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Dr. Ninguém

Maurício Rapp

Dr. Ninguém
Maurício Rapp

Revisão: Edvilson Martins
Capa: Valdir Alves Soares
Apoio: www.jconline.com.br

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eBooksBrasil
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2a. Edição Digital
© 2001 Maurício Rapp
Av. Dep. Cunha Bueno, 504
CEP 08561-310 – Poá
São Paulo – Brasil
rapp@jconline.com.br


 

Índice

Prefácio
Aviso aos navegantes
Reconsideração inicial
A) Primeiro Tempo
1. Alguém muito especial
2. Carta da despedida
3. Caso Esmeralda
    3.1. O dia do Pizza
    3.2. Pequenas mentiras, grandes verdades.
    3.3. O clube do cachorrão
    3.4. A mulher do PUM
4. Testamento.
5. Caso Darlin
    5.1. Uma sonda espacial
    5.2. Quem sou eu? Em quantos sou?
6. Caso Walkíria
    6.1. Pode, não pode
    6.2. “Apaixonite” Aguda de Terceiro Grau.
    6.3. Como é que é mesmo?
    6.4. Novos Dias
7. Caso Desfecho Walkíria
8. Caso desfecho Esmeralda
9. Caso “Banco do Tempo”
Último Aviso
B) Segundo Tempo
1. Caso Sombra
Hora da verdade
Continuação... O Sombra
C) Prorrogação
1. O caso Deus
Esclarecimentos


 

Dr. Ninguém

Maurício Rapp


 

 

Prefácio

 

Existem várias formas de viajar: seja em um navio ou em um sonho, em um avião ou em um sopro de esperança, em um automóvel ou mesmo na imaginação. Esta é a última chamada para o embarque em um passeio como você, caro leitor, nunca viu igual, se bem que você, se aceitar o convite, será muito mais que um mero leitor, mas cada coisa em seu devido tempo...

;Passado. São nossas lembranças, aquilo que temos como fato consumado e inalterável, mas existem várias formas de se lembrar, a ponto de mudar nosso presente.

;Presente. Pensando bem, é difícil situar o presente na linha do tempo, afinal, só temos certeza do que é passado e do que poderá ser o futuro.

;Futuro. Provavelmente o mais belo entre os instantes, lar da nossa esperança e eterna desculpa para nossos erros passados.

;Agora esqueça passado e futuro, tudo que existe é presente, guarde bem esta dica, que lhe será muito útil em sua jornada caso você queira vencer o grande desafio que está por vir...

;Maurício Rapp será seu guia nesta obra inesquecível, difícil definir o perfil de uma pessoa em breves e simplórias palavras, mas acredito que o autor das páginas seguintes pode ser considerado um filósofo urbano, fazendo da vida cotidiana um palco e laboratório humano, onde dos fatos mais simples é que se aprendem as lições mais grandiosas.

;Muitos aspectos provavelmente jamais estudados da vida são abordados de forma natural e despojada, abrindo nosso campo de visão e nos ensinando a ter uma nova postura diante de situações outrora ignoradas ou subestimadas.

;Diferente do conceito tradicional de um livro, ao longo da leitura um desafio lhe será proposto, desafio este que superará quaisquer barreiras tanto intelectuais quanto emocionais que você, leitor, pode ter.

Renato Borges A. Prado


 

 

Aviso aos navegantes

 

Brincar com o tempo e com o espaço. Privilégio dado apenas aos espíritos inocentes, ingênuos e puros, como os de anjos e crianças.

;Mas é isso que esse autor, parecendo se tornar um rebento quando escreve, faz, e essa história mirabolante e lúdica torna-se, deliciosamente, uma viagem onde a responsabilidade de compreender e fazer dar sentido às coisas está em um nível onde a racionalidade não pode suportar. Quem lê se entrega de corpo e alma a uma verdade que passa a julgar a mais próxima da realidade e, por tanto, mais possível de ser compreendida e aceita. Porém, quem escreve ou lê terá que descobrir por si próprio quem é, aproveitando este momento mágico, onde a leitura se transforma em prazer, para jogar com uma intuição que aflora do interior do seu ser. Isso faz com que haja um convencimento, em uma conjuntura de fatos, de que a história já teve o seu fim, mas uma intrigante resposta, desvendando o segredo desta obra, traz uma outra possibilidade sobre a verdade, fazendo com que uma surpresa, misturada com extrema dose de leveza, estimule o leitor a refletir sobre uma nova realidade que lhe foi impetuosamente calcada em suas idéias. Esse suposto autoritarismo é necessário para que o leitor volte ao seu estado de consciência material, engajando-se novamente neste universo, depois de um passeio por um mundo ainda desconhecido.

;Quem se aventura a entender as armadilhas e os entranhes da vida deve estar preparado para ler estas páginas, mas fica aqui um recado aos menos favorecidos, aos que de alguma forma ainda não estão preparados: Não se iludam e nem se deixem enganar. É um aviso que lhes dou, por ser companheiro.

;Tenham coragem principalmente quando pensarem que tudo acabou e que não pode existir mais nada. A surpresa ainda está por vir. Quando sentirem que realmente foram trapaceados, estejam atentos para que não caiam em erro novamente.

;No final, só o que vai restar é você e seus pensamentos: Isso eu garanto! E depois de lerem este escrito por completo, se estiverem realmente preparados para descobrirem o inesperado, algo posso prometer: Nunca mais serão os mesmos depois de Dr. Ninguém.

;Este livro não é apenas mais um, é um a mais no universo que ainda está por vir.


 

 

Reconsideração inicial

 

Se tem realmente certeza de que são capazes de compreender estas páginas, prossigam sem medo. Mas, o aviso já lhes foi dado...

;Ao sentirem incerteza a respeito do futuro, fechem este livro e preparem-se antes.

;A decepção irá acompanhá-los, pois este autor provará a incapacidade de todos em compreender coisas corriqueiras da vida, como a morte. Não digam que não foram avisados!

;E quando a descrença se fizer presente bem diante de seus olhos, e sentirem que realmente caíram em uma armadilha, já será tarde demais para arrependimentos. Prestem muita atenção para compreenderem o primeiro tempo da história, que é constituída em dois tempos e uma prorrogação, não sendo preciso nem ir para os pênaltis, pois a “marca da cal” é a cabeça de quem lê.

;É um desafio a ser enfrentado. Os audaciosos, destemidos e os que têm espírito de aventura, serão de fato os vencedores. Quanto aos demais, apenas passaram sem marcas deixar.

;Seria você um desbravador capaz de suportar a dor de saber que foi incapaz? Se assim for, no final será um vitorioso, caso contrário, contará com seu nome no livro dos que tentaram.

;Aos vitoriosos, no final uma grande recompensa: Saber que suportam sem repúdio o fato de que foram capazes de compreender que não tinham capacidade para a compreensão total dos fatos.

;Desta forma, fica aqui o meu alerta final: Não estremeçam! E, se por algum momento sentirem vontade de destruir o autor, este será o sinal de que o escritor venceu e vocês foram derrotados.

;Avante, que o mundo é ainda muito belo e cheio de mistérios! Estaria você preparado para enfrentar esses mistérios? Só quem ler saberá...


 

Dr. Ninguém

A) Primeiro Tempo

 

 

1. Alguém muito especial

Eu sempre achei que a felicidade estava em encontrar uma mulher com poderes sobrenaturais. Vocês já pensaram em uma pessoa assim, que pudesse adivinhar o futuro, dizer o que fazer para que tudo corresse bem? É, poderia ser bem interessante conhecer alguém desse jeito. Mas será que eu encontro? Não estou me referindo a uma bruxa, mas a uma fada, que pode estar bem perto de mim. Quem sabe eu já a conheça e nem saiba! Pois é, o que eu mais desejo é encontrar uma mulher muito especial, que entenda de assuntos místicos e tenha respostas para tudo.

;Seria o máximo! Ganharia na loteria todas as semanas.

;Mas a felicidade maior seria poder viver sem me preocupar com as coisas corriqueiras da vida. Tudo um mar de rosas! Minha mulher é quem tomaria todas as decisões no sentido de me proteger. Saber que há alguém que se preocupa e cuida da gentes todos os dias, em todos os momentos, em todas as situações, deve ser sensacional.

;Bom, acho que já me entenderam, mas ainda não cheguei ao cerne da questão. E é, justamente, o “ser feliz”. Se houve-se um problema, por mais grave que fosse, bastaria contar, e, de imediato, teria a solução. Não se trata de macumba ou coisas desse gênero, apenas questões espirituais. E para uma mulher nestas condições, nem precisaria contar as coisas da vida. Antes mesmo de acontecer, já saberia e alertaria para o caso, se é que não resolvesse antes mesmo de acontecer. Isso, de certa forma, poderia tirar um pouco do meu sossego, da minha liberdade individual, mas faz parte do jogo, e a privacidade reduzida seria compensada pela falta de problemas que teria.

;Que ótimo, mas onde encontrá-la?

;Já procurei em bares, em discotecas, em igrejas, em parques, em tudo quanto é lugar, mas em cada um deles aprendi uma coisa: se quero uma mulher que não fume e nem beba, buscar em um bar é quase um absurdo. Em uma igreja, o máximo que conseguirei é alguma beata de fé fervorosa, não que isso seja mal, mas não é o que procuro.

;E, percorrendo todos esses caminhos, descobri que as pessoas freqüentam os lugares onde encontram alguma afinidade: espiritual, material... Assim sendo, onde poderia encontrar uma fada?

;Fadas não devem com certeza, andar por bares, fazer “Cooper” em parques cheio de pessoas ou outras atividades humanas demais.

;Mas onde, que Diabos, pode-se encontrar uma fada? Que Diabos? Que contradição! Pedir uma fada evocando o Diabo. Credo! Acho que por isso as pessoas nunca acham exatamente o que querem. Pedem algo do tipo peça e lhe será dado mas pedem de forma errada, como um caso de uma amiga minha que vou contar agora:

;Uma pessoa de muita fé. Alguém que dificilmente deixa-se abalar por questões simplórias, mas, acima de tudo, de muito caráter e respeito pela vida, sua própria, como pelas vidas alheias.

;Apesar de tanta correção de caráter, um dia cometeu um tremendo engano ao formular pensamentos de forma errada.

;Andava a pé, e a cada dia que passava, mais atividades arrumava, de maneira que, tinha seu dia de apenas vinte e quatro horas, quase ocupado por completo. Gastava parte desse tempo, se deslocando de um lado para o outro. Então percebeu que se se deslocasse mais rapidamente, economizaria muito tempo, e poderia fazer mais coisas. Resolveu que já era hora de ter um carro, que a levásse rapidamente aos lugares. Formulou então o seu pensamento e pediu, pediu, pediu, fervorosamente, só um carro, um carrinho, como mesma dizia.

;E não é que deu certo? Em menos de dois meses lá estava ela andando com o seu carrinho. Na verdade, pode-se realmente dizer que era apenas um carrinho mesmo, e por pedir exatamente isso, foi que se estrepou toda. E o danado do carro, um "fusqueta" ansião, só quebrava. A cada esquina um mecânico, e a cada rua um cheque voando. O "apenas um carrinho" que tanto queria de repente se transformou em uma tremenda dor de cabeça. Mais gastos que prazer. Mais tempo em mecânicos, funileiros, do que propriamente andando no “piá”. O resultado foi que depois de um certo tempo vendeu o carro. Melhor dizer, se desfez dele e voltou a andar a pé, e é como está até hoje.

;Mas a culpa foi de quem? Minha não foi. E quem vendeu, poderia ser responsabilizado? Acho que também não. Walkíria não foi forçada a comprar nada. A culpa foi dela mesma. Quem mandou pedir só por um carrinho. Conseguiu exatamente o que quis, e ninguém pode ser responsabilizado por isso. Queria um carrinho, teve um carrinho. E agora que arque com as conseqüências.

;É, a vida é muito engraçada! Felicidade de uns é tristeza de outros. Não pode existir a felicidade sem existir a tristeza... Espera aí, quer dizer que a culpa de existir a sombra é a luz?

;Acho que daí, entende-se muitos outros mistérios...

;Mas de algo estou bem certo: a infelicidade dela foi a felicidade do antigo dono do carro, que finalmente conseguiu se desfazer da “lacraia velha”. É, a vida às vezes é bem engraçada! E nessa grande comédia toda, será que terei uma capacidade sobrenatural em formular um pensamento certo para encontrar a minha fada? Só quero uma mulher melhor, bem diferente de todas, com poderes bem especiais.


 

 

2. Carta da despedida

 

“Durante toda minha vida fui forçado a fazer coisas que não queria, que não gostava. Toda minha existência, em cada dia sofrido, em cada momento angustiante, sempre procurei tirar boas lições das situações adversas e inesperadas. Mas já estou cansado. Decisões a serem tomadas constantemente são coisas que desgastam, e por me sentir meio sem forças foi que permiti me apaixonar novamente. Acho que foi isso mesmo, uma tentativa de uma vida melhor, uma recarga de energia em potencial, chamada amor. Jamais poderei dizer que me arrependo de ter te amado.

;Durante algum tempo, você, uma simples mulher, minha mestra, me ensinou mais do que aprendi em toda minha vida. O amor não é feito para aprisionar as pessoas. Amar é construir, só ou em conjunto, uma edificação sólida de sustentação eterna.

;Meu castelo estou tentando construir, e quis você dentro dele. Mas não foi isso que você me respondeu. Nem assim, chego a guardar rancor. Quem ama perdoa a cada instante, a cada momento, a cada ação. E por te amar, fui forçado por você mesma a tomar mais uma difícil decisão, que como muitas outras já tomadas, é também contra a minha vontade tenho que te deixar livre como um pássaro.

;Se algum dia esse pássaro, que é você, resolver voltar da longa imigração, e se por acaso pousar de novo em meu caminho, quero te dizer que ficarei feliz novamente. Não que eu esteja infeliz agora. Um pouco chateado, confesso. Desanimado, de tentar em vão despertar o seu amor por mim.

;Tudo em vão coisa nenhuma.

;Por mais simplório que tenha sido nosso encontro, não foi de total desgraça. Momentos felizes tivemos, instantes raros de puro respeito, e disso não vou mais esquecer. Quero você em meu caminho, mas não quero interferir em teu caminho. Faça o que você tem que fazer. Rasgue a tua seda de uma vez por todas, como eu fiz com a minha. Leia estas linhas que escrevo com o coração aberto e sinta que não são palavras de despedida final, mas de um novo começo, embora cada um de nós em um novo caminho. E que esse seu novo começo seja tranqüilo, harmonioso e apaixonante. Você merece, assim como eu, encontrar alguém que de verdade seja uma pessoa decente para se manter um relacionamento vivo e animado. Sem dor, sem rancor, sem ódio. Desejo apenas que o amor que nasceu em mim nestes poucos dias possa te contagiar também, nem que seja apenas para ter teu respeito eterno. Isso já seria mais do que o suficiente para mim, pois nunca pedi nada em troca, nunca , nada...

;Com lágrimas nos olhos, molho o teclado desta fria máquina que não sente emoção nem prazer, apenas calcula. Não vivo mais para calcular, apenas para sentir emoções, e quanto mais fortes elas forem, maior a lição que aprendo e maior o meu crescimento. Nunca mais eu fugi de algo que precisasse ser resolvido. Enfrento. Duramente me marco. Enfrente você também o teu calvário e siga direto pelo teu destino sem se deixar desviar por ambulantes e transeuntes que só passam sem nada a nos oferecer. Siga meu exemplo e enfrente a tua realidade que não sei qual é, mas seja forte, não deixe que te dominem, não deixe que amordacem tua boca., pois dela poderão sair palavras salvadoras para teu espírito. Se você mesma não se ajudar, ninguém poderá fazê-lo. Eu tentei e não consegui. Mais lágrimas rolam pelo meu rosto, não de dor, nem de desprezo, apenas de amor, e se amo, não nego nem a mim, nem a quem amo. Por que você não deixa que flua dentro de ti algo que, com certeza, depois que brota jamais poderá dizer que se arrependeu? Receba esta carta com meu amor junto, e quando estiver sozinha em algum canto, prestes a cometer uma besteira qualquer, que Deus te proteja para que isso jamais aconteça. Pense nesta carta, e em mim. Assim poderá saber que mesmo não tendo amado e me correspondido sentimentalmente como eu gostaria que fosse, sempre vai existir alguém no mundo que te amou, ama e amará. E se isso já aconteceu com você, pode ter a certeza de que já valeu a pena ter vivido, por mais difícil que possa ser uma passagem nesta adorável vida sofrida, mas adorável.

;Que graça teria se fosse tudo um mar de rosas? Com quem eu iria me preocupar? Ainda bem que não é bem assim! Estou hoje em um estágio que não sei qual é, mas a tua presença, miúda e tímida, em minha adorável vida eterna serviu-me de um aprendizado, conforme já lhe disse anteriormente. Se um dia qualquer destes eu estiver à toa, pode ter a certeza que estarei pensando em ti. Não que só faça isso quando estou assim, mas por que meus pensamentos ultimamente têm sido todos para você. Se sentir saudades, ligue, procure-me, eu vou adorar ouvir a tua voz de novo. Mas acho que você nunca mais ira olhar para mim de novo, e sorrir para mim como sorriu nestas quatro semanas que gostaria que fossem intermináveis, mas não foi assim. O destino nos prega peças que nem imaginamos. Se não posso tê-la é por que de alguma forma não fiz por merecer isso. Te conheci e não me arrependo. Só gostaria que tivesse sido bem diferente. Talvez eu tenha sido precipitado. Se não tivesse me confessado. Se não tivesse te pressionado, se não, se não, sempre o se não.

