidos senhores, quer dos inculcados escravos. A Igreja. fiel intérprete da verdadeira doutrina de Cristo, reprovou sempre a escravidão. Os Apóstolos e Doutores assim o ensinaram e pregaram. Os Papas Alexandre III (fins do Século XII), Pio II (Bula de 7 de Outubro de 1462) o proclamaram quanto aos cristãos, censurando mesmo este último os que reduziam à escravidão os neófitos d’África. E, depois da descoberta da América, por vezes o repetiram logo desde o começo com especial referência aos povos desta parte do mundo; distinguindo-se nessa época Leão X, perante quem teve lugar a célebre disputa entre os Dominicanos e os Franciscanos sobre a liberdade dos índios, defendida por aqueles e impugnada por estes, decidindo a bem da liberdade aquele sábio e verdadeiramente cristão Sumo Pontífice.

Em relação à Espanha, ou antes ao Peru, o Papa Paulo III, por Breve de 28 de Maio de 1537, dirigido ao Cardeal Arcebispo de Toledo, muito categoricamente declarou que os Indígenas, entes humanos como os demais homens, não podiam ser reduzidos a cativeiro; Breve que mais tarde se fez extensivo ao Brasil por Bula de Urbano VIII(58). Esse mesmo Pontífice, interpretando a Bula de Alexandre VI (de 1492) sobre a conversão dos índios à fé Católica, fixou a sua verdadeira inteligência, e procurou opor barreira aos abusos dos Espanhóis contrários às determinações da Rainha Izabel, que ainda no seu testamento havia recomendado se tratasse bem aos índios(59).

Não obstante, continuava a manter-se o fato de escravizar o gentio; e agora com mais franqueza, atenta a legalização deshumana pelo governo da Metrópole de semelhante barbaridade, embora debaixo de pretendidas e subentendidas regras de Direito.

É sabido que desde os primeiros tempos, a título de resgate, os índios eram reduzidos à escravidão dos colonos, e até transportados a Portugal(60). Igualmente os aprisionados na guerra eram feitos escravos por um alegado direito do vencedor(61). Mas os colonos, levados pela avidez e cobiça, em breve tal latitude deram a esses princípios, que havia-se convertido em regra para semelhante abuso a necessidade que diziam ter de braços para a lavoura e outros misteres; empregando neste intuito todas as manhas, artifícios, fraudes, e até força a fim de obterem os índios: por tal forma, que a Corte Portuguesa viu-se na indeclinável obrigação de regular tão grave objeto, e de estabelecer restrições a esse direito de escravizar o gentio, como adiante diremos(62).

Vejamos no entanto o que se passava em as diversas Capitanias nas suas primeiras épocas. Em 12 fora dividido o território brasílico. Poucas prosperaram; algumas não puderam progredir; e outras nem mesmo fazer vingar o primeiro estabelecimento. Quais as causas?

S. Vicente, que coube a Martim Afonso de Souza, foi a primeira colonizada; floresceu dentro em pouco, não obstante dificuldades com que a princípio tiveram de lutar os colonos, já de ataques de índios de fora, já dos outros colonos; a amizade de João Ramalho e seu sogro Tibiriçá com os seus índios lhe foi de inapreciável auxílio(63). S. Vicente foi a cabeça da Capitania.

Pernambuco, que coube a Duarte Coelho, igualmente prosperou, debaixo da ilustrada, severa, e virtuosa administração desse varão, que praticou a idéia altamente civilizadora, política, e cristã de atrair os índios por meio de afagos, recompensas, e chegando mesmo a promover, em bem da colonização, o casamento dos colonos com as índias(64). Olinda foi a cabeça da Capitania.

Espirito Santo coube a Vasco Fernandes Coutinho, que comsigo trouxe, além dos colonos, pessoas de nobreza. Os índios, a começo esquivos, sujeitaram-se e muito o auxiliaram. A decadência posterior foi devida aos próprios colonos(65).

Porto-Seguro tocou a Pero do Campo Tourinho, que foi estabelecer-se no porto em que ancorou a esquadrilha de Cabral. Os índios mostraram-se mansos e trataveis, como o eram no tempo da descoberta. Reinou paz, justiça, e moralidade. Mais tarde veio a decadência(66).

Pero Lopes de Souza havia tratado de aproveitar a sua de Santo Amaro (próximo à de S. Vicente), e terras de Itamaracá, admitindo colonos, e cuidando da lavoura(67).

Jorge de Figueiredo Corrêa a dos Ilhéus. Ausência de Governo, vexame aos colonos, perseguição aos índios obstaram a que prosperasse(68).

Tais foram as Capitanias que então puderam suportar a colonização. Algumas floresceram rapidamente, sobretudo Pernambuco e S. Vicente; benéficos resultados de uma administração inteligente, religiosa, e zelosa. Em outras, depois dessa primeira prosperidade, manifestaram-se sintomas de decadência, devida principalmente ao mau governo delas, ou à ambição, injustiça, desobediência, e imoralidade dos colonos.

Das outras dessa primitiva distribuição nenhuma logrou a colonização nessa época:

A do Maranhão e mais duas, que couberam à trina sociedade do historiador João de Barros, Fernão Álvares, e Ayres da Cunha; porque a frota preparada com tamanho sacrifício naufragou desastrosamente. Alguns dos colonos, que se salvaram, fundaram na ilha da Trindade uma povoação Nazareth. Os índios lhes prestaram auxílio valioso, acompanhando mais de 200 deles os colonos restantes, quando se resolveram a abandonar a povoação(69). A sorte adversa, que não a culpa dos donatários e colonos, malogrou essa tentativa.

Outro tanto se não pode dizer da Capitania de S. Tomé, depois Campos, dada a Pero de Góes. Conseguiu fundar a povoação Vila da Rainha. Durante a sua ausência em Portugal para promover capitais e gente, tudo foi desordem na colônia. O lamentável incidente de haver sido por um pirata entregue um dos Chefes índios aos seus inimigos, levantou os mesmos índios contra os colonos, que se viram forçados a abandonar a terra(70).

Na Bahia, o seu donatário Francisco Pereira Coutinho conseguira fundar a povoação da Vitória. Mas a velhice, enfermidade, e fraqueza do donatário, a desmoralização e insubordinação dos povoadores trouxeram a ruína da colônia, retirando-se estes para os Ilhéus, e o donatário para Porto-Seguro; perecendo o mesmo com quase todos os seus às mãos dos índios de Itaparica(71).

Na Capitania de Antônio Cardozo de Barros, nem se chegou a tentar a colonização(72).

Em tal estado de cousas, não era possível que o Rei D. João III(73), que tão bem havia compreendido a vantagem de promover a colonização e o desenvolvimento da nova conquista, deixasse de tomar providências em ordem a coibir os abusos introduzidos sobretudo pelos colonos, e os defeitos reconhecidos da latitude de poderes, atribuições e isenções conferidos aos donatários(74), bem como de providenciar sobre a sorte dos verdadeiramente miseráveis indígenas, que, ou fizessem bem ou fizessem mal, eram desapiedadamente vexados, e escravizados pelos colonos.



CAPÍTULO III

Culonização; regime colonial (continuação). — Catequese. — Os Jesuítas. — Padres Manoel da Nóbrega, José de Anchieta. — Missões de índios. — Guerras dos mesmos. — Novas providências sobre o seu cativeiro.

A tentativa quase malograda de colonização; a desordem e perigo de decadência das Capitanias; a desmoralização dos colonos; a do próprio clero, que, longe de dar o exemplo do bem, levava vida desregrada; a falta sobretudo de unidade e centralização de governo, pois que os donatários eram independentes reciprocamente, e gozavam do privilégio de couto e homisio nos seus respectivos territórios; a perseverança dos Franceses em suas excursões ao Brasil; a audácia dos contrabandistas, que achavam apoio nos colonos; a insubordinação e irreligiosidade que lavravam em geral, concorrendo não pouco para este funesto resultado o fato de virem degradados criminosos ou por condenação ou por comutação de pena; e outros fatos de grave ponderação; reclamavam enérgicas providências.

Duarte Coelho, de Pernambuco, em 1546 representava ao Rei que os donatários abusavam do sou direito de asilo, negando-se a entregar os criminosos que se refugiavam nas suas Capitanias; e em carta de 20 de Dezembro do mesmo ano rogava-lhe que lhe não mandasse mais degradados, que eram piores que peste, verdadeira peçonha(75).

Por outro lado, Luiz de Góes, da Capitania do S. Vicente, dirigiu ao Rei uma carta em 12 de Maio de 1548, em que expunha com franqueza o perigo que corria a Coroa de perder a sua conquista Americana, se lhe não acudisse sem demora(76).

El-Rei, seguindo o parecer de Pero de Góes, deliberou criar no Brasil um governo central. Resolveu-se que aos donatários se restringiriam certos direitos, atribuições, e isenções, sobretudo em relação ao asilo, justiça, e fazenda pública(77).

Tomé do Souza foi o primeiro Governador Geral para o Brasil, a quem se deram as instruções constantes principalmente do seu Regimento de 17 de Dezembro de 1548(78); Pedro Borges de Souza o primeiro Ouvidor geral, a quem se deram as instruções contidas no seu Regimento, de cujas disposições dá ele mesmo notícia em carta de 7 de Fevereiro de 1550 dirigida ao Rei(79); Antônio Cardozo de Barros, o Provedor-mor da Fazenda, com o seu Regimento também de 17 de Dezembro de 1548(80); Pero de Góes foi escolhido para o cargo de Capitão-mor da Costa(81).

Entre os Regimentos parciais, igualmente expedidos então, é digno de menção especial o da criacão de Provedores das Capitanias da mesma data 17 de Dezembro de 1548(82). Posteriormente outros ainda foram expedidos, como v. g. o da criacão dos Capitães-mores em 1609(83); e outras providências se tomaram em relação aos diversos ramos da pública administração.

Nova ordem de cousas foi assim criada em bem da colônia, restringindo-se os direitos e privilégios dos donatários, e concentrando nas mãos do Governador Geral as mais importantes atribuições; era a unidade e centralização administrativa, que substituiam a independência recíproca das Capitanias; eram a ordem, a força, o princípio da Autoridade que vinham pôr cobro à anarquia, à fraqueza, à desordem e desobediência na colônia; era em suma a salvação desta, e a sua conservação integral constituindo hoje a Império Brasileiro(84).

Segundo lhe ordenava o seu Regimento, dirigiu-se Tomé de Souza para a Bahia, onde chegou a 29 de Março de 1549; trazendo em sua companhia, além dos Chefes mencionados e outras pessoas notáveis, muitos casais, 600 homens de armas, e 100 degradados(85).

Vierão também seis (sendo dois apenas irmãos) religiosos da Companhia de Jesus, os primeiros que pisaram terra brasilica, e com eles Manoel da Nóbrega(86).

Aí encontrou Tomé de Souza mais de 40 colonos, entre os quais Diogo Álvares o Caramuru, e Paulo Dias(87).

A Metrópole, porém, continuava a despejar na colônia os seus degradados, como acabamos de ver. Conquanto a legislação abusasse da pena de degredo, aplicando-a em excesso, e até por fados qne escapam à ação da justiça pública, era todavia sempre um grande mal por virem também entre os condenados muitos criminosos e perversos, que introduziam os vicios e os crimes na colônia, e inoculavam-lhe os maus hábitos que traziam(88).

Entre outras recomendações trazia o Governador a de cuidar em que os índios fossem bem tratados, castigando-se os delinqüentes que lhes fizessem dano; porque, diz o Regim. cit. — o principal fim por que se manda povoar o Brasil é a redução do gentio à fé católica.... e convém atraí-los à paz para o fim da propagação da fé, e aumento da povoação e comércio.

Também no mesmo Regimento se proibiu saltear e fazer guerra ao gentio por mar ou por terra, ainda que estivessem levantados, sem licença do Governador ou dos Capitães, que só a dariam a pessoas de confiança; sob pena de morte e de perda de toda a fazenda: e isto porque — era costume (diz o Regim.) saltear e roubar os gentios de paz por diversos modos, atraindo-os enganosamente, e indo depois vendê-los, até aos seus próprios inimigos, d’onde resultava levantarem-se eles e fazerem guerra aos Cristãos, sendo esta a principal causa das desordens que tinham havido.

Ao mesmo tempo, recomendava o Regimento, com cruel contradição — que fizesse a guerra aos que se mostrassem inimigos.... destruindo-lhes as aldeias e povoações, matando, e cativando.... e fazendo executar nas próprias aldeias alguns Chefes que pudesse aprisionar enquanto negociasse as pazes (!).

A respeito dos índios amigos autorizava a concessão de terras e aldeamentos; sendo digno de nota que nesse Regimento se consignasse desde logo a idéia altamente profícua à civilizarão dos indígenas, qual a de exigir — que os convertidos se estabelecessem junto às povoações, porque com o trato dos cristãos mais facilmente se hão de policiar.

Por outro lado, o mesmo Regimento proibiu que, atentos os graves inconvenientes demonstrados pela experiência, os colonos se internassem pelos sertões, e se comunicassem por semelhante meio de umas para outras Capitanias, sem licença do Governador, Capitães, ou povoadores, sob pena de açoites ou multa.

Várias outras importantes providências foram tomadas.

Se bem o recomendou o Regimento ao Governador, melhor o executou este, logo que se lhe ofereceu ocasião oportuna, com o fim de aterrar os gentios, não obstante prestarem-se ao serviço dos colonos a troco de quase insignificante remuneração: porquanto, levantando-se rixas entre eles, foram vítimas alguns colonos que se haviam imprudentemente embrenhado pelo sertão; para vingá-los foi mandado Pero de Góes, que, conseguindo apreender dois dos culpados, os fez fuzilar à boca de uma peça, como refere ele próprio em carta de 18 de Julho de 1551(89).

Do seu lado, porém, os Jesuítas, abrazados no santo fervor da propagação da fé, da conversão e civilização do gentio, tendo nessa época diante dos olhos unicamente a religião, conforme a pureza do seu instituto(90), não pouparam trabalhos, fadigas, e até perigos para o conseguirem. De grande auxílio lhes foi na Bahia o Caramuru e seu genro Paulo Dias. O Padre Manoel da Nóbrega(91) em breve conseguiu, pela música, pelo canto, e pelo aparato das cerimônias religiosas, entusiasmar os jovens índios, e com estes percorrendo as aldeias arrebanhar muitos, mesmo adultos; igualmente pregava aos colonos, e dirigia a escola, à qual concorriam também alguns índios mansos(92). O Padre João de Aspilcueta Navarro chegou a pregar-lhes na língua indígena(93). Alguns outros foram a outras Capitanias em sua missão evangélica, quais o mesmo Navarro, Leonardo Nunes, Diogo Jacome, Francisco Pires, Vicente Rodrigues, Afonso Braz, Simão Gonçalves. Em meados de 4549 saiu Nóbrega a visitar as Capitanias do Sul, chegando até S. Vicente.

A relaxação dos costumes continuava entre os colonos, não obstante os esforços dos Jesuítas; por tal forma, que Nóbrega, em carta de 9 de Agosto de 1549, o declara alto e bom som, dizendo ser o escândalo da mancebia, e a desordem da religião e justiça um mal geral entre colonos e indígenas, e até entre os próprios sacerdotes, em todas as Capitanias; e instava (bem como o Governador) pela presença urgente de um Bispo no Brasil(94).

Os índios continuavam, apesar das últimas providências, a ser pelos colonos aleivosamente assaltados e escravizados, como se vê da carta dirigida ao Rei pelo Ouvidor Geral Pedro Borges em 7 de Fevereiro de 1550(95); e até pelos mesmos provocados a guerras destruidoras, como ainda em data de 5 de Julho de 1559 o denuncia formalmente Nóbrega ao Governador Tomé de Souza, dizendo que — em toda a costa se tem geralmente por grandes e pequenos que é grande serviço de Deus fazer aos gentios que se comam, e se travem uns com os outros; e nisso dizem consistir o bem e segurança da terra; e isto aprovam Capitães e prelados, eclesiásticos e seculares(96). A regra de Maquiavel — dividi para reinar — já então era praticada, independente de brilhantes discursos e teorias.

Fundada a cidade de S. Salvador, cabeça do governo geral da colônia, e nela o primeiro Colégio de Jesuítas no Brasil, foi a mesma constituída sede do Bispado com a chegada do primeiro Bispo D. Pedro Fernandes Sardinha(97). Outro Colégio de Jesuítas também se fundou no mesmo ano de 1549 em S. Vicente(98).

Ao passo que o Governador Geral não se descuidava do bem temporal da colônia, seguindo porém a respeito dos índios o sistema do rigor, os Jesuítas prosseguiam na propagação da fé, e na consolidação dos princípios religiosos e da moral, meios reconhecidos os mais profícuos à boa ordem e prosperidade do estado civil e político; sem religião, sem moral, as melhores leis são quase de todo praticamente nulificadas. Os incansáveis e hercúleos trabalhos de Nóbrega, Navarro e seus companheiros o atestam. Sendo poucos para tão árdua tarefa, tiveram reforço; vindo ultimamente Luiz da Grã, e José de Anchieta(99), que chegaram à Bahia com o novo Governador geral Duarte da Costa em Julho de 1553. O Brasil era criado província à parte, tendo por provincial o Padre Manoel da Nóbrega.

Fundou ele nos campos de Piratininga um outro colégio em 154(100) da invocação de S. Paulo; o que trouxe mais tarde a fusão do estabelecimento antigo.

Os jesuítas não esmoreciam; ao contrário, maior fervor demonstraram na sua missão evangélica e civilizadora, não poupando fadigas, nem sacrifícios; o Padre Navarro, por exemplo, morreu de cansaço da primeira viagem de importância de exploração ao Rio de S. Francisco(101), o Padre Manoel da Nóbrega também de fadiga e excesso de trabalho(102).

No entanto, por tal maneira estavam arraigados nos costumes pervertidos dos colonos a falta de religião e de moral, assim como a desobediência e desrespeito às leis, por tal forma predominava a ambição de riquezas, que continuava o tráfico infame do cativeiro dos indígenas, chegando estes a venderem-se a si próprios, sobretudo na Capitania do Espirito Santo(103).

Os Jesuítas eram presentes em toda a parte, dir-se-ia que tinham o dom da ubiqüidade; aonde maior o perigo aí se achavam; com abnegação verdadeiramente cristã, cometiam atos de inaudita coragem, de assombroso heroísmo, qual, entre outros, o de arrancarem do poder e mãos dos índios (Tupinambás) um corpo humano destinado ao cruento festim(104), internando-se pelo sertão indefesos, e expostos à vingança cruel dos mesmos.

Verdadeiros apóstolos davam eles o exemplo, pregaram a colonos e índios, promoviam a reforma e regeneração da sociedade pela reforma dos costumes, pela prática da religião, e moral do cristianismo.

Infelizmente, o mal era profundo, e afetava interesses, que em todas as épocas da vida da humanidade têm sempre feito esquecer os princípios do justo e do honesto.

Também essas desordens deviam necessariamente trazer os seus naturais resultados; porque na vida moral, como na vida física, as conseqüências derivam dos fatos em uma série de outros fatos, que se prendem como os elos de uma cadeia: é a lógica dos fatos.

Os índios em todas as Capitanias começaram de reagir; e, como é natural e desculpável em povos selvagens, cometerão sem dúvida atrocidades, qual v. g. a de matarem e devorarem o mártir 1.° Bispo do Brasil com todos os seus companheiros, quando infelizmente naufragaram quase defronte da foz do Coruripe(105); os engenhos eram assaltados pelo gentio; os colonos viviam em contínuo sobresalto; a navegação sofria, porque a sua audácia tinha chegado ao ponto de acometerem os navios portugueses; a própria capital viu-se em perigo pelos ataques dos indígenas.

Para cúmulo de desgraça, os Franceses, continuando em suas excursões, haviam conseguido sob a direção de Nicolau Durand Villegaignon estabelecer-se no Rio de Janeiro (1555), angariando as boas relações e amizade dos Tamoios(l06).

Em o Norte os colonos repeliam como podiam os ataques dos índios; no Sul, porém, a audácia destes tinha crescido sobretudo por haverem alcançado algumas vantagens contra os Portugueses(107). Os colonos não poupavam os desgraçados que lhes caíam nas mãos; o ferro, o fogo, e o cativeiro eram a sorte dos índios inimigos. E, se em Pernambuco Jerônimo de Albuquerque Coelho se lisonjeava de ter submetido o gentio, o mesmo não acontecia nas Capitanias do Sul, onde as correrias e invasões dos Indígenas continuavam(108). Uma C. R. de 1557 legaliza o cativeiro dos Caetés(109).

Terminado o governo de Duarte da Costa, sendo já falecido (desde 11 de Junho de 1557) El-Rei D. João, a quem sucedeu D. Sebastião, então na menoridade, sob a regência de D. Catarina (e desde 1562 sob a do Cardeal D. Henrique), foi deliberado, à vista do crítico estado da colônia, mandar-se por Governador Geral (3.°) Mem de Sá, magistrado distinto por todos os dotes da inteligência e do coração; o qual chegou ao Brasil em 1558(110).

Acudiu ele de pronto à Capitania do Espírito Santo, onde os índios se tinham levantado; aí perdeu o filho Fornão de Sá: assim como à dos Ilhéus, e à de Porto-Seguro, onde os terríveis Aimorés não deixávam repouso aos colonos(111).

O governo da metrópole aprovou e lh’o agradeceu; e ao mesmo tempo, em carta Régia de 1558 recomendou-lhe toda a proteção aos Jesuítas na conversão dos gentios. Em outra carta Régia do mesmo ano, dirigida à Câmara de S. Salvador, igual recomendação se fez, e que aos convertidos se tratasse bem, não fossem vexados, nem se lhes tomassem as terras, porque, além de ser de razão e justiça, isto serviria de exemplo aos outros gentios(112).

Mem de Sá começou nesta época a organizar as missões, reunindo várias aldeias de índios sob o governo de um principal d’entre eles, e auxílio espiritual dos Padres da Companhia(113), os quais todavia exerceram desde logo também alguma autoridade temporal, embora em forma palernal e conciliatória; tais foram as de S. Paulo, Espirito Santo, e outras. Proibiu a antropofagia, fazendo punir severamente a infração.

Continuava entretanto o sistema do terror contra os índios que se atreviam a atacar as povoações e colonos; e também a guerra aberta para afugentá-los, quando se não submetiam, como sucedeu na Bahia e mais tarde em S. Vicente(114).

Os selvagens persistiam por sua parte em infestar a terra com suas assaltadas; formando mesmo alianças entre si contra os Portügueses, como foi a celebrada Confederação dos Tamoios, conjurada pelos esforços dos Jesuítas e sobretudo do Padre José de Anchieta(115); e auxiliando os estrangeiros, quais os Franceses, contra os colonos. — Acaso eram eles instigados pelo espírito do mal? ou tal estado de cousas teve sua causa originária no fato não interrompido das vexações exercidas pelos colonos contra os pobres índios, fossem amigos e pior se inimigos? sofrendo agora os atuais colonos as conseqüências das culpas dos antecessores, e quiçá das suas próprias?

O certo é que, se alguns Índios se mostravam assim inimigos, e até cruéis (por vingança), outros se prestavam com facilidade à catequese debaixo da direção dos Padres da Companhia(116). As missões criadas por Mem de Sá aumentavm e progrediam a olhos vistos; os índios se convertiam à religião cristã por milhares; o casamento era sancionado pelo Sacramento da Igreja; as escolas eram freqüentadas com proveito por número não pequeno deles(117). Os Jesuítas instituiram aulas da língua tupi(118).

Com as providências tomadas, com os exemplos de castigo, e mais que tudo com a intervenção e influência dos Jesuítas, conseguiu Mem de Sá algum sossego; e a colônia dava indícios de prosperar; o gentio mostrava-se mais pacifico ou amedrontado(119).

Cumprindo desalojar definitivamente os Franceses, já expulsos em 1560 do forte de Villegaignon, e fundar no Rio de Janeiro uma colônia, veio da Metrópole uma armada, que chegou à Bahia em Fevereiro de 1564, trazendo por Capitão-Mor Estácio de Sá, sobrinho do Governador. Com auxílios recebidos, principalmente de S. Vicente, entrou ele a barra em Fevereiro de 1565, e lançou os fundamentos da cidade de S. Sebastião junto ao Pão d’Açúcar. Os gentios, auxiliados e industriados pelos Franceses, incomodavam em extremo a nova colônia. Disto informado por José de Anchieta, e obtidos reforços da Metrópole e de Pernambuco, veio Mem de Sá em socorro de seu sobrinho: e, destroçando os Franceses e os índios em temíveis combates, conseguiu a paz; a cidade foi transferida para outro lugar mais apropriado, e é hoje a Capital do império. Mas Estácio de Sá havia perdido a vida em conseqüência de ferimentos no último combate(120). Deixando por Governador seu sobrinho Salvador Corrêa de Sá, voltou Mem de Sá à Bahia. Salvador repeliu os Franceses que o tinham vindo atacar, e foi batê-los a Cabo Frio, onde se haviam acoutado(121). De grande auxílio foi aos Portugueses o índio Ararigboia(122). — Os Jesuítas fundaram um outro colégio na nova povoação(123).

Urgia no entanto tomar providências sobre os índios, a fim de que se harmonizassem as queixas dos colonos, que clamavam sempre por falta de braços, e a oposição dos Jesuítas às suas injustas e exageradas preterições; de um lado a escravidão formal ou disfarçada, de outro a proteção decidida à liberdade dos mesmos. Recebeu Mem de Sá uma Carta Régia o esse respeito, de conformidade com o Assento tomado pela Mesa de Consciência e Ordens(124), impondo restrições ao direito de cativar o gentio; declarando-se no Assento e na Carta que só seria legítimo, quando o fossem em guerra justa, ou entregues por seus pais para serem educados, ou dos que se vendessem, maiores de 20 anos. Na Carta se reconhecia que tinham havido abusos para reduzir a cativeiro os índios, e que para isto se usava de manhas, enganos, e força, a fim de serem eles induzidos a venderem-se, e a resgates injustos. Na mesma Carta se recomendava que nas aldeias fossem admitidos colonos morigerados, ainda fazendo-se-lhes algumas vantagens, no intuito de facilitar a civilização dos indígenas; o mesmo pensamento já manifestado no Regimento dado a Tomé de Souza.

Segundo determinação da referida Carta, fez Mem de Sá um Conselho com o Bispo, Ouvidor Geral, e Padres da Companhia; o qual tomou a resolução seguinte, em favor dos índios: que, se algum se recolhesse às missões, só poderia ser entregue por ordem do Governador ou do Ouvidor, provada a legitimidade do cativeiro; 2.°, que perderia o colono todo o direito ao índio, se daí o tirasse à força; 3.°, que os Jesuítas entregariam dos das suas aldéas os que se confessassem escravos, ou preferissem livres servir fora; 4.°, que os resgates não seriam válidos sem o consentimento das autoridades (não obstante os forais em contrário); 5.°, que fossem castigados os que casassem as índias com escravos; 6.°, que se nomeasse um Curador aos índios; 7.°, que o Ouvidor fizesse correção pelas missões e aldeias, ouvindo as partes e administrando justiça(125).

Tão justas providências excitaram, todavia, como sempre, queixas dos colonos; e vieram demonstrar o fato público e notório da injustiça com que se mantinham cativos os índios, pela impossibilidade em que se acharam de provar que eram possuídos como tais segundo as determinações do Direito então vigente.

Tornava-se, portanto, necessário regularizar de modo mais solene semelhante matéria. Uma lei do Reino o fez; é outras se lhe seguiram.



CAPÍTULO IV.

Leis de escravidão dos índios. — Jesuítas, e colonos. — Leis de liberdade dos gentios. — Novas leis de escravidão. — Caçadas de índios. — Os Paulistas.

Desde 1568 (20 de Janeiro) tomara as rédeas do governo El-Rei D. Sebastião, cavalheiro, e religioso ao ponto do sacrifício da própria vida na defesa da fé e da religião de Cristo. Governava ainda o Brasil Mem de Sá, quando se expediu a L. de 20 de Março de 1570(126), publicada na colônia neste mesmo ano, relativa à escravidão dos índios. A influência do Cristianismo nela se revela; o anátema fulminado pelo Sumo Pontífice Paulo III na sua Bula ou Breve de 1537 não deixou de produzir alguns benéficos resultados. Todavia o Governo da Metrópole foi arrastado, a seu pesar, a fazer concessões aos colonos, mantendo exceções a favor do cativeiro dos índios, comquanto em principio reconhecesse e mandasse garantir-lhes a liberdade(127); exceções fundadas em aparente humanidade a bem dos mesmos índios, e em um errado direito do vencedor.

Reconhecendo a lei que se cativava o gentio por modos ilícitos, proibiu que de então em diante se pudesse cativar por modo nem maneira alguma; exceto: 1.° aqueles que fossem aprisionados em guerra justa, feita com licença Régia, ou do Governador; 2.°, aqueles que costumavam saltear os colonos ou outros índios para os devorarem. — Ainda nestes casos restritos, era imposta a obrigação de inscrever os cativos nos livros das Provedorias dentro de dois meses a contar da apreensão, sob pena de perderem todo o direito, e de ficarem ipso facto livres os aprisionados.

Como era de esperar, atentos os hábitos dos colonos, levantaram estes tal clamor contra a lei, que em breve foi expedida ao Governador uma Carta Régia(128) mandando restabelecer o antigo sistema de resgates, e recomendando-o do modo seguinte: — No que toca ao resgate dos escravos se deve ter tal moderação, que não se impida de todo o dito resgate, pela necessidade que as fazendas deles têm, nem se permitam resgates manifestamente injustos, e a devassidão que até agora nisso houve(129).

Mem de Sá não chegou a ser o seu executor; porquanto a Metrópole, entendendo conveniente dividir o Brasil em dois governos gerais, um ao Sul confiou ao Dr. Antônio Salema, e o outro ao Norte a Luiz de Brito e Almeida, sendo já falecido Mem de Sá, assim como o Bispo D. Pedro Leitão(130).

Antes, porém, de se separarem para os seus respectivos governos, reuniram-se na Bahia em conselho com o Ouvidor Geral e Padres da Companhia, a fim de regularem a execução das leis sobre os índios; e assentou-se em 6 de Janeiro de 1574(131) no seguinte acordo, composto de 10 capítulos ou artigos, cujas idéias capitais são: 1.° que seria legítima a escravidão do índio aprisionado em guerra manifestamente lícita; entendendo-se por tal a que fosse feita pelos Governadores segundo os seus Regimentos, ou a que ocasionalmente se vissem os Capitães forçados a fazer, precedendo resolução com voto dos Oficiais da Câmara e outras pessoas experientes, dos Padres da Companhia, do Vigário, e do Provedor da Fazenda, de que se deveria lavrar auto; 2.°, que também se reputaria legitimamente cativo o índio que, maior de 21 anos e escravo de outros índios, preferisse ser escravo de cristão; 3.°, que o resgate não era aplicável ao índio manso; o qual não podia portanto ser por tal título reduzido a cativeiro; exceto se, fugindo da aldeia para o sertão, estivesse ausente mais de um ano; 4.°, que nenhum resgate seria válido, quando feito sem licença dos Governadores ou Capitães; devendo decidir sobre sua validade os Provedores e mais dois adjuntos eleitos em Câmara no princípio de cada ano; 5.°, que as pessoas que trouxessem índios de resgate, ou por mar ou por terra, dessem entrada na respectiva alfândega, antes de qualquer comunicacão com alguém; 6.° que só seria garantida aos colonos a propriedade sobre o índio de resgate, quando registrado; tendo-se por livres os que não estivessem; 7.° que os índios apreendidos em guerra que não fosse feita nas condições expostas, seriam livres: 8.° que os infratores ficariam sujeitos às penas de açoites, multa, e degredo, além das outras em que pudessem incorrer.

Os dois Governadores, seguindo no seu governo, viram-se todavia a braços com o gentio, quiçá incitado pelos colonos, que agora achavam meio de assim arrebanharem trabalhadores para as suas fazendas e serviço.