;Mas agora parece ser muito tarde para lamentar erros cometidos no passado. E, graças a Deus, ainda os cometo. Só assim prossigo aprendendo. O que deveria ser apenas uma carta de despedida simbólica está por virar mais um livro, se assim me permitir. Vai virar, vale a pena! É amor, e amor não pode ser esquecido. Me perdoe pelo mal jeito, me perdoe pelo que fiz, me perdoe pelo que não tentei e finalmente me perdoe por não ser o que você esperava. Mas a vida é sempre assim. Nunca está tudo exatamente como gostaríamos que estivesse.

;Quero parar de escrever esta carta para colocar um ponto final nesta curta, emocionante, mas não triste história. Mas não consigo por saber que quando você terminar de ler, estará realmente tudo acabado entre nós. Por isso eu não consigo parar de escrever, mas preciso. Mais uma decisão difícil! Então, sem mais para o momento, quero te dizer que ainda e sempre te amarei, adorarei e respeitarei, eternamente. Sabe o que mais? Daqui a alguns anos, quando já maduros, eu e você, com muita certeza nos encontraremos de novo, e você mulher, mais bela do que nunca, me dirá com um sorriso nos lábios e de coração que tudo isso que aconteceu foi só uma grande e tola besteira, que ainda não estávamos prontos um para o outro e por isso não aconteceu. Eu também vou sorrir para você e dizer que fui muito afoito. Novos sorrisos e novos amores estarão acontecendo. Mais forte, mais intenso, mais real do que nunca. A eternidade é pouco para me reencontrar com você, mas isso não significa que estou eternamente em estado de “apaixonite aguda”. Eu supero! Mas gostaria que fosse diferente.

;Se pelo menos eu pudesse sentir o gosto da tua carne já me daria por satisfeito. Se eu ao menos, uma única vez, tivesse a certeza de que você se sente realmente bem perto de mim, já seria a glória. Se ao menos um instante eu tivesse um beijo caloroso e delirante, eu seria, pelo menos por um instante, um homem feliz. Felicidade não se acha, somos nós quem a buscamos para nós mesmos. Ser feliz é um estado de espírito, um momento, um instante apenas, mas mesmo assim vale a pena. Gostaria de poder levar de você uma recordação eterna que me trouxesse extrema felicidade, mas acho que não vou levar nada mesmo, só lembranças, embora as mais marcantes tenham sido as recordações de nossos últimos momentos, quando você me forçou a isso. Que pena, que pena! Lamentar não adianta nada. Ações resolvem situações diversas, mas é preciso ter coragem para tomá-las. E você, está fugindo de mim? Está fugindo da verdade que te disse? Se esconder atrás de um altruísmo próprio, e fazer coisas que não vão machucar as pessoas pode ser um belo disfarce para evitar uma grande decepção amorosa. Você tem medo de mim, do meu amor e da minha loucura. (Que aqui fique registrado que a loucura a que me refiro, é relativa a forma como aconteceu, rápido e sem explicação). Assim devo concluir que nunca percebi uma mulher tão apaixonada e tão resistente ao amor. Eu nunca conheci uma mulher que me beijasse como você me beija e ao mesmo tempo dissesse que queria ir embora. Eu nunca conheci ninguém que me olhasse tanto tempo no fundo dos olhos como você me olha para dizer que não gosta, que não quer. Daí, a minha confusão, o meu não entendimento. Parece que não está acontecendo, mas está. Que droga, que droga! Demora tanto tempo para acontecer e quando finalmente acontece, era só um alarme falso.

;Um dia eu sei que a felicidade baterá em minha porta, e quem sabe não será você arrependida? Se for, ah se for... Mas será que o que você diz é realmente o que você quer? Acho que não, acho que o que você diz é apenas mais uma decisão difícil de ser tomada para você também, mas que julga ser necessária. Julgamento errado. Só o que te peço é um carinho por dia, uma palavra de respeito, só isso! Será que isso é pedir muito? Nunca tive grande coisa, e parece que desta vez também não terei, mas sinto necessidade de ter um amor, um carinho. Alguém que em uma noite fria pudesse encostar em meu corpo e aquecer minha alma, alguém com quem eu pudesse trocar uma palavra em momentos difíceis. Só isso que quero e que te peço. Será que é pedir muito? Se for, me desculpe pelo atrevimento, mas tenho que tentar mais alguma coisa. Desistir também é uma forma de fugir, e isso eu não faço. Enquanto eu perceber que existe um sopro possível, estarei tentando. Por isso peço que pense mais a respeito e não tome uma atitude que possa se arrepender mais tarde. Serão duas pessoas machucadas. Melhor se for ninguém. Não posso permitir que você tome uma decisão e que mais tarde possa se arrepender. Isso eu não quero! O que quero é só um pouco mais de atenção. Quantas horas desperdiçadas pensando em um dia poder encontrar alguém que fosse como eu preciso: carinhosa, bela de alma e respeitosa. Aparece você e pronto, tudo e nada. Nada de me encontrar, tudo a perder. Mágoas não ficarão, mas sei que esta pode ser a última palavra entre nós dois. Reconsidere, eu apelo por isso, teus pensamentos, teus instintos. Pense melhor, veja o que você tem a perder?

; Já se envolveu. Já permitiu que eu estivesse mais próximo de você, mas não quer assumir isso. Continua com medo. E fico a pensar que mesmo assim ainda vale a pena tentar, vale mesmo! Ainda sopro, ofegante, por um pouco de vida. Viva comigo mais alguns instantes. Viva comigo e prometo que não vai se arrepender. Viva só uma vez em toda a sua vida, mas viva! Seja você mesma e não pense que vai me magoar, que não vai. Atrapalhe o nosso estarmos juntos, seja lá de que forma for que esteja pensando neste “estar junto”. Vai acabar mesmo virando livro, com certeza, vai virar mais um. Pense em mim, nas palavras que te disse, mas pense em você também e ,principalmente, em nós. Tenho certeza que se eu não tivesse dito que te amo, hoje estaria tudo muito bem, sem problemas. Mas pintou sentimento e você fugiu. Foges do amor, foges de ti mesma. Continue a fugir e será uma eterna fugitiva do destino, esse mesmo destino que nos aproximou por alguma razão que não sei ainda qual foi. Quero ainda mais te dizer, que se foges eternamente das coisas que aparecem em tua vida, que aparentemente podem ser boas mas que necessitam de uma certa dose de coragem para descobrir, estarás eternamente fugindo de ti mesma. “Só espero estar fazendo a coisa certa” foi o que escutei de você, ontem. Mas a vida não é uma expressão matemática que tem sempre um resultado exato. Não é assim, não.

;Durante a minha existência, medíocre e sofrida cometi muitos erros, e pensava sempre em tomar decisões para não errar, errando cada vez mais. Resolvi que já era hora de parar de tentar acertar. Em vez disso o que fiz foi experimentar, e uma revolução aconteceu. Finalmente estava vivendo, vivendo como sempre quis, sem me preocupar, sem compromissos ásperos, e estava vivendo. Você quer viver? Quem quer conseguir alcançar o degrau que eu alcancei tem que se propor ao erro, e errar é a forma mais sublime que conheci de humildade e de saber que realmente não sou ninguém e que quem manda é o Pai lá de cima. Errei muito e não me preocupo mais com isso. Tento todos os dias acertar, mas á única forma que descobri de acertar é tentar. Se errar, errei. Se acertar, aprendi. E assim eu vou, eternamente na busca de uma sabedoria maior, de uma nova vida, de um novo horizonte. Quer acertar? Então tem que tentar, seja lá o que for, tem que tentar. A vida é uma prova onde, quando somos encaminhados para um plano superior e ficamos a mercê de espíritos de luz, somos julgados por nossas ações. Quem errou muito, mas errou tentando acertar, tem um lugar melhor na explanada das nuvens do que quem não tentou, não fez, não errou. O número de erros e acertos não importa muito, o que importa é o motivo que nos levou ao erro. E se amar é errar, eu sou um navegante errante deste universo, onde a minha morada momentânea é esta esfera onde nos encontramos. Tenha coragem não só de tomar atitudes, mas de errar também. Eu sempre dou a cara para bater, só assim eu aprendo. Quer tentar errar? Quer ser feliz? Então tem que tentar. Tente! Espero que eu esteja te esclarecendo sobre várias coisas. Assim espero. Mas depende agora só de você. Eu estou pronto, já fiz o meu julgamento a teu respeito, e percebi que vale a pena tentar. Você é uma mulher que encanta e que esse encanto está na sua simplicidade, no seu modo de ser. Não tem vícios, não é mal educada, sempre bem humorada, embora às vezes um pouco séria demais para o meu gosto, mas eu gosto é assim mesmo.

;Agora pergunto a você: e eu? O que você viu de bom em mim? Será que nada disso vale a pena tentar, será que sou tão ruim assim que não vai valer a pena de repente cair em erro? Será que não viu nada de admirável em mim? Será que sou tão desprezível assim? Eu sei a resposta e não preciso te dizer qual é, você sabe também, e será que tudo isso não faz valer a pena tentar cair em um delicioso erro? E se não for um erro? E se for um acerto?

;O resultado será felicidade! Mas quem pode dizer? Eu e você apenas, se tentarmos, se quisermos, se permitirmos. Será que você já havia olhado para este lado da moeda? Acho que não. Amor é muito complexo para ser definido em poucas palavras, em poucos pensamentos. Em se tratando de vidas humanas existem muitos aspectos que temos que considerar, e muitos deles você omitiu, por desconhecer ou por esquecer que eles existem. Ao que mais próximo a tua decisão poderá levar é a mais um erro, e erros cometemos todos os dias. Então por que não permitir a você mesma, pelo menos uma vez, acertar? O erro ainda pode ser da minha parte, mas ainda não cheguei a esta conclusão. Espero que não seja. Tenho olhado para você e para o nosso caso de várias maneiras possíveis e ainda não encontrei todas as possibilidades. Já que não consigo entender e conhecer todas as probabilidades, eu não posso tomar nenhuma decisão. Por isso, se não sei o que fazer, o que eu sempre faço é não fazer nada, e é isso que estou fazendo com você: nada! Deixando como está para ver como é que fica. Mas você está forçando a barra. Viva! Deixe viver. Errar, acertar, errar de novo e só assim caminhamos em direção a alguma coisa que queremos, que procuramos.

;Um outro dia, pelo telefone, você me disse que o que procura é o amor, mas parece que ao mesmo tempo que procura, quando acha tem medo. Lembra a fitinha no braço? Quais foram os seus pedidos mais sinceros? Não coincidem com os que você argumentou para me deixar aqui em prantos. Se não me ama não tem problema, mas não arrume desculpas. Um dia diz que gosta de estar em minha presença e depois em seguida diz que não. Menina, não faça isso comigo. Deixe-me, se quiser, mas não deixe de tentar conhecer o amor, o meu amor, o que quero te dar e você bateu com uma porta em minha cara. Quem não quer compromisso não faz os pedidos que você fez para a fitinha no braço. Será que eu sou o erro nesta história toda? Acho que não, ninguém é tão desprezível assim para ser um erro na vida de alguém. Coloque tudo em uma balança, veja o que te ofereço. E o melhor disso é que você já me conhece, sabe da minha moral, da minha ética e do meu respeito pela vida e pelas pessoas. Faça seu próprio julgamento e veja se pelo menos existe uma pequena e íntima possibilidade de acerto. Se houver, por menor que seja, não desperdice, você tem que descobrir. Se não o fizer, será uma mulher que nunca mais saberá da verdade em nosso caso.

;Escrever, escrever e escrever, só o que me resta! Vai mesmo virar livro. Se vai! Mas dessa forma como vão acontecendo as coisas, eu ainda não sei como vai terminar, e só você pode me dizer isso agora. Querer alguma coisa não basta. Ficar em dúvida é coisa de pessoas que realmente não sabem o que querem, mas eu sei o que eu quero e luto por isso, não a qualquer preço, mas dentro das possibilidades. Você quer? Tem que lutar! Senão não consegue jamais. Mais alguns dias talvez sejam necessários para se ter uma resposta em quase definitivo. As vezes ficamos muitos anos ao lado de uma pessoa e depois descobrimos que não era nada daquilo, mas nem por isso eu desisti de procurar, e de tanto querer, encontrei. Não faz mal se não sou correspondido. O que vale é se eu acertei ou errei, e de qualquer forma que termine, tenho a certeza de que acertei, pois, mais uma amiga ganhei. Assim espero. Chega, já disse quase tudo o que queria, e só falta você ler... Só ficou faltando te dizer uma coisa: Você já pensou que eu posso ser o amor da tua fitinha, já que não quer que eu seja o da sua vida? A oportunidade sempre bate na porta de todos, mas a diferença entre uns e outros é que uns tem mais coragem de errar e outros não. Quem pode saber? Essa é a razão da vida! Somos nós quem temos que descobrir nossos caminhos. Às vezes acertamos, outras vezes erramos, mas sempre temos que seguir em frente. Esse é o caminho. Você vai tentar acertar? Ou será que prefere nem se submeter a mais esta prova? Não fuja, tenha coragem. Eu te compreendo mais do que você imagina. Um beijo carinhoso de um amigo que sempre estará disposto a estender a mão para você. Foi bom, muito bom. Nunca mais vou te esquecer...”


 

 

3. Caso Esmeralda

 

 

3.1. O dia do Pizza

 

Andava por entre ruas, avenidas, sem rumo certo. Ao dobrar uma esquina, deparei-me com uma transeunte que parecia atirar-se na frente de meu veículo. Muita pressa aparentava. Porém, notei em seus olhinhos castanhos claros e brilhantes, um olhar de pureza e ingenuidade.

;Freei bruscamente e saí do carro para socorrê-la. Meio assustado, acho que mais eu do que a bela moça, percebi que não havia acontecido nada de grave. Meu veículo, para sorte de ambos, mal havia tocado em suas pernas finas e bem torneadas.

;Perguntei se estava tudo bem, e me respondeu que estava. Sentia-me um perfeito idiota e, querendo agradá-la, passei meu telefone.

;Um sorriso largo surgiu em seu rosto, mas não disse nada. Não parecia ser do tipo de mulher que vai logo ligando para qualquer um. E senti que não telefonaria. Estava surgindo em mim. Uma estranha vontade em ter aquela mulher ao meu lado.

;Preocupado com o seu estado emocional, resolvi levá-la para casa. Estava tremula, o susto havia sido grande, mas graças a Deus, não aconteceu nada de mais grave.

;Aceitou a carona. Na verdade estava meio zonza e parecia não estar muito consciente do que acontecia. Falava sem parar, algo que parecia ser de muita importância. Algo sobre mim. Falava meio que inconsciente, isso percebia, mas falava sem parar. Contava sobre coisas que aconteceriam comigo mais para frente. Me traçava um futuro e dizia, dia a dia, o que me esperava. Bela mulher. Uma universitária, da minha idade. Descobri entre tantas outras coisas, que tinha uma filha e estava separada do marido. Não resisti, a convidei para sairmos juntos, aceitou. Poderia ser aquela mulher a minha fada? Teria encontrado?

;Morava em um apartamento com sua filha, e como estudava à noite, deixava a menina na casa da mãe. E a maioria das noites dormia lá também. Só ficava em seu apartamento nos finais de semana.

;Nos encontramos algumas vezes sem muito compromisso. Mas uma noite tocou o telefone em casa. Era Esmeralda. Me dizia que teria prova na primeira aula, que depois estava dispensada e poderíamos nos encontrar. Aceitei a proposta. Papo vai, papo vem, fomos parar em seu apartamento. Uma noite deliciosa, e já era meio tarde quando percebemos que tínhamos que ir embora.

;Esmeralda, tipo de mulher extremamente fiel. Com horários rígidos, jamais se atrasava para compromissos. Sua vida era toda certinha. Hora para chegar, hora para sair, parecia ter um relógio em sua cabeça. E foi justamente aí neste aspecto que as coisas acabaram dando errado. Durante um ano e meio de faculdade nunca havia atrasado a hora de chegar em casa. Sempre a esperavam no mesmo horário: uma irmã, pai e mãe. Era de família importante na cidade e tinha lá seus encantos na sociedade local, mas nada sério, pois não se prendia muito a coisas materiais.

;Mas naquela noite, ao levá-la para casa, ao dobrar a esquina da sua mansão, vimos uma viatura da polícia militar parada em frente a sua residência.. Tomou um susto e mandou que parasse o carro. Parei, me disse: “Nossa, o que será que aconteceu? Bem, vamos dizer a todos que estávamos comendo uma pizza”. Segui com o carro lentamente. O camburão da polícia saiu em disparada, e ao me aproximar da casa, vi sua irmã chorando nos braços de sua mãe. Seu pai estava em estado de desespero, parecia. Desceu do carro, e foi correndo para junto da mãe para tomar conhecimento do que havia acontecido. Foi um susto para mim quando todos em um delírio coletivo, gritavam o nome dela e diziam: “Você graças a Deus está viva, está viva”. Só aí eu percebi o que estava acontecendo. Como se atrasou por uma hora e meia, pensaram que tinha sido raptada. E deram um verdadeiro show na porta da casa. Que família mais maluca! Achei que estava frito. Que confusão por nada! Até polícia metida no meio. E se estivessem agora atrás de mim? Quando conseguiu explicar o que tinha acontecido, e que estava apenas comendo uma pizza comigo, foi que eles notaram que estava ali também. Correram todos em minha direção, pensei que iria tomar uma surra, mas em vez disso, agradeciam por eu ter levado Esmeralda para casa. Pediam desculpas pelo ocorrido e me interrogavam sem parar. Eu parecia uma barata tonta, não sabia o que pensar, e nem muito menos o que responder. Com a cara mais assustada do que a deles, acabei ficando quieto, não dei muitas explicações. O cômico de tudo isso foi ver todos chorarem, inclusive a moça da faculdade que estava comigo, só porque havia se atrasado um pouco. Que confusão! Mas depois deste incidente, onde fui apresentado sutilmente para a sua família, fiquei com o apelido de “Pizza”. E era assim que eles me chamavam.