Mas o erro de dividir o Brasil em dois governos foi de pronto reconhecido; e logo em fins de 1577 restabeleceu-se o de um só, confiado a Lourenço da Veiga, que empossou-se em princípios de 1578(132). Neste mesmo ano El-Rei D. Sebastião perdera a vida em Alcaçarquevir (4 de Agosto de 1578); dando este desastre lugar a que pouco depois a coroa de Portugal fosse reunida à de Castela na cabeça de D. Felipe II, por falecimento do Cardeal Rei D. Henrique(133), e assim passasse o Brasil ao mesmo domínio.

Por morte de Lourenço da Veiga (1581), foi o governo da colônia exercido interinamente por Cosmo Rangel de Macedo; tudo foi desordem na colônia; o gentio continuava alevantado: os colonos sofriam; os Franceses persistiam nas suas tentativas; e agora também os Ingleses começavam as suas.

Com o nuvo Governador Manoel Telles Barreto vieram (1583), de reforço á Companhia de Jesus alguns companheiros, entre os quais o Padre Fernão Cardim(134). No seu tempo conseguiu-se a colonização da Paraíba, tantas vezes malograda. A ordem foi restabelecida. As tentativas dos estrangeiros burladas, e mesmo repelidas à força. De sorte que, nessa época, pode-se dizer, se em algumas Capitanias o estado era pouco lisonjeiro, em outras era próspero a ponto mesmo de se desenvolver (Pernambuco v. g.) o luxo entre os colonos já de modo notável.

Falecendo Barreto (Março de 1587), passou o governo à Junta interina.

A corte de Madri expediu a Lei de 22 de Agosto de 1587(135), pela qual se suscitava a observância da Lei de D. Sebastião de 1570, nela inserta, relativamente aos casos em que os índios podiam ser cativos, acrescentando-se que os que livres trabalhassem nas fazendas não pudessem jamais ser retidos como escravos, mas sim como inteiramente livres a serviço enquanto fosse sua vontade(136); lei em que se fundaram os Padres da Companhia, combinada com outras determinações anteriores, para se constituírem os protetores e defensores dos Indígenas(137).

Em 1591 chegou ao Brasil o novo Governador geral D. Francisco de Souza; cuja idéia dominante de descoberta de minas, embora trouxesse a exploração e descobertas no sertão, todavia distraiu gente e cabedal, e impediu de acudir, como conviria, às agressões de Franceses, Ingleses, e Holandeses. Conseguiu-se no entanto a colonização do Rio Grande do Norte(138).

Ainda outros fatos se passaram; dos quais merece especial menção o de começarem os Paulistas as suas excursões para o Sul, acossando os índios. Os Jesuilas, porém, sempre firmes e alerta no seu posto como verdadeiros soldados da fé e da religião, já lhes faziam frente, estabelecidos na Laguna(139).

Em algumas Capitanias sofriam os Padres as conseqüências da sua pertinácia em defensa dos índios; assim, na Paraíba foram eles expulsos (1593) por Feliciano Coelho, que confiou as aldeias aos Franciscanos; os quais por seu turno também foram lançados fora em 1596(140).

Os Jesuítas conseguiram, entretanto, da corte de Madri outra Lei em 11 de Novembro de 1595(141) e a Provisão de 26 de Julho de 1596(142), regulando não só as condições para que se entendesse justa a guerra ao gentio, e conseqüentemente, nesse caso único, legal o cativeiro, mas também a maneira por que os Padres se haveriam com os mesmos, e os tratariam. Só seria jusla a guerra mandada fazer por provisões especiais assinadas do Real punho(143).

Havendo tomado posse do governo do Brasil em 1602 o novo Governador geral Diogo Botelho, representou este à corte sobre o sistema seguido com o gentio, qualificando-o de improfícuo, porque os Padres os tinham separados em aldeias suas; entendendo ele mais acertado trazê-los às povoações, ainda que coagidos(144). A resposta, porém, graças à influência que a ditou, foi negativa, como consta das Provisões de 5 de Junho de 1605 e 4 de Março de 1608(145), extremamente restritivas da escravidão.

A primeira(146) estabeleceu mesmo, em tese, que em nenhum caso se pudesse cativar o gentio — porque, conquanto houvesse algumas razões de Direito para se poder em alguns casos introduzir o dito cativeiro, eram de tanto maior consideração as que havia em contrário, especialmente pelo que tocava à conversão dos gentios à nossa Santa Fé Católica, que se deviam antepor a todas as mais; e também pelo que mais convinha ao bom governo e conservação da paz daquele Estado.

Foi este um primeiro raio fulminado contra a escravidão, antes tolerada e legitimada.

Na Lei de 30 de Julho de 1609(147) foi isto mais explicitamente consignado. — Em a 1.ª parte lê-se— que, para se atalharem os grandes excessos que poderá haver, se o cativeiro em algum caso se permitir, e para de todo se cerrar a porta a isto, declaram-se todos os gentios daquelas partes do Brasil por livres, conforme a Direito e seu nascimento natural, assim os que já forem batizados e reduzidos à nossa Santa Fé Católica, como os que ainda vierem como gentios conforme a seus ritos e cerimônias; os quais todos serão tratados e havidos por pessoas livres, como são; e não serão constrangidos a serviço, nem a cousa alguma, contra sua livre vontade; e as pessoas que deles se servirem nas suas fazendas lhes pagarão seu trabalho, assim e da maneira que são obrigados a pagar a todas as mais pessoas livres, de que se servem; podendo outrossim os ditos gentios com liberdade e segurança possuir sua fazenda e propriedade, morar e comerciar com os moradores das Capitanias. — Na 2.ª parte dispôs a lei sobre a civilisação e catequese dos mesmos, que confiou dos Jesuítas — pelos muitos conhecimentos e exercício que desta matéria têm, e pelo crédito e confiança que os gentios deles fazem —; aos quais igualmente confirmou o protetorado dós índios, devendo com eles entender-se o Governador sobre os aldeiamentos, distribuição de terras, entrega de índios para serviço público ou particular, não podendo outros senão eles ir ao sertão buscá-los: proibiu, outrossim, que os índios fossem contra sua vontade transferidos das Capitanias, ou das povoações e lugares em que estivessem; que sofressem tributo algum real ou pessoal; que sobre eles exercessem mais jurisdição e poder, do que fosse conferido pelos Regimentos sobre as pessoas livres. Em falta do Ouvidor, deveria o Governador nomear Juiz especial, que conhecesse das causas dos Índios, dispensando todo o favor compatível com a justiça; assim como designar por Curador para as suas causas um cristão velho e de confiança, que de acordo com os Religiosos requeresse a bem dos mesmos. — Na 3.ª parte, olhando ao pretérito, e reconhecendo abusos no cativar os índios, ordenou que fossem restituídos à liberdade todos os que foram escravizados contra Direito, não obstante títulos de venda e mesmo sentenças em contrário, que foram declarados nulos. — Na 4.ª, finalmente, impôs as penas das Ordenações e Direito Comum(148) aos que trouxessem do sertão e tivessem por escravos os gentios, em contravenção ao que ficava decretado.

No entanto, forçado Botelho a retirar-se em conseqüência de suas desavenças com o Bispo e Jesuítas, havia chegado ao Recife em Dezembro de 1607 o Governador D. Diogo de Menezes e Siqueira, depois Conde da Ericeira(149), que dali seguiu para a Bahia em fins de 1608. — Para o Sul (Espírito Santo, Rio de Janeiro, e S. Vicente) de novo separado, veio D. Francisco de Souza, igualmente Superintendente Geral das Minas, a quem sucedeu seu filho D. Luiz de Souza(150).

Pelas últimas leis sobre os índios, ficavam estes sob a tutela quase exclusiva dos Padres da Companhia; os quais já cuidavam mais de atentar para os bens temporais da Ordem com vistas ambiciosas de predomínio(151) e desenvolviam a sua indústria agrícola e até comercial, com o grande auxílio do braço dos indígenas, que tinham em grande número nas fazendas e engenhos(152). Por modo que, faltando trabalhadores aos colonos para as suas lavouras e serviços, e opondo-se os Jesuítas a que escravizassem os índios (e nisto tinham razão), ou mesmo retirassem das aldeias ou povoaçõe os já domesticados, levantaram-se, sobretudo em S. Paulo, bandeiras para irem aprender índios bravos fora da jurisdição dos Padres(153).

A Câmara da Paraíba fez chegar ao Rei uma representação datada de 19 de Abril de 1610 sobre o estado dos colonos e necessidade de lhes acudir. Em carta de 8 de Maio do mesmo ano igualmente o fez o Governador D. Diogo de Menezes. Feliciano Coelho (da Paraíba) queixava-se amargamente, receiando até que se degolassem reciprocamente índios e colonos. Ainda em Carta de 7 de Fevereiro de 1611 D. Diogo insistia em mudar-se de conduta a respeito dos índios e dos Jesuítas, tirando-se aos Padres a direção temporal das aldeias, e acabando-se mesmo com estas — porque eles e o Estado maiores vantagens ganhariam, introduzindo-se os gentios nas grandes povoações, onde somente, que não isolados delas em aldeias, poderiam ganhar os hábitos civilizados.

Semelhante estado de cousas despertou a atenção da Corte, que, revendo tão melindroso assunto, promulgou a L. de 10 de Setembro de 1611(154); a qual contém as seguintes disposições capitais: 1.ª a liberdade dos índios é reconhecida em tese, sob penas aos infratores; 2.ª, todavia era reputado legitimo o cativeiro não só dos aprisionados em guerra justa, mas também dos resgatados quando cativos de outros índios, que, a não ser o resgate, os devorariam; 3.ª, nenhuma guerra se poderia fazer ao gentio senão quando este movesse guerra, levantamento, ou rebelião; precedendo resolução tomada pela Junta composta do Governador, Bispo (se presente), Chanceler e Desembargadores(155) e todos os Prelados das Ordens (presentes no lugar da Junta), e depois de competentemente aprovada pelo Rei; exceto em caso de perigo iminente, em que todavia ficava livre ao Rei a confirmação (e portanto a legitimação do cativeiro); 4.ª, que os resgatados serviriam como cativos somente 10 anos quando comprados por preço não excedente ao taxado pela Junta(156), e perpetuamente se fosse superior; 5.ª, que para o governo civil das aldeias, o Governador, sob parecer do Chanceler e do Provedor de Defuntos, nomeasse Capitão, que serviria por três anos; organizadas as aldeias em povoações de 300 casais quando muito, em tal distância das matas do pau brasil e dos engenhos, que lhes não pudessem fazer dano; e que se lhes distribuíssem terras; 6.ª, que, quanto ao espiritual, houvesse em cada aldeia uma Igreja com um Vigário, Clérigo Português conhecedor da língua indígena; e, em falta, religiosos da Companhia do Jesus; e, não os havendo, de quaisquer outras Religiões; apresentados pelo Rei ou pelo Governador, confirmados pelos Bispos, o sujeitos às visitações(157), e penas eclesiásticas; 7.ª, que nas aldeias deveriam residir os Capitães com suas famílias, e os Vigários; 8.ª, que nelas seria o Juiz Privativo o Capitão da aldeia; de cujas decisões caberia recurso para o Ouvidor, e Relação; 9.ª, que os índios delas poderiam ser dados a serviço mesmo particular, quando os procurassem e eles quisessem servir, por preço constante da taxa geral que fosse marcada para o Estado; 10.ª, que esta ordem se guardasse em todas as aldeias presentes e futuras, bem como nas que fossem criadas de índios mandados pela mesma Lei reslituir à sua liberdade por indevidamente escravizados; 11.ª, que todos os anos mandaria o Governador tirar devassa por um Desembargador contra os Capitães de aldeias, e quaisquer outras pessoas, relativamente à falta de observância da Lei; procedendo-se por ela na Relação breve e sumariamente contra os culpados.

Os colonos haviam assim conseguido a vitória, abrindo-se de novo lugar à escravidão dos índios; o interesse pecuniário e metálico, a pretexto de — paz do Estado... e maior bem dos miseráveis que por tal sorte se pretendiam civilizar e cristianizar — levou de vencida a causa da justiça, da humanidade, e da verdadeira religião, aliás bem julgada na anterior Lei de 1609! Em vez do progresso, foi um passo altamente retrógrado, como a experiência veio confirmar.

Os Jesuítas, por seu lado, viram-se dispensados quase que absolutamente da sua tarefa, perdendo assim, com visível satisfação dos seus inimigos, um meio de grande influência e poder.

D. Diogo de Menezes se retirara em 1612, e fora substituído por Gaspar de Souza. — Os Franceses, como previra aquele estadista, dirigiram-se para o Maranhão, onde se fortificaram, sob o comando de La Ravardière; em 1615, porém, foram expulsos por Jerônimo de Albuquerque Coelho (Maranhão), auxiliado por diversos, quais sobretudo Alexandre de Moura, Diogo de Campos, Diogo Soares, e muitos Índios(158). — E fins do mesmo ano teve começo a povoação do Pará por Francisco Caldeira de Castelo Branco. Para o Maranhão principalmente eram mandados colonos dos Açores, e também os degradados(159);.

Em conseqüência das dificuldades da navegação naqueles tempos, provenientes das correntes oceânicas, as três Capitanias do Ceará, Maranhão, e Pará foram constituídas em governo distinto do das outras, em Estado separado do Brasil, por Decreto de 13 de Junho de 1621(160).

Os Jesuítas só foram aí admitidos (1622) com a formal obrigação de se não intrometerem na proteção dos índios, impedindo a sujeição aos colonos, que já então se denominava administração(161).

Enquanto isto se passava no Norte, e as outras Capitanias progrediam com algum sossego e prosperidade, os Paulistas haviam desenvolvido extrema atividade em cativar os gentios, exercendo sobre eles uma verdadeira caçada, e chegaram nas suas excursões até aos campos ao N. de Guarapuava, e missões de Guaira, onde os aprendiam por milhares, que vinham vender mesmo ao Rio de Janeiro(162).

Por esta época, organizada na Holanda a célebre Companhia das Índias Ocidentais, foram-lhe pelos Estados-Gerais conferidos extraordinários favores, inclusive fazer com os indígenas tratados de aliança e comércio, reconhecendo assim formalmente neles a qualidade e todos os direitos de homens livres, e não entes destinados a servir aos Europeus como escravos, ou contra sua vontade(163). — Esta mesma Companhia deliberou a conquista do Brasil, que tentou sem grande êxito(164). — Diogo Luiz de Oliveira, o novo Governador, tratou de fortificar-se e preparar-se contra tão temível inimigo.

No Estado do Maranhão e Grão Pará se havim estabelecido as chamadas administrações de índios, que consistiam em confiar-se o governo das aldeias a chefes colonos, que eram retribuídos com o serviço dos mesmos índios. E, porque o Alv. de 8 de Junho de 1623 o houvesse positivamente proibido(165), o povo sublevou-se, e a Câmara fez suspender a sua execução até que chegasse o Governador Francisco Coelho de Carvalho.

Por esta época, e mesmo anteriormente, Bento Maciel Parente (de execranda memória) exercia crueldades contra os miseráveis índios(166).

A título de resgates continuavam os atrozes delitos cometidos pelos colonos nos sertões em busca de índios; nada podia evitar ou impedir: de sorte que o Governador se viu forçado a proibí-los, ainda que contra a lei que em alguns casos os permitia. Mas esta justa providência deu lugar a tal clamor do povo, que ele foi obrigado a cassar a sua ordem, e restabelecer os resgates(167).

No Sul, não era mais feliz a sorte do miserável gentio. Os Paulistas continuavam nas suas correrias em caça dos índios, que escravizavam e vendiam; chegando a invadir agora as próprias missões dos Jesuítas, e até as aldeias, d’onde arrancavam mesmo os já reduzidos; por forma que dali trouxerão para cima de 15.000(168). — Por Dec. de 18 de Setembro de 1628 havia a Corte mandado que se punissem os culpados. — Os Jesuítas queixavam-se; e vieram a S. Paulo e ao Rio de Janeiro pedir providências. — Nada, porém, continha a audácia daqueles intrépidos aventureiros.

Quase em fins da primeira metade do século XVII consolidou-se a conquista Holandesa no Brasil, não obstante a oposição de Matias de Albuquerque Coelho e de outros bravos; Pernambuco era definitivamente ocupado; a colônia holandesa estendia-se nessa época (1635–1644) desde Pernambuco até o Maranhão inclusivamente, apesar de serem os Holandeses grandemente incomodados pelas correrias do índio Antônio Felipe Camarão, do preto Henrique Dias, e de outros, intitulados — capitães das emboscadas —. O governo dessa Nova Holanda ou Brasil Holandês foi confiado ao príncipe Maurício de Nassau; cuja sábia, ativa e justa administração fez em breve prosperar a colônia (singular e natural contraste do procedimento mesquinho, suspeitoso e egoísta da metrópole portuguesa ou espanhola), e grangeou-lhe a estima e o respeito não só dos seus, mas dos próprios inimigos(169); a colonização mereceu-lhe especial cuidado; os índios eram homens.

Deixemos, porém, tão vasto assunto histórico e social. Voltemos aos nossos indígenas, cuja escravidão ou liberdade foi sempre a questão abrasadora da colônia(170).



CAPÍTULO V.

Bula do Papa Urbano VIII a favor dos índios. — Oposição do povo. — Expulsão de Jesuítas. — Administração de índios. — Padre Antônio Vieira. — Aldeias. — Entradas nos sertões para descer Gentios. — Nova expulsão de Jesuítas. — Novas leis sobre índios e Jesuítas. — Guerra aos índios; destruição de tribos.

Dominava o sistema da Lei de 10 de Setembro de 1611.

Os Paulistas prosseguiam cada vez mais ousados nas suas correrias ou caçadas, e assaltavam as missões jesuíticas até do Acaraí(171), sem que cousa alguma conseguissem os Padres do Governo do Brasil; por forma que resolveram mandar queixas diretas a Madri e ao Sumo Pontífice, despachando para aquela o Padre Ruy de Montoya(172), e para Roma Francisco Dias Tano(173).

Mais bem sucedidos voltaram com uma Bula do Papa Urbano VIII (de 22 de Abril de 1639) publicando no Brasil a de Paulo III (de 28 de Maio de 1537), declarando incorrer em excomunhão os que cativassem e vendessem os índios.

O povo e a Câmara do Rio de Janeiro se opuseram à execução da Bula; e, não obstante a proteção do Governador, Salvador Corrêa de Sá e Benavides, aos Jesuítas, foram estes constrangidos a desistir de quaisquer direitos que da Bula lhes pudessem vir, e a declarar que se não envolveriam mais na administração dos índios, exceto das Aldeias, onde se comprometeram a não admitir os dos particulares, como consta do Acordo de 22 de Junho de 1640(174).

Em S. Paulo o levantamento contra os Jesuítas foi mais violento, porque trouxe a sua expulsão, conforme o acordo de 13 de Julho de 1640(175); e os Paulistas mandaram à Corte procuradores com uma representação contra os Padres, e com eles Amador Bueno enviado pela Câmara(176).

A representação referida, e a anterior que haviam levado os Jesuítas contra os Paulistas, foram submetidas ao parecer de várias pessoas conspícuas; dando em resultado que se mandassem, por Alv. de 3 de Outubro de 1643 e C. R. da mesma data, restituir os Jesuítas aos seus colégios até que se deliberasse definitivamente(177): o que todavia não pôde ser logo executado(178).

Na Bahia se havia deliberado por assento de 6 do Abril de 1643(179), confirmado pelo Rei em C. R. de 23 de Junho de 1655; fazer a guerra aos índios; o que foi confiado a Gaspar Rodrigues.

No entanto, com a gloriosa revolução do 1.° de Dezembro de 1640 havia terminado para Portugal o domínio da Espanha, e sido elevado ao trono o Duque de Bragança aclamado Rei D. João IV. — E logo em 1641 o Brasil voltou ao domínio português à exceção da parte ocupada pelos Holandeses.

O Conselho das Índias fora substituído pelo Ultramarino (1642), incumbido de prover ao que conviesse ao bem dos Estados ultramarinos, bom governo e aumento deles, e propagação do Santo Evangelho.

O desejo de lançar fora os Holandeses agora mais se pronunciava. O Padre Antônio Vieira, em um célebre sermão pregado na Bahia em 1640, provocou os povos. A corte portuguesa prestou então maior atenção a tão grave objeto; e muito facilitou a vitória a má gerência da colônia holandesa desde que em 1643 a deixou o príncipe de Nassau, assim como a guerra levantada entre a Holanda e a Inglaterra. Não foi, porém, sem se haverem ferido combates por mar e por terra, e sem se haver derramado não pouco sangue. Todos porfiavam a quem melhor serviria nessa tão grande luta, nesse patriótico empenho. Desde 1644 foram expulsos do Maranhão por Antônio Moniz Barreiros e Pedro de Albuquerque. No Ceará o mesmo lhes sucedia. Em Pernambuco durou a luta desde 1645 até 1654, em que Segismundo Von Schkoppe teve de capitular e abandonar o Recife; as batalhas dos Guararapes sobretudo decidiram da sorte da guerra da restauração. A história registra com respeito e gratidão os nomes de Antônio Telles da Silva (governador geral), João Fernandes Vieira, André Vidal de Negreiros, Antônio Telles de Menezes, Francisco Barreto de Menezes, Antônio Dias Cardoso, Salvador Corrêa de Sá e Benavides, Pedro Jacques de Magalhães, e tantos outros verdadeiros heróis; distinguindo-se o negro Henrique Dias, o índio Camarão com os seus, sua mulher D. Clara, e ainda vários outros(180).

Entretanto fatos interessantes tinham lugar na vida colonial do Brasil, e acerca dos Índios.

Por Dec. de 27 de Abril de 1645 se dispôs que os primogênitos herdeiros presuntivos da coroa se intitulariam — Príncipes do Brasil —, o que elevava a colônia à categoria de Principado(181).

Havia sido instituída por Alv. de 10 de Março de 1649 a Companhia geral de Comércio do Brasil, à semelhança da de Holanda, cuja duração seria de 20 anos, prorrogáveis por mais 10, e à qual se concedeu o monopólio de diversos gêneros(182).

O Estado do Maranhão fora dividido pela Resol. de 25 de Fevereiro de 1652 em dois governos distintos, Maranhão e Pará.

Na Bahia fora restabelecida a Relação, à qual se deu o novo Regimento de 12 de Setembro de 1652(183). Nele se recomendava ao Governador proteção aos índios de paz (§21), «não consentindo que fossem maltratados, fazendo punir com rigor quem os molestasse e maltratasse; assim como que desse ordem a que pudessem viver junto das povoações dos Portugueses, de modo que os do sertão folgassem de vir para as ditas povoações, observando-se a lei de D. Sebastião e provisões posteriormente promulgadas.»

No Pará e Maranhão continuavam as administrações de índios, com todos os horrores cometidos pelos colonos, a fim de os haverem do sertão por bem ou por mal; e abusavam por tal forma dos que caiam debaixo das mesmas administrações —que(184) em breves dias de serviço ou morriam à fome e excessivo trabalho, ou fugiam pela terra dentro, onde a poucas jornadas pereciam, havendo por esta causa perecido e acabado inumerável gentio no Maranhão e Pará, e em outras partes do Estado do Brasil.

Foi, pois, decretado pelo Alvará de 10 de Novembro de 1647(185)que, sendo livres os índios, como fora declarado pelos Reis de Portugal e pelos Sumos Pontífices, não houvessem mais administradores nem administrações, havendo por nulas e de nenhum efeito todas as que estivessem dadas, de modo a não haver memória delas; e que os índios pudessem livremente servir e trabalhar com quem bem lhes parecesse, e melhor pagasse o seu trabalho.

Outros Alvarás de 5 e 29 de Setembro de 1649 foram expedidos sobre o mesmo assunto(186).

E os novos Governadores, Baltazar de Souza Pereira, no Maranhão, e Inácio do Rego Barreto, no Pará, trouxeram instruções constantes dos seus regimentos(187), especiais para a execução das ditas determinações; o que todavia não conseguiram, em razão da oposição levantada pelos povos, que no Pará chegaram até a obrigar o Reitor dos Jesuítas, João de Souto Mayor, a declarar solenemente que os Padres se limitariam ao espiritual quanto aos índios, condição essencial de sua tolerância nessa Capitania.

Pelo mesmo tempo chegava ao Maranhão o Padre Antônio Vieira (1653), da Companhia de Jesus, com carta do Rei de 21 de Outubro de 1652, autorizando-o a proceder como melhor entendesse relativamente aos índios; para o que deveria ser auxiliado pelos Governadores conforme as instruções a estes dadas(188). Na 1.ª Dominga da Quaresma pregou ele o seu 1.° sermão, em defesa da liberdade dos índios procurando captar a benevolência, e tentar a emenda ou correção dos moradores. E, passando-se ao Pará, exibiu a Carta Régia mencionada; dando esta lugar a um levantamento popular, de que resultou assinar ele um protesto de se não envolver em reformar as administrações de índios. Querendo, porém, aquilatar por si mesmo o procedimento dos colonos na apreensão deles, acompanhou uma expedição ao Alto Tocantins; e do que observou soube desde logo tirar partido em bem da sua Ordem e dos míseros Indígenas.

A Corte Portuguesa, sempre vacilante e tímida em questão de tamanho alcance para a humanidade, e para a paz do Estado Brasílico, havia relaxado a restrição das Leis últimas, cedendo à representação dos procuradores do povo do Pará e Maranhão; e pela Provisão de 17 de Outubro de 1653(189) restabeleceu não só os casos anteriores de cativeiro dos índios, quando aprisionados em guerra justa, ou resgatados quando destinados à morte, e atados à corda para serem devorados, mas introduziu casos novos e tão latos, que era quase impossível deixar de haver índio que pudesse escapar a essa rede que assim se lançava contra todos, em bem suposto dos colonos, dos próprios índios, e desejada tranqüilidade e prosperidade do Estado. — Para se reputar justa a guerra — há de constar (diz a Provisão) que o dito gentio, livre ou vassalo, impediu a pregação do Evangelho, e deixou de defender as vidas e fazendas dos vassalos de El-Rei em qualquer parte; haver-se lançado com os inimigos da Coroa, e dado ajuda contra os vassalos. — Também será legítimo o cativeiro, se exercerem latrocínios no mar ou em terra, infestando os caminhos; salteando ou impedindo o comércio e trato dos homens, para suas fazendas e lavouras: se os índios, súditos de El-Rei, faltarem às obrigações que lhes foram postas e aceitas nos princípios de suas conquistas, negando os tributos, e não obedecendo quando forem chamados para trabalharem em o Real serviço, ou para pelejarem com os inimigos do Estado; se comerem carne humana, sendo meus súditos.— Igualmente poderão ser cativados aqueles gentios que estiverem em poder de seus inimigos, atados à corda para os comerem, e meus vassalos os remirem daquele perigo com as armas, ou por outra via; e os que forem escravos legitimamente dos senhores, a quem se tomaram por guerra justa, ou por via de comércio e resgate.

Para este fim permitiu a Provisão (2.ª parte) que se pudessem fazer entradas no sertão por pessoas eleitas, à maioria de votos, pelos Capitães-mores, Oficiais da Câmara, Prelados das Religiões, e Vigário geral (onde houvesse); acompanhadas, porém, de Religiosos que fossem à conversão dos gentios.

E quanto às aldeias, dispôs (parte 3.ª) que não lhes pusessem Capitães, e sim os Governadores as deixassem sob a direção e governo de um dos principais da sua nação, que fariam a repartição dos índios pelos colonos voluntariamente, mediante o salário costumado.

Com esta Provisão chegaram (1654) os referidos Procuradores; a vitória era atualmente do povo; os Jesuítas derrotados. — Mas o Padre A. Vieira não se acovardava tão facilmente; e resolveu ir pessoalmente a Lisboa sobre tão melindroso assunto.

Aos seus esforços foi devido criar-se aí a chamada Junta das Missões, para onde recorressem e apelassem os Missionários; ante a qual defendeu ele com ardor a necessidade da revogação da Provisão de 17 de Outubro de 1653: o que conseguiu em parte, como se vê da Lei de 9 de Abril de 1655. André Vidal de Negreiros, novo Governador do Pará e Maranhão (de novo reunidos), fiel ao seu Regimento de 14 de Abril de 1655(190) declara-se a favor dos índios(191).

Pela referida Lei ou Provisão de 1655(192) conservaram-se os quatro antigos casos de escravidão, e eliminaram-se todos os outros introduzidos pela outra Provisão de 1653; confirmaram-se as entradas no sertão para conversão dos gentios e sua distribuição, escravos de resgate; confiou-se a direção delas, e mesmo a sua resolução, tempo e modo de fazê-las, aos Padres da Companhia(193) com plena autoridade espiritual e temporal; e bem assim a direção das aldeias(194).

Estas novas resoluções da Corte, postas em execução por Vieira, auxiliado por Vidal, indo de encontro aos intentos e hábitos desumanos dos colonos no cativar os índios, produziram mais tarde os seus naturais efeitos na luta que de novo se travou entre os mesmos e os Jesuítas. Por enquanto prosseguiam estes, sob a direção de Vieira, nas suas missões; chegando a fazerem diversos da Companhia, e entre eles o próprio Vieira, várias entradas no sertão para a descida e conversão dos gentios(195): em uma destas — ficaram 240 prisioneiros; os quais, conforme as leis de S. M., a título de haverem impedido a pregação do Evangelho, foram julgados por escravos e entregues aos soldados —, como se lê em carta de Vieira de 11 de Fevereiro de 1660(196).

Por sua parte, continuavam os Paulistas as suas excursões às missões, e a guerrear e escravizar os índios; sendo das mais notáveis a bandeira que em 1648 acometeu a missão ou redução de Xerez. Mas os missionários do Paraguai, à frente de 4.000 índios ao mando do Padre Alfaro, derrotaram diversos. É de presumir que fossem destroços deles os Paulistas que apareceram em 1631 ante Curupá no Pará(197).

Em S. Paulo chegou-se a um acordo (14 de Maio de 1653) pelo qual eram readmitidos os Jesuítas, com a expressa condição porém de se não intrometerem em negócios de índios(198).

Por falecimento do Rei D. João IV (6 de Novembro de 1656), e sendo ainda menor D. Afonso VI, foi o Reino governado pela Regente a Rainha D. Luiza de Gusmão; só era 1062 tomou D. Afonso as rédeas do Estado, sendo pouco depois (Novembro de 1667) deposto pela Junta dos Três-Estados, e nomeado Regente o Infante D. Pedro; o qual, por falecimento de D. Afonso (12 de Setembro de 1683) subiu ao trono.

A questão dos índios e Jesuítas preocupava sempre os colonos, e trazia em tormento a Metrópole.

Em 1660 a Câmara do Pará propôs à do Maranhão uma aliança, com que melhor garantissem os interesses dos povos respectivos contra os Jesuítas em relação aos índios(199).

E por tal forma cresceu a exasperação contra os Padres, que em 1661 teve lugar uma sublevação(200), de que resultou serem presos e remetidos para Lisboa vários deles e o Padre Antônio Vieira; ficando outros presos em Belém (1662).

Em conseqüência, e havendo-se levantado na Metrópole um partido anti-Jesuíta, o Governo expediu a Provisão ou Lei de 12 de Setembro de 1663(201), pela qual se proibiu aos Padres da Companhia e a todos os outros qualquer jurisdição temporal sobre os índios; e que, quanto ao espiritual, fossem todos postos em pé de igualdade — por ser justo que todos sejam obreiros da Vinha do Senhor —, ficando a direção espiritual incumbida a qualquer deles, que pelo Prelado, de acordo com as Religiões, fosse escolhido, assim como a paróquia e cura das almas dos gentios das aldeias; podendo os índios ser removidos, quando parecesse conveniente; e sem que pudessem as Religiões ter aldeias próprias de índios forros de administração: e, no temporal, poderiam ser governados por algum dos seus principais, que houvesse em cada aldeia, decidindo sobre suas queixas e causas os Governadores e autoridades civis, como para os demais vassalos se achava determinado. — Pela mesma Provisão, as nomeações dos cabos das tropas para descida dos índios, e do distribuidor deles, era conferida às Câmaras; de cujo voto ficavam também dependentes as entradas anuais no sertão. Os missionários, que acompanhassem, não poderiam trazer escravos para si, nem para as suas Religiões; nem durante um ano adquirir qualquer dos que fossem resgatados: proibição que se fez extensiva aos cabos da tropa(202), Governadores, Capitães-mores, e demais ministros e Oficiais do Estado. — Finalmente eram os Jesuítas restituídos às suas missões, mas só com a jurisdição espiritual na forma exposta; exceto o Padre Antônio Vieira(203).