 

 

3.2. Pequenas mentiras, grandes verdades.

 

Depois do incidente do “Pizza”, fiquei pensando na mentira que tinha sido contada a todos. Não fazia muito o meu estilo falar mentiras, não gostava, mas já havia acontecido.

;Por mais de uma dezena de vezes eu a peguei em mentirinhas por todos os lados. Isso me incomodava e achava que uma fada não deveria sair mentindo assim.

;A Esmeralda era uma mulher super dotada, exatamente como eu queria. Parecia poder prever o futuro. Dava sempre instruções de como agir, e eu, fielmente seguia suas instruções. Mas algo parecia estar errado. Tomava conta totalmente da minha vida, dizia a hora e dia que nos veríamos, o que faríamos e onde iríamos. No começo, até que estava gostando de tudo aquilo, mas, parecia ter algo de errado. Ainda não sabia bem o que era, mas estava por descobrir.

;A minha fada, a Esmeralda, era uma mulher sem igual. Parecia não ter defeitos, sabia de tudo, conhecia todo mundo, sempre com respostas para todas as perguntas, mulher de caráter e firmeza de pensamento. Existia um ponto, porém, que não me deixava muito à vontade. Era a sua filhinha. A Érika era uma menina extremamente feliz e cheia de vida, porém, com muito ciúmes da mãe.

;Quando estávamos juntos, eu e a Esmeralda, na presença da Érika, tínhamos que fingir que éramos apenas amigos, e era assim que a Érika me via. Uma criança adorável, que sentia muito prazer em estar ao meu lado e transmitia isso. Aos poucos passou a ficar agressiva com a mãe, na minha presença. Acho que por medo de perdê-la, ou que eu fosse tomar o lugar do seu pai, já que ainda era vivo naquela época. Mas o principal fato que nos levou a um distanciamento foi a falta de carinho, pois tínhamos que a todo instante nos fingirmos de amiguinhos por causa da Érika. E isso foi fazendo com que uma separação crescesse entre nós. Embora sem percebermos, crescia a cada dia.

;Desde o começo, por causa das pequenas mentiras e por causa da Érika, e do nosso próprio comportamento, eu sentia que as coisas não iriam dar certo por muito tempo, mas enfim, eu estava com a minha fada finalmente.

;Mas este “estar com minha fada”, me chateava de verdade. De repente, tinha perdido a minha liberdade, não tinha mais opinião própria, e a cada dia eu estava mais dependente da Esmeralda para tomar as minhas decisões. Estava era ficando sem identidade própria, sem vontade. Um homem dominado, totalmente.

;E uma outra coisa acontecia, a Érika. Eu percebia que o nosso relacionamento ficava saturado por causa da menina. A Érika se transformava na minha presença, não me agredia, mas a Esmeralda era quem sofria as conseqüências. Em uma noite, depois do jantar em seu apartamento, a menina foi dormir cedo e ficamos a conversar no sofá da sala. Eu falava que não estava me sentido bem com aquela situação, e apesar de não ouvir o contrario sentia que era um silêncio de concordância. Acho que nem eu e nem Esmeralda estávamos mais suportando tudo aquilo. Resolvemos em uma conversa franca e de muita amizade, que seria melhor me afastar para ver se o conflito entre mãe e filha diminuía. Embora gostasse demais da Esmeralda, percebia que um futuro por ali seria muito complicado, e não era bem isso que desejava. Acho que nem a Esmeralda. Bem, resumindo, resolvemos que deveríamos nos separar. E assim foi feito.

;Naquela mesma noite não dormi, sentia um aperto no coração, mas fui firme. Tanto tempo querendo uma fada, e no final das contas, não era nada daquilo. Estava saturado de misticismo e de coisas do além. Só queria alguém agora bem normal, sem poderes especiais. Uma pessoa que não pudesse ver o que iria acontecer mais para a frente. Alguém igual a todo mundo. Não queria mais uma fada. Fadas são coisas de contos. Está certo que encontrei algo bem parecido, mas perdi toda a minha liberdade. Nada mais decidia, e não era isso que queria para mim.

;A Esmeralda era uma mulher muito especial mesmo, não se deixava abalar por nada. Uma tarde fomos até a minha casa. Assim que entrei na sala, vi o display da secretária eletrônica marcando que havia uma mensagem. Apertei o botão e escutei o seguinte: “Oi amor, por que é que você ainda não veio hoje? Estou te esperando, te amo, te adoro, morrendo de saudades, um beijo. Assim que chegar liga para o seu amorzinho. Um beijo, te amo.” A minha sorte era que já havia comentado com a Esmeralda que estavam ligando lá para casa e deixando esse tipo de recado. Escutou assustada. Não comentou nada, mas senti que ficou meio abalada, embora não demostrasse. Expliquei que não sabia quem era a cretina que estava deixando aquele tipo de recado para mim. Aparentemente acreditou, e realmente eu não tinha a menor idéia de quem poderia estar fazendo aquilo. Assim, o incidente ficou por uns tempos esquecido, inclusive por mim.


 

 

3.3. O clube do cachorrão

 

A separação entre mim e Esmeralda aconteceu em uma sexta feira. Por força do destino, alguém lá em cima não quis que eu ficasse um único dia sozinho e providenciou algo muito estranho.

;No sábado à tarde, só em minha casa, pensava na Esmeralda, mas sabia que não mais teria retorno. Sem muito o que fazer, e a verdade era que não iria fazer nada mesmo naquele final de semana, olhei para a estante de livros. Avistei um exemplar que falava sobre a força do pensamento. Interessante livro, e lembrei que uma amiga, a Walkíria, havia comentado e demonstrado um certo interesse pelo assunto. Fiquei de emprestar o livro, mas nunca lembrava de fazê-lo. E por que não hoje? Passei a mão no telefone e entrei em contato.

;Já a conhecia há mais de dois anos, mas nunca havia surgido nada entre nós, além, é claro, de uma trombada. Apenas conversas profissionais e nada mais. Bem, estranhamente sem que percebesse e sem que me convidasse, como em um passe de mágica, acabamos por marcar um encontro em minha casa para discutirmos o assunto do livro. E até então era apenas o que eu pensava que iria acontecer. Na hora marcada fui buscá-la. A verdade era que algum tempo atrás havia sonhado com a Walkíria por umas duas noites. E as duas vezes nós estávamos conversando muito. Não sei do que falávamos, mas parecia não ser coisa ruim. Chegando em casa, eu e Walkíria, sem muito jeito para iniciar um papo, estávamos meio tímidos e conversamos um longo tempo sobre coisas corriqueiras.

;Pensando bem, essa era exatamente a mulher que eu estava querendo. Normal em todos os sentidos. Não via o futuro, nem sabia de coisa alguma muito profundamente. Bem do jeitinho que eu queria. Nada de fada, apenas uma mulher. Conforme conversávamos o interesse ia crescendo, até que não resisti e resolvi beijá-la. Não me arrependi e, desse dia em diante, começamos um namoro.

;Eu, apesar de contente de estar com a Walkíria agora, sentia-me muito mal com tudo aquilo. Quem iria acreditar que eu me separei da Esmeralda em uma sexta-feira e conheci a Walkíria no sábado seguinte? Não havia passado nem vinte e quatro horas de luto, e já de novo na ativa. Com quem mais poderia ter acontecido isso? Ninguém em sã consciência acreditaria nessa história, e esse era o maior problema, pois, nem a Esmeralda, quando ficasse sabendo, acreditaria. E tinha que contar, antes dela saber pela boca de terceiros. Mas como? Jamais acreditaria em mim. Nem mesmo os meus amigos estavam acreditando no que tinha acontecido. Confusão total. Mas dando tempo ao tempo, quem sabe não seria tudo resolvido?

;Pois bem, em uma noite, depois de mais ou menos um mês de ter acontecido a minha separação, a Esmeralda telefonou e pediu que eu fosse até seu apartamento para dar um jeito no computador, que estava com problemas. Lá fui eu. Muito bem recebido, um chá estava servido na mesa, sentei e conversamos. Foi então que aconteceu. Contei apenas que havia conhecido alguém. Pronto, me odiou por dentro. Achava que eu a tinha trocado pela outra. Escutei o diabo dela, e por mais que me esforçasse, não consegui fazer com que entendesse o que tinha acontecido. A primeira coisa que falou, abrindo o seu vasto repertório de pura emoção para cima de mim foi: “Aquele telefonema, eu sabia! Você esteve com duas mulheres ao mesmo tempo!” E isso nunca foi verdade, por uma questão de horas, concordo, mas não era verdade. Situação incomoda aquela. Saí de seu apartamento meio de rabo entre as pernas e me dirigi para o apartamento de um amigo, o Tenório, que estava a minha espera com o Sigmund.

;Pronto! Estava com uma cara que nem eu acreditava. Nunca tinha passado por aquilo, e agora, justamente sem ter feito nada de errado, estava ferrado. Ninguém iria acreditar. Contei a eles, e realmente não acreditaram. Aproveitaram a situação para me rebaixar um pouco mais, embora que meio na brincadeira. Estava formado o clube do cachorrão, onde eu fui colocado como tesoureiro, o Tenório como Presidente e o Sigmund como Office Dog.

;Divertido, mas ...


 

 

3.4. A mulher do PUM

 

A Esmeralda quando criança, tinha um probleminha. Formação de gases. As crianças na escola a chamavam de bruxa, pois quando andava pelos corredores dizia: “Fulana vai escorregar agora” e fulana escorregava. Nunca entendi direito o que era que acontecia se adivinhava o futuro ou se jogava uma praga e acabava acontecendo.

;Mas o interessante era que bastava ficar nervosa para que gases de fedor insuportável começassem a se formar em seu intestino.

;A criançada as vezes a provocava na hora do recreio, e quando entrava para a sala de aula, pronto, ninguém mais a suportava. Era um pum atrás do outro e de um cheiro incrivelmente forte e desagradável.

;Um ambiente fechado, cheirando a pum, era triste de ser suportado, porém tinha que ser.

;Parecia se divertir com aquilo. Talvez fizesse de propósito. Talvez apenas uma reação emocional, mas o fato era que nem os professores agüentavam mais.

;Em dias de provas, a garotada, sabendo do probleminha dela, a usavam. A irritavam e depois ninguém conseguia ficar na sala. Daí, a prova era realizada dentro de uma confusão generalizada.

;Apesar de seus poderes especiais, a Esmeralda quando pequena não sabia usá-los muito bem, era extremamente tímida. Uma garota bonita, muito simpática, mas quando ficava nervosa, puns e mais puns a todo instante. Uma vez em seu apartamento, lembro bem, comemos uma pizza, e depois fiquei meio enfastiado. Virou-se e disse que precisava ir para um lugar ao ar livre. Descemos até um pátio grande, lá eram puns e mais puns que saiam uns atrás dos outros, e ria dizendo, “foi assimilação, esses gases eram seus.” E ria.

; A verdade era que eu estava me sentindo melhor a cada pum que a Esmeralda soltava. Meio desagradável, mas verdadeiro. Assim foi a menina do pum na escola.


 

 

4. Testamento.

 

Caros amigos e amigas. Se estão agora diante de meu advogado, é por que eu não mais faço parte deste mundo.

;Embora durante toda a minha existência eu tivesse uma vida bastante interessante, não me foi dado o direito de acumular uma fortuna inestimável, porém, o que tenho de mais precioso é o que vou deixar a vocês. Tratasse não de dinheiro ou de bens materiais, mas sim de uma coisa que ganhei ha muito tempo de um senhor chamado Amaro, e que nunca tive coragem de usar. Para dizer a verdade, o Sr. Amaro, também não.

;Talvez vocês que agora receberão este presente tenham mais capacidade do que eu. Talvez, mas apenas talvez.

;Deitado aqui em meu leito de morte, e eternamente em estado de sentinela, passo a não mais poder me expressar diretamente a vocês, e por isso, instituí este testamento.

;Espero que respeitem a minha vontade e saibam fazer bom uso de tudo que receberem, pois são coisa valiosas, não para este mundo, mas de grande utilidade se souberem usar e se tiverem capacidade para isso.

;Bem, as minhas posses se resumem em dois objetos de inestimável valor para mim, e que gostaria que fossem guardados com a mais elevada estima.

;Trata-se de um pote do tamanho de um pote de margarina que, segundo estudiosos, contém o último sopro de vida de um santo homem que viveu ha mais de cem anos isolado nas montanhas. E o segundo objeto, é uma estrela de cinco pontas em material desconhecido, que deve sempre ser usado junto ao peito para que tenha seu efeito garantido.

;O primeiro objeto, deixo para a Esmeralda e o segundo, para a Walkíria.

;Assim que minha vontade for satisfeita, e se for de concordância para ambas, elas devem ser as novas zeladoras dessas preciosidades que nunca usei e não sei nem para que servem.

;Desejo a todos muitas felicidades e que me deixem finalmente descansar em paz.


 

 

5. Caso Darlin

 

 

5.1. Uma sonda espacial

 

Era manhã de natal. Deitado em minha cama, meio enjoado pela misturada de comidas e bebidas da noite anterior, eu não me sentia muito bem. Deveria ser umas 8 horas, quando algo de inusitado aconteceu em meu quarto.

;Transpondo a janela, como se não existisse, o que parecia ser uma sonda do tamanho de um tubo de desodorante, de cor metálica e cheia de anteninhas, entrou pelo ambiente. Circundava de um lado para o outro. Era estranho aquele objeto. Sobrevoava todo o quarto e em meu redor, especialmente. Não sentia medo, mas sabia que aquilo não era uma coisa deste mundo, mas o que poderia ser, eu não sei.

;Para meu espanto ainda maior, não é que o teto do meu quarto se abriu e pude ver uma enorme nave parada bem em cima da minha casa?

;A sonda, que parecia pertencer àquela nave, ia de um lado para o outro, como se procurasse por alguma coisa. A porta do guarda roupa estava aberta, e vi o estranho objeto entrar. Parou bem em cima de uma caixa em que eu guardava umas tranqueiras velhas, uma estrela e um pote de barro velho. Parecia se interessar por aquilo, mas não sei dizer ao certo o que fazia lá.

;Sem mais explicação alguma, simplesmente subiu em direção ao teto e desapareceu dentro da nave. Acho que eu estava em transe, e estava sendo aberto um portal dimensional, por onde eu podia ver o que acontecia fora da casa. Estranho, mas aconteceu de verdade.

;Depois disso, passaram-se alguns dias e um outro fato insólito aconteceu.

;Novamente um portal apareceu no teto do meu quarto, onde eu podia ver o que estava acontecendo do lado de fora. Uma nave em tom azul claro apareceu, e sobrevoava a minha casa. Parecia não ser muito grande, e realmente não era. Entrou pelo meu quarto e foi direto ao guarda roupa. A porta abriu sozinha e vi a nave jogar algo como se fossem estrelinhas douradas em cima da minha caixa de objetos inúteis. O pote de barro e a estrela. Não sei o que faziam, mas não me atrevi a perguntar. A nave partiu e minha vida voltou mais ou menos ao normal, pois no porta-trecos eu não mexia mais. Eu heim!!!!


 

 

5.2. Quem sou eu? Em quantos sou?

 

Não andava me sentindo muito bem. Sei lá o que estava acontecendo, mas um mal rodeava o meu ser. Resolvi que uma volta em um parque qualquer da cidade, um pouco de exercício e ar puro poderia me fazer bem. E foi o que fiz.

;Caminhei alguns minutos, mas sentia-me cansado. Resolvi sentar em um banco para descansar um pouco e adormeci.

;Que sensação mais estranha estava acontecendo comigo! Parecia estar me desprendendo do corpo. Não sentia mais meu coração e nem parecia respirar. Não sentia falta de ar e o mal estar passou como num passe de mágica.

;Comecei a levitar para fora do meu corpo. Era estranho! Eu via o meu corpo lá embaixo aparentemente dormindo no banco da praça. Mas não era eu que estava lá, eu estava era lá em cima. Coisa engraçada, mas, mais engraçado ainda, ficou quando eu vi um terceiro eu saindo de dentro de mim mesmo. Impossível! Aturar um já era difícil, dois então, nem pensar. Mas, três? Quem era aquele sujeito que estava dentro do meu corpo e que se parecia tanto comigo? Pensei que poderia ser meu espírito. Mas então quem era eu? Eu estava levitando pelos céus e os dois “eus” lá embaixo, um rolando para dentro do outro. “Um fantasma” pensei. Mas, então eu era um fantasma agora! Eu, quem afinal de contas? Ria, e me divertia com toda aquela situação. Flutuava e ao mesmo tempo rolava de dentro para fora de meu corpo, e meu corpo lá imóvel. Credo. Quem era eu afinal de contas?

;Nisso, uma janela abriu bem diante do banco. Senti-me forçado a sentar nele, ao lado do meu corpo, e como em uma televisão, minha vida começou a passar. Que cena mais interessante. Eu deveria ter uns sete ou oito anos. Estava em uma sala de uma casa simples. Uma música daquela época tocava alto. As pessoas dançavam, mas em um canto da sala havia uma garota bem feinha e bem gordinha. Vi uns garotos formarem uma rodinha. Falavam algo que não podia escutar, e olhavam, ora para mim, ora para a gorducha. Andaram em minha direção. Eram todos bem mais velhos do que eu. Acho que tinham uns treze ou quatorze anos cada um. Seguraram em minha mão e me levaram em direção aquela gorda horrorosa. Fiquei com medo de apanhar deles e fui de livre expontânea pressão. Colocaram-me bem em frente da gordona e mandaram que dançasse a noite toda. Foi o que fiz. A garota deveria ter uns doze anos, mas era muito gorda. Lembro que não conseguia abraçá-la por completo. Sua cinturinha era grossa demais. E música vem, música vai, dançávamos sem parar.

;Todos olhavam para mim e riam sem parar. Meus pés já estavam doendo, mas ordens eram ordens. E quando por várias vezes ameacei parar, correram em minha direção e mandavam continuar. Acho que foi por isso que nunca mais quis dançar de novo. Que noite horrorosa aquela!

;Uma nova cena apareceu bem em minha frente. Era o enterro de meu cachorro preferido, o Jupi, também pudera. Só tive aquele mesmo.

;Jupi extremamente inteligente, do meu ponto de vista, pois nunca permitia que humanos interferissem em seu comportamento. Meu pai sempre tentava ensinar alguns truques para o Jupi, mas nunca conseguiu. O cachorro era danado de esperto. Jamais permitiu que alguém o dominasse. O velho sempre dizia que o cachorro era extremamente burro, mas acho que não, era é muito esperto. Se assim não fosse, por que, então o Jupi obedecia? Mandava que fosse embora querendo que ficasse, e o Jupi parecia entender os meus pensamentos e ficava. Mandava o Jupi sentar pensando que iria ficar de pé e que não adiantava nada mandar essas coisas , e realmente, de pé ficava. Mas essa inteligência toda dele teve um preço muito alto. Um dia um mamífero intruso, invadiu sua área e o Jupi o comeu. Pena que era um rato. Resultado: pegou uma doença e morreu. Até para morrer foi esperto, pensava eu na minha criancice. Deitou-se para não levar um tombo. Uma bela manhã meu pai veio até meu quarto me chamar para um funeral. Eu deveria ter uns seis ou sete anos. Levantei e fui ver do que se tratava. Vi o Jupi mais duro e frio do que nunca, mas para mim, estava apenas dormindo mais um pouco. Fiz um carinho nele, chamei-o pelo nome, e como não me atendeu, eu disse para o meu pai: Hei!!! Acho que esta morto mesmo. Mas para mim, morte não significava nada. Não sabia do que se tratava. Meu pai, muito esperto, e como era um cachorro diferente, fez uma cova diferente a meu pedido. Um enorme buraco redondo. Na minha imaginação, iria ficar ali uns dias e depois nasceria um pé de Jupi ou coisa assim, sei lá, mas não disse nada ao meu pai para não o impressionar, que com um só já não agüentava, quanto mais com um pé de Jupi!

;Papai o colocou delicadamente na cova e antes de jogar terra por cima dele eu dei um grito: “Espera!” Disse ao meu pai: “Coloca esse cobertozinho (que era um saco onde dormia) por cima dele para que não sinta frio à noite, a terra esta muito fria hoje”. Meu pai olhou para mim, deu um sorriso e fez o que pedi. Agora sim, o Jupi podia dormir em paz, estaria quente e confortavelmente instalado em sua cova redonda. Que cachorro esperto aquele, até para morrer! Nos dias seguintes, molhava a cova para que não sentisse sede. Plantei um pé de couve em cima do morrote para ficar mais bonito. Sinceramente, nunca vi uma verdura tão verdinha e fresquinha como aquela, e pedia insistentemente para que minha mãe fizesse uma salada, mas nunca fez. Eu jamais entendi o porquê.

;Entre uma cena e outra, podia ver as pessoas desfilando pelo parque. Passavam pela minha frente, mas isso não interferia nas imagens. Parecia que a TV imaginária estava dentro da minha cabeça. Olhavam para o meu corpo adormecido no banco, soltavam as vezes alguns comentários do tipo “Acho que está bêbado” e seguiam em frente. Com certeza, não podiam me ver. Eu era invisível aos olhos deles. Mas via tudo e a todos perfeitamente. E mais importante do que isso, podia escutar os seus pensamentos. Como o de um cara que passou com uma garota, dizendo que estava perdidamente apaixonado, mas só o que realmente queria era levá-la para a cama. Que canastrão! Ler o pensamento das pessoas seria uma coisa justa? Não sei se era ou não, mas não podia fazer nada. Pensamentos agora, eram como frases em um alto falante sem voz e captava a todos sem distinção.

;Novamente, a televisão começou a mostrar uma cena.

;Agora estava dentro de um caiaque remando mar a dentro. Ah! Como lembro bem desse dia. Sol quente, vento no rosto. Perdi a conta do tempo e do espaço. Só o que via pela frente era o enorme oceano chamando por mim. O horizonte misturando-se com a água e nada mais.

;O dia era de mar calmo, e de vez em quando uma ou outra marola a chacoalhar o barco. Mas lá adiante, haviam ondas grandes de mais de um metro. Como poderia ser aquilo? Ondas lá e calmaria aqui! Resolvi ir remando para ver mais de perto o que acontecia. Quanto mais me aproximava das ondas, mais estranho ia ficando o cenário. O vento passava a soprar cada vez mais forte, e a não mais do que uns trinta metros de distância das ondas, pude ver perfeitamente, como um vidro, separando parte do mar: de um lado águas calmas e do outro, águas agitadas.

;Interessante aquilo! Resolvi que iria entrar dentro das ondas, e fui.

;Que delícia! O caiaque pulava de um lado para o outro, e remando sempre em direção ao mar aberto fui deslizando sem perceber o que de verdade estava acontecendo. Embriagado pela beleza das ondas, de repente percebi que havia algo de errado. Não mais escutava barulhos de crianças ou de qualquer outra coisa. Apenas o som da água que se chocava contra a fibra da minha embarcação. Parei de remar olhei para trás e de embriagado passei a uma sobriedade de dar inveja a qualquer cristão. A praia tinha ficado muito para trás. Só o que conseguia ver eram montanhas, que pareciam mais morretes. Resolvi voltar, e o desespero por pouco não tomou conta de mim.

;Enquanto ia remando mar a dentro, o vento cortava o meu rosto e as ondas vinham em direção oposta a que estava indo. Mas, agora, era completamente o contrário. O vento soprava em minhas costas fortemente, o que me fazia andar mais rápido, porém, o contínuo passar de ondas por mim dava a impressão de que eu estava indo cada vez mais para trás. Na ansiedade de logo chegar a praia, a atenção nos detalhes que estavam tão distantes fazia com que parecessem estar mais distantes do que realmente estavam. Remava, remava e já não sabia se estava indo para frente ou para trás. Estaria eu em uma corrente marítima que me arrastava e esta me arrastando para o alto mar? Esses pensamentos me inquietavam, e tinha que manter a calma. Resolvi então conversar com as ondas para não prestar muita atenção na distância que ainda faltava para remar. Depois de algum tempo levantei a cabeça, e para a minha surpresa avistei pontos coloridos na praia de onde tinha partido. Uma tranqüilidade se abateu sobre mim e relaxei. Finalmente estava convicto de que estava indo em direção a praia. Mais algumas centenas de remadas e já podia ouvir o som de pessoas gritando ao longe. E, um pouco mais, estava em casa novamente.

;O que eu aprendi com isso tudo é que mesmo em um ambiente deslumbrante e maravilhoso, não devemos jamais perder a atenção daquilo que se está fazendo, e acho que isso se aplica a todos os instantes da vida. Foi um adorável passeio, embora com todo o medo que passei.

;A televisão dentro da minha cabeça não parava de gerar imagens. Estava agora em uma quadra de uma escola. Eu tinha como profissão na época, dar aulas de educação física.

;Fazia a chamada dos alunos para uma turma regular. Quando chamei o nome de um aluno que ha muito não comparecia a aula. Para dizer a verdade, desde o início eu já estava de olho no sujeitinho, e estava apenas esperando uma oportunidade para chacoalhar com o raparigo. Chamei seu nome, olhei firmemente para seu rosto. Respondeu: “Presente”. Larguei os diários de classe no chão e parti em sua direção. O garoto deveria ter uns dezessete anos, maior do que eu, e mesmo assim não me intimidei.

;Que besteira fui fazer. Soltei os cachorros para cima dele. Dizia: “O que é que você está pensando que é isso aqui? Colônia de férias? Está pensando que vem a hora que quer e pronto? Está achando isso aqui com cara de algum clube? Onde é que você estava este tempo todo?” Para o meu espanto, olhou bem fundo nos meus olhos com ar mais envocado do que o meu e respondeu: “Tava preso”.

;Senti um ar meio frio correr pela minha espinha de cima até embaixo. Fiquei completamente sem saber o que fazer. Mudo, sem reação. O garotão se apercebeu da minha fraqueza momentânea e resolveu botar para quebrar. Falou: “Tem algum problema?”

;Timidamente eu respondi que não e que se fosse preciso eu até reporia aulas para não perder o ano. Disse eu: “Fica tranqüilo. Já que é assim, você não poderia mesmo estar em dois lugares ao mesmo tempo. Acho que lá onde você estava deve ter feito bastante ginástica, de modo que não tem problema algum.”

;O estranho é que depois de uma semana o sujeito nunca mais apareceu. Se o prenderam, acho que não o soltaram mais.

;A noite já estava caindo, e eu, ainda dormindo no banco do parque. Não me importei e preferi continuar vendo a minha própria vida na televisão. Afinal, eu era o astro principal.

;Novamente dentro do meu caiaque, mas estava agora em uma enorme represa de águas calmas. Como antes, sol quente na cabeça. Avistei ao longe um desbarrancado de terra vermelha. Resolvi remar até lá, mas para isso precisaria atravessar aquele enorme lago. Remei, acho que por uns quarenta minutos, e só o que via pela minha frente era aquela enorme muralha de terra vermelha cada vez mais próxima, que mesmo próxima, ainda estava muito distante. Parei para descansar um pouco e só aí dei conta de onde estava: Sensação mais estranha... Bem no meio do nada! Apesar de poder ver as margens distantes á minha volta, era como se estivesse totalmente só, e realmente estava..

;Levantei a cabeça em direção ao céu e o que vi era apenas o azul límpido de um cenário estupefato e belo. Olhei para a água e imaginei quantos metros mais abaixo poderiam ter antes de chegar ao fundo. E em meio a toda essa mirabolante experiência, pude entender a grandeza do Universo. Olhando para o céu, eu imaginava quantas estrelas estavam bem ali na minha frente, e não as poderia enxergar por causa do sol que brilhava mais forte.

;Um vazio imenso se instalou dentro de mim, e como em um passe de mágica, numa questão de apenas alguns segundos, pude perceber o tamanho que realmente representava dentro do universo, ou seja, nada! Me sentia tão diminuído e impotente diante de tanta grandeza, que estava a mercê de qualquer coisa. Parecia até que uma bactéria tinha maiores poderes do que eu. Mas era assim que eu sentia. Logo eu, o todo poderoso, diante de uma coisa tão enorme, calma, tranqüila, e ao mesmo tempo, tinha consciência que bastaria uma rajada de vento mais forte para que meu pequenino barco virasse e complicasse a minha vida. Sentia-me impotente diante de tudo aquilo. Olhei para o “morrote” vermelho e não mais me interessava. Resolvi voltar da minha solidão para a civilização e nunca mais consegui estar novamente naquele mesmo estado de êxtase, onde o insuperável se fez visível por alguns instantes e me colocou no meu devido lugar. Foi extremamente agradável sentir o que eu senti.

;Estava dentro de um trem. Era o último da noite e voltava para casa com mais um colega de faculdade. Entre uma estação e outra, entrou um bando de mais de dez elementos mal encarados que ficaram a nos fitar. Eu e meu amigo, em pé encostados em uma porta, observávamos o que acontecia, e a única certeza que tínhamos era que um assalto estava se desenhando. O vagão totalmente vazio. Ninguém para nos socorrer. Sem lugar algum para correr, não tínhamos muito o que fazer. Meu colega olhou para mim e começou a rir. Abriu a bolsa e meteu a mão dentro. Olhava para os sujeitos, que agora tinham formado uma enorme roda perto de nós. Olhava para mim e dava risada. Mas gargalhava! Percebi o que pretendia e resolvi fazer o mesmo. Coloquei minha bolsa perto do peito, abri o zíper, enfiei a mão dentro e comecei a dar risada e, assim como o meu amigo, olhava para os sujeitos e gargalhava. Os cretinos nos encaravam, e percebemos que ficaram meio sem ação. Eles nem podiam imaginar o que guardávamos dentro da bolsa para eles.

;O trem se aproximava da estação, parando lentamente. Os meliantes se dirigiram para uma das portas do vagão e saltaram fora. Passaram por nós pelo lado de fora do trem e nem olharam. Ríamos, e ríamos. Era só o que podíamos fazer.

;Bem, resumidamente, aconteceu que o trem partiu. Fechou todas as portas e saiu tomando velocidade. Quando estava passando em frente aos “boiolinhas”, eu saquei de dentro da bolsa um desodorante e meu colega um sabonete e tiramos uma com a cara daqueles safados. Foi só riso daí para frente, embora, tínhamos a certeza de que por muito pouco não fomos assaltados.

;Muita coisa engraçada acontecia quando dava aulas para a criançada. E parecia que aquele operador de TV estava apenas sintonizando canais onde passavam essas aulas.

;Daí, em meio a tudo isso, aparece uma tela em que estou dando aula de ginástica para as crianças. Era uma escola retirada, dessas em meio a favelas. Bandido era o que não faltava por ali, mas tinha também um pessoal que, como diziam, era de paz. Para meu susto, durante a aula, entra um bando de maloqueiros na quadra que se infiltraram entre os alunos e passaram a fazer ginástica também. Não entendi nada do que estava acontecendo. Uns estavam de chinelo, outros de calça e sem camisa, alguns apenas de calção e, ainda, um bando deles descalços. Era a própria imagem de um pelotão desgarrado e disimado pelo inimigo.

;Parei e fiquei a olhar os elementos por alguns segundos, que estavam com uma cara bastante assustada, sem saber o que fazer.

;Para minha surpresa ainda maior, não é que uma viatura da polícia para em frente a escola, descem dois guardas, andam em minha direção e perguntam: “Professor, com licença, aqui todos são seus alunos?”

;Sem saber o que responder, olhei para a cara daqueles marginais, todos com os olhos esbugalhados de pavor. Pensei, rapidamente, que se alguém estivesse armado ali poderia começar um tiroteio, já que os dois policiais estavam com suas mãos no coldre, prontos para sacar a arma.

;Sem pestanejar, respondi: “Sim, aqui são todos meus alunos.” Os policiais perguntaram se eu havia visto um bando de elementos passar por ali. Respondi que sim, e que haviam pulado o muro.

;Os policiais agradeceram e ainda me orientaram no sentido de que se eu os visse, era para chamá-los imediatamente, pois eram de alta periculosidade. Depois disso se retiraram, e os malandros andaram em minha direção dizendo: “Tá limpo mano, tá limpo. Aqui na terrinha você agora é protegido, sem problema, não tem mais pro seu lado não. Valeu mano, valeu, precisando é só gemer que a gente corre pra ajudar.”

;Não respondi nada, apenas observei os elementos se retirarem, aos poucos, da minha aula.

;E depois desse incidente, nunca mais tive problemas com a galera de lá. Da pesada mesmo, aquele povo!

;Também um outro dia estava em uma outra escola, afastada, e as aulas eram dadas em um enorme campo de futebol. Todas as manhã eu tinha que parar para que um rebanho passasse. Estavam indo para um pasto perto dali. Sempre igual.

;Uma certa manhã estava ensinando atletismo, do outro lado do campo. Olhei para a direção onde se encontrava a maioria dos alunos e percebi que um deles carregava meus diários de classe, na mão.

;Aquilo, de certa forma, era uma afronta! Onde já se viu! Um pirralho, perdido do meio do mato, mexer nas minhas coisas. Que moleque mais pentelho! Me aproximei dele e percebi que, quando me viu, também mudou a sua direção e agora andava para o meu lado.

;Antes mesmo de estar bem próximo, já comecei a soltar todo o meu vocabulário ruim para cima do pestinha: “Onde já se viu isso, seu moleque mal educado! Quem deu ordens para você mexer em minhas coisas?” O garoto, coitado, até que tentava se explicar, mas antes que conseguisse soprar uma única palavra, eu o atropelava com mais insultos. “Seu cara de cavalo velho, vou mandar chamar o seu pai para te dar uma advertência! Você não sabe que é crime mexer em coisas alheias?” E o garoto tentava novamente se explicar: “Não professor, é que...”

;Eu o interrompia, não o deixava falar, e continuava: “Esses diários são documentos importantes da escola! Posso até processar você e a seu pai por esse seu ato impensado! Vou te levar para a sala do diretor para que tome nota da sua afronta. Mal educado! Seu moleque salafrário.”

;Quando, para meu espanto, não é que o garoto resolveu se defender? Sem dar chance para que o interrompesse novamente indagou: “Não professor, é que a vaca estava lambendo o seu diário e eu os apanhei para que não estragassem”.

;Minha cara ficou caída. A maior “cara de tacho” que poderia um sujeito ter, eu tinha naquele momento. Olhei meio desolado para a capa de um dos diários que o garoto segurava e vi uma grande e nojenta lambida na capa. Que situação mais incômoda eu havia me metido! Que coisa mais desagradável!

;E por falar nisso, sentado aqui neste banco, só agora eu estou realmente entendendo o que é que esta acontecendo comigo. Que estranho! E acho que vou ter que reformular algumas maneiras de pensar que, de agora em diante, serão totalmente inadequadas.

;Acho que não vou mais precisar de uma mulher. Quem precisa? Mulher para que?

;Levantar de manhã, aquele rosto bonito, sensual, amassado do lado. Em seguida um beijo carinhoso, quente, gostoso, aquele bafo do vinho da noite anterior. Quem quer isso? Você quer? Eu é que não! E, realmente, acho que não preciso mais de uma mulher. Mulheres são todas iguais. Fazem de tudo para conseguir o que querem e depois, nos deixam na mão.