Esta decisão produziu desencontrados efeitos no Maranhão e no Pará; de que resultou tergiversação em sua execução. Já anteriormente (1662) as Juntas haviam deliberado sobre descidas de índios, e restituição dos Jesuítas ao Estado com a cláusula de se não envolverem em tal assunto(204). O Governador Rui Vaz de Siqueira suspendeu a sua execução, e convocou Junta geral. Enquanto a Câmara do Pará queria que se cumprisse a lei, e o Governador não, e que este mandava por fim subitamente executá-la(205), a Câmara de S. Luiz em Junta resolveu mandar ao rei uma representação, suspensa no entanto a dita Lei(206). Com a demora da resposta, em Belém suscitaram-se desordens, publicando a Câmara (1666) por bando a Lei; o que igualmente sucedeu depois em S. Luiz do Maranhão (1667). O Governador, assim forçado, pôs-lhe todavia na execução as restrições constantes das dúvidas submetidas à Corte.

Afinal vieram estas resolvidas pela C. R. de 9 de Abril de 1667, que ordenou a inteira observância da Provisão de 1663, com os aditamentos seguintes: 1.° que aos missionários era proibida toda e qualquer intervenção na repartição dos índios: 2.° que seria esta sempre feita pelo Juiz mais velho(207), de acordo com a Lei de 18 de Outubro de 1666(208).

O novo Governador Antônio de Albuquerque Coelho de Carvalho, na sua execução, arrogou-se atribuições exorbitantes com ofensa dos direitos das Câmaras e dos Juízes. Efetuaram-se no entanto alguns descimentos de índios(209).

Sucedendo-lhe Pedro César de Menezes, as novas dúvidas postas à execução das leis últimas suscitaram a expedição da C. R. de 21 de Novembro de 1673(210), pela qual foi declarado que se publicassem e cumprissem essas leis de 1663 e 1667, e se acrescentava que a eleição dos cabos das entradas, dos repartidores, e a deliberação de mandar ao sertão descer os gentios não se fariam sem autoridade dos Governadores.

A perseguição aos índios era um mal incurável; e agora o ódio ia até à destruição do miserável gentio. Em 1664 tribos foram aniquiladas, quais as dos Tapuias do Urubu. No governo de Inácio Coelho da Silva (1679) igual sorte tiveram os índios Taramambezes, perseguidos por água e por terra, não se poupando sexo, idade, nem os fugitivos. Posteriormente fatos idênticos se repetiram(211).

No entanto, o Governo da Metrópole não cessava de recomendar proteção aos índios e aos missionários, como ainda no Regimento novo de 23 de Janeiro de 1677 para os Governadores Gerais do Brasil(212).

Continuavam as excursões pelo interior do país, já não tanto em busca de índios, como de minas de metais preciosos. Crescia a população. Os vexames e males provenientes do monopólio conferido à Companhia do comércio trouxeram a sua extinção (1663). Era criado o Arcebispado da Bahia, e os bispados do Rio de Janeiro e Pernambuco(213); sendo o l.° Arcebispo D. Gaspar Barata de Mendonça: e o bispado do Maranhão(214). Em fins de 1679 assentou-se no Rio da Prata a colônia do Sacramento, que deu origem em diversas épocas a graves complicações com a Espanha.

A questão dos índios continuava a inquietar a colônia, e a provocar novas decisões da Metrópole; — A Câmara do Maranhão tinha ali por procurador do povo Paulo Martins Garro(215). — A de S. Paulo queixava-se de que os Jesuítas só desejavam os índios para si, de modo que entre os seus domésticos se contavam para cima de 700(216); chegando-se mesmo a lavrar aí em 24 de Junho de 1677 um acordo com o Reitor do Colégio, Padre Francisco de Morais, para que este não influisse em bem da liberdade dos índios sob pena de sofrer o que ao povo aprouvesse(217). — No Rio de Janeiro algumas desavenças se haviam levantado entre a Câmara e os Jesuítas(218). — No Espírito Santo resolvera-se fazer a guerra aos índios(219); o que foi incumbido aos Paulistas(220).

Os Jesuítas, porém, não se deixavam reduzir à nulidade, nem se davam por vencidos nas lutas com os colonos, já não pelo amor santo e puro de reduzir à fé Católica os gentios, e de protegê-los contra os excessos dos povos, mas principalmente por amor próprio, e defesa da sua preeminência. A decidida influência dos Padres se revela claramente nas determinações que se tomaram, como veremos.



CAPÍTULO VI

Leis sobre liberdade dos índios. — Missões Jesuíticas. — Regimento das missões. — Novas leis de escravidão. — Descimento de índios. — Guerras dos mesmos. — Novas providências.

A Lei de l.° de Outubro de 1680 (restaurando a de 30 de Julho de 1609), e a Provisão de igual data foram o resultado dessa interminável questão entre Jesuítas e colonos por causa ou a pretexto de índios(221).

Reconhece-se na Lei que — tem mostrado a experiência que são de maior ponderação as razões que há para proibir o cativeiro em todo o caso, cerrando a porta aos pretextos, simulações, e dolos com que a malícia abusa. — E, desejando reparar tão graves danos e inconvenientes, e principalmente facilitar a conversão dos gentios, atendendo por outro lado ao que mais convinha ao bom governo, tranqüilidade e conservação do Estado do Brasil, aonde por muitos anos se experimentaram os mesmos danos e inconvenientes que ainda então se sentiam no do Maranhão; — Ordenou que dessa época em diante se não pudesse cativar Índio algum do dito Estado em nenhum caso, nem ainda nos excetuados nas leis anteriores; sendo livres os que fossem prisioneiros nas guerras defensivas ou ofensivas que os colonos lhes fizessem, como se usa nas da Europa; podendo somente ser entregues nas aldeias de índios livres Católicos, para que se pudessem reduzir à Fé, e servir ao Estado.

A Provisão(222) regulava a distribuição e o serviço dos índios livres, e dispunha o seguinte: 1.° que fossem recolhidos às suas respectivas aldeias os que andassem por fora; 2.° que, verificado o número total de índios de serviço, fossem distribuídos em três partes; das quais, uma ficaria nas aldeias para tratar da lavoura, subsistência própria, e dos índios descidos de novo; a outra seria distribuída pelos moradores; e a terceira se agregaria aos Padres da Companhia, para os acompanharem ao sertão; 3.° que aos índios se dessem terras, livres de tributos, sem atenção a concessões já feitas das mesmas, porque, devendo ser sempre salvo o prejuízo de terceiro, estava implicitamente resalvado o dos mesmos índios, primários e naturais senhores delas; 4.° que só os missionários da Companhia de Jesus poderiam ir ao sertão trazer, catequizar, e administrar os gentios, que pela grande confiança que neles tinham perderiam o temor do cativeiro, e prestariam inteira fé à liberdade que a nova lei lhes afiançava; sendo certo que não só os mesmos missionários se haviam mostrado sempre os mais práticos o zelosos neste santo ministério, cujo desempenho se lhes confiava exclusivamente, mas porque eram graves e notórios os inconvenientes de ser ele exercido ao mesmo tempo por diversas Religiões; 5.° que os missionários nunca se acompanhassem de gente de guerra, pelo temor que inspirava aos índios; exceto quando absolutamente fosse isto indispensável por precaução, e mesmo assim à sua escolha e aprazimento; 6.° finalmente, aos Padres se mandaram restituir todas as aldeias, e entregar quaisquer outras que estivessem vagas e sem párocos.

Estas novas leis foram, como sempre, mal recebidas na colônia, e para logo deram lugar a reclamações e queixas por causa da distribuição dos índios, e por entenderem os colonos que ofendiam altamente os seus direitos e interesses vitais; confiando-se, além disto, aos Jesuítas, que tinham por seus inimigos, toda a jurisdição espiritual e temporal sobre os índios. Por outro lado, também o Bispo do Maranhão se queixou, por pretender que lhe cabia jurisdição sobre os Jesuítas em qualidade de simples Párocos(223).

Outra causa grave de descontentamento do povo foi o monopólio conferido a uma nova Companhia de comércio do Grão-Pará e Maranhão pelo Alvará de 12 de Fevereiro de 1682(224). Já neste Alvará o acordo respectivo se fez modificação à Lei e Provisão referidas; porque se permitiu aos contratadores ou assentistas fazer no sertão as entradas que quisessem, e ter na Capitania até cem casais de índios a seu serviço, contanto que os baixassem à sua custa, e lhes dessem um sacerdote (escolhido pelo Ordinário) para os catequizar, sem que pessoa alguma, nem mesmo o Governador, se pudesse ingerir por qualquer forma em tal matéria.

Tantas causas acumuladas deram em resultado no Maranhão a revolta aberta (1684) de Manoel Beckman (ou Bequimão), a deposição do Governador, a expulsão dos Jesuítas, e declarar-se extinta a Companhia do Comércio(225), tudo por deliberarão do uma denominada Junta dos Três Estados (clero, nobreza e povo). Os Padres sairam para Portugal em número de 27, depois de declararem, e se obrigarem, que em nenhum tempo por sua vontade nem leve pensamento volariam. Inúmeros índios assistiram ao seu embarque(226). Havendo os Padres saído em dois navios, um destes foi tomado por um corsário, que os deitou em terra; sendo pelo Governo Provisório do Maranhão mandados para Belém: o outro chegou à Bahia, onde já então se achava de novo o Padre Antônio Vieira, e daí seguiu para Lisboa. Também à Corte tinha ido Tomás Beckman, irmão do chefe da sublevação, em missão dos sublevados.

Mas os do Maranhão, logo que se promulgou a citada lei de 1680, haviam mandado a Lisboa procuradores a reclamarem, distingindo-se entre eles Manoel Guedes Aranha, acérrimo defensor da escravidão. Conseguiram eles a Lei de 2 de Setembro de 1681(227), pela qual eram restabelecidas as administrações particulares de índios, visto estarem as aldeias muito diminutas e não baixarem índios para o serviço dos moradores, nem os haver para as entradas do sertão; havendo risco, por esta causa, de interromper-se o comércio, consistente na indústria dos mesmos índios, e até de perder-se a sua comunicação. Conseguintemente dispôz a Lei: 1.° que os moradores, ou individualmente, ou unidos em sociedades e companhias, averiguando o número de índios de que houvessem mister para as suas fazendas e serviços, e com a devida autorização do Governador, pudessem fazer descimentos; 2.° que os índios fossem sustentados pelos administradores e se lhes dessem terras para as suas lavouras; 3.° que para as entradas iria sempre um Religioso da Companhia, ou de Santo Antônio; ao qual ficariam sujeitos no espiritual, levantando os moradores Igreja para o culto; 4.° que, no temporal, seriam livres os descidos conforme as leis em vigor; decidindo o Governador as suas dúvidas, ouvindo sempre o Padre respectivo; 5.° que a distribuição dos índios entre os moradores seria feita na proporção do cabedal com que cada um houvesse concorrido para a entrada, descimento, e fundação da aldeia; 6.° que os índios trabalhariam, por salário, uma semana para os moradores; ficando-lhes outra semana livre para si em suas aldeias e lavouras; 7.° que não seriam obrigados a trabalhar, se lhes não fosse pago o salário do mês antecedente; 8.° que, para as entradas, só levariam os moradores metade dos da sua lotação, ficando a outra nas aldeias para conservação destas; 9.° que destes serviços eram isentas as mulheres; podendo elas, se quisessem, acompanhar os maridos ou pais ao trabalho, contanto que viessem dormir à aldeia.

Era a escravidão disfarçada o que se restabelecia.

A revolução, porém, do mesmo ano obstou à sua execução, não se fazendo pela mesma Lei obra alguma por se oferecer outro meio mais conveniente(228), de que trataremos.

Os Jesuítas em Lisboa fizeram subir à presença do Rei um memorial dos P. missionários do Estado do Maranhão com 12 propostas relativamente aos negócios de índios, e à sua explusão; em o qual, queixando-se amargamente, concluíram pedindo a sua reintegração no Brasil e Maranhão, com vantagens e garantias as mais latas no espiritual e temporal relativamente aos índios e missões(229). Não eram os Jesuítas pessoas que se deixassem facilmente abater.

Antes, porém, de resolver definitivamente sobre tão grave assunto, cumpria pôr cobro à revolta. Em 1685 chegou ao Maranhão o novo Governador Gomes Freire de Andrade; o qual tomou enérgicas providências, que trouxeram a paz ao Estado por algum tempo; e chamou os Padres que se achavam no Pará(230).

Os Jesuítas voltavam agora, vencedores, de Belém e Lisboa. A C. R. e Regimento de 21 de Dezembro de 1686, denominado das missões, entregavam-lhes para sempre não só a direção espiritual das aldeias, e índios, mas também o governo temporal e político, objeto constante dos seus esforços e ambição(231), embora o mesmo concedessem aos Religiosos de Santo Antônio, e conseqüentemente a outras Ordens Religiosas(232), a quem se permitiu aldear índios.

Reconhecendo o dito Regimento no seu preâmbulo que todos os esforços das leis promulgadas tinham sido inutilizados pela malícia dos moradores que inventam e descobrem novos modos de se não observarem, dispôs: 1.° que os Padres tornassem ao dito Estado; 2.° que teriam o governo não só espiritual que d’antes tinham, mas também o temporal e político das aldeias de sua administração, como igualmente se concedia aos Padres de Santo Antônio relativamente às suas: com a declaração de se observarem neste governo as leis régias, em ordem a prestarem-se os índios à defesa do Estado, guerras do sertão, e outros serviços; 3.° que haveriam dois procuradores dos índios, um em S. Luís, e o outro em Belém; aos quais se dariam alguns índios para o seu serviço, sem que comtudo fossem sempre os mesmos à arbítrio dos Padres; 4.° que seriam eleitos pelo Governador sob proposta do superior; e se lhes daria Regimento; 5.° que nas aldeias não poderiam morar senão os índios e suas famílias, sob pena de açoites e degredo para Angola; 6.° que ninguém poderia ir às aldeias tirar índios para seu serviço ou para qualquer outro fim, sem licença; nem aí se conservar além do tempo da licença; tudo sob pena de prisão, multa, e degredo para Angola; 7.° que, constando que os índios e índias eram induzidos a saírem das aldeias para se casarem com escravos, ficassem em tal caso livres os escravos, e se mandassem para as aldeias; mas que, não constando do induzimento, ficariam sempre os índios e índias obrigados a permanecer nas aldeias, embora com licença do Bispo lhes fosse lícito sair para ver o cônjuge: outrossim que, pela fraqueza das índias, verificando-se adultério, de que provinham graves danos às aldeias, o Ouvidor geral tirasse devassa (por exceção à lei geral em contrário sobre tal crime) em cada ano, punindo com degredo para Angola o adúltero, e a adúltera (caso o marido não a quisesse receber) como parecesse mais benignamente à Junta das Missões; 8.° que os Padres tivessem muito em cuidado o aumento de povoação índia nas aldeias, por ser isto conveniente não só à segurança e defesa do Estado, mas às entradas nos sertões e serviço dos moradores; 9.° que igual cuidado tivessem de descer dos sertões novas aldeias de índios, persuadindo-os ao trato e comércio dos colonos; 10.°, que, para evitar engano no comércio e serviço dos índios, seriam os preços dos gêneros taxados pela Câmara com assistência do Governador, Ouvidor geral, e Procurador da Fazenda: e os salários pelo Governador com assistência dos Padres da Companhia e de Santo Antônio, ouvidas as Câmaras; do que tudo se deveria lavrar assento; 1l.°, que os salários seriam pagos metade no começo e o resto no fim do serviço; 12.°, que se criassem dois livros para a matricula dos índios capazes de servir, a saber: de 13 a 50 anos de idade; 13.°, que deles se iriam eliminando os falecidos e incapazes de serviço; e seriam reformados bienalmente; 14.°, que a repartição dos índios se fizesse por tempo de seis meses para Belém, e de quatro meses para S. Luiz (podendo permitir-se até seis); derrogada nesta parte a Lei do 1.° de Abril de 1680; 15.°, que a repartição seria em duas partes, e não mais em três (como fora ordenado), ficando uma nas aldeias, enquanto a outra ia ao sertão; 16.°, que os Padres da Companhia não seriam contemplados nesta repartição por assim o haverem eles pedido, dando-lhes o Governador, em compensação, para os seus serviços os das aldeias de Pinaré e Gomary, ou de outras que pudessem (em falta) descer, com a condição de não servirem aos morados; 17.°, que para cada residência dos Padres em distância de 30 léguas de S. Luís e de Belém, o Governador daria 23 índios; que nas outras residências se poderiam servir dos das aldeias próximas; 18.°, que a repartição dos índios pelos moradores seria feita pelo Governador, e em sua falta pelo Capitão-Mor com assistência de duas pessoas eleitas pela Câmara, do Superior das Missões, e Párocos das aldeias, sem que nela fossem contemplados o Governador e tais pessoas; expedindo-se licença aos moradores para irem às aldeias receber os do seu quinhão; 19.°, que atenta a falta de índios nas aldeias de repartição, e tendo os moradores necessidade de ir ao sertão por motivo de comércio, determinado que fosse o número de índios necessário para os acompanharem, apenas metade se tirasse das aldeias ditas, e os outros das outras aldeias mediante o salário taxado; contemplados também os moradores que tivessem escravos próprios, visto a necessidade de ficarem estes nas fábricas e o perigo de fugirem nos sertões; 20.°, que algumas índias poderiam ser repartidas, a salário, pelos moradores para fazerem a farinha quando fosse tempo apropriado, e lhes criarem de leite os filhos, a arbítrio dos Missionários; 21.°, que as aldeias fossem de 150 vizinhos, na forma do Regimento dado ao Governador; exceto quando se compusessem de nações inimigas, caso em que dentro do distrito das residências poderiam ser estabelecidos em pequenas freguesias; 22.°, que os índios descidos de novo seriam isentos de servir por dois anos, por ser necessário este lapso de tempo para serem doutrinados na fé (primeiro motivo de sua redução ) e para fazerem suas roças e se acomodarem à terra, antes que se arrependessem por causa do jugo do serviço; que a respeito de todos os índios descidos se deveriam religiosamente observar os pactos que com os mesmos se fizessem no sertão pelos missionários, por ser isto conforme à fé pública, fundada no Direito Natural, Civil, e das Gentes; que, se não quisessem os índios descer, mas se mostrassem inclinados a observar a Fé Cristã nos seus sertões, os Padres os estabelecessem em aldeias nos mesmos sertões do modo o mais cômodo — porque não permite a justiça que sejam tais homens obrigados a deixar as terras que habitam — quando não repugnam ser Cristãos, e além disto é conveniente que as aldeias se dilatem pelos sertões para que se possam mais facilmente penetrar e se tirem as vantagens pretendidas; 23.°, finalmente, que os Governadores dessem aos Missionários todo o auxílio, ajuda, e favor para sua segurança nas entradas nos sertões, e para mais facilmente fazerem as missões; que, outrossim, a Junta das Missões(233), à qual se daria Regimento, fizesse cumprir e executar fielmente o presente Regimento(234).

Dominava, porlanto, o sistema das leis últimas, e o mencionado Regimento das Missões do Grão-Pará e Maranhão.

Mas em breve se lhe foram descobrindo defeitos e lacunas, que exigiram novas providências. Gomes Freire de Andrade, em Junta com o Governador Artur de Sá e Menezes, Padres Superiores, Ouvidor, e Desembargadores, tomou um Assento declaratório de vários Capítulos do Regimento, o qual foi confirmado pelo Alvará de 22 de Março de 1688 com alguns novos additamentos(235); consistindo principalmente no seguinte: 1.° que os índios ou índias que casassem com escravas ou escravos, não pudessem servir aos senhores destes, nem a seus ascendentes, descendentes, ou parentes dentro do 2.° grau por Direito Canônico, pelo dolo que nisso poderia haver; 2.° que os que fossem às aldeias com licença do Governador, a apresentariam logo aos missionários ou diretores delas; nem se demorariam aí mais de 3 dias, salvo por causa justa atestada pelos missionários; tudo sob penas severas; 3.° que nos contratos com os índios interviesse o Governador; mas com audiência do Ouvidor Geral, quando fossem relativos a matérias de Justiça.

Outra importante alteração foi decretada pelo Alvará de 24 de Abril de 1688(236), ordenando-se que os resgates se fizessem à custa da Real Fazenda, para o que se destinaram logo 2.000 cruzados para o Pará e 4.000 cruzados para o Maranhão; encarregados dos mesmos resgates os Prelados das missões: a distribuição dos índios resgatados seria feita pelas respectivas Câmaras, com autoridade do Governador, e assistência do Ouvidor Geral, preterindo as pessoas que deles maior necessidade tivessem para as suas lavouras e Fazendas, as quais reembolsariam as despesas do resgate em ordem a manter-se sempre aquela soma para este fim designada, e mais pagariam 3$000 de direitos por cabeça de índio, imposto destinado ao mesmo fim.

Porém a mais grave modificação foi a do Alvará de 28 de Abril do mesmo ano 1688(237), que derrogou em parte a Lei do 1.° de Abril de 1680 e restabeleceu a de 9 de Abril de 1655 com algumas alterações. — Refere o Alvará no seu preâmbulo que, segundo informações(238), e ouvidas pessoas entendidas, com a providência absoluta da Lei de 1680 proibitiva do cativeiro dos índios ainda mesmo nos casos de guerra justa e de resgates, se havia não só impedido que se salvassem vidas e almas, porém que as guerras dos mesmos índios entre si e com os colonos se houvessem tornado mais bárbaras por se não pouparem as vidas, chegando os índios a prenderem à corda os prisioneiros para devorarem; ou, quando podiam, os iam vender aos estrangeiros, com grande dano do Estado: e que, sendo o principal intento no domínio das Conquistas a conservação delas pelo aumento da Fé e liberdade dos índios, e chamá-los ao grêmio da Igreja, ficavam restabelecidos os resgates e cativeiros, do modo seguinte: l.° que os resgates seriam feitos por conta da Real fazenda para com todos os que se achassem cativos de outros índios, quer presos à corda para serem devorados, quer dos cativados para serem vendidos a outras nações, contanto que não repudiassem eles os resgates por entenderem que outro meio tinham de livrarem a vida, e não houvesse influxo dos moradores para tais cativeiros; 2.° que para os resgates, modo de fazê-los, distribuição dos resgatados, reembolso das despesas à Fazenda, imposto, e outras particularidades, se observaria o Alvará anterior de 24 de Abril (com pequenas modificações); 3.° que, quanto ao cativeiro dos aprisionados em guerra com os colonos, seria legítimo não só quando em guerra defensiva contra as invasões dos índios principalmente se estes se opusessem com mão armada às entradas dos Missionários nos sertões e pregação do Evangelho, mas também em guerra ofensiva que os colonos fossem obrigados a fazer-lhes para impedir suas invasões; 4.° que, porém, se deveriam veriíicar exatamente as cláusulas aí declaradas para que tais guerras e cativeiros fossem legítimos, a saber: em guerra defensiva, somente no ato da invasão dos índios contra as aldeias ou povoações, com efetiva hostilidade; e na ofensiva, o temor certo e infalível da invasão dos mesmos, e esgotados os meios brandos, pacíficos, e conciliatórios de os fazer desistir do seu intento, ou quando, tendo feito hostilidades graves e notórias, não dessem satisfação condigna; justificando-se além disto todos os fatos que concluíssem pela legitimidade da guerra; 5.° que seriam livres todos os índios que por outros modos fossem de fato escravizados; 6.° que de tudo se daria conhecimento ao Rei para providenciar ulteriormente como melhor parecesse.

Mas. como sempre, aberta a porta à avidez dos colonos, a escravidão e a perseguição dos miseráveis Indígenas eram a conseqüência natural e forçosa dessa incessante perplexidade do Governo da Metrópole em matéria de tanta monta; a inexecução das Leis, clara ou disfarçada, uma vez tolerada, animava novas violações, autorizava novas e mais audazes exigências. Por modo que, como já anteriormente havia mui bem dito o Padre Antônio Vieira em suas cartas de 20 de Maio de 1653 e 4 de Abril de 1654(239), — a título de resgates, não haviam senão extorsões e impiedades — a Majestade era nomeada, mas não obedecida.

Apesar de todas as providências para prevenir os abusos, apesar de haverem as C. R. de 15 de Março de 1696 e 20 de Novembro de 1699(240) recomendado e incumbido semelhante matéria com grande interesse à Junta das missões, e de haver esta de sua parte concorrido com a sua boa vontade, suscitando mesmo providências já do governo da colônia, já do da Metrópole, nada podia impedir a violação das determinações reputadas as mais salutares, as mais conciliatórias, ainda que se relaxassem os princípios da verdadeira e rigorosa justiça, humanidade, e religião, no intuito da paz do Estado e obediência dos moradores.

Exemplo estrondoso deu-se com a execução da última lei facultativa dos resgates e cativeiro dos índios; porquanto em menos de 3 anos, não obstante a gravidade das penas pelas infrações, haviam-se estas generalizado por tal forma, que quase todos os moradores(241) se achavam nelas incursos por cativarem Índios contra as determinações Régias e os interesses públicos; sendo necessário que a piedade do Rei D. Pedro II acudisse aos povos com o perdão por Alvará de 6 de Fevereiro de 1691(242): em o qual igualmente se fizeram modificações das penas e se criou a de multa (o dobro do valor do índio) metade para o denunciante (compreendido o próprio índio escravizado) e a outra metade para a redenção ou resgate deles, além de serem os infratores obrigados a pagar-lhes em dobro o salário; e se mandou, outrossim que fossem imediatamente restituídos à sua liberdade todos os indevidamente cativados, e entregues aos superiores das missões para os aldear.

Cresceram, porém, as reclamações dos moradores pelos embaraços em que se viam por falta de braços para as suas lavouras, segundo pretendiam eles; quando o mal era, se pode dizer, geral em toda a possessão portuguesa na América, e derivava de várias causas, quais a peste, a opressão da indústria, lavoura, e comércio por excessivos tributos e erradas providências, perseguições da Santa Inquisição, enfim má administração geral e até da Metrópole(243).

A Câmara do Maranhão representou por vezes sobre a miséria em que dizia acharem-se os moradores por falta de escravos. Em resposta lhe foi dirigida a C. R. de 20 de Novembro de 1699(244) autorizando as entradas no sertão para o resgate deles, a arbítrio da Junta das Missões, observadas as leis a tal respeito.

Várias outras providências sobre as missões e índios foram ainda tomadas, mas com referência às leis últimas.

Em a Capitania de S. Paulo se havia autorizado pelas C. R. de 26 de Janeiro e 19 de fevereiro de 1696(245) as administrações particulares de índios, com certas restrições, quais — de não servirem senão uma semana, mediante salário, e a outra para si, — não irem aos sertões senão os mais robustos, — não ser a jornada excedente a 4 meses; e isto com o fim de se proverem de braços para os seus serviços, satisfeitas assim as queixas dos moradores.

Ainda em princípios do século XVIII novas providências foram tomadas pela Metrópole em relação aos índios, e a prover os colonos de gente para os trabalhos. Várias Cartas Régias se expediram, sobretudo para o Maranhão(246).

Os tratados com a França, do 4 de Março do 1700 e 11 de abril de 1713 proibiram reciprocamente a entrada de súditos das duas Nações no território contestado entre ambas para resgatarem índios, ou fazerem comércio de escravos índios(247).

Mas, como sempre, os abusos progrediam, e a tendência maliciosa para a opressão dos indígenas se tornava manifesta; do que resulavam o desrespeito às leis, a desordem da colônia, as novas guerras que os índios levantaram. Era por tal forma escandaloso o abuso, que a Provisão de 5 de Julho de 1715, expedida já por D. João V, mandou repreender o Capitão-mor José da Cunha d’Eça, por ter feito prender o procurador dos índios, contra os seus privilégios, pelo fato de estar ele requerendo a bem dos mesmos e contra as violações das Leis.

Da mais notável é a Provisão de 9 de Março de 1718(248) exemplar eloqüente da constante perplexidade, luta, e eontradição do Governo da Metrópole em semelhante matéria. — Acedendo (preâmbulo) às representações do Governador, e tendo em vista os pareceres das Juntas sobre descimentos de índios para abastecer as aldeias, e as lavouras e fazendas dos moradores, e para a defensa do Estado, livrando-os sobretudo da barbaridade em que vivem, devorando-se uns aos outros; sobre consulta do Conselho Ultramarino, foi decretado: 1.° que, quanto aos descimenlos voluntários dos Índios que, a instâncias e diligências dos missionários, se quisessem deixar conduzir e reduzir, tratados, não como escravos, mas como livres, não podia haver dúvida que fossem lícitos; 2.° que quanto, porém, aos descimentos forçados, precedendo ameaças ou força, podia haver escrúpulo, porque — estes homens são livres e isentos de minha jurisdição (diz El-Rei) que os não pode obrigar a saírem, das suas terras para tomarem um modo de vida de que eles se não agradam, o que, se não é rigoroso cativeiro, em certo ponto o parece pelo que ofende a liberdade. Contudo, se estes índios (continua a Provisão) são como os Tapuias bravos, que andam nus, não reconhecem Rei nem Governador, não vivem com modo e forma de república, atropelam as leis da natureza, não fazem diferença de mãe e filha para satisfação da sua lascívia, comem-se uns aos outros, sendo esta gula a causa injustíssima das suas guerras, e ainda fora delas os excita a frecharem os meninos e inocentes, neste caso será permitido fazê-los baixar à força e por medo para as aldeias, por ser isto conforme à opinião dos Doutores sobre a matéria; com as duas limitações referidas na mesma lei, a saber: 1.° que se não façam tanto à força que hajam mortes, exceto quando se torne indispensável justa defesa pela oposição dos mesmos índios; 2.° que, se depois de aldeados, fugirem para viverem como bravos com ofensa das leis da natureza, possam ser constrangidos a voltar, sem que sejam mortos, e não se entendendo cativos os que voluntariamente tornarem.

O Governo da Metrópole, cedendo sempre, por uma ou por outra forma, às exigências dos colonos, também por sua parte entendia que dos índios podia a seu bel-prazer dispor e lançar mão quando e como lhe parecesse, não só para dá-los a serviço particular, mas para empregá-los nos serviços públicos: como se a necessidade de tais serviços particulares ou públicos, ainda com um fim pio, pudesse jamais autorizar tais violências à liberdade dos mesmos índios! como se a utilidade do fim legitimasse os meios! Inúmeras cartas Régias dão testemunho dessas distribuições de índios(249); e algumas até autorizaram a venda para certos fins, ainda em datas próximas às leis que pareciam sustentar agora de modo mais permanente a sua liberdade, como v. g. a Carta Régia de 30 de Maio de 1718 que autorizou o resgate de 200 índios para com o produto da venda dos mesmos auxiliar-se a construção de uma nova Igreja Catedral no Maranhão(250).

Moradores, o próprio Governo (apesar dos seus escrúpulos), e até os Jesuítas, degenerados dos seus primeiros e gloriosos tempos, todos praticavam de modo, que os índios eram de fato, contra algumas disposições humanas das leis, destinados só ao trabalho da colônia, e que neles se pretendia apenas um viveiro de trabalhadores, de cujas forças, sangue e indústria tirassem o maior proveito possivel, ainda com perigo e triste realidade da sua progressiva diminuição e desaparição, de que já tanto se queixavam(251). A redução à Fé Católica, a civilização dos Indígenas não eram senão pretextos irrisórios de semelhante procedimento; o bem espiritual era posto, de fato, à margem, a alma era no que menos se pensava e se cuidava. A realidade, a triste verdade era — tirar do braço indígena o maior proveito material possível, reduzir os índios a instrumento de trabalho, ainda mesmo aqueles que (quase por escárnio) se mandavam reputar livres, pois que de livres só tinham o nome, estivessem aldeados ou em mão particular, ou até nos sertões, que lá mesmo os iam buscar para o serviço, quisessem ou não eles deixar as suas terras e bosques, as suas pobres choupanas, as suas canoas, a vida enfim que tanto amavam na liberdade(252).

Semelhante procedimento, e a tradição das ofensas praticadas sucessivamente por quase dois séculos, transmitida a todas as tribos (tradição que ainda hoje se conserva com ódio aos Portugueses), provocaram os índios a guerras contra os colonos. Por fins do século XVII foi o Rio Grande do Norte invadido por uma chusma deles, que pôs em grave perigo a Capitania; acossados foram atacar a do Maranhão.

Os Paulistas, por seu lado, entranhavam-se por essa mesma época em novas bandeiras a proverem-se de braços nos sertões; foram, porém, derrotados(253). Mas o seu gênio e hábitos aventureiros os levaram a prosseguir em suas excursões, já não tanto para aprenderem índios, como para descobrirem minas de ouro; e assim chegaram eles às Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, lançando os fundamentos de diversas povoações, para as quais eram atraídos os moradores da colônia e Estado em tal quantidade, que parecia querer despovoar-se o litoral(254).

Ao menos, este novo emprego de sua atividade, o reforço do braço Africano, a persistência (embora ainda de algum modo tímida) do Governo da Metrópole na proteção dos índios, as emigrações destes para fugirem ao cativeiro legalizado ou violento, e aos serviços impostos a título de civilizá-los, e outros fatos graves que atraíam a atenção do Governo e dos povos, pareciam dar tréguas às perseguições que lhes faziam, e induzir os colonos a outras vias e meios de seu desenvolvimento.

Sobre os índios, ainda outras determinações foram tomadas no reinado de D. João V, que, por falecimento de D. Pedro II em 9 de Dezembro de 1706, governava o Reino; determinações que todavia se ressentem do espirito sempre contraditório da legislação até aí promulgada. A C. R. de 5 de Julho de 1715 proibiu cativá-los injustamente, e a outra de 12 de Outubro de 1719 providenciou sobre a sua distribuição pelos serviços (255).

Ao mesmo tempo, várias outras providências se tomavam a bem da colônia. Na Bahia um Sínodo Diocesano aprovara em 1707 as Constituições Eclesiásticas do Arcebispo D. Sebastião Monteiro da Vide. A povoação e colonização estendia-se pelo restante do litoral, e também pelo interior; criando-se por isto capitanias novas Santa Catarina e S. Pedro do Sul, destacadas de S. Paulo, e sujeitas ao Rio de Janeiro (4 de Janeiro de 1742); e independentes as de Minas Gerais (Alv. de 2 de Dezembro de 1720), Goiás (Alv. de 8 de Novembro de 1744) e Mato Grosso (Alv. de 9 do Maio de 1748). Para o Sul (Santa Catarina principalmente) se promovia a introdução de colonos dos Açores e Madeira; no entanto que para o Norte (Maranhão, Ceará e Rio Grande) se remetiam os degradados, declarando-se mesmo que para aí se deviam entender os degredos para o Brasil (Decs. de 15 de Setembro de 1717 e 22 de Março de 1722). Criaram-se Juízes de Órfãos, e novas Ouvidorias, a fim de facilitar a administração da Justiça: e os Bispados do Pará (1720—Clemente XI), S. Paulo e Minas Gerais (6 de Dezembro de 1745 — Candor lucis, aeternae — Benedito XIV).

Desordens internas se levantaram por vezes na Colônia, como em Minas Gerais entre Paulistas e Europeus, desordem de Manoel Nunes Vianna 1708 (V. Rev. do Inst. Hist. VI, 14); Bahia, motim Maneta, e Pernambuco, desordem dos Mascates. — Do estrangeiro também sofria a colônia, já de Espanhóis no Rio da Prata, já de Franceses no Rio de Janeiro com as invasões de C. Duclerc e Duguay Trouin (1710 e 1711). A paz de Utrecht, porém, trouxera tratados (1713) da maior importância para o Brasil.

Dir-se-ia que na primeira metade do século XVIII lavrava por todo o Estado Brasilico fermentação dos elementos morais e materiais para o seu desenvolvimento, embora parecesse que a desordem e a confusão conspiravam para a ruína da colônia. Já então contava ela poderosos elementos de força, vida e atividade; a lavoura, a indústria, as letras mesmo denotavam o seu progresso.

A velha questão dos Indígenas, as guerras destes aos colonos e vice-versa, continuavam; e as leis de algum modo concorriam para manter esse lamentável estado. É assim que no Ceará, Piauí e Rio Grande do Norte eram os índios cruel e atrozmente perseguidos, a pretexto de barbaridades por eles cometidas; perseguição autorizada pela C. R. de 20 de Abril de 1708(256). Na Bahia assaltavam eles os colonos(257). E com maior dano em Mato Grosso os canoeiros Paiaguás(258); fazendo os Paulistas varias excursões para puni-los, aprisionando grande número, mas sem que eles se dessem por vencidos(259).

No Maranhão as leis últimas sobre os índios eram iludidas na sua execução pela má vontade dos colonos; de sorte que expediu-se o Dec. de 13 de Abril de 1728 permitindo aos moradores que, à sua custa, e competentemente autorizados, baixassem os gentios para suas fazendas, casas, lavouras e fábricas, pelo proveito que daí vinha ao Estado, visto saírem da barbaridade e virem para o grêmio da Igreja; ficando no arbítrio do Governador, Bispo, Ouvidor Geral, Vereador mais velho, e do missionário do respectivo distrito, resolverem sobre o tempo de serviço, salário a pagar, e recurso contra as vexações que se exercessem(260). Os Padres da Companhia opuseram-se a isto e à respectiva deliberação da Junta, suscitando eles a execução e observância sobretudo do Regimento das Missões. As Câmaras do Pará, e do Maranhão, em 1732, representaram ao Rei(261), por intermédio do seu procurador Paulo da Silva Nunes, pedindo que se tirasse aos missionários a jurisdição temporal das aldeias e dos índios, entregando-se a capitães Portugueses. Tão graves eram as acusações, que El-Rei mandou a sindicar o Desembargador Francisco Duarte Santos; o qual, depois de minuciosas indagações, deu o seu parecer em 15 de Julho de 1735(262) a favor da conservação desse poder temporal (aliás já explicado nas C. R. de 26 de Fevereiro de 1693 e 27 de Março de 1721, conquanto não observadas na prática), chegando nesse seu parecer a concluir que — a supressão de tal poder aos missionários seria a ruína das aldeias (263).

Entretanto, já a Resol. de 13 de Abril de 1734 havia disposto que se não pudesse fazer guerra ofensiva, sem que o Governador remetesse primeiro o seu voto e o dos ministros da Junta das Missões em segredo ao Conselho Ultramarino, para que este desse a última decisão(264).

Nova representação fizeram os povos daquele Estado subir à presença do Rei, em data de 24 de Junho de 1734(265), em a qual longamente expuserão, a seu modo, as queixas que tinham contra os Jesuítas, e pediam providências.

Não podia, porém, tolerar-se que a Colônia, e sobretudo o Maranhão e Pará, estivessem em contínua agitação por causa da liberdade ou escravidão de índios, com grande detrimento da Religião, da catequese e civilização dos mesmos, da paz do Estado e tranqüilidade dos povos, com habitual ofensa e desobediência mesmo formal às leis. O erro estava em manter-se aberta a porta ao cativeiro dos índios, franco em alguns casos, e disfarçado nos outros pelo modo por que se praticavam os descimentos e serviços. El-Rei, em sua piedade e religião, quis tentar ainda uma vez o auxílio da intervenção do Chefe da Cristandade, para que, falando ao coração, à consciência, e inspirando aos colonos o amor do próximo, o temor de Deus, e sentimentos mais humanos e cristãos, conseguisse a observância das leis promulgadas, e de outras providências que pretendia tomar de acordo com o Sumo Pontífice. Nova era se vai abrir a favor dos Indígenas.



CAPÍTULO VII.

Bula de Benedito XIV a favor dos índios. — Novas providências sobre os mesmos. — Guerra das Missões no Rio da Prata. — Oposição no Amazonas. — Os Jesuítas. — Leis de liberdade absoluta dos índios. — Nova forma do seu governo temporal. — Diretório para o Maranhão e Pará. — Expulsão dos Jesuítas. — Decadência das aldeias; dispersão dos índios. — Abolição do Diretório. — Novas providências.

A instâncias do Rei D. João V expediu o SS. Padre Benedito XIV, a sua memorável Bula de 20 de Dezembro de 1741, em a qual, suscitando as dos seus antecessores Paulo III e Urbano VIII, proibia terminantemente que qualquer pessoa secular ou eclesiástica, de qualquer categoria que fosse, possuísse como escravos os índios e os reduzisse a cativeiro por qualquer forma, sob as penas de excomunhão latae sententiae; bula dirigida ao Arcebispo e Bispos do Brasil, e outros domínios nas Índias Ocidentais e América(266).

Foi ela publicada no Pará pelo Bispo D. Frei Miguel de Bulhões, com muitas recomendações do Rei para que se fizesse efetiva a sua execução(267).

Mas, infelizmente, surgiu logo oposição dos povos, que o impediram, ficando assim suspensa de fato; suspensão que durou alguns anos por entender o Bispo que, achando-se já então enfermo o Rei da moléstia de que veio a falecer, não devera agravar-lhe os padecimenlos com tais notícias(268).

No entanto, era da Real intenção tomar enérgicas providências para que a liberdade dos desgraçados indígenas fosse respeitada; e ainda quase em fins do seu reinado foi expedida uma Resolução de 1748 proibindo que o Governador mandasse tropas para resgates de índios sem que informasse primeiro, com o seu parecer e o da Junta, se haviam nos sertões índios nas condições da Lei de 1688 para serem resgatados(269).

A enfermidade do Rei e seu conseqüente falecimento privaram-no dessa glória, reservada pela mão da Providência ao seu sucessor D. José I, que por morte de D. João V em 31 de Julho de 1750 subiu ao Trono.

Desde logo cuidou o novo Rei, secundado pelo exímio e enérgico Ministro Sebastião José de Carvalho e Mello (depois Marquês de Pombal), de levar a cabo o intento de seu Augusto Pai.

Já no Regim. de 13 de Outubro de 1751, dado à Relação do Rio de Janeiro, segunda criada no Brasil (por Lei de 16 de Fevereiro de 1751) à reclamação dos povos do Sul da colônia pela grande distância da da Bahia, se recomendava no § 28 ao Governador toda a proteção aos índios de modo idêntico ao que se achava disposto no Regimento da Relação da Bahia(270).

Aquelie grande estadista, no intuito de maior desenvolvimento da riqueza, poder, e influência do Reino, ao mesmo tempo que se ocupava seriamente de excitar as forças da Nação, dirigia as suas vistas de águia para as colônias, merecendo-lhe especialíssima atenção o Brasil pelos recursos que dele tirava a Metrópole, pela sua extensão, grandeza e riquezas naturais, e pelo seu progresso material e intelectual não obstante as peias que o regime colonial sempre opusera(271).

Uma das questões que trouxe constantemente a colônia e a Metrópole em verdadeiro tormento foi a dos índios. Ainda no reinado último, como vimos, a execução da Bula de Benedito XIV tora impedida por oposição do povo. Fazia-se, pois, necessária uma medida terminante e com eficácia posta em execução para que cessasse de uma vez para sempre semelhante estado de cousas.

Outra gravíssima questão era a da extraordinária infuência dos Jesuítas, do seu imenso poder quer no Reino, quer na colônia, quer no Universo inteiro(272); chegando a constituir quase que — Estado no Estado —, com grave detrimento da causa pública.

Decidido o grande Ministro a atacar de frente e com vigor apenas se oferecesse ocasião oportuna, esta surgiu naturalmente de acontecimentos da maior importância.

Poucos mezes antes do falecimento de D. João V se havia concluído com a Espanha o tratado de limites das respectivas possessões na América, em 13 de Janeiro de 1750; pelo qual se havia igualmente convencionado a cessão dos sete povos das missões em troca da colônia, que ficaria pertencendo à Espanha(273). Ratificado por D. José em 1751, tratou-se de dar-lhe execução, não obstante a intriga levantada por mão oculta para ser ele anulado. Por parte de Portugal, foi enviado para o Sul Gomes Freire de Andrade (depois Conde de Bobadela), Capitão General do Rio de Janeiro, S. Paulo, e Minas; o qual saiu do Rio em Fevereiro de 1752. Encetando os respectivos Comissários os seus trabalhos, viram-se impossibilitados de prosseguir (1753) em razão da oposição e resistência que lhes levantaram os índios, instigados e dirigidos pelos Padres das missões do Uruguai, onde, assim como no Paraguai, haviam os Jesuítas criado missões, verdadeiras Repúblicas de Índios, por eles governadas como senhores absolutos sem obediência ao Rei, e em população superior a 100.000 almas, só e exclusivamente em proveito dos mesmos Padres e da sua Ordem(274).

Do lado do Norte (rios Madeira e Negro) não mais felizes foram os Comissários, sendo por parte de Portugal o Governador Capitão-General Francisco Xavier de Mendonça Furtado; porque os Índios, aconselhados e insinuados pelos Padres, retiravam-se das aldeias, levando comsigo os mantimentos, canoas e remeiros, impedindo deste modo que se prosseguisse na demarcação(275).

Achava-se, portanto, travada a luta diretamente entre a Coroa e os Jesuítas. Antes de desfechar-lhes o golpe decisivo e mortal, cumpria desarmá-los. A liberdade dos Índios, por eles a principio em boa fé protegida contra os colonos e ultimamente esquecida pelos proveitos temporais que dos seus serviços retirava a Companhia, foi a própria arma de que se serviu o sagaz Ministro para quebrar o encanto do poder e influência da Ordem.

Por Lei de 6 de Junho de 1755 se suscitou a observância do Breve de Benedito XIV, de 20 de Dezembro de 1741, assim como de várias leis do Reino sobre a liberdade de pessoa, bens, e comércio dos Índios do Pará e Maranhão(276). O preâmbulo desta lei resume eloqüentemente tudo quanto se poderia dizer para justificar semelhante decisão, nos termos seguintes — .... mandando examinar pelas pessoas do meu Conselho e por outros Ministros doutos e zelosos do serviço de Deus e meu, e do bem comum dos meus vassalos, que me pareceu consultar, as verdadeiras causas com que desde o descobrimento do Grão-Pará e Maranhão até agora não só se não tem multiplicado e civilizado os índios daquele Estado, desterrando-se dele a barbaridade e gentilismo, e propagando-se a doutrina Cristã, e o número dos Fiéis alumiados da luz do Evangelho, mas antes pelo contrário todos quantos Índios so desceram dos sertões para as Aldeias, em lugar de propagarem e prosperarem nelas de sorte que as suas comodidades e fortunas servissem de estímulo aos que vivem dispersos pelos matos para virem buscar nas povoações pelo meio das felicidades temporais o maior fim da bemaventurança eterna, unindo-se ao grêmio da Santa Madre Igreja, se tem visto muito diversamente, que, havendo descido muitos milhões de Índios, se foram extinguindo(277), de modo que é muito pequeno o número das povoações e dos moradores delas, vivendo ainda esses poucos em tão grande miséria que, em vez de convidarem e animarem os outros Índios bárbaros a que os imitem, lhes servem de escândalo para se internarem nas suas habitações silvestres com lamentável prejuízo da salvação das suas almas, e grave dano do mesmo Estado, não tendo os habitantes dele quem os sirva e ajude para colherem na cultura das terras os muitos e preciosos frutos em que elas abundam: — foi assentado por todos as votos, que a causa que tem produzido tão perniciosos efeitos consistiu, e consiste ainda, em se não haverem sustentado eficazmente os ditos índios na liberdade que a seu favor foi declarada pelos Sumos Pontífices e pelos Senhores Reis, meus predecessores, observando-se no seu genuíno sentido as leis por eles promulgadas .... cavilando-se sempre pela cobiça dos interesses particulares....

Conseguintemente, dispôs-se: 1.° que os Índios são livres em tudo e por tudo, conforme a Lei do 1.° de Abril de 1680, que se mandou observar; 2.° que não houvessem mais administrações, nem administradores; sendo facultado aos índios, como livres que são, servir a quem bem quiserem, na forma da Lei de 10 de Novembro de 1647; 3.° que como tais ficariam sujeitos às leis por incorporados nos povos confiados ao governo de El-Rei, e hábeis, como os outros súditos, sem distinção nem exceção alguma, para todas as honras, privilégios, e liberdades; 4.° que a respeito dos então possuidos como escravos, o mesmo se entenderia, observado o § 9.° da Lei de 10 de Setembro de 1611; com exceção somente dos descendentes de pretas escravas, que continuariam no domínio dos senhores emquanto outra providência se não desse; 5.° que, porém, para obviar os abusos que esta exceção poderia criar, os índios se deveriam ter por livres só pela presunção do Direito Divino, natural e positivo a favor da liberdade; incumbindo a prova do contrário a quem requeresse contra a liberdade, ainda sendo réu; 6.° que estas questões seriam tratadas sumariamente, pela verdade sabida, em uma só instância, e decididas em Junta composta do Diocesano, Governador, Superiores das Missões de Jesus, Santo Antônio, Carmo, e Mercês, Ouvidor Geral, Juiz de Fora, e Procurador dos Índios; sendo necessária pluralidade de votos contra a liberdade, e bastando a seu favor o empate deles: devendo a apelação ser apenas no efeito devolutivo, e não suspensivo, para a Mesa de Consciência e Ordens, onde seriam tais causas decididas de preferência a quaisquer outras; 7.° que, convindo promover a lavoura e indústria, interessando nisto reciprocamente os moradores e os Índios, o Governador em Junta de Ministros letrados, e ouvindo o Governador e Ministros de S. Luís do Maranhão, com acordo das duas respectivas Câmaras, taxasse os salários ou jornais devidos aos Índios conforme o preço comum do Estado; os quais seriam pagos por férias no fim de cada semana, em dinheiro, pano, ferramenta, ou outros objetos, como melhor parecesse aos trabalhadores; autorizada a sua cobrança executivamente, conforme o Alv. de 12 de Novembro de 1647, e abolidas quaisquer outras taxas; 8." que aos Índios ficava restituído o livre uso dos seus bens, até agora impedido com manifesta violência, observando-se o §40 do Alv. do 1.° de Abril de 1680(278); e conseqüentemente se deveriam erigir em vilas as aldeias que tivessem o competente número de índios, e em lugares as mais pequenas; repartindo-se pelos mesmos as terras adjacentes às suas respectivas aldeias; sustentando-se os índios no domínio e posse das terras para si e seus herdeiros; e castigando-se com todo o rigor quem os perturbasse; 9.° que, sendo o principal fim dilatar-se a pregação do Evangelho e trazer os indígenas ao grêmio da Igreja, e sendo difícil persuadí-los a descer às povoações, nos sertões fossem aldeados na sobredita forma, levantando-se Igrejas, e convidando-se missionários que os instruíssem na Fé; 10.° que aos mesmos Índios seria livre o seu comércio, ainda no sertão, por convir a eles próprios e aos moradores; cuidando-se igualmente da sua instrução civil.

Em data de 7 de Junho do mesmo ano expediu-se um Alvará, complementar da dita lei, abolindo inteira e absolutamente o poder temporal dos missionários de qualquer Religião, por incompatível com as obrigações do sacerdócio, e altamente contrário à boa ordem e administração da justiça, como já fora decretado na Lei de 12 do Setembro de 1663, nele inserta e suscitada; e em conseqüência, dando nova forma ao governo temporal dos Índios, determinou que nas Vilas fossem preferidos para Juizes Ordinários, Vereadores, e Oficiais de Justiça os Índios naturais delas e dos seus distritos, sendo idôneos, e que as aldeias independentes das Vilas fossem governadas pelos seus respectivos principais, que teriam por subalternos os Sargentos-mores, Capitães, Alferes, e meirinhos de suas nações; recorrendo as partes, quando se sentissem gravadas, aos Governadores e Juízes na forma das leis e ordens já expedidas.

O Alv. de 7 de Junho de 1755, que confirmou a criacão de uma nova Companhia de comércio do Grão-Pará e Maranhão, dispôs nos §§11 e 12 sobre o modo de pagar os salários aos Índios, como pessoas livres.

Já por C. R. de 3 de Março de 1755 se havia criado a nova Capitania do Rio Negro no Alto Amazonas, e dado nova forma às fundações de aldeias, repartição de terras pelos Índios, e outros objetos concernentes; providências que a já citada Lei de 6 de Junho fez extensivas às outras(279).

Foram aquelas determinações, ao mesmo tempo que a aurora da liberdade dos míseros indígenas, que por dois séculos e meio gemeram debaixo da escravidão e da opressão a mais injusta e violenta, raios fulminados com mão firme e certeira contra a Companhia de Jesus.

Segundo ordens terminanles da Corte, foi pelo Bispo do Pará publicada em Maio de 1757 a Bula já referida de Benedito XIV, e pelos Governadores as duas leis mencionadas(280).

Os Jesuítas eram assim derrotados; e punidos exatamente por onde haviam pecado.

No entanto, quer no Sul, quer no Norte continuavam eles a levantar embaraços aos comissários encarregados da demarcação, de que falamos, chegando ao extremo de se oporem pela força com os seus índios à execução do tratado de 1750(281).

Resolvido o Ministro a castigá-los severamente, conseguiu do Sumo Pontífice Benedito XIV a bula do 1.° de Abril de 1758 autorizando ao Cardeal Saldanha para reformar a companhia de Jesus em Portugal e todos os seus domínios. Em conseqüência foi-lhes proibida a continuação do comércio, que faziam com o maior escândalo, contra as proibições canônicas, no Reino e colônias; assim como confessar e pregar(282).

Embalde tentaram eles a revogação do Breve da reforma ante a Cúria Romana; havia soado a sua derradeira hora(283).

Um incidente da maior gravidade veio precipitar os acontecimentos, favorecendo o plano do hábil Ministro. O atentado de 3 de Setembro de 1758 contra a vida de El-Rei D. José deu motivo ou pretexto a que se visse nele envolvida a Companhia de Jesus. Por outro lado, a cólera (má conselheira) e o despeito por se verem derrotados quase irremediavelmente, levaram os Jesuítas no Brasil a excessos, que se podem qualificar verdadeira e formal rebelião contra o Governo, já por palavras, já por obras(284).

Ao mesmo tempo que o Rei, de acordo com o Sumo Pontifice e Prelados Diocesanos, tomava providências contra os Jesuítas quanto ao espiritual (C.R. de 15, 19, e 20 de Abril de 1759), igualmente as tomava quanto ao temporal, conducentes ao mesmo fim, mandando-os conservar reclusos por suspeitos e sequestrar-lhes os bens (C. R. de 19 de Janeiro de 1759), e tirando-lhes o direito de ensinar (C. R. de 28 de Junho de 1759).

Até que afinal, e pelas razões que fizeram urgente a sua deliberação, não obstante penderem da Cúria Romana reclamações, foi expedida a enérgica Lei de 3 de Setembro do mesmo ano de 1759, pela qual foram os Jesuítas declarados proscritos, desnaturalizados, e expulsos do Reino e seus domínios(285).

Publicada no Brasil, foi ela executada com tal aparato, como se se tivera de combater algum formidável inimigo. Decretou-se, além disso, e fez-se efetivo o seqüestro dos seus bens, incorporação ao Estado como vacantes, e venda, com exceção somente dos destinados ao culto Divino (Alvará de 25 de Fevereiro de 1761, Provis. de 26 de Fevereiro e 4 de Março de 1773).

Alterada ficara profundamente, como vimos acima, a legislação sobre os Índios com as leis de 1755 já citadas. A estas, porém, havia precedido o Alvará de 4 de Abril do mesmo ano, em que, para se facilitar o casamento dos colonos com as índias em proveito reciproco de uns e outros, bem geral da colonização, e desenvolvimento do Estado, se declarou não só que não havia nisto infâmia alguma, senão que ao contrário seriam eles e os seus descendentes merecedores de mais particular proteção, dando-se-lhes a preferência para os cargos, por capazes de qualquer emprego, honra, ou dignidade, proibindo-se que fossem injuriados com a denominação de caboclos, ou outra semelhante(286),

Em execução das mesmas leis (de 1755), expediu o Governador Francisco Xavier de Mendonça Furtado, para o estabelecimento da Vila de Borba-a-Nova no Rio Madeira, um Regimento datado de 6 de Janeiro de 1756 aprovado por C. R. de 7 de Julho de 1757(287); o qual se fez extensivo às demais Vilas, e serviu de exemplar ao outro mais desenvolvido, composto de 95 capítulos e datado de 3 de Maio de 1757, expedido pelo mesmo Governador para o Pará e Maranhão enquanto não fosse por S. M. ordenado o contrário, nestes mesmos termos aprovado por Alv. de 17 de Agosto de 1758(288).

A este tempo já o Alv. de 8 de Maio de 1758 havia feito extensivas a todo o Brasil as leis de 1755 sobre a liberdade de sua pessoa, bens, e comércio, que em favor dos Índios se tinham expedido para o Estado do Norte, ficando assim em tudo e por tudo igualados nos mesmos favores e garantias(289); suscitando-se a observância das ditas leis por diversas resoluções, como v. g. em Goiás pela C. R. de 18 de Outubro de 1758(290).

No Grão-Pará e Maranhão se executava o tão celebrado referido Regimento ou Diretório cujas principais determinações são as seguintes: 1.° que, atenta a lastimosa rusticidade e ignorância com que alé então haviam sido educados os índios, e enquanto não tivessem capacidade para se governarem, haveria um Diretor, nomeado pelo Governador; o qual se deveria regular pelo que no mesmo se dispunha (Cap. 1.°); 2.° que, competindo o Governo nas Vilas aos Juízes e outras autoridades, e nas aldeias independentes delas aos respectivos principais, o Diretor não teria em caso algum jurisdição coativa; devendo representar às ditas autoridades, e também ao Governador do Estado, para proverem de remédio; mas sempre com brandura e suavidade para que o horror do castigo não afugentasse os Índios das povoações (Cap. 2.°); 3.° que seria o principal cuidado dos Diretores a catequese e civilização dos mesmos, conforme as intenções e zelo dos Reis de Portugal (Cap, 3.°); 4.° que, quanto ao espiritual, ficava isto à vigilância do Prelado respectivo; devendo, porém, os Diretores prestar de sua parte todo o auxílio e favor, e ser os primeiros a darem o exemplo de respeito à Igreja (Cap.4°); 5.° que, quanto à civilização pelos meios temporais, cuidariam de fazer aprender a língua portuguesa, banido o perniciosíssimo abuso de conservarem os índios na ignorância dela; que se creariam escolas para um e outro sexo, onde se lhes ensinaria também a doutrina Cristã, sendo os mestres pagos pelos pais ou em dinheiro ou em gêneros (Caps. 5.° a 8.°); 6.° que, tanto em público como no particular, dessem os Diretores aos Índios a devida consideração conforme a sua posição, cargos, e cabedais, a fim de que isto lhes servisse de estimulo a bem procederem; que não fossem chamados negros, pela infâmia e vileza que isto lhes trazia por equipará-los aos da Costa d’África como destinados para escravos dos brancos, segundo se pensava; que os Índios tomassem sobrenomes, com preferência de famílias Portuguesas, para evitar a confusão que do contrário se seguia, e a vileza de o não terem; que cuidassem de aconselhar a conveniência de construírem casas à semelhança das dos Portugueses, para que não vivessem todos promiscuamente com ofensa da honestidade; que por conselhos procurassem banir os vícios e sobretudo o da embriaguez, a que os índios se entregavam com paixão, mas sempre com brandura para que eles se não exasperassem e fugissem; que cuidassem igualmente de conseguir que os índios deixassem de andar nus, persuadindo-os ao trabalho para se vestirem (Caps. 9 a 15); 7.° que, sendo um dos fins das leis promulgadas concorrerem os Índios para o bem do Estado, além do proveito próprio, por meio da agricultura e do comércio, os Diretores o tivessem em vista, aconselhando-os, e prometendo-lhes a preferência nas honras, privilégios, e empregos, conforme o seu trabalho; pedindo para os mesmos terras, se nas povoações não houvessem suficientes (Caps. 16 a 19); 8.° que, havendo sido causas da miséria pública não só a ociosidade, mas também o abuso de terem sido aplicados os Índios a serviço dos particulares, cuidassem os Diretores com mais especialidade em que fizessem eles cultura de mandioca (para farinha), feijão, milho, arroz, e outros gêneros alimentícios, assim como de algodão e tabaco gêneros de grande interesse comercial (Caps. 20 a 26); 9.° que, a fim de ser abençoado o trabalho dos Índios, se pagasse o dízimo, isto é, a décima parte do produto das lavouras e dos gêneros que adquirissem; avaliadas para isto competentemente as roças, e feita a cobrança em tempo oportuno, ou a arrecadação dele para a Fazenda Real (Caps. 27 a 33); 10.° que, em prêmio do seu trabalho teriam os Diretores a 6.ª parte de todos os frutos das lavouras dos Índios, bem como dos gêneros que estes adquirissem não sendo comestíveis, exceto se os vendessem ou fizessem outro negócio (Cap. 34); 11.° que, sendo o comércio um dos meios mais eficazes para completa felicidade do Estado, riqueza dos povos, civilização das Nações, e poder das Monarquias, procurassem os Diretores fomentá-lo e desenvolvê-lo entre os Índios, convidando-os mesmo a buscarem gêneros e drogas do sertão; mas que, atenta a sua rusticidade e ignorância, não obstante a liberdade de comerciar também neles reconhecida, os Diretores interviessem sempre a fim de regularem o preço dos frutos e valor das fazendas, evitando dolo e fraude contra os Índios; e que, quando preferissem receber em gêneros, não admitissein cousas supérfluas aos mesmos Índios, ou nocivas como a aguardente; punindo-se até quem introduzisse esta bebida nas povoações ou canoas sem licença (Caps. 35 a 42); 12.° que os Diretores não poderiam comprar aos Índios os ditos gêneros por si, nem por interposta pessoa, nem com eles fazer negócio ou contrato algum (Cap. 43); 13.° que em todas as povoações houvesse um livro chamado — do Comércio — onde se lançassem todas as transações dos Índios, para que se conhecesse a fidelidade e zelo, e se evitassem os enganos com que até então foram tratados (Cap. 44); 14.° que os Diretores provocassem os Índios a procurar para o seu comércio as cidades, por ser de maior proveito e reputação para os próprios índios, e geral do Estado (Cap. 45); 15.° que promovessem o comércio do sertão como da maior utilidade pelas drogas e gêneros que fornece, excitando-os à extração de resinas, óleos, manteiga de tartaruga, cacau, cravo, salsa e outros gêneros, convidando-os a irem em ocasião oportuna e sem prejuízo da cultura nas povoações, e observando-se para isto o serviço das canoas conforme no mesmo Regimento se dispunha; e que de todo o dinheiro que liquidamente importasse a venda dos gêneros se deduzisse o dízimo para a Fazenda Real, as despesas da expedição, a gratificação arbitrada ao cabo da canoa, e a 6.ª parte para os Diretores, dístribuido-se o restante pelos Índios em partes iguais (Caps. 46 a 47); 16.ª que o dinheiro pertencente aos Índios não lhes seria entregue por incapazes de administrar, mas empregado na compra de fazendas de que houvessem mister (Cap. 58); 17.ª que, devendo os Índios como parte integrante do corpo social concorrer para a sua conservação, e sendo a distribuição deles pelos moradores de utilidade vital para as lavouras, fábricas, serviços e comércio com vantagens recíprocas de uns e outros, os Diretores cuidassem em que os Principais não faltassem com os índios aos moradores, ainda que com detrimento da maior utilidade dos mesmos Índios; que a repartição se fizesse em duas partes, sendo uma para se distribuir pelos moradores para os ditos fins; devendo, para que se fizesse justa repartição, matricular-se todos os capazes de serviço, isto é, de 13 a 60 anos, matrícula revista todos os anos para a respectiva inscrição e eliminação (Caps. 59 a 66); 18.ª que, a bem dos Índios, nenhum fosse dado a morador para fora da povoação sem licença escrita do Governador, assim como a nenhum morador fosse lícito retê-los além do tempo, sob penas aos transgressores (Cap. 67); 19.ª que, em bem dos Índios, a importância integral dos salários seria paga de pronto logo ao receberem-nos os moradores; mas que, entregue uma parte ao Índio, as outras duas ficariam em depósito no cofre para lhe serem entregues no fim, perdendo-as ele, se fugisse antes de acabar o tempo do serviço, a favor do morador; perdendo, porém, este não só a importância integral, mas ainda o dobro, se houvesse dado causa à deserção (Caps. 68 a 70); 20.ª que, em todo o caso, falecendo o Índio no trabalho ou impossibilitando-se para ele, o morador seria obrigado a pagar-lhe ou aos seus herdeiros o salário em proporção do serviço (Cap. 70); 21.ª que estas disposições seriam extensivas aos Principais e outros Índios, que mandassem Índios ao sertão, depositando título ou crédito da importância do salário se não tivessem dinheiro (Cap. 71); 22.ª que, preferindo os Índios recebê-los em fazendas, os Diretores não consentissem que lh’as dessem por preços exorbitantes, sob pena de responderem pelo prejuízo (Cap. 72); 23.ª que, para se fiscalizar este importante assunto da distribuição dos Índios, os Diretores remeteriam em cada ano ao Governador uma relação circunstanciada (Cap. 73); 24.ª que os Diretores cuidassem na construção de casas de Câmara e cadeia; assim como aconselhassem os Índios em construir para si (Cap. 74); 25.ª que, sendo causa de se acharem abandonadas as povoações não só às violências dos habitantes que obrigaram os Índios a fugir para os matos, mas o abuso de os reterem no serviço, os Diretores mandassem uma lista de todos os que se achassem ausentes, a fim de que, conhecido o motivo, se aplicasse remédio a tão grave mal (Cap. 75); 26.ª que, convindo que as povoações se aumentem e sejam populosas, constando pelo menos de 150 moradores, se poderiam reduzir as aldeias a povoações reunindo-as como melhor parecesse, mas sem violência dos Índios, sobretudo quando de nações diferentes; tentando-se, outrossim, para o mesmo fim o descimento de Índios, a cargo dos Juízes e Principais das vilas e aldeias, ainda à custa de maior despesa da Real Fazenda por assim se dilatar a fé (Caps. 76 a 79); 27.ª que, convindo muito a bem da civilização dos Índios a comunicação e comércio com os brancos, e tendo mostrado a experiência que o contrário tem resultado da odiosa separação em que até então uns e outros se conservaram, seria permitido estabelecerem-se os de exemplar procedimento nas povoações dos Índios, e até auxiliados e considerados, distribuindo-se-lhes terras, sem prejuízo, porém, dos mesmos Índios, primários e naturais senhores delas; sujeitos a condições para que não abusassem dos Índios, não os vexassem, não lhes tirassem suas terras, não os indispusessem com os brancos, sob penas mesmo de serem expulsos das povoaçõcs e de perderem tudo quanto aí tivessem (Caps. 80 a 86); 28.ª que, para extinguir essa abominável separação de Índios e brancos, fomentassem os Diretores os casamentos de uns e outros, por não haver nisto infâmia alguma; castigando-se os que, depois de casados, desprezassem os maridos ou as mulheres só pela qualidade de Índios (Cap. 87 a 91); 29.ª que antes de dois anos de assistência nas povoações não fossem os novo-descidos do sertão obrigados a servir (Cap. 94); 30.ª que, sendo os Diretores apenas uns tutores dos Índios, tivessem muito em cuidado tratá-los sempre com prudência, suavidade e brandura, tão recomendada nas leis; e que, esquecidos da própria conveniência, se entregassem exclusivamente aos interesses dos Índios, de modo que estes buscassem afinal voluntariamente as povoações; pois que deste modo se conseguiriam os altos e santíssimos fins das leis, a saber: dilatação da Fé, extinção do gentilismo, propagação do Evangelho, civilização dos Indígenas, bem comum dos vassalos, aumento da agricultura, introdução do comércio, e o estabelecimento, opulência e total felicidade do Estado (Caps. 92 a 95).