;Ser usado por elas, é esse o destino da maioria de nós, pobres homens. Ficamos fracos e indefessos diante delas, quando caímos nas garras das elegantes e sofisticadas mulheres.

;Mulheres... Quem precisa? Eu é que não.!

;Quando fico só, leio um livro. É mais interessante. Um bom romance e pronto! Você já leu “Rasgando a Seda”? Aquilo sim é que vale a pena.

;Deitar à noite na cama e sonhar com as mulheres, pode ser um pesadelo.

;Mas para quê, para que servem, afinal de contas, as mulheres? Talvez só para sexo mesmo. Mas só para isso? Acho mesmo que é isso que a maioria das mulheres querem de nós, pobres homens. Mas comigo, não! Tem que ser apaixonado, ardente. Tem que ser místico, leve, delicado.

;Mas as mulheres? Ora, essas mulheres... Qual delas saberia me tratar como eu mereço?

;Nenhuma! São todas iguais: O perfume reluzindo no pescoço; o cheiro forte do batom vermelho em meus lábios; o olhar sutil e desconfiado de quem quer, mas omite. Mulheres, só mulheres: Todas iguais. Queria uma diferente! Já tive uma, mas não deu muito certo, e agora, aqui nesse banco, não tenho mais muito o que escolher. Já sabem o que aconteceu comigo?

;Mas antes de contar a vocês, eu gostaria de ter uma que fosse romântica. Que me tratasse como eu mereço. Mas onde eu iria encontrar isso? Talvez uma mulher boa seja uma mulher morta. Que trágico, mas no fundo no fundo são todas iguais. Bebem, fumam, e ainda se não bastasse, nos finais de semana, vão ao cabeleireiro se encontrar com as amigas. Sempre dão um jeitinho para chegarem mais tarde em casa. Inventam uma reunião de produtos de limpeza ou algo parecido, e pronto, nos deixam para trás. Mas, no fundo, no fundo, quando chegam em casa querem é a janta pronta. Pode uma coisa dessa?

;Mas eu vou resistir e dizer que não. Nada disso mais pode me interessar.

;Nunca mais vou beijar lábios macios e delicados com a paixão de um adolescente. Não quero mais. Nunca mais vou abraçar loucamente e querer engolir por inteiro e unir corpos como se fossem apenas um.

;Nunca mais vou esperar a hora que não passa para encontrar de novo meu amorzinho.

;Nunca mais, nunca mais.

;Mulheres, quem precisa delas? Eu é que não preciso mais.

;Não quero mais olhar curvas sinuosas e atraentes desfilando por campos floridos e aromatizados com fragrância mais que exuberante. Não quero mais saber de olhar fundo nos lindos olhos e sentir o desejo crescente a cada instante. Não quero mais saber disso, uma sereia eterna que com o canto encanta e ressoa pelos quatro cantos.

;Para que tudo isso? Faz sentido afinal? Acho que não! Coisa mais besta, besta mesmo.

;Com o que eu tenho que me conformar agora é que realmente já morri e não posso mais ter o que eu mais apreciava e gostava. Uma mulher de corpo, alma e espirito. Mas para mim só ficou o espirito, infelizmente. Adeus mulheres, deixarei-as em paz, agora.


 

 

6. Caso Walkíria

 

Para dizer a verdade, só o que eu queria depois de conhecer a minha suposta fada, era uma mulher bem comum, sem grandes poderes, sem muitos mistérios. Todo o tempo que estive com a Esmeralda sempre pensava: “Será que é isso mesmo que quero? Talvez uma mulher normal, não sei...”

;Embora não estivesse em busca direta disso a todo instante, esses pensamentos, quando próximo dela, passavam pela minha cabeça. Isso, de certo modo, me amedrontava. Sabia que minha fada, poderia a qualquer instante saber o que eu estava pensando e, pior do que isso, sabia que se descobrisse os meus desejos mais reservados, os concretizaria. Isso sempre fazia com que não pensasse. Isso me aniquilava. Bastava desejar e pronto, lá estava tudo as mil maravilhas. Mas sempre tinham as complicações. Sabia que tudo tinha um preço e não estava com muita vontade de ficar devendo muita coisa para quem quer que fosse.

;O que procurava era não desejar, e para não pensar, automaticamente, deixava de existir.

;Havia permitido me envolver com alguém que era uma tremenda de uma mulher, mas acho que não estava preparado para aquilo. Os seus poderes especiais que tudo controlava, acabaram por tirar a minha possibilidade de livre escolha. Interessante como tinha conseguido conquistar aquela mulher. Será que o bruxo nessa história era eu? Bastou eu querer e pronto, lá estava a Esmeralda a minha disposição. É certo que depois acabei por descobrir que havia pedido errado, mas fazer o quê? Se não tivesse feito o que fiz, deixado me envolver, jamais saberia ao certo como seria. Por este ponto, eu não me arrependo. Do que me arrependo é das coisas que não fiz, das que gostaria de ter feito e, por covardia, ou por achar alguma coisa errado, não permiti que acontecessem.

;Desta vez estava bem certo, mais do que certo daquilo que desejava: Apenas não desejar nada. Quero, de agora em diante, uma vida bem tranqüila A apenas sentar e deixar o barco correr. E foi isso mesmo que fiz. Nada! Como diz o ditado: “quando não se sabe o que fazer, não faça nada”. E segui o conselho.

;E por falar em barco, estou me lembrando agora que existiu ha muito tempo uma garota que era uma tremenda gata e que vivia a dizer que a vida dela era como um barco, que simplesmente deixava que a correnteza levasse. As vezes, havia corredeiras mais alvoroçadas. As vezes, águas tranqüilas para percorrer. Mas o importante era não deixar que o barco afundasse. Isso estava claro agora. Apenas navegar, navegar...

;Antes, porém, de pensar desta maneira, em uma tarde, no local onde eu trabalhava, dei um baita esbarrão em uma outra moça que cruzou comigo em um corredor. Gozada a minha vida: é cheia de trombadas! E estava para acontecer mais uma.

;A danada da garota não deu nem bola para mim, nem sequer olhou para a minha cara. Abaixou-se, apanhou os papeis que carregava, levantou-se e seguiu em frente. Meio sem jeito, pedi desculpas, mas pareceu nem ter escutado. Assim, passou mais uma trombada sem muitas conseqüências. Isso, na verdade, mais adiante iria nos colocar frente a frente novamente.

;Minha relação com a ex-fada já estava quase em seu limiar e, um dia, andando pelas ruas sem pensar, e tentando não pensar em nada, não é que uma nova trombada aconteceu na calçada? Pois é, a moça do corredor de novo. E desta vez foi diferente. Ficou furiosa e reclamou de mim, perguntando se eu não olhava por onde andava. Pedi desculpas, mas foi em vão. Era uma tarde chuvosa e seus papeis desta vez caíram em uma poça de água. Realmente ficou desconcertada. Parecia ser de muita importância. Não teve jeito de fazer a moça ficar calma.

;No meio daquela confusão infernal que ali se instalava, acabei perdendo a paciência e dizendo que se não olhava por onde ia e trombava com os outros, era porque esses outros eram tão estúpidos quanto eu, pois não eram capazes nem de se desviarem de um cretino qualquer.

;Parou de falar por um instante, olhou pela primeira vez para o meu rosto, observou-me atentamente. E não é que, para o meu espanto, pediu desculpas?

;Fiquei com uma baita vergonha. Estava realmente sendo grosso com a moça. Disse que quem deveria se desculpar era eu, e assim começou uma conversa até que bastante interessante. Falávamos sobre coisas diversas, mas o assunto sempre voltava para a questão da força do pensamento. Falei sobre um livro que explicava bem a respeito deste assunto. Houve um interesse grande por sua parte, pude notar. Acabei oferecendo-o, emprestado, mas disse que não sabia onde estava guardado, e assim que tivesse um tempo, o procuraria e achando, ligaria e o emprestaria. Foi a deixa para pegar o seu telefone. Acho que ficou sem jeito em não me dar o número, mas acho mesmo que nem se importou porque mostrava-se realmente muito interessada no danado do livro.

;Assim foi. Embora eu quase não a encontrasse no ambiente de trabalho, ficou uma amizade distante e sem interesse algum, um pelo outro, se bem que era uma mulher de se encher os olhos.

;Por muito tempo fiquei sem vê-la, até que me separei da Esmeralda. Olhei para a estante, naquele Sábado, e acabei ligando, e deu no que deu. Não sei explicar, mas foi isso mesmo que aconteceu.

;Parecia já estar programado o nosso encontro. Como um relógio tudo funcionou perfeitamente. O gozado era não ficar nem sequer vinte e quatro horas sem uma namorada. Sem querer, sem pensar em fazer o que aconteceu, apenas aconteceu e pronto. Talvez por ter deixado o barco navegar e sem ter medo de viajar em águas desconhecidas.

;Mas aqui entre nós: será que existia alguém lá em cima que era capaz de adivinhar o meu futuro desejo e programar tudo tão bem assim?


 

 

6.1. Pode, não pode

 

A Walkíria era uma mulher espetacular, mas tinha alguns probleminhas. Um dia podia, no outro não. As mesmas coisas que fazia em um dia, no outro, já era tudo diferente.

;Nunca consegui entender isso direito, mas acho que era por serem demoradas as suas decisões. Sempre estava indecisa. Para saber se queria ou não fazer alguma coisa, era uma eternidade. Dúvidas já eram rotinas em sua vida. Sem posição forte, não se definia para nada. Coisa estranha em uma mulher. Ainda mais pelo fato de que era de caráter firme e enérgico.

;Enganá-la era a coisa mais dolorosa que poderia acontecer no mundo. Magoava-se por quase nada. Mas não deixava transparecer. Até que um dia, as coisas mudaram radicalmente. Finalmente Walkíria havia tomado uma decisão, e não era de voltar atrás quando estava realmente decidida.

;Qual decisão? A de que já era a hora de realmente assumir um compromisso, e assumiu. O escolhido fui eu. Deu um baita trabalho. Lembram da carta da despedida? Foi para a Walkíria que escrevi.

;No início, não queria deixar se envolver. Estava com medo, não confiava muito em mim, sei lá, na verdade o que passava em sua cabeça. Mas depois, um súbito clarão de paixão tocou o seu coração. Daí, já era. Entregou-se de corpo e alma. Mulher muito interessante, a Walkíria.

;O maior problema da Walkíria era realmente o seu querido pai.

;Contava-me que quando tinha uns cinco anos de idade o pai cometeu um crime.

;A mãe dela era meio que safadinha. Moravam em um bairro afastado e um sujeito cujo nome eu não me recordo, adorava paquerá-la. O pai sempre se ausentava de casa por longos períodos. Mas o motivo, nunca soube explicar. É bem provável que tivesse outra família. O danado do sujeito que paquerava sua mãe, um dia entrou em casa e a mãe não resistiu. Um romance começou entre eles. Coisa absurda! Mas era verdade. Desse dia em diante um inferno se alojou naquela casa. O sujeito, muito cafajeste, ameaçava a mãe dela, dizando que se não ficasse com o amante, mataria o seu Alaor, pai de Walkíria.

;Mas isso quem dizia era a mãe, pois o sujeito irresponsável acabou levando um tiro do pai da Walkíria.

;Em uma tarde em que Alaor estava em seu lar, o sujeito apareceu dizendo que daquele dia em diante iria morar lá. Ficava ameaçando entrar na residência. Seu Alaor que não era besta nem nada, esperou que o sujeito colocásse o pé dentro do portão e mandou bala com uma garrucha velha que guardava atrás da porta da sala.

;Resultado: o sujeito também já era. O mais gozado foi depois, no julgamento, o juiz perguntava para o seu Alaor se tinha consciência de que a sua mulher o estava traindo, e Alaor respondeu que sabia que era chifrudo.

;Bem, depois de todo esse escândalo, acabou definhando, e na verdade, sumiu do mapa, abandonando a filha e a mulher.

;Até posso entender uma coisas dessas, mas depois de cinco anos de contatos, abandonar a filha assim desse jeito? Que desamor! Embora tenha sido um choque muito grande, não justifica essa atitude.

;Com isso tudo, a Walkíria cresceu sem pai e sempre quis conhecer o velho, mas nunca o localizou. Sumido para sempre. Vivo ou morto? Talvez com um pouco de sorte consiga um dia esclarecer toda essa situação.

;Esses fatos, assim como outros na infância, marcavam a vida de Walkíria. Um deles foi uma vez em que Walkíria foi morar com uma tia por aproximadamente uns seis meses. Um dia sua tia disse que sua mãe não voltaria mais, e que deveria ir arrumando as coisas e procurar um lugar para ficar. Lógico que era tudo uma brincadeira. Mas a Walkíria não entendia assim. Não tinha mais do que uns seis anos de idade. Humildemente, pegou a sua sacolinha, colocou alguns brinquedos dentro, e partiu. Abriu o portão e saiu caminhando sem rumo. Sua tia dizia tchau, e Walkíria olhava para trás e andava sem destino.

;Sabia que não poderia mais ficar ali. Sabia que tinha que ir para algum lugar, mas não sabia para onde ir. Apenas andava em linha reta, desconsolada. Sentia-se perdida. Achava que sua vida havia acabado e pensava em andar até encontrar a sua mãe. Mas onde?

;Esse episódio eu só estou descrevendo para que todos possam entender porquê uma mãe haveria de largar uma filha tão querida na casa de uma irmã por tanto tempo.

;Sem pai, pois já ha algum tempo não o via mais, e agora sem mãe também. Pobre Walkíria, que fim a esperava?

;Mas a questão é realmente esta. O porquê de uma mãe ficar longe tanto tempo de uma filha?


 

 

6.2. “Apaixonite” Aguda de Terceiro Grau.

 

De verdade a Walkíria havia me encantado. Eu estava totalmente entregue. Um dia entramos em uma estação do metrô, e ficamos por algum tempo esperando o trem. Conversávamos animadamente e finalmente estranhamos a demora. Para a minha surpresa, assim como para a dela, vimos um trem saindo da estação. Estávamos no lado da plataforma em que não passavam trens e, ao contrário de todos, ficamos lá, a sós, e nem nos apercebemos de tal fato.

;Uma vez fizemos uma viagem de ônibus e tínhamos que pegar o dito cujo em um determinado terminal rodoviário. Nós, automaticamente, nos dirigimos para um outro terminal e ficamos a procurar por um ônibus que jamais estaria lá. Até que percebemos que estávamos em local errado.

;Mas era sempre assim. A presença de um diante do outro, era desconcertante. O mundo poderia acabar que para nós estava bom demais. Nada que acontecesse à nossa volta tinha a menor importância. Era tudo uma questão de um olhar para o outro, para ficar tudo certo.

;Algum tempo depois de ter me contado a história do sumiço de seu pai, voltou a tocar no assunto. Não gostava muito de falar, mas parecia precisar. Perguntei se gostaria de encontrá-lo. Disse que sim, e me propus a ajudá-la. Concordou.

;Ao mesmo tempo em que Walkíria queria encontrar o seu pai e saber da verdade, não fazia nada para que isso acontecesse. Resolvi que tal tarefa era bem mais fácil do que parecia, e parti em busca de informações.

;Depois de algumas semanas, eu já estava com o número do celular do pai dela em meu poder. Voltei a falar a respeito do assunto, e perguntei se queria que eu falasse com seu pai, ou se ela mesma gostaria de ligar. Respondeu que eu poderia ligar. Liguei, e tive uma tremenda de uma decepção.

;O velho parecia ser uma pessoa que só pensava nele mesmo.

;Um ser como aquele não poderia ser o pai da Walkíria. Walkíria, uma mulher de caráter firme e forte, uma índole acima de qualquer suspeita. O homem que, aliás, não se dizia pai da Walkíria, me disse que já estava com setenta e um anos e não queria mais problemas. Realmente era uma pessoa extremamente egoísta que parecia só pensar nele mesmo. Mas que sujeito mesquinho! Disse para mim que não queria mais vê-la, que sentiria uma emoção muito forte e que poderia não agüentar. Ainda argumentava que estava velho demais e que as coisas estavam boas do jeito que estavam, e não queria nenhum tipo de complicação.

;Mas, e a complicação que provocou na vida da Walkíria! Isso não conta? É. Só pensava nele e o resto que se danasse! Que sujeito mais asqueroso! Um crápula, com o perdão da palavra.

;Fiquei revoltado com o que escutei ao telefone. Um velho bem ordinário! Percebi que era perda de tempo tentar fazer alguma coisa para forçar um encontro entre eles. Um velho daquele deveria ser entregue a algum asilo que ninguém se importaria. Um pai que rejeita a própria filha. Que ordinário! Um safado, um safado!

;Mas diante de tudo isso, e mesmo tendo essa opinião a respeito do sujeito, pude perceber que as coisas não eram realmente bem assim como estavam aparentando ser. De verdade pude sentir em um determinado instante em que conversava com o velhote, que o danado soltava algumas lágrimas, e pelo telefone eu escutava o fungar da sua narina. Interessante. Chorou, mas não queria ver. Não queria mais encontrar. Era um passado morto. Já havia colocado uma pedra naquele assunto, e me parecia perda de tempo tentar descobrir a verdade deste ângulo. Mas estava a fim de descobrir o que havia acontecido, mais para esclarecimento da Walkíria do que para minha curiosidade.

;Então, de que modo eu poderia saber o que realmente poderia ter acontecido? Uma mãe que abandona a filha. Um pai carinhoso que desaparece. Mas uma idéia estava passando pela minha cabeça agora. Talvez, talvez se eu... aí adormeci.

;Enquanto eu durmo um pouco, pois ninguém é de ferro, vou aproveitar para contar uma outra história para você, se é que ainda não dormiu também. E se dormiu, não tem importância, espero para te contar amanhã e, afinal, vou poder descansar mais um pouco também.