Posto em execução este Regimento ou Diretório, começaram desde logo os abusos contra os desgraçados Índios, que, livres em nome, se viam inteiramente sujeitos sobretudo aos Diretores; os quais, longe de protetores, se constituiram verdugos, já no trato que davam a esses infelizes metendo-os em troncos em cárceres privados, e castigando-os até com açoites, já no modo desabrido e de desprezo com que se portavam mesmo para com os Principais, já nos excessos que cometiam, arrogando-se atribuições que lhes não competiam e expressamente eram confiadas às autoridades, já praticando mil outras violências e infrações, chegando ao excesso de impedirem que os Párocos doutrinassem os Índios na língua destes ainda que ignorassem os mesmos Índios a portuguesa. Interessados os Diretores na 6.ª parte do produto das lavouras e comércio, e sendo certo o lucro da extração das drogas do sertão, distraíam os índios quase exclusivamente neste serviço, com prejuízo da lavoura e das povoações, aplicando todos a este trabalho, sem distinção, contra as leis e o referido Diretório. Quando na lavoura, obrigavam os Índios a trabalho excessivo dia e noite pela esperança de maior vantagem no seu quinhão da 6.ª parte. Tais deduções se faziam no produto da venda dos gêneros dos Índios, que estes quase nada recebiam; e isto mesmo quase sempre em cousas inúteis. Se levavam os gêneros à capital, deduziam-se, além do dízimo para a Real Fazenda, despesas, quinto para o cabo da canoa, 6.ª parte para os Diretores, mais 3% para o Tesoureiro, 2$000 de novos direitos, e o viático para a Igreja! A distribuição a particulares importava violências, como anteriormente, obrigados os Índios, à simples ordem do Governador, a abandonar tudo para servirem aos moradores; e em poder destes eram tratados pior que escravos, pois só cuidavam de tirar dos mesmos o maior serviço possível, chegando à inqualificável barbaridade de lhes deitarem pimenta nos olhos se adormeciam prostrados de fadiga. Se os Índios, assim cruelmente tratados, fugiam, eram perseguidos no sertão em seus mocambos; e se apreendidos, castigados severamente com trabalhos e calceta, sem direito a prêmio ou salário algum. Pela faculdade de serem pagos dos seus serviços em gêneros, muitas vezes lhes davam pelo trabalho de um mês apenas duas varas de algodão (300 réis) e ainda menos. Terras não lhes davam, vagando eles por estas ou aquelas roças; e por último entranhando-se nos matos em ranchos, a que chamavam mocambos, fugindo afinal para os gentios do sertão.

O próprio Diretório, contradizendo em muitas de suas disposições as salutares determinações das leis últimas, e querendo conciliar a liberdade e proteção dos Índios com o serviço dos moradores e desenvolvimento da riqueza pública à custa do trabalho desses miseráveis, criou um verdadeiro labirinto que deu origem a todos aqueles maus resultados; de sorte que em sua execução tudo foi pelo pior contra os Índios. Da liberdade de sua pessoa, bens e comércio tinham somente a bela promessa da lei; o fato era a continuação da vexação e opressão. D’onde resultou, naturalmente, não se conseguir fim algum das leis nem do Diretório, quanto à civilização e catequese.

Em data posterior a 1773(291), governando o Pará João Pereira Caldas, dirigiu ao Rei uma longa representação o Dr. Antônio José Pestana da Silva, que servira de Ouvidor e Intendente Geral dos Índios(292); em a qual luminosamente expôs o modo por que, sempre abusivamente, se praticavam as leis e o citado Diretório, concluindo pela abolição deste, e oferecendo bases para novo governo temporal dos Índios, assim como lembrando novos meios de se fomentar o desenvolvimento da lavoura e comércio(293); porquanto, diz ele, — bem claro fica que de nada serviram as leis aos Índios para serem amparados na sua liberdade. O Diretório é um labirinto ou mistura de determinações que dá causa a muitas ilusões e desacertos que hoje se praticam no Estado. Sejam bons os Europeus, que será supérfluo o constrangimento para os Índios seguirem o útil, o honesto e o bem(294). Desempenhem-se as leis, seja completa a liberdade dos Índios, sejam livres suas pessoas, suas ações, e os seus bens, que haverão lavouras, domicílios estabelecidos, e o comércio se exercitará sem o descômodo e a violência das distribuições, sem opressão e constrangimento dos miseráveis. E, girando a correspondência por todos, e sem nenhum custo e com maravilha indizível, se verá brilhando a luz da Fé e a verdade do Evangelho por todo o país, e se dilatará não só o grêmio da Igreja, mas também se estenderão os limites do Império Português, por nós nunca d’antes presenciados.

Se no Norte do Estado do Brasil eram negativos os resultados, também no Sul quase o mesmo se dava, não porque fosem más as leis, porém porque a sua execução era má.

Em S. Paulo, v. g., D. Luiz Antônio de Souza expediu aos Diretores das aldeias umas Instruções, semelhantes ao Diretório de que acima falamos para o Pará. Os Índios, para não repartirem ou darem a 6.ª parte ao Diretor, abandonavam as aldeias. Ordenou ele que de tudo quanto ganhassem os Índios se deduzisse a terça parte para o índio, dos outros dois terços tirasse o Diretor a sua 6.ª parte, e o mais fosse recolhido ao cofre para a Igreja e pároco; de sorte que, sendo o salário do Índio naquele tempo 100 réis por dia, apenas recebia ele 33 réis para se sustentar a si, mulher e filhos! A miséria, a devassidão, o roubo, a fuga foram as conseqüências necessárias(295).

Se alguma aldeia ainda era entregue aos cuidados de Regulares, por exemplo aos Capuchos de Santo Antônio, como sucedeu em S.Paulo (1793) e outros lugares, eram os Índios sujeitos, não obstante as leis últimas, a um célebre Regimento tomado em Capítulo no Rio de Janeiro aos 13 de Agosto de 1745, em o qual só se respirava a prepotência, a barbaridade de castigos, açoites, e tronco, excomunhões, como se nos infelizes Índios se não vissem mais do que ferozes inimigos votados ao rigor e à destruição(296).

As perseguições cotinuavam, e até a venda dos prisioneiros em proveito das bandeiras, contra a proibição das leis últimas, como sucedeu com os Caiapós e outros em a Capitania de Goiás(297).

Por tal modo se executavam as referidas leis, no Brasil, e o célebre Diretório no Pará, que o próprio Governador desta Capitania D. Francisco de Souza Coutinho informou sobre isto ao Governo da Metrópole; o qual expediu a Carta Régia de 12 de Maio de 1798, assinadajá pelo Príncipe Regente, depois Rei D. João VI, que em nome de sua máe D. Maria I regia o Estado desde que, tendo ela subido ao Trono por falecimento de D. José (24 de Fevereiro de 1777) fora a mesma Rainha acometida em 1792 de enfermidade mental.

Nessa Carta Régia(298) se dispôs o seguinte: 1.° abolição do Diretório dos Índios; ficando estes resumidos aos seus direitos em pé de igualdade com os demais vassalos livres, e governados pelas mesmas leis; 2.° que, em conseqüência, nas relações com Índios a serviço se observassem as leis sobre deveres de amo e criado; e que o Governador jamais dispusesse arbitrariamente deles por qualquer motivo, ainda do Real serviço, exceto para defesa da terra; 3.° que o Governador tivesse muito a peito a proteção aos Índios, quer aldeados e já civilizados, quer dos ainda embrenhados nos matos; 4." que se promovessem os casamentos dos brancos com Índias, isentando os parentes próximos de quaisquer serviços públicos por certo número de anos; 5.° que se não fizesse guerra alguma aos Índios, nem se desse auxílio a uns contra os outros; 6.° que só se lhes poderia fazer guerra defensiva, e isto mesmo em caso extremo; 7.° que ninguém empreendesse descimentos de índios, quer por conta própria, quer pela da Real Fazenda; 8.° que ninguém pudesse receber nem haver por qualquer forma escravos dos Índios, ainda que se alegasse o pretexto de serem postos em liberdade; 9.° que fossem batizados aqueles que livremente acompanhassem os moradores, e se cuidasse da sua educação e instrução, dando-se-lhes mesmo o privilégio de órfãos; 10.° que todos são livres; e aos moradores seria permitido fazer livremente com eles o comércio, e estabelecer-se nas terras dos mesmos índios com a devida licença do Governo; 11.° que os Eclesiásticos incumbidos da conversão dos Gentios, e cura das almas, seriam pagos pela Real Fazenda; 12.° que se daria prêmio a todo aquele que reduzisse qualquer nação de Gentio. Ainda outras providências aí foram tomadas em ordem a conseguir-se a civilização dos Indígenas, para proveito destes, bem da Igreja e do Estado; recomendando-se muito particularmente a sua exata observância.

O Governador promoveu efetivamente a execução dessa determinação, expedindo as ordens necessárias, como consta de sua resposta de 30 de Abril de 1799(299); em a qual declara que um dos efeitos imediatos foi recolher-se às povoações muita gente que se achava ausente por não ter casa nem roças.

Não obstante essa perpétua questão de índios, o Brasil progredia; a população crescia; as letras e artes achavam cultores na colônia, chegando-se mesmo a fundar associações literárias na Bahia e Rio de Janeiro sob a proteção de alguns Governadores; escolas regulares se criaram, e também seminários; a lavoura, a navegação eram protegidas; igualmente o comércio com a Metrópole, instituindo-se mesmo companhias de comércio; continuava a mineração do ouro, e novas descobertas de diamantes, com grande proveito do Erário português; crescia a renda pública. Em todos estes resultados se via a sabedoria, o tino administrativo e político do grande Ministro de D. José. Tratados de limites eram concluídos. A sede do Governo central foi transferida da Bahia para o Rio de Janeiro, tendo os Governadores o título de Vice-Reis (1763 a 1808).

Aquela prosperidade da colônia sofreu, porém, ainda muito com o regime monopolista da Metrópole, e sobretudo com a demissão do exímio estadista, e falecimento do grande Rei, aos quais o Brasil tanto deveu, e deve.

.Mas, apesar de tudo, era já tão vigorosa a seiva da colônia, que alguns espíritos audazes e generosos deixaram-se arrastar a uma tentativa de emancipação política em Minas Gerais, expiando mártires da sua generosa idéia de liberdade(300). A emancipação do Brasil estava reservada pela Providência para tempos, é verdade, não muito remotos, e a outras mãos e elementos(301).

Deixemos, porém, tais assuntos; suspendamos também o estudo sobre a colonização; e voltemos aos nossos índios. Começa o século XIX; vejamos o que a respeito deles se há feito, e o que é possivel fazer-se em bem dos mesmos e da pátria.



CAPÍTULO VIII.

Restauração do sistema do terror contra os índios. — Guerra aos mesmos. — Bandeiras. — Novas providências para a sua catequese e civilização. — Sistema misto.

Vigoram as leis últimas sobre liberdade dos índios.

Da compressão em que viviam quando mantida a escravidão, da sujeição aos senhores, da ausência de deliberação própria, da tutela forçada enfim em que jazeram por anos e por séculos passaram quase sem transição para o estado de liberdade plena, extremo oposto; abandonados, portanto, a si mesmos, aos seus próprios recursos, à sua própria e única deliberação, afinal internaram-se pelos sertões; as aldeias caíram em decadência e ruína; só a muitos esforços e à custa de grandes sacrifícios se chegaram a manter ou a aldear, sem vantagens notáveis para a sociedade(302).

A catequese pouco ou nada aproveitava; a influência fascinadora dos Jesuítas tinha desaparecido, e os índios sem a direção desses Padres desnortearam completamente. A civilização dos mesmos ressentiu-se necessariamente da supressão dos elementos que a entretinham. Por cúmulo de infelicidade, a introdução de escravos Africanos concorreu não pouco para impedir a civilização dos Indígenas; igualados àqueles como escravos eram do mesmo modo maltratados pelos colonos, e das relações com os Africanos não podia vir senão aumento e agravação de elementos desfavoráveis à civilização dos índios(303); das uniões lícitas (casamentos, ora tolerados, ora de algum modo dificultados), ou ilícitas, com os dessa raça decaída, proveio um cruzamento reputado degradante, e realmente de perniciosa influência física e moral para os mesmos índios, por forma que os colonos por vileza os denominaram em geral negros, e foi preciso que a lei proibisse tratá-los por tais(304); e dessas uniões resultou perpetuar-se na descendência índia, proveniente de escravas de raça Africana, a escravidão, e ser mantida por disposição da Lei não obstante haver a mesma lei abolido a escravidão dos indígenas(305).

Por outro lado, os Índios conservando sempre vivas pela tradição as perseguições cruéis e a escravidão que sofreram dos colonos, e nutrindo sempre indelével o ódio contra os Portugueses(306) assaltavam os habitantes em uma ou outra capitania. Os moradores não os poupavam; e ao mesmo tempo representações eram levadas à presença do Príncipe Regente. O sistema do rigor foi de novo ensaiado, apesar da improficuidade dele já demonstrada pela incessante perplexidade do seu emprego e do da moderação durante perto de três séculos.

Em 1806 fez-se a guerra aos índios na Bahia(307)

Achando-se já no Brasil (Janeiro de 1808) o Príncipe Regente com a Real Família, em conseqüência da invasão de Portugal pelo exército Francês no reinado de Napoleão I, mandou-se fazer guerra ofensiva aos Botocudos, em Minas Gerais, pela C. R. de 13 de Maio de 1808(308) dirigida ao Governador e Capitão General da Capitania: na qual se lê o seguinte: «Que desde o momento, em que receberdes esta Minha Carta Régia, deveis considerar como principiada contra estes índios antropófagos uma guerra ofensiva, que continuareis sempre em todos os anos nas estações secas, e que não terá fim senão quando tiverdes a felicidade de vos senhorear das suas habitações, e de os capacitar da superiodade das minhas Reais armas, de maneira tal, que movidos do justo terror das mesmas peçam a paz, e sujeitando-se ao doce jugo das leis, e prometendo viver em sociedade, possam vir a ser vassalos úteis, como já o são as imensas variedades de índios, que nestes meus vastos Estados do Brasil se acham aldeados... Que sejam considerados como prisioneiros de guerra todos os índios Botocudos, que se tomarem com as armas na mão em qualquer ataque; e que sejam entregues para o serviço do respectivo comandante por 10 anos, e todo o mais tempo, em que durar sua ferocidade, podendo ele empregá-los em seu serviço particular durante esse tempo, e conservá-los com a devida segurança mesmo em ferros, enquanto não derem provas do abandono da sua ferocidade o antropofagia.»

Por igual modo se mandou proceder contra os Bugres, em S. Paulo, pela C. R. de 5 de Novembro de 1808(309) dirigida ao Governador e Capitão General da capitania, onde se lê o seguinte: — Que não há meio algum de civilizar povos bárbaros, senão ligando-os a uma escola severa, que por alguns anos os force a deixar e esquecer-se da sua natural rudeza, e lhes faça conhecer os bens da sociedade... Que todo o miliciano, ou, qualquer morador, que segurar algum destes Índios, poderá considerá-los por 15 anos como prisioneiros de guerra, destinando-os ao serviço que mais lhe convier.

O sistema de brandura ou humanidade, como se exprimem essas Cartas Régias, foi aí abandonado para se restaurar o do terror; pensamento manifestado ainda na C. R. de 2 de Dezembro de 1808(310) como proveitoso pelo que suecedeu contra os Botocudos. Nessas Cartas Régias eram restauradas também as bandeiras, quer de tropa de linha, ou de milicianos, quer de particulares, contra os índios; e a escravidão era disfarçada em servidão temporária, e mesmo indefinida.

Mas de todas as determinações expedidas nessa época com tal intento sobressai a C. R. do 1.° de Abril de 1809(311), altamente interessante, e na qual se lê: «Ao mesmo comandante ordenareis que quando seja obrigado a declarar a guerra aos índios, que então proceda a fazer e deixar fazer prisioneiros de guerra pelas bandeiras que ele primeiro autorizar a entrar nos campos; pois sem essa permissão nenhuma bandeira poderá entrar; bem entendido, que esta prisão ou cativeiro só durará 15 anos, contados desde o dia em que forem batizados, e desse ato religioso, que se praticará na primeira freguezia por onde passarem, se lhes dará certidão, na qual se declare isso mesmo, excetuando porém os prisioneiros homens e mulheres de menor idade; pois que nesses o cativeiro dos 15 anos se contará ou principiará a correr, nos homens de 14 anos e nas mulheres de idade de 12 anos; declarando também que o proprietário do índio guardará sempre a certidão para mostrar o tempo de cativeiro que ele deve sofrer, e ficará exposto a declarar-se livre o índio, se acaso perder a certidão e não puder tirar outra, bem entendido que os serviços do índio prisioneiro de guerra, de uns a outros proprietários, durará pelo espaço de tempo, que haja de durar o seu cativeiro, e segundo mostrar a certidão que sempre o deve acompanhar. Os prisioneiros de guerra feitos pela tropa se distribuirão pelos oficiais e soldados da mesma tropa, à exceção daqueles que for necessário deixar para o meu Real serviço.... Que fazendo partir o Comandante com a tropa de linha e artilharia.... proporcional à expedição intentada, façais ir juntamente dois religiosos ou sacerdotes de zelo exemplar e de luzes, que sejam encarregados não só de catequizar, batizar e instruir os índios, mas de vigiar que com eles se não pratique violência alguma, senão aquela que for necessária para repelir a sua natural rudeza e barbaridade.»

Aqui manda-se fazer guerra ofensiva para aterrar e subjugar os índios, quer pela tropa, quer por bandeiras; e, ao mesmo tempo que se recomenda a intervenção de religiosos que catequizem, batizem, e instruam os índios, se ordena que a tropa seja ajudada até de artilharia! e mais ainda, se restabelece a escravidão (embora temporária) dos prisioneiros, por 15 anos a contar do dia em que fossem batizados! sem excetuar os velhos, mulheres, e crianças! não se devendo para os impúberes contar esses 15 anos senão desde que tivessem chegado à puberdade!

Os prisioneiros das bandeiras eram transferíveis enquanto durasse o seu cativeiro; e garantido este aos proprietários pela certidão, que se lhes devia dar, do batismo do índio com essa declaração; à tropa doviam ser distribuídos os seus respectivos prisioneiros, em os quais também teria o seu quinhão o Real serviço!

De sorte que, pretendendo-se a catequese e civilização dos índios, tentava-se à força de baionetas e de metralha! Devendo-se-lhes fazer abraçar a religião de Cristo, comecava-se por avivar-lhes e aguçar o ódio contra os sectários e os Ministros dessa Santa e sublime religião! a água do batismo, que para muitos foi e é a da redenção, para esses infelizes era a do cativeiro!

As conseqüências são fáceis de prever. Recrudescência do ódio e animosidade dos índios contra os habitantes; fuga e dispersão dos mesmos, não sem inquietarem e trazerem em sobresalto os moradores; maior dificuldade para atraí-los ao grêmio da religião e da sociedade.

O Regente já havia recebido várias representações e informações enviadas pelos Governadores e Câmaras, sobressaindo nessa época a do Desembargador João Rodrigues de Brito, da Bahia, que reprovava o sistema de aldear os índios em povoações separadas, e entendia que só a estreita comunicação com a gente civilizada podia excitar neles o apetite das comodidades da vida social. Também era notável a Memória, que à Rainha D. Maria I, havia dirigido Domingos Alves Branco Moniz Barreto, a qual refere ele próprio (em outra sua Memória contra o tráfego e escravidão dos Africanos) fora bem recebida e aprovada; aí propunha o seu autor um novo humanitário plano para catequese e civilização dos Indígenas(312).

Prestando o Governo alguma atenção a semelhante assunto, não obstante o muito que tinha de providênciar para o Brasil e também para Portugal e demais possessões em crise tão melindrosa e grave, expediu a já citada C. R. de 2 de Dezembro de 1808 para a civilização dos Índios do Rio Doce(313), em a qual se recomendam os meios brandos para os Índios que se queiram sujeitar voluntariamente, a intervenção de Eclesiásticos virtuosos que se encarreguem da redução e instrução, a edificação de Igrejas, e o aldeamento só quando em grande número; que, sendo em pequeno número, fossem distribuídos pelos fazendeiros e agricultores com certas obrigações, servindo-os por 12 anos, e por 20 sendo menores de 12 anos em compensação da educação e alimentação; que se permitisse nos aldeamentos estabelecerem-se famílias portuguesas morigeradas e industriosas; e que se dariam prêmios aos fazendeiros que melhor tratassem os índios e maior número civilizassem, promovessem casamentos, e mostrassem maior número de nascimentos deles nas suas fazendas. Aí mesmo se reconhece que os Diretores abusavam e que os índios fugiam para os bosques, nas palavras seguintes: «havendo a experiência mostrado que as aldeias ou povoações de índios não têm igualmente prosperado, antes vão em decadência, já pela natural indolência e pouco amor deles ao trabalho, já pela ambição das pessoas, que com o título de Diretores ou outro qualquer só têm em vista tirar partido de gente grosseira, rústica e pouco civilizada, para absorverem à sua sombra os socorros dados pela Minha Real Fazenda, que tendo sido muito consideráveis, têm sido em parte infrutíferos ... serão obrigados nas devassas anuais denominadas Janeirinhas a perguntarem pelos que desencaminham índios, ou os induzem a fugir para os bosques e a subtrair-se à civilização....»

Expediu ainda as C. R. de 28 de Julho de 1809 e 5 de Setembro de 1811(314) sobre aldeamentos de várias tribos, quais os Puris e Xamixunas, e redução de outras, quais os Canajás, Apinagés, Chavantes, Cherentes, e Canoeiros. Ao mesmo tempo que aí se declara que os índios são livres e que de não serem mantidos eficazmente na liberdade tem provindo grandes males, e que se recomendam os meios de brandura e o auxílio da Religião, também se ordena o emprego da força como único meio extremo de os reduzir, e que sejam mesmo destruídos, se for necessário, embora se reconheça que a maior culpa está da parte dos colonos, moradores e até dos Diretores. Na citada C. R. de 1809 (art. 7.° das Instruções que a acompanham) lê-se o seguinte: «A fim de que prospere o aldeamento, conservando-se os que presentemente existem, e a fim de que se animem outros muitos índios a descer dos sertões é de suma necessidade que o Diretor lhes faça ver, e que eles se convençam, de que são inteiramente livres, e isentos de toda a escravidão, podendo dispor livremente de suas pessoas, sem outra sujeição temporal que não seja a que devem ter às leis do Soberano, a fim de viverem felizes à sombra delas na sociedade civil e união cristã, tendo a honra de ficarem associados aos mais vassalos de S. A. R.; sendo certo que, por se não haverem sustentado os Índios eficazmente na liberdade, é que se tem extinguido o grande número das aldeias e povoações, desertando milhares de índios, internando-se outra vez nas suas habitações silvestres, e diminuindo-se os braços que são necessários para cultivar a terra e colherem-se os muitos e preciosos frutos que ela é capaz de produzir.» — Na outra C. R. de 1811 se lê o seguinte: «Acontecendo que este meio não corresponda ao que se espera, e que a nação Canajá continue nas suas correrias, será indispensável usar contra ela da força armada; sendo este também o meio de que se deve lançar mão para conter e repelir as nações Apinagé, Chavante, Cherente, e Canoeiro; porquanto, suposto que os insultos que elas praticam tenham origem no rancor que conservam pelos maus tratamentos que experimentaram de alguns Comandantes das aldeias, não resta presentemente outro partido a seguir senão intimidá-los, e até destruí-los, se necessário for, para evitar os danos que causam.»

O sistema então seguido foi misto, quer dizer, meios brandos e conciliatórios, ao mesmo tempo que a força e o terror; se o índio não se quisesse sujeitar por bem, devia ser reduzido à força contra sua vontade, ou perseguido como inimigo a que se não desse quartel, e mesmo destruído, exterminado. Tal é o espirito, o pensamento que se revela em todas essas determinações, e que foi expressamente manifestado no Aviso de 11 de Dezembro de 1811(315) nas palavras «deixando-se agora ver .... a esperança que pode haver de que se consiga com os meios fortes acompanhados dos de brandura o efeito tão desejado da sua pronta civilização ... continuando a fazer-se-lhe uma dura guerra enquanto não quiserem pacificar-se e viver debaixo da proteção das Leis.»

Foi um erro grave esse de pretender submeter, catequizar e civilizar os índios à força de armas e pelo terror, não obstante parecer ao governo que dele se colheria, ou se colhera, alguma das almejadas vantagens. A triste realidade foi recrudescer o ódio dos mesmos contra os cidadãos, e a destruição dos Índios, ou sua dispersão fugindo assim à civilização, a que aliás eram convidados com pólvora e bala, e com o cativeiro ou servidão.

E até (cousa notável) pela dubiedade da expressão servo, que na acepção vulgar significa ora escravo ora servo propriamente dito, resultou que Índios sujeitos apenas à administração fossem batizados como servos, pois que assim também eram denominados os administrados, e lançados os registros respectivos em livros comuns aos dos batismos dos escravos e catecúmenos (conquanto aí mesmo se distinguissem), como sucedia em S. Paulo. Daqui proveio originarem-se vexames, cativeiros ilegais, e questões que ainda hoje têm sido levadas aos Tribunais(316).

No entanto, o coração bondoso do Príncipe Regente não deixava de recomendar também os meios pacíficos e amigáveis na redução dos índios, e o bom tratamento deles, como dissemos. Ainda no Regimento de 13 de Maio de 1812(317) dado à Relação do Maranhão, criada por Lei de 23 de Agosto de 1811, modelado pelos da Bahia e Rio de Janeiro, no Tit. 2.° §15 se lê o seguinte: «Favorecerá os Gentios do distrito da Relação que estiverem em paz, não consentindo por modo algum que sejam maltratados, ou obrigados a serviços e trabalhos alguns por preços e tempos arbitrários, que não sejam estipulados por mútuas convenções, da mesma maneira que se observa com todos os outros meus vassalos. E mandará proceder com rigor contra quem os maltratar ou molestar, dando ordens e providências para que se possam sustentar, e viver junto das povoações dos Portugueses, ajudando-se delas, de maneira que os que habitam no sertão folguem de vir para as ditas povoações, e entendam que tenho lembrança deles; guardando-se para este efeito inteiramente a lei, que sobre esta matéria ordenou o Senhor Rei Dom Sebastião no ano de 1570, e todas as mais leis, provisões e ordens expedidas sobre a mesma matéria, e muito especialmente as que foram promulgadas e expedidas pelo Senhor Rei D. José.»

Aqui se suscita a observância das leis a favor dos Índios, e com especialidade as de D. José 1.°. O que mais tarde foi repetido, quando, criada por Alv. de 6 de Fevereiro de 1821(318) a Relação de Pernambuco, se mandou que esta se regesse pelo Regimento dado à do Maranhão.

Várias providências ainda se tomaram sobre a civilização, educação, e aldeamentos de diversas tribos, no Maranhão por Prov. de 9 de Setembro de 1815 e 3 de Janeiro de 1816, em S. Pedro do Sul por Prov. de 8 de Janeiro de 1818, e assim em outros lugares do Estado(319).

A este tempo já o Brasil era elevado à categoria de Reino, unido aos de Portugal e Algarves, pela C. L. de 16 de Dezembro de 1815(320), e governado por D. João VI, aclamado e sagrado Rei (o 1.° em terra americana), por falecimento em 20 de Março de 1816 de sua mãe a Rainha D. Maria I.

Com a vinda da Família Real, com a elevação do Brasil à categoria de Reino, embora sob o mesmo cetro, com a abertura dos portos às Nações do mundo pela C. R. de 28 de Janeiro de 1808, (alcançada a esforços do distinto Brasileiro José da Silva Lisboa, depois Visconde de Cairu), com as maiores franquezas outorgadas, com a instituição de Tribunais e Repartições independentes dos da Metrópole, enfim com a organização de sua administração própria, estava reconhecida a sua autonomia; estava feita a sua independência, pelo menos nas idéias, no espírito público, e pelo conjunto do mecanismo governativo e administrativo do Estado.

O Rei, porém, desassombrado definitivamente da invasão estrangeira em Portugal com a queda do grande Capitão do século em Waterloo, e chamado por força dos seus deveres à sede Metropolitana, deixou as terras brasileiras, que tanto amava(321), em 26 de Abril de 1821; ficando por seu Lugar-Tenente e Regente o Príncipe D. Pedro(322).

As tentativas de emancipação política, malogradas em fins do século passado (1789–Minas Gerais), e em princípios do atual (1817–Pernambuco), agora achavam ensejo oportuno(323). D. Pedro, Príncipe talhado para herói dos belos tempos da Grécia e de Roma antigas, coroa a obra começada por seu magnânimo pai; e à face de Deus e do Mundo proclama nos Campos do Ipiranga em S. Paulo a independência do Brasil (7 de Setembro de 1822), que, em gratidão, lhe confere o título de seu Defensor Perpétuo, e o aclama seu Imperador (12 de Outubro).

Ao passo que a consolidação da independência e da nova ordem de cousas absorvia os cuidados principais do Governo, não deixava este de atender a representações sobre os índios, e de tomar algumas providências; sem que resolvesse cousa alguma de modo geral, mesmo porque havia sido convocada a Assembléa Constituinte e Legislativa Brasileira, aberta em 3 de Maio de 1823, e havia intenção(324) de organizar os Poderes Políticos em forma constitucional, confiando-se ao Legislativo o direito de fazer Leis e revogá-las.

Dessas providências particulares e singulares temos exemplo na Port. de 18 de Abril de 1822 que mandou proceder ex-ofício relativamente ao injusto cativeiro de índios do Rio das Mortes em Minas, na Prov. de 9 de Maio e Port. de 3 de Junho de 1823 prestando auxílio pecuniário ao Governo de Minas para obter e manter a civilização dos Botocudos, na Port. de 21 de Agosto do mesmo ano que ordenou para Minas que não se lhes fizesse mal e antes fossem tratados com afabilidade, e em outras determinações(325).

Mas, aberta a Assembléia Geral Constituinte e Legislativa Brasileira, a questão dos índios não podia deixar de ser aí aventada. José Bonifácio de Andrada e Silva ofereceu uma importante memória e projeto para catequese e civilização dos Indígenas(326). As idéias de liberdade, mais vivazes nessa época, fizeram inserir no Projeto de Constituição apresentado à Constituinte um artigo favorável aos índios, bem como um outro sobre a abolição gradual da escravidão dos negros(327). Dissolvida, porém, a Constituinte (12 Nov. 1823), e encarregada a uma Comissão nomeada pelo Imperador D. Pedro a confecção do Código Constitucional ou Lei Fundamental do Império, que foi promulgada e jurada em 25 de Março de 1824, aí nada de especial se dispôs a tal respeito; só mais tarde teve isto lugar, como diremos.

Aquela Assembléia havia, no entanto, decretado(328) na Lei de 20 de Outubro de 1823 (que extinguiu as Juntas Provisórias de Governo estabelecidas nas Províncias, e o confiou a um Presidente e Conselho) que incumbia aos Presidentes em Conselho promover as missões e catequese dos índios (art. 24 e §9.°).

Esta disposição, pelo vago e indeterminado dela, era apenas tomada antes como recomendação do que como rigoroso dever. Todavia, tratando-se da catequese de índios de S. Pedro do Sul, a Port. de 25 de Maio de 1825 (329) deu providências de conformidade com a dita Lei, recomendando os meios brandos, e amigáveis. Também o fizeram as Resols. ou Leis de 6 de Julho de 1832(330), tomadas sobre outras dos Conselhos Gerais de Goiás e Minas Gerais, relativamente aos Índios e sua educação.

Embora subsistissem ainda as C. R. de 1808 e enxertado na legislação o sistema do terror e do cativeiro ou servidão, em verdadeiro antagonismo com o das leis de D. José I que cumulativamente se mantinham, o Governo, convencido mais uma vez, pela experiência, da ineficácia de tal sistema e dos graves males que ele importava, o foi abandonando; e nas diversas providências que tomou, ainda a respeito dos Índios bravos e por acometimentos que praticavam contra a gente civilizada, não deixava de recomendar a brandura, afabilidade, e o emprego de meios próprios e capazes de os atrair voluntariamente, como se vê da Port. de 25 de Outubro de 1823 sobre os Canoeiros de Goiás, do Dec. de 12 de Maio de 1824 sobre os índios do Rio Doce, das Port. de 16 de Novembro e 7 de Dezembro de 1824 sobre a aldeia Graciosa em Goiás e ajustes com Chefes Cherentes(331), da Port. de 23 de Março de 1825 sobre os da vila de Cimbres em Pernambuco, da Port. de 18 de Outubro do mesmo ano sobre os do Rio Negro que se mandaram sustentar em sua liberdade, do Av. de 9 de Março de 1830 sobre os de Mato Grosso(332).

O rigor, o terror continuava na legislação como arma a empregar, se as circunstâncias o exigissem na opinião dos Governantes; e tanto, que na Port. de 26 de Setembro de 1825(333) se declarou que aos Presidentes e Comandantes das Armas pertencia a escolha e nomeação do Comandante e força das bandeiras contra os Índios.

Semelhante sistema, porém, reprovado formalmente em sábias leis anteriores, que derrogaram as que o haviam sancionado, de novo ensaiado em pleno século XIX e ainda uma vez convencido de improfícuo, desumano, pernicioso, e adverso aos grandes fins da redução e civilização dos Indígenas, e mais ainda absurdo pela coexistência do outro sistema diametralmente oposto, dando em resultado um sistema misto, prenhe de contrasensos e de recíproca oposição, não podia prevalecer. O estado da civilização, e as idéias clamavam por uma reforma; a intenção do legislador constituinte exigia providência que desenvolvesse o seu pensamento, e deduzisse as suas conseqüências.



CAPÍTULO IX.

Direito novo. — Abolição completa e definitiva do cativeiro e servidão dos Índios. — Proteção e favores. — Sistema atual — Futuro dos Índios ante a civilização. — Conclusão.

Já não governava o Brasil o seu primeiro Imperador, que havendo libertado do jugo da Metrópole um grande e nobre povo, e fundado em terra Americana um invejado Império, cumprindo assim parte, gloriosa da sua missão, chamado pela Providência a outra igualmente gloriosa fora no Velho Mundo salvar também a Metrópole da reação do absolutismo contra as idéias liberais e constitucionais. A revolução de 7 de Abril de 1831 elevou ao trono o Senhor Dom Pedro II, então menor; e o governo coube à Regência em nome do mesmo Augusto Senhor, que mais tarde (1840) o assumiu e é hoje o Imperante.

Era azada a ocasião para se derrocar o carunchoso e desumano sistema das Leis do terror e da escravidão contra os Índios.

Por honra dos poderes do Estado, por honra do país e da civilização, foi promulgada a Lei de 27 de Outubro de 1831(334), que dispõe o seguinte: — Art. 1.° Fica revogada a C. R. de 5 de Novembro de 1808 na parte em que mandou declarar a guerra aos índios Bugres da província de S. Paulo, e determinou que os prisioneiros fossem obrigados a servir por 15 anos aos milicianos ou moradores, que os aprendessem. — Art. 2.° Ficam também revogadas as C. R. de 13 de Maio e de 2 de Dezembro de 1808 na parte em que autorizam na província do Minas Gerais a mesma guerra, e servidão dos Índios prisioneiros. — Art. 3.° Os Índios todos até aqui em servidão serão dela desonerados. — Art. 4.° Serão considerados como órfãos, e entregues aos respectivos Juízes para lhes aplicarem as providências da Ord. Liv. 1.° Tit. 88. — Art. 5.° Serão socorridos pelo Tesouro do preciso até que os Juízes de Órfãos os depositem onde tenham salários ou aprendam ofícios fabris. — Art. 6." Os Juízes de Paz nos seus distritos vigiarão, e ocorrerão aos abusos contra a liberdade dos Índios.

Foi, portanto, reprovado formalmente pelo legislador o sistema do terror e da perseguição; foi abolido de uma vez para sempre o cativeiro ou servidão mesmo temporária dos índios, ainda quanto a pretérito; foram eles equiparados aos órfãos e postos debaixo da proteção dos respectivos Juízes; socorridos pelo Tesouro Público enquanto necessitassem; e finalmente incumbida aos Juízes de Paz nos seus respectivos distritos a defesa e guarda da liberdade dos mesmos Índios.

Ainda mais, a Resol. de 6 de Julho de 1832(335) ordenou para Minas, que se criasse um colégio para educação da mocidade Indiana de ambos os sexos, e deu-lhe organização; podendo ser admitidos também Índios adultos mas sem residência no colégio.

Continuavam os Ouvidores de Comarcas a ser os Juízes privativos e administradores dos Índios(336). Mas, extintos os Ouvidores pela Lei de 20 de Novembro de 1832 (que criando o Código do Processo Criminal, e dispondo provisoriamente sobre a Justiça Civil, deu nova forma à organização Judiciária), sem que esta houvesse tomado providências a tal respeito, a Regência decretou em 3 de Junho de 1833(337) que ficasse essa administração dos bens de Índios a cargo dos Juízes de Órfãos enquanto a Assembléia Geral outra cousa não resolvesse: o que foi explicado no Aviso de 18 de Outubro do mesmo ano(338), 13 de Agosto de 1834(339), e outras Decisões; o contencioso passou para as Justiças ordinárias (L. cit. de 1832 Dispos. Prov. art. 20, Av. cit. de 1834).

Foi mais declarado por Aviso do 31 de Julho de 1834(340) que às Câmaras Municipais também incumbia velar em que os Juízes de Órfãos cumprissem exatamente os seus deveres quanto aos Índios, e representar a favor destes.

A lei de 12 de Agosto de 1834(341), denominada Ato adicional à Constituição do Império, extinguindo os Conselhos Gerais de Província, e substituindo-os pelas Assembléias Legislativas Provinciais, dispôs no art. 11 §5.° que competia às mesmas Assembléias promover cumulativamente com a Assembléa Geral e o Governo a catequese e civilização dos Indígenas.

Todas as Autoridades eram, pois, chamadas a promover o maior bem dos Índios, em proveito deles e do país; a lei estava agora decidida e francamente ao seu lado para protegê-los com verdade e eficácia. O sistema de procedimento com esses infelizes, degradados descendentes de Eva, havia mudado inteiramente. Todos os favores, ainda de menores ou órfãos, lhes eram outorgados.

O Governo aproveitava na Marinha os que julgava aptos para ela, como se vê da Circ. de 29 de Maio e Aviso de 2 de Agosto de 1837(342), mas proibindo o emprego de meios violentos no engajá-los para tal serviço; sendo mais tarde expressamente autorizado a contratá-los pela Lei n.° 369 de 18 do Setembro de 1845 art. 5.° §17(343).

Continuava a manter-se a competência dos Juizes de Órfãos sobre a administração dos bens dos Índios, e se lê no Decreto n.° 143 de 15 de Março de 1842 art. 5.° §12(344).

Convindo, porém, regular de modo geral e mais uniforme o importante assunto da catequese e civilização dos Índios, a Lei n.° 317 de 21 de Outubro de 1843 art. 2.° §21 autorizou o Governo a fazê-lo, e no art. 36 dispôs sobre as estâncias e terrenos dos da Comarca de Missões em S. Pedro do Sul que declarou nacionais; e já na Lei n.° 285 de 21 de Junho do mesmo ano art. 1.° fora ele autorizado a mandar vir missionários capuchinhos(345).

Para melhor execução desta última foi expedido o Decreto n.° 373 de 30 de Julho de 1844 regulando o modo de distribuição dos capuchinhos para as missões, e qual a sua sujeição e relações para com os Bispos, e para com os superiores locais e o Geral em Roma(346).

E em execução do art. 2.° §21 da citada Lei de 21 de Outubro foi promulgado o Decreto n.° 426 de 24 de Julho de 1845(347), que vigora ainda hoje.

Este Decreto pode-se denominar o Regimento (atual) das Missões, como no mesmo se indica. — Suas disposições constam de 11 artigos, dos quais o primeiro se desenvolve em 38 parágrafos, o segundo em 18 parágrafos, o terceiro em 7 parágrafos e o sexto 7 parágrafos. — Em cada Província deve haver um Diretor Geral dos Índios, nomeado pelo Imperador. Em cada aldeia um Diretor nomeado pelo Presidente, sob proposta do Diretor Geral; um Tesoureiro, Almoxarife, e Cirurgião, cargos que dependem do estado e importância da aldeia, e que podem ser exercidos pelo mesmo indivíduo; outros agentes, como pedestres, oficiais de ofício, etc; e finalmente de um missionário pelo menos. — Nos arts. 1.° e 10 se declaram quais as atribuições e obrigações do Diretor Geral; no art. 2.° as do Diretor da aldeia; nos arts. 3.° e 4.° as do Tesoureiro; no mesmo art. 4.° as do Almoxarife; no art. 5.° as do Cirurgião (que é igualmente o encarregado da botica), e do enfermeiro; no art. 6.° as do missionário. — Finalmente, no art. 11 se confere, enquanto servirem, ao Diretor Geral a graduação honorária de Brigadeiro, ao Diretor da aldeia a de Tenente Coronel, e ao Tesoureiro a de Capitão; facultando-se-lhes o uso do uniforme respectivo estabelecido para o Estado-Maior do Exército.

As idéias capitais desse Regulamento são: 1.° conversão dos Índios ao cristianismo, e sua educação religiosa, a cargo dos missionários; 2.° instrução primária, também a cargo dos mesmos; e criacão de aulas para ela, se o missionário não for suficiente; 3.° proibição expressa de força e violência para atrair os Índios às aldeias, para a educação religiosa, nem para outros quaisquer fins de sua catequese e civilização; 4.° instrução de Índios nas artes mecânicas segundo as suas propensões, promovendo-se para este efeito o estabelecimento de oficinas nas aldeias; 5.°, mais particularmente o aproveitamento deles na cultura ou lavoura; 6.°, demarcação dos distritos das aldeias, e das terras concedidas aos Índios em comum ou separadamente; podendo mesmo de simples usufrutuários virem a ser proprietários; 7.° proteção aos Índios, quer em suas pessoas e liberdade, quer em seus contratos, quer em seus serviços, quer em suas terras; 8.° proibição de serem dados a serviço particular; 9.°, procurar pelos missionários atrair os Índios selvagens, e aldeá-los ainda que em separado; 10.°, proibição de irem de fora pessoas negociar nas aldeias ou estabelecer-se nelas, salvo com licença; 11.°, promover os casamentos dos índios entre si, e com pessoas de outra raça; 12.°, fazer expulsar das aldeias para além de 5 léguas fora dos limites dos distritos respectivos as pessoas de caráter rixoso, de maus costumes, que introduzam bebidas espirituosas, ou tenham enganado os Índios lesando-os; 13.°, proibição de vexá-los com exercícios militares, contrariando aberta e desabridamente os seus hábitos e costumes; 14.°, garantia de jornais ou salário aos Índios quando chamados a serviço público ou da aldeia; 15.° auxílios a bem de suas necessidades, de sua saúde e bem estar; 16.°, proteção das aldeias pela força militar, quando necessário; 17.°, proteção às viúvas e herdeiros dos Índios.

Por seu lado, ficam os Índios sujeitos: 1.°, a serviço público mediante salário, que deve ser taxado; 2.°, a serviço da aldeia, igualmente por salário; 3.°, a alistamento para serviço militar, sem que todavia sejam vexados; 4.°, a prisão correcional até 6 dias, em certos casos, a arbítrio do Diretor.

O Maioral dos Índios deve ser consultado, para se ir de acordo com ele quanto ser possa, quando se tiver de designá-los para as plantações, e serviço da aldeia ou público.

As terras das aldeias, quando possam ser dadas de aforamento, somente o serão para edificar casas, e jamais para cultura.

Recomenda-se também no citado Regulamento que as festas religiosas e civis sejam feitas com a maior pompa; e que se introduza nas aldeias o gosto pela música instrumental.

O Diretor Geral e Diretores das aldeias são constituídos procuradores dos Índios, e podem nomear quem os represente perante as Justiças e autoridades.

A força militar da aldeia pode ter um regulamento especial.

As próprias aldeias terão seus regimentos especiais, e instruções, propostos ao Governo Imperial pelos Diretores Gerais.

O regime econômico e outros assuntos ainda aí foram providênciados; incumbindo aos diversos empregados os seus relatórios e informações; e recomendando-se finalmente ao Diretor Geral que exponha ao Governo os inconvenientes encontrados na execução do mesmo Regulamento e de outros que sejam expedidos, e indiquem as medidas que entendam mais apropriadas ao grande fim da catequese e civilização dos Índios.

O Governo tem-se mostrado solícito em promovê-la, protegendo-os ao mesmo tempo, e as aldeias ou colônias indígenas.

Mas a tendência bárbara, sempre renascente, de escravizar os Índios, apesar do rigor das leis penais e de outras medidas, fez expedir a Circ. de 9 de Agosto de 1845(348) providênciando para que não fossem comprados nem escravizados os seus filhos. — Felizmente, para honra da nossa civilização, se alguns abusos se tem cometido contra a liberdade dessa mísera gente por se manter ainda a odiosa instituição da escravidão que os provoca, não são todavia da natureza daquele que refere testemunha ocular, passado em Corrientes no ano da Graça de 1866 em pleno século XIX, e em um Estado Republicano, quanto a Índios do Chaco que eram vendidos de dia e em público(349)!

A fim de atrair os das vizinhanças do Araguaia e Tocantins providenciou-se no Av. de 29 de Janeiro de 1849(350); e para a redução de outros por territórios de S. Paulo até Mato Grosso, nos Avs. de 31 de Janeiro de 1849 e 21 de Maio de 1850(351).

O Governo ainda reprovou por Av. de 15 de Junho de 1850(352) as hostilidades praticadas pelo Presidente de Mato Grosso contra os Índios selvagens, meio que — longe de concorrer para os civilizar e catequizar, tende de mais em mais a afugentá-los da sociedade, e a extinguí-los; recomendando, outrossim, abstenção de violência... a qual só pode ter cabimento para repelir os ataques por eles cometidos ... e jamais para os ir procurar às matas, e exterminá-los.

Em auxílio dos esforços do Governo também se declarou o concurso de particulares e sobretudo de associações, um dos mais poderosos elementos do progresso moderno: a — Sociedade contra o tráfico de Africanos, e promotora da colonização, e civilização dos Indígenas —, fundada na Capital do Império pelo Dr. Nicolau Rodrigues dos Santos França Leite e outros distintos cidadãos, e aprovada por Av. de 31 de Agosto de 1850(353) é disso exemplo; se negativos foram os resultados, ao menos houve boa vontade, e a manifestação de um grande, útil, humanitário e generoso pensamento.

Executava-se, pois, o citado Regimento das Missões, de 1845, da melhor forma possível, como ensaio do novo sistema, em Mato Grosso, S. Paulo, Sul, Paraná, Amazonas, Pará, e outros lugares(354); e perdura como disposição geral.

O Governo tem sido habilitado com recursos pecuniários, até por verba especial nas diversas leis de Orçamento; verba que, sendo v. g. de 16:000$000 na Lei de 21 de Outubro de 1843 art. 2.° §21, foi elevada até 80:000$000, como se vê nas de data mais recente. E efetivamente tem despendido em auxílio das colônias indígenas, em gratificações a Diretores Gerais, a Caciques de Índios, a capuchinhos, e em outros misteres a bem da catequese e civilização, como se vê de atos de diversas datas quais o Av. de 31 de Agosto de 1859, 10 de Agosto de 1864, 29 de Agosto, 28 e 30 de Novembro do mesmo ano, e outros sobretudo de 1864(355).

Contratou-se a vinda de missionários capuchinhos, que têm sido empregados em tão piedoso e útil ministério; e ainda recentemente, em oficio de 25 de Julho de 1865(356) se recomenda que venham com brevidade.

Têm sido nomeados Diretores Gerais, e Diretores de aldeias; e tentado enfim o maior desenvolvimento das colônias indígenas, e a civilização dos Índios.

Em falta de Diretores, continuaram os Juízes de Órfãos como administradores(357).

Os frutos, porém, não têm correspondido à expectativa, conquanto não hajam sido de todo perdidos o trabalho e despesas. Algumas aldeias têm-se mantido, embora a custo; tal é a miséria em outras, que nem vestuário ou roupa tinham os Índios, sendo necessário ordenar-se que v. g. se repartisse com eles a de uma colônia militar, e pagar-lhes vestuário em valor de 450$000, como sucedeu com a colônia anexa à militar de Urucu(358). Atualmente contam-se mais ou menos 67 aldeias com uma população Índia de 22.000 almas(359). Outras têm sido abandonadas pelos Índios que ou se confundem na massa geral da população, e assim se tem já declarado oficialmente dando-se por extintas as aldeias(360), ou fogem para o sertão, para os seus mocambos, preferindo a vida selvagem, de inteira e primitiva liberdade, aos cômodos da vida civilizada, que para eles são verdadeiros incômodos, vexames, e constrangimento. As terras abandonadas, como da Nação, têm sido mandadas incorporar nos bens nacionais, e reputar terras públicas devolutas para serem aproveitadas na forma da Lei(361).

Os Índios bravos continuam a incomodar com suas correrias, assaltando as fazendas, os viandantes, os povoados(362), até os próprios mocambos ou quilombos de negros(363); assim como a destruirem-se reciprocamente(364).

A vindita particular há sido por seu lado exercida contra os Índios. Ainda em 1864 na Bahia foram eles perseguidos(365), e em 1865 os Chavantes em S. Paulo foram surprendidos nas suas aldeias, sofrendo verdadeira caçada(366).

O Governo, a fim de proteger os habitantes no Paraná e Mato Grosso autorizou destacamentos de linha(367); e contra os Guajajaras no Maranhão também foram tomadas providências em 1866(368).

No intuito de desenvolver a população do Império por todos os meios, e de promover a substituição do trabalho escravo pelo livre, não era possível que o Governo deixasse de insistir em aproveitar também os destroços da raça indígena, hoje quase extinta e reduzida a mui pouco(369); conquanto tão limitada sobretudo em relação ao vastíssimo território do Estado, não era nem é para desprezar atenta a proporcionalmente diminuta população que conta o Brasil(370), a conseqüente escassez e necessidade de braços; menos ainda é para abandonar a idéia de civilizá-los, e deixar de persistir em chamá-los ao grêmio da sociedade.

Mas o Regimento das Missões de 1845, em sua execução, mostrou-se defeituoso. Por outro lado, os abusos contra os desgraçados Índios praticavam-se quase como em todos os tempos anteriores, partindo mesmo dos Diretores, que, em vez de protetores, se têm quase no geral mostrado ou indiferentes, ou perseguidores. E até, por falta de pessoal habilitado, as aldeias não têm sido regidas convenientemente, nem tem sido possível, desenvolver o sistema de tais colônias e do citado Regimento.

De modo que já nas Intrs. de 25 de Abril de 1857(371), expedidas para as do Paraná e Mato Grosso aquele Regulamento foi alterado; no Av. n.° 29 de 19 de Maio de 1862(372) igualmente, conferindo-se aos Índios a propriedade de terras que lhes fossem dadas desde que aí se estabelecessem com efetiva cultura e habitação por 5 anos ao menos; nas Intrs. de 13 de Maio de 1864(373), em ofício de 26 ao Diretor da colônia do Ribeirão das Lages no Mucuri, tratando-se também dos Indígenas, alterações se fizeram; e ainda nas Instrs. de 24 de Dezembro do mesmo ano(374) expedidas para o estudo do rio Ivaí que comunica Mato Grosso com o litoral no Paraná, e em bem da colonização e catequese.

Os Diretores cuidam principalmente em tirar dos Índios o maior proveito possível, não em bem dos mesmos Índios, das aldeias e do país, mas seu próprio; pouco ou nada se importam com o bem estar desses infelizes, seu desenvolvimento, civilização e progresso(375); enlevam-se nas honras militares que lhes dá a graduação conferida polo citado Regimento, em discutir se devem ter o tralamento de Senhoria ou Excelência(376), e em outras futilidades semelhantes(377). Abusam, além disso, contra os Índios, retendo-os presos correcionalmente mais dos 6 dias permitidos naquele Regulamento; e pretendendo que não possam eles recorrer ao habeas-corpus, sendo necessário que o Governo decidisse que este remédio também era extensivo, ainda em tal caso, aos Índios(378).

Novas providências se fazem necessárias. O Governo já o tem demonstrado por fatos, como dissemos, e ainda ultimamente por atos de 1866(379), e francamente o expôs perante o Corpo Legislativo(380). Já em 1864 fora proposto na Câmara dos Deputados um aditivo ao Orçamento da Agricultura(381) autorizando o Governo a reformar aquele Regulamento de 1845, e a chamar Padres Trapistas para dirigirem colônias agrícolas de Indígenas. E suscitou-se caloroso debate na mesma Câmara sobre os Índios e sobre a readmissão de Jesuítas(382).

Sejam ou não chamados de novo Jesuítas, ou continuem os Capuchinhos(383), ou sejam convidados outros Clérigos Regulares ou Seculares, pois que todos receberam a missão de pregar o Evangelho e propagar as doutrinas de Cristo, como declarou o Divino Mestre(384), e o lembra a L. de 12 de Setembro de 1663, o que é certo é que só o missionário sinceramente devotado pode alcançar alguns benéficos resultados(385). O poder da Religião Cristã, insinuada por meios brandos e suasoríos, e manifestada no culto externo pela imponente majestade das suas festas religiosas, é o mais forte meio para a conversão dos selvagens; a sua civilização deve necessariamente começar por aí; na gente civilizada mesmo, é pela religião que começa a educação, pois que é ela o primeiro pasto do espirito e da moral nos verdes anos, e cujas impressões nunca mais ou muito dificilmente se apagam(386). A Religião Cristã, além do elemento divino o mais filosófico e sublime, além do culto o mais respeitável e digno da grandeza do Criador, é ou contém ao mesmo tempo um verdadeiro Código dos deveres do homem, admirável pela sua simplicidade e suculento laconismo, concebido em princípios ou teses claras, e incontestáveis por serem leis gravadas por Deus no coração humano, e que seguidas conscienciosamente dispensariam todo esse aparatoso amontoado de leis, qual outra Bahel, e que quanto mais crescem mais demonstram a decadência do povo(387).

Conviria que os Índios, durante certo período, tivessem Juízes privativos para suas causas civeis e crimes, atenta a sua rusticidade e ignorância, os seus usos e costumes, a sua educação; e mesmo, que tivessem legislação à parte, que os regesse nesse período; o processo principalmente devera ser modificado, brevidade e favores; decidir-se mais ex aequo et bono, e em forma paternal, do que pelo rigor do Direito.

Deve-se evitar que sejam eles governados ou administrados por diretores que só visem a vaidade ou o interesse próprio(388), assim como, que sejam vexados pela presença de soldados (por via de regra má gente), por aparatos bélicos que os amedrontem ou afugentem, e por serviços excessivos.

A instrução primária(389); as artes mecânicas; a lavoura; e outras semelhantes ocupações; a marinha mesmo(390) e o exército(391) para os que se mostrassem dispostos e inclinados ao serviço militar; a marinha mercante; as belas artes; eis já não pequeno campo para a educação e aproveitamento dos Índios. Mas também poderiam ser facultados os estudos secundários, e superiores aos que se mostrassem com aptidão para eles, e mesmo o Clericato(392), enfim todos os ramos da aplicação variadíssima da atividade humana, tanto quanto o suportem as inclinações e a vontade de cada um: não devem os Índios ficar condenados à lavoura e a certas indústrias somente como servos adscriptícios, que nisto mesmo parece perpetuar-se o sistema da escravidão disfarçada. Deve-se alargar o círculo, abrir o campo em que eles possam ser úteis a si e ao país.

Conviria, outrossim, facilitar quanto fosse possível a sua comunicação e trato com a gente civilizada, de modo a conseguir-se o mais breve possível que eles se confundissem na massa geral da população como os demais cidadãos, e não ficassem segregados da sociedade debaixo de tutela forçada quase perpetuamente e como que constituindo nação a parte; os favores e a tutela não devem anular a atividade e a iniciativa individual, reduzir o homem a autômato com o pretexto de o julgarem indefinidamente incapaz de se reger; com tal sistema nem se atende ao grave mal que ele importa para a unidade nacional.

Faz-se igualmente necessário tratar da abolição da escravidão, que na legislação ainda se mantém, dos Africanos e seus descendentes, para que cesse de uma vez para sempre o abuso que se tem conservado entre alguns Índios de venderem as mulheres e os filhos(393), e de serem também reduzidos criminosamente, mas de fato, a escravos, por desumana e metálica gente civilizada.

Quais as naturais habilitações e disposições dos Índios, para as indústrias, para as artes e belas artes, para a cultura do espírito, para o emprego da atividade do homem no ilimitado campo do seu desenvolvimento, já o dissemos sucintamente no Cap. 4.°; e disso dão testemunho irrecusável sobretudo os Jesuítas, e escritores antigos e modernos(394).

Que resultados se tenham colhido quanto à população, bem se deixam ver pelo matiz de raça indígena em todas as Províncias do Império, e com especialidade nas do Norte por mais predominante em algumas(395); abastecendo hoje de modo notável o exército oriundos dela, e distinguindo-se muitos outros em diversas indústrias e profissões.

Quanto aos serviços que são eles capazes de prestar, com verdadeira abnegação, fidelidade, coragem, sobretudo na guerra, ficou demonstrado à evidência pelo que dissemos nos Capítulos antecedentes; Tibiriçá, Ararigboia, Camarão, e outros são nomes de grata recordação. Serviços foram tais de alguns, que mereceram o prêmio dos beneméritos; Camarão v. g. foi agraciado com a Comenda da Ordem de Cristo, o tratamento de Dom, e foro de fidalgo, além de ser nomeado general dos Índios da sua nação(396); e ainda por Decreto de 25 de Fevereiro de 1819(397) isensões de tributos foram dadas como recompensa aos que os prestaram por ocasião da revolução de 1817 em Pernambuco(398). Mesmo agora, por ocasião da injusta e bárbara guerra que nos moveu e sustenta o Paraguai, os Índios têm prestado bons serviços, sobretudo em Mato Grosso, quais os Terenas e outros; socorrendo até com mantimeníos e gados, e recolhendo nas suas aldeias famílias que a estas se haviam abrigado(399).

A imaginação dos nossos romancistas e poetas também tem achado na história dos indígenas assunto digno não só da literatura ligeira ou amena, mas da clássica; desde o romance modesto e simples até a epopéia, aí têm eles bebido fatos que a imaginação desenvolve, e reveste das galas do belo e do maravilhoso; Fr. José de Santa Rita Durão, Basílio José da Gama, D. J. Gonçalves de Magalhães, A. Gonçalves Dias, e outros talentos dessa ordem não se dedignaram de o fazer; Caramuru, Uruguai, Confederação dos Tamoios, Timbiras bem o revelam.

Mas, descendo dessas regiões, que a alguns tem por tal forma transviado a pretenderem nos Índios uma civilização e habilitações que não tinham nem têm, apesar de capazes de adquirí-las se bem dirigidos, porém de fato mui distantes do homem civilizado superior pela instrução e educação, não somos também da outra opinião extrema, sustentada ainda por um belo e laborioso talento, que pretende que só a força pode domar o Índio, e fazê-lo entrar na sociedade, que só por ela e pela servidão ou sujeição forçada poderá conseguir-se a sua redução(400). Estas doutrinas já anteriormente haviam sido vitoriosamente combatidas; e ainda ultimamente pelo ilustre escritor do Timon Maranhense, João Francisco Lisboa, de saudosa memória, assim como pelo ameno e laborioso autor da História da fundação do Império Brasileiro, e por outros. Entre aqueles extremos está como única verdadeira e preferível a opinião destes últimos. Felizmente aquelas idéias de terror, força, sujeição coacta não têm hoje prosélitos; a experiência levou a convicção aos ânimos dos incrédulos; as idéias e sãos princípios alcançaram afinal a vitória.