;Vamos dormir agora. Amanhã eu inicio o conto, com você mais disposto do que nunca. Mas não vá deixar para ler depois que estiver bastante cansado, aí não vale.

;Até amanhã!

;Supondo que hoje já é amanhã, se você dormiu mesmo. E que ontem é hoje, caso não tenha dormindo. Supondo apenas que você é você mesmo e não eu, que estou escrevendo e lendo ao mesmo tempo vamos ao que interessa.

;Agora eu me confundi todo. Eu sou quem? Sou o que está escrevendo? Ou sou o que está lendo? E hoje, é ontem? Você, ou eu, dormimos ou não?

;Deixa eu esclarecer melhor. Eu sou o que está escrevendo dormindo. Você, o que está lendo acordado, você lembra? Se aproveitou para dormir também, então já estamos ambos acordados, será que dormindo? Vamos prosseguir.

;A Walkíria morava em uma cidade de política curiosa e um tanto duvidosa. Embora nunca tivesse tido provas sobre fatos escusos, tenho que reconhecer que coisas estranhas aconteciam naquela cidadela. E Walkíria, não era amiga do “Rei”.

;O prefeito da cidade, na verdade, adorava construir novas obras, e resolveu que a cidade já merecia um viaduto, o primeiro da região. Após meses de batalha política, a verba foi destinada pelo governador para a construção do referido viaduto que ligaria coisa alguma a lugar nenhum. Duas largas e bem distribuídas alças de um viaduto, que seria o orgulho da cidade.

;Tempos de muita inflação, e quando todos pensavam que a obra estava pela metade, foi inaugurada. Em vez de duas alças, apenas uma.

;O mais engraçado é que a placa de bronze, dessas de inauguração, fica do lado contrario ao lado onde os pedestres andam. O único jeito de ler o que esta escrito na placa é descer pelo viaduto de carro e parar em frente mas nunca dá, por causa do trânsito.

;E é aí que eu quero chegar. O trânsito. Leiam atentamente e depois me digam de quem é a responsabilidade pela morte do Antônio de Oliveira, morador ilustre da cidade, de idade avançada, mas lúcido. Tinha sido, em tempos passados, político influente na região. Fez boas obras em prol da comunidade local, mas morreu por causa do danado do viaduto.

;O caso é o seguinte: O viaduto tão referido era para ter quatro pistas, duas para subir e duas para descer.

;Um dia, Antônio passou mal e chamaram uma ambulância. Prontamente foi atendido e removido para um hospital, mas tarde demais. Acontece que, ao embocar na parte inferior do viaduto, a ambulância pegou uma fila de carros que estavam em marcha reduzida, atrás de um caminhão que transportava areia. Subindo a uma média de cinco quilômetros por hora, e com o trânsito congestionado, a ambulância não conseguiu subir o viaduto, não em menos de três minutos, que foram fatais para Antônio. Morreu ao dar entrada no hospital regional de uma cidade vizinha, de parada cardíaca. E agora, a responsabilidade da morte de Antônio era de quem?

;Notem uma coisa: se o viaduto tivesse duas alças, a ambulância subiria em menos de trinta segundos, mas como não tinha, Antônio morreu. Bem, não estou aqui para julgar ninguém, muito menos quem construiu o viaduto. Mas, de certa forma, a responsabilidade por aquela morte vai ser atribuída a alguém, pelo menos aqui, no mundo dos sonhos. Sonhar é bom. Faz bem à alma. Você sonha?

;Mas chega de blá blá blá. Já está na hora de acordar. Vamos voltar para a história.

;Acordando...

;Mas quem esta acordando agora? Eu é que não sou! Se estivesse dormindo não poderia ter escrito tudo isso. Isso está ficando é muito complicado para o meu gosto. Dormindo, acordando, morto, vivo...

;Deixa isso para lá. O que interessa é a Walkíria. Já sei o que aconteceu, só não sei como contar.

;A verdade era a seguinte: Por sobre forte intuição, em questão de segundos, tive todo o esclarecimento do caso. Doloroso, mas fácil de se entender. A mãe da Walkíria, mulher jovem na época, imponente e de caráter áspero, descobriu que o calhorda tinha uma outra família. Vivia fazendo pressão para que o pai da Walkíria largasse da outra mulher e fosse morar com elas. Porém, o velho não parecia estar muito disposto a isso, e como já não agüentava mais a mãe da Walkíria pressionando, arrumou uma desculpa qualquer e fez com que mudasse da cidade para um outro estado. Assim passaram a viver. De vez em sempre o pai da Walkíria visitava e cuidava da menina com muito carinho.

;A mãe da Walkíria, cansada de tanto esperar por uma solução, resolveu que já era hora de mudar as coisas e estabilizar a sua vidinha. Simples, mas digna. Sabe o que fez? Arrumou um outro namorado.

;O idiota do pai da Walkíria, sem saber do que estava acontecendo, acabou por sustentar os três, por um longo tempo. Walkíria, a mãe e o namorado. Mas um dia, a casa caiu.

;Quando o pai da Walkíria descobriu o que estava acontecendo, simplesmente foi a maior briga. E como já contei mais para trás, acabou em morte. Resumidamente, pois de resto não interessa muito, o pai ameaçou levar a menina embora. Queria porque queria ficar com a menina. Não era por menos, uma garotinha encantadora, lindinha mesmo.

;A mãe, com medo e sem recursos, mandou a menina para a casa de uma irmã, para escondê-la do pai, e depois disso, nunca mais Walkíria o viu. Fiquei sabendo mais tarde que por várias vezes veio a sua procura, mas sem sucesso. Ninguém deixava que se aproximasse da menina, com medo de a raptar. De verdade, queria era levar a Walkíria embora e tomar conta dela o resto da vida. Mas não foi assim que aconteceu. Sua mãe impediu, e ficou com uma grande raiva do pai querido que agora já não prestava mais.

;Por outro lado, o velhote quando viu que não poderia mais ver a menina, que era o seu xodozinho. Colocou na cabeça a idéia de que nunca mais a procuraria de novo. Quando a Walkíria completou quatorze anos, seu pai a procurou novamente, mas também sem êxito. A mãe sabendo que o pai não ficaria mais com a família, usava a menina para se vingar. E o pai por sua vez, vendo que não conseguiria mesmo ficar com a menina, resolveu que se afastaria e deixaria a mãe na miséria. Uma vingança mesquinha, foi mesmo o que aconteceu. Miséria, fome e desespero no resto da infância da Walkíria. Mas já havia passado, e agora, de verdade, estava era muito bem. Mas como contar isso?


 

 

6.3. Como é que é mesmo?

 

Vamos deixar uma coisa bem clara para que possamos prosseguir sem nenhuma dúvida: Todos já perceberam que morri lá no banco da praça. Isso deve ficar bem claro!

;Agora, então, vocês vão ter que me explicar uma coisa. Se estou morto, quem é que está escrevendo? Questão bastante interessante essa! Aposto como não tinham pensado nisso ainda. Bem, vão pensando enquanto vou contar como é que fiz com que a Walkíria aceitasse a verdade sobre o seu passado. Mas, antes, vamos colocar uma outra questão.

;Na verdade, estava escrevendo esta história até um dia antes de ir parar no banco da praça. Uma idéia para vocês sobre o que poderá estar acontecendo. Um sonho? Uma obra psicografada? Ou será que simplesmente escrevi isso tudo antes de morrer? Se assim foi, sou realmente um belo de um bruxo! E ainda mais, capaz de prever o futuro. Mas, então, para que precisaria de uma fada? Não sei...

;Em relação a Walkíria, posso dizer que a convenci em definitivo depois que tomei uma atitude estranha e drástica. Tinha que ser oito ou oitenta. Walkíria sempre foi uma pessoa muito concentrada nas ciências exatas. De certa forma, o sobre natural a impressionava muito. Então, o que fiz foi me aproveitar dessa sua fraqueza para esclarecê-la sobre o seu passado. Sabem de que forma? Primeiro fiz contato com um senhor que dizia poder prever o futuro. Se podia prever o futuro, falar sobre o passado seria mais fácil. Marquei uma entrevista com esse senhor e me submeti às suas previsões. Nunca fui muito de acreditar que alguém pudesse de verdade prever o futuro, mas era um recurso que não havia descartado e estava disposto a experimentar para ver se dava realmente certo.

;Pois bem, pedi que me fizesse uma previsão para os próximos quinze dias. E fez. Quinze previsões, uma para cada dia. Anotei cada uma delas. Todas as manhãs, levantava e lia a previsão do dia. Sempre dava certo. Incrível, mas era verdade! A mais interessante foi que o Sr. disse-me que receberia um dinheiro inesperado. Era bem pouco, mas iria satisfazer às minhas necessidades de uma determinada situação. Isso foi no oitavo dia. Não acreditei muito, pois andava de bem com a vida naquele período.

;Na manhã do oitavo dia, sai apressado de casa. Sem perceber, deixei minha carteira em cima da mesa. Durante todo o dia não dei por falta de nada. Bem à tarde, estava saindo de um edifício quando deparei-me com um garoto que vendia um jornalzinho. Contou uma história triste, pediu para que colaborasse comprando um exemplar que o seu próprio pai imprimia no fundo de casa. Fiquei comovido com o relato do garoto e resolvi ajudar. Enfiei minha mão no bolso e cadê a minha carteira? Pensava ter perdido. Olhei desolado para o chão, sem saber direito o que fazer e avistei uma moeda. Apanhei a danada e dei ao garoto que saiu todo sorridente. Mais um acerto do adivinho!

;Depois do décimo quinto dia já tinha uma opinião formada em relação ao adivinho. Havia acertado quinze das quinze previsões. Era o bastante para mim. Só faltava levar a Walkíria e ver o que era que o advinho falaria. Contei o que se passou comigo, Walkíria achou interessante e resolveu ir também.

;Fomos, e sabem o que foi que o advinho falou? Tudo exatamente conforme já tinha imaginado. Então vamos aos fatos, mas não sem antes esclarecer mais um porém.

;Todos já devem ter percebido o grande poder de um dedo. Um dedo hoje em dia pode até remover montanhas, e se duvidarem, exterminar toda a vida do planeta com muita facilidade. Depois que inventaram o computador, a palavra falada está, a cada dia que passa, perdendo espaço para um simples dedo.

;Imaginem só, se não fosse o dedo, não estaria aqui escrevendo. Percebem como um dedo pode formar tantas opiniões?

;Levem a questão para o seguinte lado. Escrevo um texto, coloco em uma rede de computadores qualquer e posso, sem saber, estar atingindo milhares de pessoas da mesma forma como se estivesse falando ao vivo em uma grande rede de televisão. Mas o mais importante do que a palavra ou o dedo, são as idéias. Estas sim, podem cruzar fronteiras. Ainda vai chegar o dia em que a comunicação entre as pessoas não irá mais precisar de palavras e nem de dedos. Estamos caminhando para isso, já perceberam? Ou ainda continuam entalados em idéias arcaicas e primitivas sobre a comunicação?

;Em tempos bem remotos eram apenas gestos. Depois, inventaram palavras. Mais para frente, a escrita. E agora, só Deus sabe quais as novas formas de comunicação do século XXI.

;Telepatia? Talvez, mas ainda não é para esta geração. O que está ficando bem evidente é que idéias existem, e podem ser lançadas no ar a cada instante.

;Quando digo no ar, quero dizer literalmente no ar mesmo. Em um telefone celular fica bem claro que o ar está repleto de palavras e idéias. Se mencionarmos o rádio e a televisão, essas idéias aumentam ainda mais. A questão é: como captar estas idéias todas? Ondas mentais a cada instante circulando em torno de nossos corpos, e não somos ainda capazes de captar todas, de forma consciente.

;Conversando hoje com um amigo, isso quer dizer que se, conversei com um amigo, é por que eu estou ainda vivo! Ou será que esse amigo está morto também? Será que mortos podem conversar? Já pensou, eu sentado em cima de um túmulo, feito alma penada, conversando com uma caveira qualquer? Não deve ser bem assim não! Mais para frente vamos voltar a esse assunto. Mas como ia dizendo, esse amigo me dizia exatamente isso: As idéias que estão pelo ar, e que às vezes captamos, recebemos e achamos que é intuição, estalo de gênio, ou coisa parecida, não passam de simples ondas mentais, eletro magnéticas, dêem o nome que quiserem. Mais de noventa por cento das vezes estamos apenas captando idéias, assim como as que captei em relação aos acontecimentos sobre a história do pai da Walkíria.

;E voltando ao pai da Walkíria, era justamente aquilo mesmo que eu já havia dito. Com o acréscimo que seu pai a abandonou por vaidade e orgulho. Traia e não admitiu ser traído. A Walkíria ficou escondida dele muito tempo. Sua mãe se vingava do pai, escondendo a filha, conforme já havia dito e era tudo exatamente isso mesmo.

;Walkíria estava realmente formando uma opinião a respeito do ocorrido. Isso era bom.

;Vou pular um pedaço da história para acabar de vez com essa parte.

;Depois de alguns anos o pai da Walkíria a procurou. Andava meio adoentado e mandou que um amigo de bigodinho a encontrasse. Walkíria o visitou e ficou tudo isso bem resolvido. Quem não gostou muito foi a mãe dela. A velha queria mesmo era uma vingancinha para cima dele, mas esse não era o desejo da Walkíria. Mostrou-se uma filha que amava o pai e soube esperar o velhote quebrar o seu orgulho e baixar a cabeça para a sua simplicidade e humildade.

;Seu pai até deixou uma herança. Mil e quinhentas cabeça de gado, do bom e do melhor. Walkíria vendeu e se estabilizou economicamente por um bom período.

;E por falar em herança, lembram de um testamento que escrevi mais para trás?

;Está na hora de darmos prosseguimento a esta história a partir do ponto em que realmente estava naquele banco do parque, contando dali para frente, o que aconteceu. Já descobriram se estou mesmo escrevendo este livro? Não? Então quem está?


 

 

6.4. Novos Dias

 

Sentado ainda no banco da praça, podia ver e escutar tudo o que queria. Bastava imaginar e pronto, sons e imagens apareciam na estranha televisão a minha frente.

;O dia estava amanhecendo e percebi que, mesmo se quisesse, não poderia sair do banco. Fazia força para sair de lá, mas não conseguia. Estava como que amarrado naquele lugar.

;Vi dois homens aproximarem-se de mim, e levarem meu corpo para longe. Estranho. Estava só, sem meu corpo. Por várias vezes pensava nele e aparecia na telinha a sua imagem dentro de um caixão. Pessoas em volta, algumas chorando, outras indiferentes, e podia também escutar seus pensamentos.

;Eram de todos os tipos, como uma mulher que chegou bem perto e pensou: “Era tão bom!”. E o pior é que jamais a tinha visto em vida. Outros pensavam em não pensar coisas ruins ao meu respeito, pois temiam que eu pudesse ouvir, e realmente podia.

;Um sujeito se aproximou e estava impaciente. Pensava na quantidade de tempo perdido, porque afinal, já estava morto mesmo: “Tempo é dinheiro e estou aqui com esse defunto que nem intimidade comigo tinha! Quando em vida já era chato, e agora, depois de morto, ainda tenho que aturá-lo...”

;Uma outra senhora apareceu e chorava, mas de verdade nunca nem sequer me cumprimentava na rua.

;Uma moça se aproximou do caixão e pensava que eu havia morrido sem querer ter experimentado o seu corpo. Pensava que eu era homossexual ou coisa parecida. Acontece que a danada era uma mocinha, como posso dizer, inteiramente bem alegrinha. De verdade, nunca quis sair com aquela mulher. Não fazia o meu tipo.

;Havia também um sujeito que apareceu por lá e o que mais queria era um lugar para poder passar a noite. Parou ao lado do caixão e eu o reconheci. Tinha estudado comigo no primário. Olhou para mim e derramou algumas lágrimas... de fome. Podia sentir seu estômago roncar e doer. Bem, pelo menos de alguma coisa serviu o meu velório: O danado se encheu de café com biscoitos e se deu por satisfeito. Dormiu a noite toda em uma cadeira, no canto da sala.

;Ainda sentado no banco, percebi que o tempo estava ficando ora cada vez mais lento, ora cada vez mais rápido. O que me alegrava era a televisão em minha frente. Um presente dos deuses, sem dúvida!

;Os relógios pareciam não mais funcionarem. Via as pessoas andarem cada vez mais lentamente, até que paravam por completo. Era algo que me assustava um pouco.

;Para esse fenômeno eu tinha uma explicação. Eu deveria estar vibrando em uma faixa tão alta, e realizando coisas a uma velocidade tão enlouquecedora que todo o resto parecia estar completamente parado. Congelado... essa era a verdade!

;Mas havia momentos de alternância, onde a paisagem parecia mover-se a uma velocidade imensa, de forma que eu não podia ver nem o que estava acontecendo.

;Eram borrões que se formavam a minha frente, nublando tudo ao redor e quando voltava ao normal, a paisagem estava totalmente modificada, ou chovendo, ou frio, ou calor. Arvores cresciam e diminuíam. Acho que estou mesmo é preso neste banco, ou seja, preso a um lugar, mas solto no tempo, para frente e para trás. Sem controle, seria o meu destino ficar eternamente preso a um banco de um parque?

;Havia agora dois tempos para mim: um que determinava o que estava acontecendo comigo a cada momento e um outro que se passava entre os vivos. Estranho dizer isso, entre os vivos, mas a verdade tem que ser dita!

;Chegado o dia da leitura do meu testamento no tempo dos vivos, para mim apenas alguns segundos haviam passado.

;As partes envolvidas foram chamadas. Esmeralda e Walkiria ainda não se conheciam.

;Um ambiente estranho. As duas, tristes, não pareciam se importar com a presença uma da outra. O testamento foi lido por meu advogado. Prestei a máxima atenção em cada palavra de cada um dos presentes. Um espanto expresso no rosto de ambas, quando lhes foi dito o que a cada uma caberia.