Entre perseguir os Índios, dar-lhes caça como animais ferozes ou daninhos, destruí-los, exterminá-los ou afugentá-los, — e deixá-los livres divagar pelos sertões na sua vida errante como nos primitivos tempos, não há que hesitar; se não quiserem pelos meios brandos e suasórios abraçar a vida civilizada, não devem ser a isto constrangidos pela força, pelo cativeiro ou servidão, e menos ainda perseguidos e destruídos; o homem civilizado, por isso que o é, não se deve mostrar bárbaro como o selvagem, ou mais bárbaro do que ele; se atacado, defenda-se, porque é este o Direito natural, mas limite-se na defesa ao que for estritamente indispensável e justo(401); qualquer excesso não tem razão de ser, degenera em crime e em vingança ou ferocidade.

Não queremos dizer que demos de mão à catequese e civilização dos Indígenas; este fim não deve ser abandonado. Referimo-nos somente aos meios. Se houvesse quem entendesse que só pelo terror, pela perseguição, pelo cativeiro, isso se poderia conseguir, decididamente seria muito preferível deixá-los em paz no seu estado selvagem; o tempo e a Providência fariam o que o homem não pudesse.

À proporção que o Estado crescer em população, em facilidade de comunicações por terra e por água, à proporção que o território se for cobrindo de mais povoados, e se forem descortinando os sertões (onde principalmente eles hoje se abrigam), o facho da civilização abrirá caminho, espancando as trevas da selvageria, e ou eles se hão de necessariamente acolher nos braços do homem civilizado e confundir-se assim na massa geral da população, ou serão forçados a ceder o campo nessa luta desigual, em que a vitória, conquanto incerta na época, é certa e infalível, por ser o decreto de Deus Onipotente na ordem providencial das Nações, manifestada pela História do Mundo.

FIM DA 2.ª PARTE.



Notas

(l) Humboldt— Vue des Cordillères et monumens des peuples indigènes de l’Amerique. — Essai politique sur le royaume de la Nouvelle Espagne.

(2) Quais eram as tribos aborígenes que habitaram cada uma das Provincias do Império ao tempo em que o Brasil foi conquistado.... quais emigraram e para onde.... foram questões propostas no Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, e por este aprovadas (Rev. IX, 363); desenvolvidas em relação à Bahia pelo Coronel Inácio Accioli de Cerqueira e Silva (Rev. XII, 143). — De modo mais geral foram tratadas pelo distinto Dr. Antônio Gonçalves Dias, de saudosa memória, no seu precioso trabalho intitulado — O Brasil e Oceania —, cujo manuscrito, reputado perdido, foi restituído ao mesmo Instituto em 1866 pelo Dr. A. H. Leal, por intermédio do Dr. Cláudio Luiz da Costa, e tem de ser impresso na Revista, conforme a deliberação já tomada em 1853 (Rev. XVII, 578). — Em relação à América geral, entre outros, escreveu o Padre Fr. Gregório Garcia — Orígen de los Indios de el nuevo Mundo — 1729; Belocc — Histoire d’Amerique et d’Oceanie 1844; E. B. d’E. — Essai sur cette question: quand et comment l’Amérique a-t-elle été peuplée d’hommes et d’animaux — 1767.

(3) V. Gabriel Soares (Rev. XIV); Gandavo (Rev. XXI, 367); Southey, Hist. do Brasil traduzida por Castro e comentada pelo Cônego Dr. J. C. Fernandes Pinheiro; F. A. de Varnhagen, Hist. geral do Brasil; Accioli. Mem. já cit.; Joaquim Norberto de Souza e Silva, Memória histórica e documentada das aldeias de Índios da Província do Rio de Janeiro, laureada pelo Inst. Hist. (Rev. XVII, 109).

(4) V. Alcide d’Orbigny — L’homme Americain. — De l’Amerique meridionale considérée sur les raports physiques et moraux. — Auguste de St. Hilaire — Voyaqe aux sources du Rio de S. Francisco et dans la province de Goyaz.

(5) Refere o Padre Antônio Vieira que só no Pará e Maranhão mais de 100 eram as línguas; refere Gama (Mem. Hist. da província de Pernambuco) que 150 dialetos eram falados: pode-se dizer que tantos, quantas as tribos, nações, ou cabildas disseminadas pelo vasto território do Brasil. — Tupininquins, de costumes mais brandos, não se confundiam com os terríveis Aimorés, nem com os valentes Tamoios; ainda hoje as tribos existentes se distinguem perfeitamente, Botocudos, Coroados, e um sem número de outras.

(6) V. Caminha, Carta a El-Rei D. Manoel (nas Notícias Ultramarinas, IV); Cartas Jesuíticas (manuscrito da Biblioteca Pública do Rio de Janeiro, de que possuo cópia feita por meu finado pai); Gabriel Soares, Gandavo, e outros já cit.; J. F. Lisboa — Timon Maranhense: Lery, Hans Staden — Viagens; príncipe Maximiliano — Viagem; Debret — Viagem pitoresca; Padre João Daniel — Tesouro descoberto no Rio Amazonas (Rev. II, III); Simão de Vasconcelos — Crônica da Companhia de Jesus; J. de Laet; St. Hlaire; Ferdinand Denis; Jaboatão — Crônica Seráfica da Província de Santo Antônio do Brasil. — Rocha Pitta — América Portuguesa; Beauchamp — Hist. do Brasil, traduzida e comentada por Pedro José de Figueiredo; Charlevoix — Histoire du Paraguay; D. J. Gonçalves de Magalhães Os Indígenas perante a História (Rev. XXII, 3); além de outros muitos escritos quer especiais, quer gerais ou diversos.

(7) V. Padre Manoel da Nóbrega — Informação dos casamentos dos Índios do Brasil (Rev. VIII, 234); Coronel J. J. Machado de Oliveira — Qual era a condição social do sexo feminino entre os Indígenas no Brasil (Rev IV, 168).

(8) Idem. — Varnhagen, Hist. geral do Brasil

(9) V. Rev. do Inst. I, 209; Gabriel Soares cit.; Varnhagen cit.

(10) Cônego Dr. J. C. Fernandes Pinheiro Episódios da história pátria.

(11) A da transmigração — V. Varnhagen — Hist. Ger. — São muito conhecidas as cerimônias dos cruentos festins das tribos antropófagas desde que era apreendido o inimigo ou a vítima até ser devorada.

(12) V. Lery; Histoire d’un voyage fait en la terre du Brésil; Southey, Hist. do Bras.: Magalhães — Memória já cit.; Cartas Jesuíticas, etc. — E até a respeito da valentia das próprias mulheres correu o mito das Amazonas; sobre o qual discursou em uma interessante memória o finado poeta Dr. A. Gonçalves Dias (Rev. do Inst. XVIII, 5).

(13) O mesmo ainda hoje se nota.— Varnhagen cit.

(14) Garcilazo (Peru); Herrera (Índias); Solis (México). — V. Les Incas por Marmontel; Colombo (poema por M. de A. Porto-Alegre, Cantos 21 a 23.

(15) Magalhães cit. Rev. XXII, 3.

(16) Varnhagen cit.; J. J. Machado de Oliveira — Memória em desenvolvimento do programa do Inst. Hist. sobre as idéias de divindade e imortalidade da alma entre os Indígenas (Rev. VI, 133).

(17) Lery cit.; Machado de Oliveira— Memória cit.; Cônego Fernandes Pinheiro; Magalhães — Memória já cit. (Indígenas perante a História). A lenda das montanhas azuis, e outras, assim como o ceremonial de enterrarem conjuntamente com o cadáver certos objetos de seu uso, e para um fim d’além túmulo, são indícios veementes dessa crença.

(18) A. Gonçalves Dias — Introdução a Berredo; J. F. Lisboa — Timon Maranhense; Desembargador R. de S. da Silva Pontes — Memória em desenvolvimento do programa do Inst. Hist. sobre a construção de templos e estátuas em Missões (Rev. IV, 65).

(19) Varnhagen — Hist. Ger.

(20) São disto testemunho as primeiras relações das descobertas, começando pela muito conhecida carta de Pero Vaz de Caminha; dão testemunho os Jesuítas, os Franceses, os próprios Portugueses; a história (como veremos no desenvolvimento deste trabalho) o demonstra.

(21) Guaicurus ou Índios cavaleiros (Rev. do Inst. Hist. I, 21).

(22) Varnhagen — Hist. Ger.; Lisboa — Timon; J. Norberto — Memória já cit.; Bellegarde —Hist. do Brasil; Dr. J. M. de Macedo —Hist. do Brasil. D’entre as inúmeras tribos (160 mais ou menos) espalhadas por tão vasto território apontaremos por mais importantes as seguintes: Tupininquins e Tupinaes (Porto Seguro e Ilhéus); Tupinambás (Bahia e Norte); Tamoios (Rio de Janeiro); Guaianazes (S. Vicente, S. Paulo); Goitacazes (Campos); Aimorés (Ilhéus); Tabaiares e Caetés (Pernambuco); Pitaguares (Itamaracá, Parahyba, Rio Grande do Norte); Tabajares (Ceará); Timbiras, Amoipiras, Taramambezes, Tapuias, etc. (Maranhão. Pará, Amazonas); Coroados (Minas Geraes); Guaicurús. Paiaguás, Guaranis, etc. (Goiás, Mato-Grosso e Sul). — Qual a população indígena ao tempo da descoberta? — Eis um problema impossível de resolver. — O Padre Antônio Vieira pretendia que muitos milhões de Inciios tivessem descido dos sertões, e assim se lê também na L. de 6 de Junho de 1733. Mas parece haver exageração, como bem pondera J. F. Lisboa no seu Timon Maranhense (II, 233). — Varnhagen na Hist. Ger. (I, 98) eleva apenas a um milhão. — Sem nos emaranharmos em semelhante questão, diremos apenas que, para serem arrebanhados, aldeados, escravizados, maltratados, e mortos aos milhares, para sofrerem, como sofreram, os Índios as perseguições e guerras de entre si, e, pior ainda, o extermínio dos conquistadores, perdurando ainda até nossos dias, quer dizer, por perto de 4 séculos, parece evidentemente diminuto o cálculo do ilustre autor da História Geral do Brasil

(23) Varnhagen — Hist. Ger. I, 126.

(24) Mello Freire, Dir. Civ. Liv. II tit. I §5

(25) Carta de Pero Vaz de Caminha ao Rei D. Manoel do 1.° do Maio de 1500; dita de Mestre João, de igual data. — Relação da viagem de Cabral (Col. de Notícias para a Hist. e Geogr. das nações ultramarinas, pela Academia Real das Ciências de Lisboa tomo II n. 3).

(26) Deste fato existe um monumento em tela na Academia das Belas Artes do Rio de Janeiro, pelo aproveitado autor Victor de Meirelles.

(27) Carta 1.ª do Américo na Col. cit. II, n. 4; Fr. Francisco de S. Luiz — Índice Cronológico. — O Visconde de Santarém — Recherches sur Americ Vcspuce — pronuncia-se contra este. — Mas o Sr. Varnhagen o combate vitoriosamente, tirando a lume as dúvidas e a verdade.

(28) Varnhagen — Hist. Ger. I, 20.

(29) Idem I, 21.

(30) V. Fr. Francisco de S. Luiz — índice Cronológico. — Os Portugueses em África, Ásia, América e Oceania (Obra clássica).

(31) Varnhagen — Hist. Ger. I, 23 e 427.

(32) Varnhagen — Hist. Ger. I,23; Lisboa — Timon II.

(33) Herrera — Década III, L. 8.° Cap. 10; Varnhagen cit. I, 34.

(34) Navarrete — Col. de Viag. III, 23, 24, 544, 547, 553, 534; Abreu Lima — Synopsis Cronológica.

(35) Varnhagen — Hist. Ger. I,26.

(36) V. Accioli — Mem. Hist. da Bahia; Mello MoraisBrasil Histórico; Varnhagen — O Caramuru perante a História, memória premiada pelo Instituto Histórico Brasileiro, e impressa na Rev. X, 129.

(37) Varnhagen — Hist. Ger. I,33,34.

(38) Ferdinand Dénis — Génie de la navigation.

(39) Varnhagen cit.

(40) Idem.

(41) Roteiro de Pero Lopes, irmão de Martim Afonso, publicado e anotado por F. A. de Varnhagen. — As cartas régias determinando a expedição e contendo as instruções a Martim Afonso são datadas de 20 de Novembro de 1530.

(42) Roteiro cit.

(43) Se africanos ou não, é ponto duvidoso (Varnhagen — Hst. Ger. I, 49). Mas é mais de presumir que fossem Índios por não ser facilmente crível que reexportassem Africanos.

(44) Pero Lopes — Roteiro cit.

(45) Varnhagen — Hist. Ger, I,30,

(46) Pero Lopes, Roteiro cit.; Fr. Gaspar da Madre de Deus — Memórias para a Hisóoria da Capitania de S. Vicente.

(47) Por doações de 1534 e 1535. — V. Ayres do Casal — Corografia Brasílica.

(48) Carta de El-Rei D. João III a Martim Afonso em 28 do Setembro de 1532.

(49) Varnhagen — Hist. Ger. , I; Lisboa Timon II, III.

(50) Idem. — As doações, os forais, os regimentos especiais, e a legislação geral da Metrópole em tudo quanto se não opusesse às determinações peculiares para a colônia, tal foi o regime legislativo do nascente Estado. — Dessas doações e forais alguns vêm transcritos no Timon.

(51) V. Oeuvres de Don Barthélemy de las Casas, précédées de sa vie, por J. A. LLorente; Herrera — Historia general de las Índias; Raynal — Histoire Philosophique et politique des établisseméns et du commerce des Européens dans les Deux-Indes.

(52) Herrera cit. Dec. I, L. 9.° cap. 5.°

(53) Damião do Góes — História de Portugal; Alexandre Herculano — Hist. de Portugal.

(54) Las Casas — Oeuvres cit.

(55) Guedes Aranha (em data posterior) também assim pensava e dizia que os Índios tinham sido criados para servirem aos brancos(Timon II).

(56) Oeuvres de las Casas, precédées de sa vie já cit.

(57) V. g. a que se levantou entre Espanha e Portugal depois da descoberta do Novo Mundo por Colombo, e antes da do Brasil por Cabral, resolvida por Alexandre VI na tão célebre Bula de 4 de Maio de 1493, à qual se seguiu o tratado de Tordesilhas de 7 de Junho de 1494, confirmado posteriormente pela Bula de 24 de Janeiro de 1506. (V. Visconde de Santarém — Quadro elementar, etc.; Cantu — Histoire Universelle XIII).

(58) Adiante diremos. — Em 1537 se expediram várias Bulas, citadas em Las Casas (Oeuvres); B. da Silva Lisboa (Annaes do Rio de Janeiro); J. Norberto (Memória já cit.), e em outros.

(59) Las Casas — OEuvres.

(60) Damião de Góes — Hist. de Portugal; Varnhagen — Hist. Ger. I, 23.

(61) Varnhagen cit. I, 174.

(62) V. Cap. 3.° e seguinte. — A Lei de 1570 e outras o dizem alto e bom som; e já anteriormente isto se relata no Regimento dado a Tomé de Souza em 1548, assim como se prova com outros documentos da época.

(63) Madre de Deus — Capitania de S. Vicente.

(64) Hist. Ger. cit.; Gama — Memórias de Pernambuco. — Os Índios Tabyra, Hagibe e Piragibe lhe foram de grande préstimo; aliando-se aos Tabajaras bateu os temíveis Caetés (Gama cit. I, 96).

(65) Hist. Ger. cit.; Braz da Costa Rubim — Memórias sobre a Capitania do Espírito Santo (Rev. do Inst. Hist. XIX, 336; XXIII, 113). — Vasconcellos —Ensaio.

(66) Hist. Ger. cit. I, 153.

(67) Fr. Gaspar — Capitania de S. Vicente; Varnhagen — Hist. Ger. cit.

(68) Hist. Ger. cit. I. 156.

(69) Hist. Ger. cit. I, 161.

(70) Hist. Ger. cit. I, 164; J. Norberto — Memória já cit. (Rev. do Inst. Hist. XVII, 109).

(71) Hist. Ger. cit. I, 167; Accioli &mdash ;Memórias.

(72) Coruja — Hist. do Brasil pag. 22; Accioli — Mem.; Corogr.

(73) V. Crônica de D. João III; Annaes por Fr. Luiz de Souza, publicados por Alexandre Herculano.

(74) Varnhagen cit.; Lisboa — Timon; Cônego Dr. J.C. Fernandes Pinheiro na — Biblioteca Brasileira pag. 309; Dr. C. A. de Souza Filgueiras — Reflexões sabre as primeiras épocas da História do Brasil (Rev. do Inst. Hist. XIX. 398).

(75) Varnhagen - Hist. Ger. I,187.

(76) Varnhagen — Hist. Ger. I, 190.

(77) Idem; Lisboa — Timon; Cônego Dr. J. C. Fernandes Pinheiro na Bibliotheca Bras. pag. 309.

(78) V. Lisboa — Timon III, 304; Avcioli —Mem.

(79) Lisboa III, 318.

(80) Lisboa cit. III, 311; Rev. do Inst. XVIII, 166 (manuscrito oferecido por Sua Majestade o Imperador).

(81) Varnhagen — Hist. Ger. I,195.

(82) Lisboa — Timon III, 315.

(83) Lisboa — Timon III, 353.

(84) Cônego Dr. Fernandes Pinheiro ua Bibl. Bras, já cit. — Com o volver dos tempos e conseqüentes abusos, essa concentração tornou-se excessiva e vexatória; por forma que já em carta de 14 de Dezembro de 1655 o Padre Antônio Vieira se queixava dizendo que — havia um só entendimento, uma só vontade, e um só poder, e este é de quem governa.

(85) Accioli — Mem.; Varnhagen I, 197; Lisboa — Timon; e outros.

(86) Simão de Vasconcellos — Crônica da Companhia de Jesus do Bispado do Brasil. — Os Jesuítas não foram os primeiros padres e religiosos que vieram ao Brasil. Os Franciscanos, v. g., os haviam precedido; porquanto, criada em 1503 a primeira feitoria denominada Santa Cruz, aí estiveram dois, que levantaram templo, e tentaram a redução e catequese dos Índios, segundo refere Fr. Antônio da Piedade na Crônica da Província da Arrabida (Varnhagen — Hist. Ger. I, 425). Mais tarde outras Ordens Religiosas se introduziram; e por tal forma, que foi necessário que o governo da Metrópole tomasse providências a respeito (Hist. Ger. cit., 293; Lisboa — Timon); e algumas tratavam mesmo da catequese, e chegaram a dirigir aldeias, sobretudo no Norte do Brasil, como foram os de Santo Antônio, S. Francisco, N. S. do Carmo, Mercês, etc. (V. Jaboatão — Orbe Seráfico). — Porém nenhuns outros Padres prestaram os mesmos serviços nem conseguiram os mesmos resultados (Cônego Fernandes Pinheiro — Ensaio sobre os Jesuítas — Rev. do Inst. XVIII, 67; Breves reflexões sobre o sistema de catequese seguido pelos Jesuítas, — Rev. XIX, 379).

(87) Varnhagen — Hist. Ger. I, 197.

(88) Lisboa — Timon II, III.

(89) Varnhagen cit. I, 201.

(90) A instituição é de Santo Inácio de Loyola em 15 de Agosto de 1534, aprovada pelo Papa Paulo III (Bula de 27 de Setembro de 1540 —Regimini militantis Ecclesiae). — V. Histoire de la Compagnie de Jesuspor Cretineau-Joly; Balthazar Telles — Crônica da Companhia de Jesus da província de Portugal; Simão de Vasconcellos — Crônica da Companhia de Jesus do Estado do Brasil; Southey — Hist. of Brasil; Guioberti — Il Jesuíta moderno.

(91) Accioli — O Jesuíta Manoel da Nóbrega, (Rev. do Inst. VII. 406).

(92) Cartas Jesuíticas; Varnhagen cit. I, 202.

(93) De que compôs uma gramática; sendo mais tarde composta outra pelo Padre Luiz Figueira (Jesuíta).

(94) Hist. Ger. cit. I, 204.

(95) Lisboa — Timon III; Varnhagen — Hist.Ger. I.

(96) Timon cit. III, 478.

(97) A Bula é do 1.° de Março de 1555 — Super specula militantis Ecclesiae.

(98) Por Leonardo Nunes, e Diogo Jacome.

(99) V. Accioli — O Jesuíta José de Anchieta (Rev. do Inst. VII, 551); Pereira da Silva — Plutarco Brasileiro; Varões ilustres; Simão de Vasconcellos - Vida do Padre José de Anchieta.

(100) Fr. Gaspar — Capitania de S. Vicente; Noticia na Rev. do Inst. II, 423; Simão de Vasconcellos cit. — Em o dia 25 do Janeiro aí se disse a primeira missa. — V. Pedro Taques — Hist. da Capitania de S. Vicente — na Rev. do Inst. IX.

(101) Hist. Ger. cit. I, 215.

(102) Em 1570 (Accioli cit.; Simão de Vasconcellos cit.)

(103) Hist. Ger. I, 225; Timon; — Cartas de Manoel da Nóbrega.

(104) Existe na Academia das Belas Artes do Rio de Janeiro uma grande tela comemorando ato tão estupendo (esboço do finado distinto professor Mello).

(105) Hist. Ger. I, 221; — Parecer sobre a obra — Reflexões críticas, etc., na Rev. do Inst. Hist. II, 111.

(106) Monsenhor Pizarro. — Memórias do Rio de Janeiro; B. da Silva Lisboa — Annaes; — Cônego Fernandes Pinheiro — França Antártica (Rev. XXII, 3).

(107) Distinguiu-se, entre outros, o Índio Roniam-Bebe ou Cunhambebe (Thevet; — V. Rev. do Inst. XIII, 517).

(108) Hist. Ger. I; — Timon II.

(109) A esta Carta régia fazem alguns remontar o cativeiro legal dos Índios no Brasil, conquanto existisse de fato muito antes (Timon II, 380). Mas já no Regim. dado a Tomé de Souza em 1548 se falia em cativar o gentio por direito do vencedor; e o fato era de algum modo tolerado pelo governo. Já antes mesmo desse Regimento, em C. R. de 1532 a Martim Afonso de Souza se lê a faculdade de cativarem os colonos os gentios, e até de os mandarem vender a Lisboa livres de sisa.

(110) Accioli — Mem.; Monsenhor Pizarro - Mem.

(111) Hist. Ger. I, 238, 242. — Rubim - Mem. já cit.

(112) Hist. Ger. I, 233, 236.

(113) Hist. Ger. I, 237.

(114) Idem, 241.

(115) Vida de José de Anchieta por Accioli, e Pereira da Silva; — Simão de Vasconcellos — Crônica cit. — Foi por esta ocasião que compôs ele o seu afamado poema da vida da Santíssima Virgem em 4172 versos latinos, que escrevia na areia da praia do mar, e retinha de memória!

(116) O sistema destes Padres na catequese dos Índios se vê ingenuamente exposto nas Cartas Jesuíticas, das quais algumas já se acham publicadas. (V. Cônego Fernandes Pinheiro — Breves Reflexões, etc, na Rev. do Inst. Hist. XIX. 379).

(117) Carta de Mem de Sá de 30 de Março de 1560.

(118) V. Rev. do Inst. III, 366; XIV, 374, 391.

(119) Carta de Ruy Pereira de 1560; — Hist. Ger. I, 244.

(120) Pizarro, e Lisboa — Memórias, e Annaes cit. — C. Fernandes Pinheiro — França Antártica.

(121) Lisboa — Annaes do Rio de Janeiro.

(122) Depois do batismo Martim Afonso — V. pelo Cônego Januário da Cunha Barbosa na Rev. do Inst. Hist. IV. 207.

(123) Annaes e Memóriasreferidos; — Crônica.

(124) Varnhagen — Hist. Ger. I, 238, 239.

(125) Varnhagen — Hist. Ger. I. 260.

(126) Vem extratada na Synopsis de Figueiredo II, 132, e inserta na L. de 22 de Agosto de 1587; — lê-se a sua íntegra em Varnhagen — Hist. Ger. I, 268.

(127) Diz o seguinte: — D. Sebastião, etc. Faço saber aos que esta lei virem, que sendo eu informado dos modos ilícitos que se tem nas partes do Brasil em cativar os gentios das ditas partes, e dos grandes inconvenientes que disso nascem, assim para as consciências das pessoas que os cativam pelos ditos modos, como para o que toca a meu serviço, e bem, e conservação do estado das ditas partes, e parecendo-me que convinha muito ao serviço de Nosso Senhor prover nisso em maneira que se atalhasse aos ditos inconvenientes, mandei ver o caso na Mesa da Consciência, pelos deputados do despacho dela, e por outros letrados; e conformando-me nisso com sua determinação e parecer: Defendo e mando que daqui em diante se não use nas ditas partes do Brasil dos modos que se até ora usou em fazer cativos os dilos gentios, nem se possam cativar por modo nem maneira alguma, salvo aqueles que forem tomados em guerra justa que os Portugueses fizerem aos ditos gentios, com autoridade e licença minha, ou do meu Governador das ditas partes, ou aqueles que costumam saltear os Portugueses, e a outros gentios para os comerem; assim como são os que se chamam Aimorés e outros semelhantes. E as pessoas que pelas ditas maneiras lícitas cativarem os ditos gentios serão obrigadas dentro de dois meses primeiros seguintes, que se começarão do tempo em que os cativarem, fazerem escrever os ditos gentios cativos nos livros das Provedorias das ditas partes para se poder ver e saber quais são os que licitamente foram cativos. E não o cumprindo assim no dito tempo de dois meses: Hei por bem que percam a ação dos ditos cativos e senhorio. E os gentios que por qualquer outro modo e maneira forem cativos nas ditas partes declaro por livres, e que as pessoas que os cativarem não tenham neles direito nem senhorio algum.

(128) De l573, ou anterior.

(129) Hist. Ger. já cit. I, 273,

(130) A divisão foi cfTcilunda pela C. R. de 10 de Dezembro de 1572. (V. Hist. Ger. cit. I, 489.)

(131) Hist. Ger. I. 273.

(132) Monsenhor Pizarro — Memórias II, 113.

(133) Em 31 de Janeiro 1580.

(134) Simão de Vasconcellos — Crônica já cit.; e outros.

(135) Vem citada na L. de 6 de Junho de 1733: e em Figueiredo Synopsis Cronológica I. 152, II, 238.

(136) Figueiredo —Synopsis II, 238

(137) Hist. Ger. I, 315 e nota 5.

(138) Hist. Ger. I, 308.

(139) Idem, 312.

(140) Idem, 491.

(141) Citada nas Leis de 30 de Julho de 1609, e 10 de Setembro de 1611: e extratada na Synopsis de Figueiredo II, 271, e melhor nas ditas Leis.

(142) Citada e extratada na L. de 30 de Julho de 1609; também referida por Figueiredo — Synopsis II, 274, e João Pedro Ribeiro — Índice Cronológico I, 22.

(143) L. cit. de 11 de Xovcmbro de 1593.

(144) Consultas de 31 de Janeiro e 21 de Julho do 1603 (Hist. Ger. I, 316).

(145) Hist. Ger. I, 316 e 473

(146) Vem citada nas Leis de 1609 e 1611 de que adiante trataremos; a sua íntegra se lê na Col. de Coimbra, e na moderníssima Col. de Leis por Andrade.

(147) Col. de Coimbra, e de Andrade. — De efêmera duração foram estas providências absolutamente negativas da escravidão dos indígenas.

(148) Já então vigoravam as Ordenações Filipinas desde 1603, sem prejuízo porém das leis especiais da colônia.

(149) V. Razão do Estado do Brasil no governo do Norte somente assim como o teve D. Diogo de Menezes até o ano de 1612; — Gabriel Soares — Notícia, etc.

(150) Rev. do Inst. Hist. XII, 7.

(151) A pureza da instituição foi-se perdendo com o desenvolvimento das conquistas espirituais dos Jesuítas em todo o globo, e mais ainda pela superveniente ambição de mando, poderio, e riquezas; Acquaviva não é Loyola (V. Guioberti — II Jesuita moderno).

(152) Hist. Ger. I.

(153) Southey — Hist. of Brasil. — Bandeiras denominavam-se a reunião de indivíduos armados, com destino a internarem-se pelas terras e sertões a prear, e perseguir Índios, pretextando debelá-los.

(154) Col. de Coimbra, e de Andrade.

(155) Já existia a Relação da Bahia, criada por L. de 1588, mas instalada só em 1609 com o seu Regim. de 7 de Março deste ano.

(156) Anteriormente era taxado pelas Câmaras, com a singularidade de ser a taxa o máximo do preço (4$000 réis); o que importava (se lícito fosse o negócio) verdadeira transação leonina em detrimento dos miseráveis índios (V. J. Norberto — Memória já cit.)

(157) Esta cláusula deu lugar a sérias contestações entre os Jesuítas e os Bispos.

(158) Berredo — Annaes Hist. do Maranhão

(159) Berredo — cit., — Lisboa — Tim II, III.

(160) Idem.

(161) Hist. Ger. I, 333; — Lisboa — Timon II, III, 28.

(162) Hist. Ger. I, 335; — Southey — Hist.

(163) V. Barlœus — Rerum.... in Brasilia.... gestarum sub Præfectura... Comitis Mauritii.

(164) Hist. Ger.I, 350.

(165) Timon III; — Hist. Ger. I.

(166) Timon III.

(167) Timon III.

(168) S. Leopoldo Annaes, 231.

(169) V. Barlœus já cit.; Netscher — Les Hollandais au Brésil.

(170) Na frase incisiva do ilustre autor do Timon Maranhense.

(171) Southey — Hist. of Brasil II, 317.

(172) Este Padre compôs um — Vocabulário, arte, e tesouro da língua guarani.

(173) Hist. Ger. I,406.

(174) Rev. do Inst. Hist. III, 113, XII, 13. — Pedro Taques — Notícia histórica da expulsão dos Jesuítas do colégio de S. Paulo (Rev. XII, 5).

(175) Rev. III, 117, XII, 10 - Pedro Taques cit.

(176) Pedro Taques cit. (Rev. XII); Fr. Gaspar da Madre de Deus — Memórias e Noticia.

(177) Pedro Taques cit. (Rev. XII, 27 e 28).

(178) Hist. Ger. I, 414.

(179) Accioli - Mem. I. 416.

(180) V. Barlœus já cit.; Netscher cit.; Rocha Pitta cit.; Duarte de Albuquerque — Memórias diárias da guerra de Pernambuco; — Ericeira — Portugal restaurado; — Calado — Valeroso Lucideno; — Fr. Rafael de Jesus — Castrioto Lusitano; — Brito Freire — Historia Brasílica; — Fr. Gioseppe di S. Theresa — Istoria delle guerre del Regno del Brasile; — Cônego Dr. Fernandes Pinheiro — Brasil Holandês (Rev. do Inst. XXIII, 67); J. M. de Macedo — Dúvidas sobre alguns pontos de História Pátria (Rev. XXV. 3).

(181) Hist. Ger. II, 2 — Foi o primeiro o Príncipe D. Teodósio, filho do Rei D. João IV.

(182) Timon III — Desde o Rio Grande do Norte até S. Vicente.

(183) Col. de Coimbra. — Desde 1626 se havia extinguido, destinando-se às despesas da guerra e defesa do Estado as somas respectivas.

(184) Assim se lê no Alvará de 10 de Novembro de 1647.

(185) Col. do Desembargador Delgado; Col. de Andrade. — Vem inserto na Lei de 6 de Junho de 1755.

(186) Hist. Ger. II, 41 nota 5.

(187) Timon III.

(188) V. Berredo — Annaes cit.; André de Barros — Vida do Padre Antônio Vieira; J. F. Lisboa — Timon IV.

(189) Col. de Andrade; Berredo cit. fl. 426.

(190) Timon III.

(191) Hist. Ger. II, 63.

(192) Referida e extratada na Lei do 1.° de Abril de 1680. — V. Melo Morais — Corographia III, 393.

(193) Os quais poderiam ser acompanhados de escolta militar, inteiramente à sua disposição.

(194) André de Barros Cit.; Hist. Ger. II, 64.

(195) André de Barros cit.; Timon cit.

(l96) Timon III, IV.

(197) Hist. Ger. II, 40.

(198) V. Rev. do Inst. Hist. XII, 30.

(199) Timon III.

(200) Berredo cit. n.° 1039 a 1076; Timon cit. III, IV.

(201) Inserta na Lei de 7 de Junho de 1733

(202) Esta exclusão deu lugar a vivas reclamações; porque, diziam os colonos, assim não haveria quem quisesse fazer entradas, desde que nenhuma vantagem tirava.

(203) Timon III, IV.

(204) Idem III.

(205) Timon III.

(206) Idem.

(207) Idem.

(208) Mello Morais — Corographia cit, III, 396

(209) Timon III.

(210) Idem.

(211) Timon III.

(212) Hist. Ger. II, 66 e 75; Timon cit.

(213) Por Bulas de Inocêncio XI de 16 de Novembro de 1676.

(214) Por Bula de 30 de Agosto de 1677.

(215) Berredo — Annaes n.° 1196.

(216) Em 1676. — S. Leopoldo — Annaes § 233.

(217) B. da Silva Lisboa-Annaes I, 139.

(218) Idem IV, 271.

(219) Accioli — Mem., I, 113.

(220) Hist. Ger. II, 74.

(221} A Lei vem inserta na Lei de 6 de Junho de 1733 (Col. cit,) — E a Provisão em Timon III.

(222) J. F. Lisboa — Timon III, 183, 303 a 305.

(223) Timon III, 186 e 187.

(224) Além de fazendas e gêneros, obrigavam-se os contratadores ou assentistas a meter na colônia 10.001 negros, à razão de 500 por ano (V, Timon cit. III, 189).

(225) A. Gonçalves Dias na Rev. do Inst. Hist. XIV, 378; Timon III.

(226) Timon III, 235 a 237.

(227) Timon III, 253, 393 a 397.

(228) Como declarou a Lei de 19 de Fevereiro de 1696 (Timon III, 255).

(229) Timon III, 257; Mello Morais — Corographia.

(230) Timon cit. 261 em diante.

(231) Timon III, 277. — Este Regimento com várias Decisões posteriores foi impresso e publicado, de ordem régia, avulso, em 1724 por Manescal em Lisboa (J. P. Ribeiro — Índice I, 249). Dele dão notícia todos os escritores, e ainda ultimamente também em Mello Morais — Corographia cit. — Na Biblioteca Pública desta Corte existe um exemplar manuscrito, cópia do dito impresso .

(232) Padre José de Morais — Memórias sobre o Maranhão, publicadas por Cândido Mendes de Almeida em 1860; e por Mello Morais na Corographia.

(233) Do Maranhão e Pará, que efetivamente aí funecionou.

(234) Tal é em extrato o disposto nos 23 Capítulos do tão celebrado Regimento das Missões para redução do gentio do Estado do Maranhão e Pará ao grêmio da Igreja, e repartição do serviço dos índios que depois de reduzidos assistem nas aldeias. — Para fazê-lo servi-me do manuscrito (hoje quase ilegível) acima referido, em falta do impresso. — Aproveito a ocasião para agradecer ao digno bibliotecário Fr. Camilo de Monserrate a sua bondade para comigo.

(235) V. o manuscrito referido.

(236) Idem; J. Pedro Ribeiro — Índice cronológico de leis.

(237) V. o manuscrito supra referido.

(238) O Governador do Maranhão Gomes Freire de Andrade, em ofício de 13 de Outubro de 1685, havia representado sobre o estado de atenuação das Capitanias por falta de cabedais e de braços; e lembrava, entre outras providências, a permissão dos resgates, até com grande vantagem (pensava ele) da Fazenda Pública, abastecendo-se destarte os moradores, aliviando-os dos assentistas, e evitando que os índios buscassem os estrangeiros para lhes venderem os escravos. Dizia ele — resgatar Índios, que vivem em contínuas guerras, comendo-se uns aos outros, por não haver quem lhes compre os prisioneiros, que neste desamparo perdem a vida e a salvação. Grande barbaridade é deixá-los perecer por este modo, quando as razões para permitir-se o cativeiro dos negros de Guiné não são tão justificadas....; mandarem-se ao resgate Oficiais de Fazenda acompanhados de Religiosos da Companhia. Poder-se-á comprar cada escravo por quatro ou cinco mil réis, a troco de ferramentas, velórios, e outras bagatelas: e vendendo-se depois por trinta, não só lucrará S. M. um grande avanço, como ficarão os moradores remediados para beneficiarem os seus engenhos desmantelados; o que com índios forros jamais poderão conseguir, porque, além de os não haver, sabida cousa é que o trabalho das suas fábricas só escravos podem suportar... Sem a permissão de escravos nunca poderá este Estado ser nada, tendo aliás tanto com que ser grande. Além de que é de receiar que, não podendo os índios fazer conosco o comércio, busquem para ele os estrangeiros confinantes. {Timon III, 280).

(239) Mello Morais-Corographia IV, 129, 130.

(240) Idem IV, 130, 131.

(241) Diz o próprio Alvará de 6 de fevereiro de 1691.

(242) V. manuscrito já cit.; — e Morais Corographia IV, 131.

(243) Hist. Ger. II, 89 e seguintes.

(244) Manuscrito já cit. Bib. Pub.

(245) Hist.Ger. II, 98.

(246) Desembargador M. Fernandes Thomaz - Repertório de leis extravagantes.

(247) V. o texto destes tratados na obra monumental do sábio e distinto Brasileiro Dr. Joaquim Caetano da Silva — L’Oyapoc et l’Amazone..

(248) Manuscrito cit. Bib. Pub. — Timon III, 136.

(249) Timon III, 440 nota.

(250} Idem III, 440.

(251) Padre Antônio Vieira. — Pretende que muitos milhões de índios foram assim destruídos pelos colonos; e dizia que estes só queriam do sangue vermelho dos mesmos tirar o ouro amarelo.

(252) Padre Antônio Vieira. — V. Timon III, e IV

(253) Hist. Ger. II. 95 e 98.

(254) Monsenhor Pizarro — Memórias; — Fr. Gaspar — Cap. de S. Vicente; — Alencastre — Annaes da Província de Goyaz — (Rev. do Inst. Hist. XXVII); - Padre L. A. da Silva Souza — Memória sobre Goyaz (Rev. XII, 429).

(255) Fernandes Thomaz — Repertório — V. índios.

(256) Hist. Ger. II, 162.

(257) Idem II, 164.

(258) Idem II, 169 e 171.

(259) Idem II, 172.

(260) Moraes — Corographia III, 184.

(261) Idem IV, 138.

(262) Moraes — Corographia IV, 123 a 130.

(263) Idem IV, 135 e 136.

(264) Idem III, 400.

(265) Idem III, 123.

(266) Col. de Breves, e Leis Régias.... expedidos sobre a liberdade... dos índios do Brasil, etc.

(267) Col. cit. n.° 4 pag. 14.

(268) Idem.

(269) Moraes — Corographia cit. III, 400.

(270) Col. do Desembargador Delgado.

(271) V. A administração de Sebastião José de Carvalho e Mello, Marquês de Pombal — 4 vol.

(272) v. Col. de Breves e Leis Régias, etc., Cit.; — Cretineau — Joly; Guioberti.

(273) S. Leopoldo Annaes; — V. de Santarém — Quadro elementar.

(274) Col. de Breves e Leis Régias cit; — Padre Gay — República Jesuítica do Paraguay (Rev. do Inst. XXVI); — Reúublica Jesuítica no Uruguay e Paraguay (Rev. IV, 265).

(275) Relação abreviada, etc., na cit. Col. de Breves e Leis Régias; — Varnhagen — Hist. Ger. II, 194.

(276) Col.de Breves cit.; Col. de Leis pelo Desembargador Delgado.

(277) Assim o dizia também o Padre Vieira. Parece exagerado o cálculo. Mas, se se referir ao número de índios que foram sucessivamente destruídos desde os primeiros tempos, não o será, como se lê em uma memória do Desembargador Carvalho e Albuquerque, de que adiante falarei. Da América Espanhola refere o Padre Las Casas que em meio século destruíram os conquistadores para cima de 13 milhões de índios.

(278) Que diz o seguinte: — E para que os ditos gentios que assim descerem, e os mais que há de presente, melhor se conservem nas aldeias, Hei por bem que sejam senhores de suas fazendas, como o são no sertão, sem lhes poderem ser tomadas nem sobre elas se lhes fazer moléstia. E o Governador, com parecer dos ditos Religiosos, assinará aos que descerem do sertão lugares convenientes para neles lavrarem e cultivarem, e não poderão ser mudados dos ditos lugares contra sua vontade, nem serão obrigados a pagar foro ou tributo algum das ditas terras, ainda que estejam dadas em sesmarias a pessoas particulares, porque na concessão destas se reserva sempre o prejuízo de terceiro, e muito mais se entende e quero se entenda ser reservado o prejuízo e direito dos índios, primários e naturais senhores delas.

(279) Manuscrito referido B. P. f. 113 a f. 117.

(280) Col. de Breves e Leis Régias já cit.

(281) Relação abreviada, etc, na Col. cit.

(282) Col. cit.

(283) Posteriormente foram expulsos de França, Espanha, Nápoles; e afinal abolida a Ordem por Bula de Clemente XIV, de 1773.— Mais tarde (7 de Agosto de 1814) foi ela restabelecida pelo Papa Pio VII.

(284) Relaçãocit.; — Hist. Ger. II.

(285) Expedida mais tarde definitivamente a Bula de extinção da Ordem de 21 de Julho de 1773 — Dominos ac redemptor, etc, foi ela auxiliada em sua execução pela L. de 9 de Setembro de 1773.

(286) Col. de Leis cit.; Timon III; — Fernandes Thomaz — Repert.

(287) Manuscripio já cit. da B. P.; — Moraes — Coroqraphia IV, 134.

(288} Col. do Desembargador Delgado.

(289) Idem.

(290) Alencastre já cit. (Rev. XXVII, 143); sendo anteriormente sujeitas aí as aldeias ao regime militar constante do Reg. de 13 de Junho de 1754.

(291) Nem o impresso, nem o manuscrito que tive em vista, trazem a data; mas induz-se do texto.

(292) M. S. já cit. da B. P.; M. Morais — Corographia IV, 122 a 185. — Conquanto o impresso não seja textualmente idêntico ao manuscrito referido, todavia não pode restar dúvida, conferindo-se (como fiz) um e outro.

(293) Entre estes era o de promover-se a introdução e comércio dos escravos de Angola e Guiné, para alívio dos índios, proveito dos moradores, desenvolvimento da agricultura, etc., além da vantagem espiritual de serem reduzidos à fé católica os negros!

(294) Assim o afirma ele por experiência própria; declarando haver conseguido por trabalho seu e à expensas suas o descimento de muitos índios, quando magistrado na Capitania do Rio Negro.

(295) José Arouche de Toledo Rendon — Memória sobre as aldeias de índios da Província de S. Paulo — (Rev. do Inst. Hist. IV, 293).

(296) Coronel J. J. Machado de Oliveira Noticia raciocinada sobre as aldeias de índios da Província de S. Paulo (Rev. do Inst. Hist. VIII, 204).

(297) Alencastre — Annaes da Província de Goyaz (Rev. XXVII, 160, 161).

(298) Publicada na Rev. do Inst. Hist. XX, 433.

(299) Rev. cit. XX, 445.

(300) Chamada a conspiração do Tiradentes (V. José de Rezende Costa na Rev. do Inst. Hist. VIII, 297; — Dr. A. Pereira Pinto em a Confederação do Equador — Rev. cit. XXIX, 36). — De 1789 - 1792.

(301) Desde a vinda da Família Real, em 1808, maiores franquezas ao Estado, abertura dos portos ao estrangeiro, elevação do Brasil a Reino em 1815, a emancipação política de 1822 proclamada nos gloriosos campos do Ipiranga era conseqüência necessária. Tais são os arcanos da sabedoria Divina, ainda no mundo moral, e na ordem providêncial das Nações.

(302) Hist. Ger. II, 301 e 302. — V. Reflexões econômico-políticas pelo Desembargador Manoel de Matos Pinto de Carvalbo e Albuquerque, oferecidas ao Marquês de Aguiar, Ministro e Secretário dos Negócios do Reino, 1814; manuscrito da Bib. Flum. nesta Corte; aproveito o ensejo para agradecer ao respectivo bibliotecário o Sr. Martins a leitura deste manuscrito. Deplora o seu autor o estado de desgraça das aldeias e dos Índios nos termos seguintes ... que havendo descido dos sertões inumeráveis gentios por mais de dois séculos se foram sempre gradualmente extinguindo, de modo que nos últimos anos do reinado do Sr. D. João V apenas se conservaram alguns daqueles desgraçados nas primeiras aldeias em que se estabeleceram sem ordem nem formalidade alguma. Vivendo ainda esses poucos em tão grande abatimento e miséria que, em vez de atraírem por força das comodidades próprias os Bárbaros seus Nacionais, lhes serviam pelo contrário do maior escândalo e estímulo para mais abominarem a nossa comunicação e trato; embrenhando-se nas suas antigas habitações silvestres, com lamentável prejuízo da salvação de tantos milhões de almas; e com o mais considerável dano dos verdadeiros interesses do Estado. E com efeito teriam chegado a extinguir-se de todo nas aldeias das Capitanias do Sul, se estas de alguma forma não participassem também das paternais providências que o Sr. Rei D. José I foi servido dar para o restabelecimento do Pará e Maranhão pelas sábias leis de 4 de Abril, 6 e 7 de Junho de 1775, 8 de Maio e 17 de Agosto de 1758.

(303) V. Cônego Januário da Cunha Barboza. — Se a introdução dos escravos Africanos no Brasil embaraça a civilização dos nossos indígenas? (Rev. do Inst. Hist. I, 143); — José Silvestre Rebello — sobre a mesma questão. (Rev. I, 133).

(304) Diretório já cit. de 1737 aprovado pelo Alv. de 1738.

(305) L. de 6 de Junho de 1755 § 4.° — que diz o seguinte: — Desta geral disposição (de serem livres todos os índios) exceto somente os oriundos de pretas escravas, os quais serão conservados no domínio dos seus atuais senhores, enquanto Eu não der outra providência sobre esta matéria.

(306) Como se reconhece formalmente na C. R. de 5 de Setembro de 1811. Ainda hoje subsiste intenso esse ódio tradicional. (V. Dr. Couto de Magalhães — Memória sobre o rio Araguaia).

(307) Accioli — Memória (Rev. do Inst. Hist. XII, 143)

(308) Col. de Leis — Ouro Preto.

(309) Idem.

(310) Col. de Leis — Ouro Preto.

(311) Hist. Ger. II, 321.

(312) Em Outubro de 1788. — Publicada na Rev. do Inst. Hist. XIX, 33. — Em 1814 também ofereceu ao Príncipe Regente D. João uma memória notável o Desembargador Carvalho e Albuquerque já cit., em que expunha as suas idéias sobre catequese, que em substância são: 1.°, estabelecimento de colônias de índios de preferência nas costas marítimas pela maior facilidade e vantagem da agricultura e comércio; 2.°, distribuição de terras, e tombo delas para as colônias; 3.°, distribuição das mesmas pelos índios; 4.°, providências sobre a povoação, estabelecimento dos índios, despesas para isso; sobre alimentação, vestuário, habitações, instrumentos agrícolas, etc.; 5.°, hospitais, médicos, boticas; 6.°, instrução religiosa, propagação da fé católica, igrejas, sacerdotes; e governo espiritual dos índios; 7.°, educação, escolas, ofícios mecânicos; 8.°, casamentos dos índios, e suas comodidades; 9.°, governo temporal, organizado por decúrias e centúrias, com seus inspetores e Intendentes de polícia, Capitães-mores, etc.; e uma junta com jurisdição coativa mais em forma paternal do que judicial (V. Reflexões, etc., parte 2.ª tits. 2 a l3 — M. S. da Bibl. Flum.) — Mais modernamente o ilustre Brasileiro José Bonifácio (1823) à Assembléia Constituinte (impressa na Rev. do Inst. Hist. XII, 228). — E ainda em 1839 o distinto literato Cônego Januário da Cunha Barboza, em desenvolvimento ao prograuima do Inst. Hist. — Qual seria o melhor sistema de colonizar os índios entranhados em nossos sertões... (Rev. II, 3).— Outras memórias, até especiais sobre civilização de Botocudos, e outras tribos, existem; o que prova a importância da questão e o interesse que beneméritos hão por ela tomado.

(313) Col. de Leis — Ouro Preto.

(314) Col. de Leis — Ouro Preto.

(315) Col. de Leis — Ouro Preto.

(316) V. g. na causa cível vinda por apelação da província de S. Tanto em 1864 à Relação da Corte, apelantes Josefa Maria do Carmo e outros, apelados Silvestre e outros.

(317) Col. de Leis cit.

(318) Col. de Leis cit.

(319). Col. de Leis por Nabuco.

(320) Col. de Leis. - Ouro Preto.

(321) J. M. Pereira da Silva. mdash; Fundação do Império Brasileiro.

(322) Pereira da Silva. — Fundação do Império Brasileiro.

(323) V. Pereira da Silva cit.; A. Pereira Pinto — A Confederação do Equador (Rev. do Inst. Hist. XXIX, 36).

(324) V. Pereira da Silva cit; sobre as bases fundamentais de governo.

(325) Col. Nab.

(326) Na Rev. do Inst. Hist. XII, 228.

(327) V. Diário da Constituinte; — A Constituinte perante a História por F. J. M. Homem de Mello.

(328) Col. de Leis — Ouro Preto. — Os decretos dessa 1.ª Assembléia eram promulgados independente de sancão, na forma do Dec. de 23 de Agosto de 1823.

(329) Col. Nab.

(330) Col. de Leis.

(331) Cunha Matos — Repert. V. índios.

(332) Col. Nab.

(333) Col. Nab.

(334) Col. do Leis

(335) Col. Leis.

(336) V. Dec. de 3 de Junho de 1833 pr. (Col. de Leis.)

(337) Col. cit.

(338) Furtado — Repert.

(339) Col. de Leis.

(340) Col. cit.

(341) Col. de Leis.

(342) Idem.

(343) idem.

(344) Idem.

(345) Col. de Leis.

(346) Col. Leis. — Novo plano das missões dos Capuchinhos foi organizado por estes, e apresentado ao Governo (V. Relat. do M. da Agric. de 1865).— V. nota 385.

(347) Col. de Leis. — V. nota 385.

(348) Jornal do Commercio 222; Furtado — Repert.

(349) V. Courrier de la Plata extratado no Diário Oficial e Jornal de 21 de Novembro de 1866.

(350) Dr. Furtado — Repert. cit.

(351) Idem.

(352) Col. de Leis - addit.

(353) Col. cit. — addit. — V. Dr. A. Pereira Pinto no seu — Direito Internacional I, 353 nota.

(354) Não é, portanto, de todo exato o que se lê nos — Apontamentos Jurídicos do Dr. J. F. Silveira da Motta. V. Índios, quando diz que esse Regulamento não tem tido execução. — Os Relatórios dos Presidentes de Província, e do Governo provam a exatidão do que dizemos.

(355) Col. de Leis; Diário Oficial. — Ainda recentemente se mandou dar a Fr. Caetano de Messina 1:200$000 para despesas a bem da catequese (Av. de 31 de Outubro de 1866 — no Diário Oficial de 14 de Dez.); assim como a Fr. Antônio Ganges a ajuda de custo de l:200$000, e se lhe arbitrou 1:200$000 como Diretor nomeado para o aldeamento de Ipiabanha em Goiás (Avs. de 13 e 17 de Nov.de 1866 no Diário Oficial de 15 e 16 de Dez.)

(356) Diário Oficial de 31 de Agosto.

(357) J. F. Silveira da Motta — Apont. Jurid. — V. índios; não obstante haver o Governo deixado indecisa essa competência (V. Av. de 17 de Outubro de 1846 e 24 de Agosto de 1847).

(358) Av. de 28 de Abril de 1865 (Diário Oflcíal de 8 de Junho), Av. de 7 de Novembro de 1865 (Diário Oficial de 8 de Dezembro) — Sobre aldeamentos em S. Paulo, V. Diário Oficial de 26 de Novembro de 1864.

(359) Não há estatística exata; mas deduz-se do Rel. do Min. da Agric. de 1865 e sobretudo do de 13 de Maio de 1866. — A Província do Amazonas só por si contém 38 aldeamentos com 17.385 índios; e o Pará 10 com 3.200 índios; S. Pedro dois com 839. — Na capital do Amazonas há um estabelecimento para educação dos filhos dos índios; o qual tem dado bons resultados (Relat. cit. de 1866).

(360) O Av. de 20 de Maio de 1862 (Col. de Leis - adit.) extinguiu aldeamentos em S. 1'aulo, Pernambuco, e Sergipe; o Av. de 25 de Outubro de 1865, (Diário Oficial de 16 de Novembro) na Província do Rio de Janeiro. — V. Relat. do Min. da Agric. de 1865 e 1866.

(361) Avs. 172 de 21 de Outubro de 1852, n.° 273 de 18 de Dezembro de 1852, n.° 44 de 21 de Janeiro de 1856.

(362) V. g. no Amazonas (Relat. do Presidente da Província do 1.° de Outubro de 1864); Mato Grosso (V. Jornal, Sup. de 9 de Novembro de 1864, pag. 1 col. 6ª; os Coroados no Paraná (Diário Oficial de 18 de Outubro de 1866, pg. 3 col. 1.ª); no Maranhão os Guajajáras (Diário Oficial de 29 de Novembro de 1866, pag. 4 col. 1.ª); em Mearim (Maranhão) sublevaram-se os das aldeias (provocados por empregados subalternos da Diretoria), uniram-se a outros em número superior talvez a mil, atacaram a guarnição, moradores, famílias, (Diário Oficial e Correio Mercantil de 29 de Dezembro de 1866; Diário Oficial de 12 de Janeiro de 1867, pag. 3.ª); e ainda em Outubro de 1866 os selvagens do Javari (Amazonas) flecharam pessoas da expedição encarregada da demarcação de limites do Império, morrendo o Capitão Tenente Soares Pinto (V. Diário Oficial de 9 e 10 de Janeiro de 1867); e outros perseguem os destacamentos militares, de que têm particular ojeriza (Diário Oficial de 12 de Janeiro de 1867)

(363) V. g. em Maracassumé no Maranhão (Jornal de 31 de Março de 1865).

(364) V. g. no Amazonas em 1865. (Relat. do Presidente da Prov. de Maio de 1865). — Diário Oficial de 25 de Outubro.

(365) V. Correio Mercantil de 4 de Dezembro pag. 1 col. 2.ª

(366) V. Jornal do Comércio de 23 de Outubro.

(367) Av. do l.° e 26 de Agosto de 1864 — Diário Oficial de 2 e 17 de Setembro.

(368) Diário Oficial de 28 de Novembro de 1866, pag. 4 col. 1.ª

(369) Da estatística da população, organizada em 1817 e 1818 pelos governadores, de ordem do Governo, e transcrita por Balbi na — Statistique de Portugal et du Brésil — vê-se que, sobre uma população de 3.817.900 almas, os Índios aldeados e pacíficos orçavam por 250.000 (V. Hist. da Fund. do Imp. IV, 261). Henry Hill, em a sua Memória de 1817, orçava apenas em 1000.000 os Índios domesticados, e em 500.000 os bravos (V. Rev. do Inst. XXIX — l.ª parte, pag. 178, calculando o total da população em 3.300.000 almas. O Conselheiro A. H. Velloso de Oliveira em a sua informação — A igreja do Brasil —, de 1819. calculando o total da população em 4.396.132 indivíduos, aí comprende 800.000 índios bravos, o mínimo que lhe é possível admitir (Rev. cit. XXIX — 1.ª pag. 179). O Senador C. Baptista de Oliveira em 1850 calculou a população do Brasil em 8.020.000 almas, sendo 2.500.000 escravos; sem dizer cousa alguma quanto aos índios (Rev. do Inst. Hist. XV, 113). O Sr. Sebastião Ferreira Soares nos seus — Elementos de estatística, 1865 — orçando a população do Império em 11.780.000 habitantes, dos quais deduz 1.400.000 escravos, computa no restante 10.380.000 livres, 500.000 indígenas, sem distinção (1, 43). O Padre Pompeu na sua — Geographia, 1864 — calcula em 10.100.000 habitantes, dos quais 1.700.000 escravos; além de mais de 200.000 índios disseminados pelos sertões do Amazonas, Pará, Maranhão, Piauí, Minas, Goiás, Mato Grosso e Paraná.

(370) V. nota antecedente. — Orçando mais ou menos a população do Brasil em 10.000.000, distribuída por uma superfície de 256.886 léguas quadradas (Humboldt), cabem 30 ou 40 habitantes por légua quadrada! É quase um deserto! Cem milhões aí viveriam comodamente (V. Padre Pompeu cit; Ferreira Soares cit.)

(371) Não vem na Col.; porém delas faz menção o ofício de 12 de Abril de 1865, que também não vem na Col. mas se lê no Diário Oficial desse ano, e o Relat. do Min. da Agric. de 15 de Maio de 1866.

(372) Col. — adit. — Não obstante o Reg. de 1845, que exigia maior prazo; não obstante a lei de terras de 1850 e seu Reg. de 1854. — O Governo tem providênciado para que os índios sejam mantidos na posse e domínio das suas terras e propriedades.

(373) Não vem na Col.

(374) V. Diário Oficial do 1.° de Janeiro de 1865.

(375) V. Fala dirigida à Assembléia Provincial do Pará em 15 de Agosto de 1884 pelo Presidente (Diário Oficial, Sup. de 21 de Fevereiro de 1865); Relat. do Presidente do Amazonas do 1.° de Outubro de 1864; Relat. dos Presidentes do Pará e Amazonas em 1865, e 1866; Relat. do Mini da Agric. de 15 de Maio de 1866.

(376) V. Ofi. de l8 de Julho de 1865 (Diário Oficial de 30 de Agosto).

(377) V. g. se constituindo advogado para defesa de índios podem conceder-lhe honras de Diretor d’aldeia; resolvendo o Governo pela negativa (Av. de 22 de Outubro de 1864 no Diário Oficial do 1.° de Novembro: se os Diretores gozam somente das honras militares ou também das isenções e privilégios; decidindo o Governo que só das honras (Av. de 28 de Outubro de 1864, Diário Oficial de 4 de Novembro).

(378) Av. de 30 de Agosto de 1865 (Diário Oficial de 2 de Setembro).

(379) V. Relat. do Min. da Agricultura, etc., em 1865 e 1866. — Ainda recentemente, contra o sistema do Reg. cit. de 1845, foi nomeado Diretor do aldeamento de Ipiabanha em Goiás o Capuchinho Fr. Antônio de Gange (Av. de 13 de Novembro de 1866 (V. nota 383).

(380) V. Relat. cit. sobretudo de 1866. — Nos Relatórios anteriores do Ministério do Império (a cujo cargo estava a catequese e civilização dos indígenas) se acham notícias a respeito. Criado o novo Ministério da Agricultura, Comércio e Obras Públicas, passou para este, ficando a Cargo especial da Diretoria das terras públicas e colonização a catequese e civilização dos Índios, as missões e aldeamentos dos indígenas (L. 1067 de 28 de Julho de 1860, Dec. n.° 2747 de 16 de Fevereiro de 1861, art. l.° n.° 14, art. 11 n.° 3); e portanto nos Relatórios respectivos se dá conta deste importante assunto.

(381) Diário Oficial de 4 de Junho de 1864.

(382) V. discurso do Dr. J. M. de Macedo em 8 de Abril de 1864 no Jornal do Comércio, Sup. de 13 desse mês. — O Papa tentou obter de D. João VI a volta dos Jesuítas; mas o Rei opôs-se (V. Pereira da Silva — Fundação do Império IV).

(383) Os Capuchinhos têm prestado muito bons serviços, como tem sido reconhecido e confessado pelo Governo (Relat. do Min. do Império de 1863, e outros; e modernamente Relat. do Min. da Agric.), e pelos Presidentes de Província (Relat. destes). Ainda em 1884 foram Cherentes aldeados em Goiás por esforços do missionário (Jornal de 13 de Dezembro).

(384) Euntes ergo docete omnes gentes (S. Mat. Cap. 28 v. 19 e 20). Sicut misit me Pater, et ego mitto vos, S. João Cap. 20 v. 21).

(385) V. Relat. do Presidente do Amazonas do 1.° de Outubro de 1864 (Diário Oficial de 10 de Maio de 1865); Relat. dos Presidentes do Pará e Maranhão em 1866 (Jornal, Sup. de 7 de Julho). A história que vimos de esboçar prova à evidência a verdade da proposição enunciada. A concordata com a Santa Sé de 28 de outubro de 1862 sobre a vinda de missionários Capuchinhos o confirma; garantindo-se-lhes maior latitude e liberdade de ação no exercício de suas funções civilizadoras. O Reg. de 23 de Abril de 1857, e o outro de 1862 atribuem a alta direção dos aldeamentos ao elemento religioso, alteradas, portanto, neste sentido as administrações dos aldeamentos (V. Relat. do Min. da Agric. de 15 de Maio de 1866).

(386) Na Constituição do Arcebispado da Bahia isto se recomenda em relação a todos, livres ou não, brancos, Índios, ou negros.

(387) Tácito — Annaes

(388) Conquanto seja nossa opinião que não deve o governo temporal ser exercido exclusivamente pelo missionário, todavia entendemos conveniente que tenha este uma certa autoridade temporal paternal, principalmente nas primeiras fases da catequização; destinado o Índio a fazer parte da comunhão social, sua educação deve ser dirigida a este grande fim, e não a segregá-lo da sociedade civil. — Os resultados dependem não só das leis, mas sobretudo dos incumbidos da sua execução; e infelizmente bom pessoal é raro.

(389) O estudo das línguas indígenas não seria para desprezar, atenta sobretudo a necessidade do seu conhecimento para chamar os índios bravos; os Jesuítas assim procederam, e colheram grandes vantagens (V. Varnhagen na Rev. do Inst. Hist. III, 53). Ainda ultimamente foi autorizada a nomeação de Intérprete por Av. de 28 de Novembroi de 1864, (Diário Oficial de 24 de Dezembro); o que prova a necessidade daquele estudo e conhecimento. E já na C. R. de 28 de Julho de 1809 se exigia que o Diretor fosse inteligente do idioma dos índios.

(390) Sobre aquisição de índios para guarnecerem canoas de serviço em S. Pedro do Sul e no Amazonas V. Av. de 16 de Abril de 1861 (Boletim Oficial), e de 11 de Outubro de 1864 (Diário Oficial de 22).

(391) Alguns têm sido agregados até a colônias militares, como v. g. na do Urucu; o índios têm sido fardados e armados para defesa das aldeias.

(392) De se ordenarem índios, que tivessem vocação para o estado sacerdotal, poderia vir grande vantagem para por meio deles se obter mais facilmente a redução e civilização dos selvagens.

(393) V. g. no rio Madeira (Diário Oficial de 29 de Dezembro de 1864).

(394) V. Cartas Jesuíticas; — Gabriel Soares; — Gandavo; — Jaboatão; — Padre João Daniel; — Alex. Rodrigues Ferreira; — Lery; — Varnhagen; — J. F. Lisboa; — Magalhães; — A. Gonçalves Dias; — Cônego Fernandes Pinheiro; e outros distintos Brasileiros e estrangeiros.

(395) Timon III contra a Hist. Ger.

(396) D. Antônio Filipe Camarão nos — Ensaios biográficos — dto Dr. Moreira de Azevedo. — V. também D. Clara Felipa Camarão (mulher do mesmo) por J. N. de Souza e Silva na Rev. do Inst. X, 387.

(397) Dr. Furtado — Repert.

(398) Pereira da Silva — Fundação do Império.

(399) Diário Oficial de 23 de Outubro de 1866; Ofício do Presidente de Goiás em 6 de Outubro de 1866 no Diário Oficial de 21 de Novembro.

(400) Varnhagen na Hist. Ger. do Brasil.

(401) Como ainda não há muito foi declarado no Av. 68 de 9 de Fevereiro de 1863.



 

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