;A Esmeralda ficou sem saber o que falar, aparentando decepção. A Walkíria, ídem.

;Esmeralda, com o pote de barro, saiu pela sala, se despediu meio sem jeito, e partiu. A Walkíria ainda ficou a conversar com algumas outras pessoas, segurando pelas mãos a estrela mágica que lhe cabia como herança. Mas nem uma e nem outra sabiam o que fazer com aquilo.

;De verdade, também não sabia como elas poderiam utilizar aqueles objetos. Nem imaginava!

;A mais curiosa era a Esmeralda. Chegando em seu apartamento, olhou para o pote, suspirou e ficou a imaginar o que poderia ter dentro dele. Vagarosamente, foi tomando coragem e resolveu que iria abrí-lo. O último suspiro de um homem santo dentro do pote... tendo ou não tendo, iria descobrir.

;Se as coisas estiverem acontecendo muito rapidamente, me avisem para que possa mudar de ritmo. É que aqui, preso neste banco, perco um pouco a noção do tempo, como já expliquei anteriormente. Mas que coisa mais idiota esse Zé Ninguém acaba de escrever, devem estar pensando, vocês que estão lendo! Como é que vocês poderão me avisar?

;“Coragem mulher”, pensei eu. Mas isso a Esmeralda teve. Cuidadosamente levantou um pouco a tampa do pote, de forma a formar uma pequena fresta. Sutilmente percebi que sentiu um aroma forte e desagradável de cebola que saia de dentro do pote, como uma brisa.

;O cheiro era tão ruim que imediatamente fechou o pote. Naquele breve instante pensava apenas em quem poderia ter um hálito tão forte. Gostaria de saber. Na mesma noite teve um sonho bastante estranho. Um homem, aparentando uns 80 anos de idade, sentado em um canto de uma sala de uma casa pobre, comia cebolas sem parar. Parecia doente. Um outro senhor se aproximou dele e com o pote, que agora a Esmeralda possuía, colocava perto da narina do senhor de idade avançada, parecendo querer capturar o ar que respirava.

;Esmeralda acordou com aquele sonho latejando em sua memória, e não sabia explicar o que de verdade tinha acontecido.

;Resolveu que iria dar mais uma espiadela no pote para ver se tinha ou não algo dentro. Abriu novamente, bem devagar, e pode novamente sentir o bafo de cebola que saía do seu interior. Naquele momento soou o telefone, e desejou que aquele aparelho danado nunca mais tocasse...

;Fechou o pote e foi atender a chamada, mas ninguém respondia. Desligou e resolveu que mais tarde faria nova investigação, saindo apressada para mais um dia de trabalho.

;Do outro lado do meu universo, eu via a Walkíria olhar, sem parar, para a estrela que tinha herdado. Curiosa, não entendia. Mas uma coisa eu posso afirmar: era uma estrela extremamente feia, meio pegajosa. Estranha, muito estranha! Walkíria a manipulava de um lado para o outro, sem saber o que fazer. De súbito, lembrou de seu pai, e desejou saber o que poderia ter acontecido se seu pai a tivesse levado embora. Colocou a estrela junto ao peito e suspirou.

;Não é que para o seu espanto, a estrela feia e pegajosa emitiu um raio de luz em direção ao centro do quarto onde se encontrava e, como em um holograma, imagens começaram a ser geradas. Walkíria assustou-se um pouco, mas não se desequilibrou emocionalmente com o fato. Via em imagens tridimensionais o que poderia ter acontecido se o pai a tivesse levado.

;Seria uma Doutora bem sucedida. Teria estudado em um país distante e seria uma médica de nomeada reputação. Mas em relação ao sentimento que tinha sobre seu pai, era o mesmo: culpava-o por tê-la separado da mãe.

;Desejou então ver o que poderia ter acontecido se seu pai tivesse assumido a sua educação e deixando-a viver com sua mãe. Viu a mesma cena de antes, mas com uma diferença de sentimentos. Desta vez o culpava por nunca ter se aproximado e apenas ter dado bens materiais.

;É! Parece que a Walkíria não tinha saída mesmo. De uma forma ou de outra seria a mesma coisa. Caminhos diferentes para resultados iguais. A vida é assim...

;Pelo menos uma coisa a satisfazia agora. Sabia para que servia a estrela, e me agradecia por lhe ter dado aquele presente.

;Droga, se eu soubesse, quando era vivo, para que servia esta coisa, seria tudo bem diferente. Mas acho que não tive coragem de fazer coisa alguma.

;A maioria das pessoas deve ser como eu: anseiam por uma mudança, mas não dão um único passo em direção aos acontecimentos. Isso é que é pura covardia! Acho que todos nós somos covardes por natureza. Tememos o novo por não sermos capazes de prever se a mudança será favorável ou não. Se estamos em uma situação extremamente indesejada, algumas vezes, preferimos que fique tudo como está, mesmo causando sofrimento. A covardia se faz presente. Melhor ruim, do que arriscar algo que pode melhorar ou piorar. Para se fazer mudança é preciso ter muita coragem, muita mesmo!

;Na maioria das vezes somos covardes, temos medo de mudanças que desestabilizam, tanto o que é justo como o que é injusto. Isso nos amedronta. Não corremos o risco de perder, mesmo que seja para perder nada, isso causa medo em todos.

;Todas essas coisas fazem parte do desenvolvimento de cada um, e sobre o desenvolvimento, tanto do homem, como de um todo, estou, a cada dia que passa, mais conscientizado de que tudo está bem relacionado com o meio de transporte que utilizamos.

;Vou falar agora sobre o meu próprio desenvolvimento.

;Quando era bem pequeno, meu universo era dentro de um berço e um chiqueirinho. Sair para fora dele era extremamente perigoso! Pensava: “E o dia em que tiver que sair daqui de dentro para pegar minha própria comida, como é que vou fazer?”

;Passaram-se alguns anos e o desafio maior era cruzar a linha do portão do quintal da casa, sozinho. Um grande obstáculo a ser vencido. Mais alguns anos e a esquina da rua era um lugar distante e sombrio, onde realmente começava o mundo. Venci uma rua, duas ruas e conquistei uma cidade inteira, ao poder de pedaladas em uma bicicleta.

;Mas, uma nova barreira se impunha diante de mim: a de novas cidades. Apenas saía da minha própria, acompanhado de meus pais. E quando peguei meu primeiro ônibus com amigos para sair da cidade, foi a glória total. Uma nova conquista.

;E desse ponto em diante, o meu desenvolvimento esteve mais atrelado à tecnologia que se implantava rapidamente em minha volta. Conquistar novos lugares, sem um meio de transporte adequado, seria quase impossível.

;Era prisioneiro de uma cidade, de um Estado, um País. Vencer todas essas barreiras de distâncias enormes para conquistar novos conhecimentos era um desafio ainda maior.

;O veículo de transporte é o mais importante. Carros, ônibus, aviões, foguetes... Mas, entre todos esses meios, existe um fantástico, que traz, a cada dia, possibilidades de comunicação ainda maior, um computador. Revirou todo o mundo do avesso, mudou conceitos, formou novas teorias e as pessoas acabaram tendo acesso a lugares distantes com muita facilidade. A barreira da distância está realmente por terminar.

;E tudo isso não mais teria importância em ser comentado se não fosse pelo simples fato de que reafirmo que o meio de transporte é um dos recursos essenciais para o desenvolvimento de um ser.

;De certa forma somos todos prisioneiros neste grande e enorme planeta, já que ainda não somos capazes de ir e vir para além dele. Mas esta barreira, um dia, também cairá, e os primeiros passos já foram dados nessa direção.

;O computador pode nos levar a lugares distantes sem termos que carregar esse enorme e delicado corpo físico junto. O que é um alívio! Quem não se recorda de um enjoou em uma viajem mais demorada de ônibus? O mal estar do calor que incomoda o corpo, a ponto de fazer com que quase percamos os sentidos? Um vômito aqui, um calorão ali,... erg...!

;Mas agora, com essa máquina maravilhosa, não precisamos mais do corpo para irmos visitar uma pessoa. Um telefone celular também é um mini computador. Está em toda parte.

;Engraçado, desde que estou sentado neste banco, não vi nada por aqui parecido com um. Mas, percebi uma coisa. Uma máquina responde a sua programação de forma fria e logicamente. E neste banco, o que responde para mim sempre de imediato são os meus pensamentos.

;Então é isso... Meus pensamentos! Através deles poderei fazer o que quiser. Mesmo preso neste banco, já encontrei um meio de transporte eficiente para essa situação incômoda de prisão, no banco da praça.

;Será que estou preso, ou será que não sei como sair daqui?

;Estou encontrando uma resposta para isso, também. Um meio de transporte adequado deste lado do universo, se assim posso dizer, não são máquinas, mas sim um computador que na vida aí da terra sempre usei muito pouco. Esse computador é o meu pensamento. Penso, logo, acontece. Fantástico! Mas ainda não sei como deslocar essa minha imagem, que acredito ser eu sentada neste banco. Mas não sou mais de carne. Nem sei do que sou feito. Será que realmente existo?

;Crise existencial... Mas se não existo, quem está escrevendo? Boa pergunta.


 

 

7. Caso Desfecho Walkíria

 

A Walkíria já sabia para que, finalmente servia a estrela. Pelo menos era o que pensava... Pensou errado de novo. A incerteza e a insegurança sempre fazem parte da vida de qualquer pessoa. E dela também. Não era porque tinha uma estrela que seria diferente.

;Ela estava feliz. Podia ver isso sentado do meu banco, minha prisão. E, embora já tivesse descoberto um veículo para que pudesse andar por aí, não sabia ainda dirigi-lo. Sem embreagem, sem freio e sem acelerador... Como fazer para locomoção? Será que sair voando, feito bruxo, daria resultado.? Mas a cena que via na televisão a minha frente era mais interessante: Walkíria extremamente feliz por saber como funcionava a estrela, rezava pela minha alma em agradecimento. Mas, coitada, nem sabia o que lhe esperava.

;Pensava em poder prever o futuro e poder ajudar as pessoas. Mas as pessoas estariam preparadas para aceitar tantas verdades? Acho que não! E por falar em “acho”, posso dizer com certeza, “jamais “ache” alguma coisa. Deixe que os sábios façam isso. Sempre tenha certeza do que faz.”

;Walkíria pegou a estrela mágica e resolveu fazer algumas experiências. Mas precisava ver algo que não fosse muito trágico, algo que não a abalasse demais. Pensou em prever qual o time de futebol que seria campeão por aqueles dias, já que o campeonato estava na sua reta final. E a estrela entrou em ação. Um reboliço dentro do quarto. Luzes piscantes por toda volta, como se santos e deuses estivessem sendo evocados. E uma projeção holográfica apareceu bem a sua frente: Era uma cena de uma equipe de futebol comemorando o título tão desejado. E justamente o seu time do coração! Walkíria ficou extremamente feliz. Pensou novamente em querer saber quando seria o casamento de sua irmã e viu um calendário embaixo da tela com a cena do casamento. Ficou mais feliz ainda, e via que era tudo para os próximos dias. Mas como? Não haveria tempo hábil para que um casamento como aquele que viu, acontecer em tão pouco tempo. E só então compreendeu que estava acontecendo alguma coisa de errado com a estrela.

;Fez mais uma experiência: Pensou em querer saber como seria o seu próprio casamento. O que viu não a agradou muito: uma cena em branco. Nada aparecia. Significaria isso que jamais se casaria? Pensou em querer saber o que comeria no seu próximo almoço: Apareceu uma imagem de uma tremenda macarronada.

;Recolheu a estrela de seu peito, deitou em sua cama e adormeceu. No dia seguinte perdeu a hora para o trabalho, acordou quase na hora do almoço. Levantou, foi para a cozinha, e não é que sua mãe preparava uma macarronada para o almoço? Então a estrela, de certa forma, funcionava! Esperou mais alguns dias para tomar novas atitudes em relação a esse assunto. Mas para o seu espanto, o seu time do coração, no dia seguinte da macarronada, foi desclassificado.

;“Como pode isso?” pensou. “Umas coisas dão certo e outras erradas. Tem que existir algum meio correto de usar esta estrela encantada. Devo estar fazendo algo de errado!”

;Do meu banco, sentado, sozinho, apenas tendo como divertimento a televisão na minha frente, que tudo em que pensava, focalizava, me divertia com a história e a confusão que estava sendo implantada na cabeça da Walkíria. Queria de alguma forma ajudá-la a decifrar o enigma, pois já havia entendido como a estrela funcionava, mas não encontrava uma maneira de fazer isso.

;É... Pensei muito! Milhares de cenas apareciam a minha frente, embaralhavam ainda mais as minhas idéias, e a concentração ficava cada vez mais difícil.

;Do outro lado do universo, a Walkíria apreensiva, desestimulada, não conseguia realmente entender o que estava acontecendo com a danada da estrela. Fez milhares de experimentos, mas quanto mais usava a estrela, mais se confundia.

;Do meu banco, um dia, uma noite, um sei lá o quê, vamos dizer que em um tempo qualquer, (esse negócio de se perder no tempo esta me deixando meio confuso), fiquei muito preocupado com o que acontecia com a Walkíria. Tentei mandar um pensamento. Quem sabe não o receberia como uma intuição?

;Pensei forte, e mandei meu E-mail para ver se estava certo o endereço. Finalmente estava tentando algo diferente: Uma comunicação entre os que ainda possuíam corpos de carne e osso e os desencarnados. Pensei o seguinte, focalizando a imagem dela: “a estrela só funciona se você desejar saber coisas a seu respeito. Se pensar em coisa de interesse de terceiros, só o que verá será a sua própria vontade acontecendo.”

;Essa era a resposta para o funcionamento correto da estrela mágica. De alguma forma, teria que receber minha mensagem.

;Uma noite, totalmente relaxada, pude observar que estava meio dormindo, meio acordada. Podia ver pela minha TV que a minha mensagem, a do meu pensamento, estava circulando ao seu redor. Mas como uma muralha, existia alguma coisa que impedia a idéia de penetrar em seus pensamentos. Talvez uma faixa errada de vibração, ou a Walkíria não estaria pré disposta a receber essa idéia. Lembram que falei que idéias andam navegando pelo espaço, ao nosso redor a todo instante, e que basta termos um meio de captar estas mensagens para que descubramos um mundo novo?

;Pois é, a Walkíria bem ali com a resposta para tudo que queria saber, e não conseguia captar. Cego é quem não quer ver! Mas estava disposta a enxergar. Fazia força para isso.

;Quase adormecida, sentiu que seus pensamentos voavam pelo vago espaço dentro da sua cabeça. Cansada de pensar, resolveu que não mais pensaria. Apagou qualquer idéia, pensamento, ou qualquer outra coisa que pudesse interferir em sua mente.

;Silêncio profundo. Um vazio enorme. Nada pensava. Por alguns segundos, conseguiu, e então pude observar que o pensamento que a rodeava de imediato entrou pela sua cabeça. Despertou de um salto. Correu para o armário onde guardava a estrela mágica e fez novas experiências com a danada.

;Era incrível! Estava finalmente entendendo o funcionamento. Agora sim, poderia fazer bom uso dela. E isso era de muita importância para mim. Eu, em minha prisão, dependia da compreensão dela em relação a estrela para poder me libertar. A questão era: deveria querer saber sobre o seu futuro mais longínquo. Isso traria uma grande surpresa... Mais para frente eu conto o que é.


 

 

8. Caso desfecho Esmeralda

 

A Esmeralda sempre foi um osso duro de roer. Sempre dizia àquela mulher que era uma leoa. Isso era mais do que a verdade! Porém, quando cismava com alguma coisa, não tinha santo que a fizesse mudar de idéia.

;O pote mágico acebolado seria coisa ideal para guardar, quem sabe, molho de tomate, porém, não era essa a idéia dela. Ficou muito pensativa a respeito do pote e estava disposta a descobrir a sua utilidade.

;Continuando de onde havíamos parado quando a Esmeralda saiu para trabalhar, quando voltou para casa, tinha idéias mil. Estava pensando em dar um ponto final naquele pote. Sentou em seu sofá e, atentamente, observava o pote, sem muita pressa. O que mais a incomodava era o que o sonho da noite anterior poderia ter a ver com o pote? Teria tudo mesmo acontecido conforme o sonho que tivera? “Sei não”, foi o que pensou. Sempre desconfiada, nunca se deixava levar por primeiras impressões. Sempre pesquisava muito antes de formar uma opinião, e essa foi a minha sorte.

;A Esmeralda pegou o pote na mão e pensou: “Quem poderia me ajudar a desvendar este segredo?” Abriu e cheirou novamente a cebolada. De rápido estalo, lembrou de um nome: Mariazinha. Mulher que se dizia vidente e aconselhava pessoas nas mais diversas situações. Passou a mão no telefone e deu conta que não mais funcionava. O cheiro de cebola ainda impregnava as suas narinas. Êta cheirinho porreta! Pensou em tomar um banho de água bem quente antes de prosseguir. Assim o fez. Mas ao ligar o chuveiro, a água parecia sair fervendo. Estranho... Estava prestes a descobrir o poder do pote. E num estalo desejou água gelada. Sabem o que aconteceu? Nada, de nada!

;E agora? A Esmeralda por um momento havia pensado que tudo o que pensava se realizava, mas não foi assim com o chuveiro. Talvez só coincidência. Por vias de dúvida, resolveu tirar a prova dos nove. Segurou o pote, pensou fortemente em ter olhos azuis. Correu para o espelho, e nada havia acontecido. Pensou em telefonar novamente, mas aí lembrou que o aparelho estava mudo. Cheirou o pote novamente e desejou que o aparelho funcionasse normalmente, um toque rápido indicou que o aparelho já estava novamente em uso. Bem, ao menos para uma coisa serviu essas experiências! Esmeralda ficou ainda mais confusa. Ora funcionava, ora não.

;Aqui do meu banco eu apenas podia assistir, sem nada fazer. Mas, espera um pouco, e se fizesse como fiz com a Walkíria para induzí-la a um acerto? Afinal, também já sabia da finalidade do pote. Concentrei-me profundamente e enviei meus pensamentos para Esmeralda. Mais do que depressa, lá estavam eles. Todos em volta dela, como pássaros ao redor de uma gaiola. Mas o efeito não dependia de mim.

;A Esmeralda tinha que entrar naquele estado de total de ausência de pensamentos. Isso fazia com freqüência, todas as noites antes de dormir. Alias, dormir era o que fazia de melhor: Não podia ver uma cama que já capotava. Após mais algumas horas de tentativas frustradas querendo descobrir os segredos do pote, Esmeralda foi dormir. Pronto: Tudinho resolvido. Era apenas uma questão de minutos para que recebesse o meu pensamento.

;Quase adormecida... Percebi que meus pensamentos tentavam entrar em sua cabeça, mas não conseguiam., como se uma barreira os impedisse. Observando mais atentamente, pude notar que havia algo de diferente nesta situação, em relação a mesma coisa que aconteceu com a Walkíria: A Esmeralda parecia ter um escudo protetor a sua volta, uma luz branca, ora meio azulada, ora meio esverdeada, que impediam meus pensamento de executarem sua tarefa.

;Pensei muito sobre o assunto e descobri a resposta depois de algum tempo. Bem, para mim foi algum tempo, mas acho que no tempo daí da terra seria algo relativo a alguns anos. Anos em questão de horas. Ora para frente, ora para trás.

;A questão era: estava em um campo de vibração muito diferente do meu. Para dizer a verdade, vibrava em uma faixa superior a minha. Desta maneira estava imune às minhas idéias, como que protegida de coisas mais inferiores. Eu tinha que dar um jeito nesta situação... Mas como?

;Pensei mais e mais, e quanto mais pensava, menos entendia. Fiz várias tentativas de vibrar e formar meus pensamentos em campos mais elevados, mas nada deu certo. Só me restava uma chance: Usar a Walkíria para, poder interferir junto a Esmeralda. Mas vocês pensam que a Esmeralda desistiu? Que nada! No dia seguinte, lá estava novamente tentando descobrir o enigma.

;Para a minha sorte de tanto teimar, e isso fazia com perfeição, acabou descobrindo o segredo do pote. Todas as vezes em que cheirasse o bafo de cebola, o que pensasse em seguida seria realizado. Foi aí que me estrepei todo! Vocês já vão saber porquê.

;Sabendo da verdade sobre o pote de barro, Esmeralda teve uma idéia mirabolante. Pensou: vou cheirar o pote e desejar que o tempo volte ao dia em que fui quase atropelada por Darlin. E foi o que fez, para o meu azar. Sabem o que é que aconteceu com isso? Acabei ficando preso a este banco, em um lapso de tempo. Tudo corria muito bem até ter o desejo de voltar no tempo. Voltava e começava tudo de novo. Esmeralda, para a minha surpresa, durante alguns minutos depois do retorno no tempo, sempre lembrava-se do que havia acontecido. Por isso a tonteira toda quando quase a atropelei. Mas, em seguida a uma boa noite de sono, era como se tudo estivesse acontecendo pela primeira vez. Estranho... Mais estranho era eu mesmo não saber de nada, e de nada me lembrar. Apenas tenho consciência disso, agora que estou aqui, preso neste banco.

;Séculos vão, séculos vem, e eu continuo preso a este banco. De certa forma, o destino já sabia de algo, pois fui literalmente preso aqui para a minha segurança. Mas como desfazer este feitiço? Pote mirabolante... mas muito sacana! Que safadeza da Esmeralda! Todos presos a este lapso de tempo.

;Bem, de verdade, enquanto estou aqui neste banco é porque estou mortinho mesmo. Mas, em um passe de mágica, passo a viver quando Esmeralda deseja voltar no tempo. Mesmo assim há uma coisa que ainda não está explicada: Agora, depois de morto e preso aqui no banco, eu já sei da verdade e do que está realmente acontecendo. Mas morto não escreve... Então, quem está escrevendo? Escrevendo morto eu não estou, isso eu juro!

;As coisas daqui do banco são bem interessantes. Enquanto o tempo na terra decorre em ordem cronológica, e cada coisa parece estar em seu devido lugar, aqui é bem diferente: Ora sinto que é futuro, ora passado. Difícil de explicar o que realmente acontece, mas vou tentar: Um tempo onde não existe relógio, e nem decorre de maneira constante e para frente. O tempo realmente não existe aqui. Mas como se relaciona com o tempo da terra? Acho que apenas tenho essa impressão por causa da televisão a minha frente e que permite que veja tudo o que quiser, como filmes que já aconteceram e que ainda iriam acontecer.

;Interessante a posição da Esmeralda. Sempre desejava a mesma coisa, tentando mudar o passado, ter um novo futuro, mas acabou ficando presa também a esse lapso de tempo. O interessante era que quando voltava tinha a memória de tudo o que iria ainda acontecer. Durante a viajem no carro, depois que quase a atropelei, contava tudo o que aconteceria de mais importante. Mas eu nunca acreditava muito, por isso, sempre acontecia a mesma coisa. O que eu fazia em seguida era escrever estas páginas que aconteceriam depois da minha morte. Agora já contei quem está escrevendo. Espero que tenham entendido.

;E de verdade, de bruxa ou fada a Esmeralda não tinha nada. Simplesmente, sobre as coisas mais corriqueiras e que não contava para mim, no carro, tinha lances de rememorar o futuro que já havia acontecido e que, de verdade, já era passado, e contava para mim. Estranho... Se o futuro já havia acontecido, então o que ainda iria acontecer era o passado. Tudo passado! Estávamos presos ao passado, já que o futuro não existia. Estranho...

;Mas deste banco, com o tempo indo ou não, para frente ou para trás, sempre tinha momentos em que novas idéias apareciam e novas coisas eu aprendia. Como, por exemplo, coisas sobre o maior fiador do mundo. Vocês sabem quem é? Sim, Deus! Quantas e quantas vezes dizemos: “Deus lhe pague” quando alguém nos faz um bem em que nos sentimos sem “poder” para pagar. Sempre Deus! Esse cara deve ter um cartão de crédito muito gordo, pagando por todo mundo... Mas, será que aceitou ser realmente nosso fiador? Será que não estamos apenas deixando nossa própria responsabilidade de lado ao empurrarmos a dívida para que “ele” se vire?

;Acho que somos bem interesseiros! Onde já se viu uma coisa dessas? Eu devo e é Deus quem paga! Já está na hora de mudar esta forma de pensamento. De hoje em diante, ou melhor dizendo, de hoje para trás, pelo menos por enquanto em relação ao para trás, vou procurar eu mesmo pagar as minhas dívidas. Afinal, nunca recebi um memorando dizendo que o “Todo Poderoso” pagaria as minhas contas. Acho que andei abusando muito. Bom velhinho, se assim posso dizer, não deve estar muito certo ficar creditando tudo o que devo em sua conta...

;Depois de tanta coisa que acabei escrevendo, fiquei com uma certa dormência nos dedos. Mas acho que isso é impressão de quando estava vivo. Êpa, mas quando estava vivo, estava escrevendo! Então estou realmente com dormência. Espero que não...

;Outra coisa que tive muito tempo para meditar foi a respeito do nome de para quem trabalhamos e fazemos as coisas.

;Às vezes, ou melhor, por muitas vezes escutei dizerem que tal coisa era feita em nome de alguém. Muitas destas vezes a pessoa citada jamais poderia ter deixado uma ordem dessa. Querem um exemplo? Então lá vai, mas espero que não me excomunguem antes de terminarem de ler, para que entendam direitinho a minha idéia.

;Estou falando de Jesus. Quanta coisa se faz em nome dele? Não é porque é citado o seu nome é que é uma coisa boa. Será que quem está dizendo que está fazendo em nome de Jesus tem a aprovação dele? Bem, entendam. Muita gente usa essa expressão e forma de agir, que identifica de imediato uma fé fervorosa e de muita paixão. Mas, será que Jesus, lá de onde está, realmente aprova o que está sendo feito em seu nome? Pensem a respeito. Lembram das cruzadas. Matava-se em nome de Deus, e Deus, ao menos pelo que sei, na verdade não tinha nada a ver com aquela matança toda.

;Já se matou muito em nome de Igrejas que blasfemavam o nome de Deus E fazer as coisa em nome de Jesus, não sei se é muito correto. Acredito que o mais correto seria assumirmos a responsabilidade e não passá-la adiante, em nome de alguém que, de verdade, nunca vimos, apenas conhecemos a sua obra, e que nem ao menos temos a certeza de que o que estamos fazendo é realmente o que o próprio faria. Pela diferença de desenvolvimento e pela grandiosidade do bom senhor Jesus, acho que o que ainda fazemos de melhor, não passa de coisinhas meio sem importância. Porém, para nós, presos a esta imensa penitenciária sideral, é um fato que merece repercussão. E realmente merece, mas não vamos colocar isso em nome de alguém, vamos fazer porque queremos e acreditamos. Temos que ter mais fé no que fazemos, e não creditar tudo a um outro ser. Maneira covarde de se encarar as coisas! Se for bom, fui eu quem fiz, ou pior ainda, Jesus fez por meu intermédio. Fui apenas instrumento. Se estiver errado, fiz por que mandou. Mas cadê a procuração dele, dizendo o que era ou não era para ser feito? A bíblia? Devo lembrar que Jesus não escreveu uma única linha! Agora já podem me excomungar, concordar, ou negar, até morrer, assim como estou agora, mas de uma coisa estejam certos: Se fizeram certo ou errado, não importa muito, importa aquilo que fizeram. O que hoje parece ser certo, pode estar completamente errado. Lembro ainda de Galileu, que teve que dizer, em público, que a terra não era redonda, para sobreviver. Naquela época se acreditava que a terra era realmente chata. Chato era a cabeça de quem acreditava nisso! Por isso, lembrem, sempre existe a possibilidade de estar alguma coisa errada. Então não vamos acreditando em tudo que se escuta, principalmente no que acabo de escrever. Para acreditarem nisso, primeiro tentem provar que estou completamente errado. E, depois, se não conseguirem, aí sim, devem acreditar. Desta forma não serão jamais enganados. Tomem cuidado para que falsos profetas não os conduzam por labirintos...

;Voltando à história original, como é que poderei sair deste lapso de tempo? A resposta é uma só: Tenho que encontrar uma maneira de avisar Esmeralda que não mais desejasse voltar no tempo naquela data. É uma pena eu não me lembrar de nada quando retorno. Apenas a Esmeralda lembra, por um breve tempo . Que coisa! Mas como vou poder conseguir instruí-la para que não faça mais isso? Estarei eu realmente perpetuamente preso a este banco? De uma coisa engraçada eu me recordo agora: Quando era bem pequeno, acho que com uns 10 ou 12 anos, e tinha que levantar cedo, ficava torcendo para que o tempo de alguma forma parasse e fosse eternamente aquele mesmo dia, aquela mesma hora, eternamente: principalmente quando fazia frio! Será que a força do meu pensamento é tão forte assim que de alguma maneira eu consegui realizar o meu sonho? Se assim foi, saiu o tiro pela culatra. Me estrepei por pensar errado.

;E por falar em pensar errado, desse lado de cá, aprendi muitas coisas. Aqui as coisas acontecem bem rapidinho. Não tem demora. Basta pensar, que já acontece. Basta pensar em alguma coisa, que de imediato acontece. Isso é bom, mas por outro lado, se perceberem bem, é muito perigoso. Enquanto estou pensando em algo, esse algo existirá, e estarei sofrendo todas as suas influências. Já pensaram se por acaso tiver um pensamento ruim? Me estrepo todo! Tenho que tomar muito cuidado, aqui. Estranhas as coisas neste lugar. Na terra, ou no mundo dos vivos, temos que planejar, executar, e só depois, às vezes, acaba acontecendo. Mas aqui, é de imediato. No mundo dos vivos, se fosse como aqui, seria um tremendo caos. As pessoas têm, muitas vezes, pensamentos ruins, que poderiam se voltar contra elas mesmas.

;Bastaria, para isso, que alguém andando pela rua pisasse em nossos pé para soltarmos um palavrão e uma praga. Pronto, concretizando de imediato, seria um arrependimento atrás do outro. Acho que o mais importante por aqui é controlarmos as nossas reações emocionais, de maneira a não causar muitos estragos. Pensando desta maneira, acho que a única razão de se existir a terra dos vivos é para aprendermos a pensar, controlar melhor nossas emoções, pois delas saem toda a força do universo. Isso ficou bem claro para mim, aqui do banco. Engraçado, precisei morrer para acordar para a vida, quero dizer, para realmente começar a aprender como é que as coisas acontecem.

;Aqui deste lado ainda não encontrei ninguém. Parece tudo deserto. Apenas vejo as pessoas que são ainda de carne e osso. Ou penso que são... Será que esse treco só aconteceu comigo? Seria isso aqui o purgatório ou um lugar onde estou a espera de um Deus maravilhoso que irá me colocar em vida novamente depois de um holocausto qualquer? Para dizer a verdade, acredito que nem uma coisa e nem outra. Apenas estou preso aqui. E por acreditar, em vida, que a vida terrena era a única vida que realmente existia, não me preocupei em estudar sobre coisas além morte. E por acreditar sempre no que era mais fácil, pois exigia menos esforço, me acomodei. Acreditar em alguma coisa que apenas nos convém, é muito bom apenas para nós mesmos. Mas isso poderá trazer sérias complicações. Sempre tive medo dessas coisas, e sempre achei que eram coisas de demônios ou algo parecido, que existia sempre dois lados: O do bem e o do mal. Porém, como estou aqui deste lado agora, será que sou do bem ou do mal?

;Sinceramente não sei, e nem estou preocupado em saber. Apenas sei que sou... Mas o quê? Não importa muito! Prestem bem a atenção em uma coisa: Estou em um banco, preso. Seria o inferno? Sé é, não é de todo mal! Nada há de ruim aqui, a não ser quando penso em coisa ruins, porque realmente acontecem. E então minhas emoções afloram. O medo cresce e fico cada vez mais perdido.

;Do que preciso realmente, é de uma boa orientação. Mas, pelo que posso ver na TV, da terra, parece-me que o que mais importa por lá é algo que aqui não faz sentido algum: dinheiro. Aqui, a moeda corrente é pensamento. Pensei: “sou rico, pobre, o que quiser”. Pensei bem: “Sou do bem”. Pensei mal: “sou do mal”. Pensei outro dia, enquanto via a cena de um cara escorregando na calçada: “bem feito, é muito arrogante! Vai servir de lição para que aprenda a não andar mais depressa do que os outros”. No exato momento em que pensei isso, senti uma coisa estranha se aproximando do meu corpo. Mas, se estou morto, como posso ter um corpo? Vamos corrigir: Algo se aproximando de mim, uma espécie de nuvem negra... Depois de algum tempo, descobri que eram vibrações negativas, e isso, enquanto estava vivo, fazia com que as pessoas se afastassem um pouco de mim. Pena... isso só descobri agora! Coisa de criança, mesmo.


 

 

9. Caso “Banco do Tempo”

 

A coisa é mais simples do que parece. Difícil, é encontrar os meios. Querem ver só como se faz?

;Primeiro preciso entrar em contato com a Walkíria e pedir para que entre em contato com a Esmeralda, conte o que está acontecendo e pedir que deseje voltar para o dia em que a sonda espacial entrou em meu quarto. Simples, não é? Seria, se soubesse como fazer isso! Havia um grande problema no meio disso tudo: A Walkíria não acreditava em sua intuição. Mandei vários pensamentos para que fizesse o que acabei de mencionar, mas em vão.

;A Walkíria em vez disso, descobria a cada dia que passava, mais coisas a respeito de si própria. Resolveu que já era hora de descobrir o que de real havia acontecido com o seu pai. Descobriu. Exatamente conforme o homem que prevera o futuro lhe disse. Interessante... Agora, em definitivo, Walkíria não tinha mais dúvidas a respeito do seu passado. Mas o que mais a preocupava era o futuro. Dia a dia descobria alguma coisa a seu respeito, porém, em meio a tantas descobertas, algo a preocupou bastante: Desejou saber o que aconteceria no seu aspecto profissional, depois de alguns anos. Foi a minha sorte! E vi uma luz no final do túnel, algo que não havia pensado, mas que a Walkíria fez e acabou dando certo.

;Trata-se do seguinte: Quando pediu para que a estrela mágica lhe mostrasse o que aconteceria em um futuro não muito distante, sabem o que foi que viu? Uma tela em branco. Uma imagem vazia, nebulosa e sem vida. O que isso significaria? Não soube responder de imediato, mas aos poucos fui compreendendo. Logo de início, Walkíria pensou que estaria prestes a morrer, e como morto não tem futuro, talvez por isso, não tivesse aparecido imagem alguma. Desejou ver de que maneira morreria. Mas, a mesma coisa. Apenas uma cena esfumaçada. Que poderia estar acontecendo?

;Acontecia o seguinte: Walkíria não tinha um futuro muito distante; Não morreria; Ou a estrela estava com seus poderes danificados, ou então... Já descobriram? Fácil, operação lógica! Se não posso ver um futuro muito distante é porque de, alguma forma, algo impede que isso aconteça. Ou a estrela estava danificada, ou esse futuro não existia. E foi assim que pensei. Mandei meu pensamento. Recebendo em forma de intuição, aceitou, mas não sem antes tirar a prova dos nove. Desejou ver algo bem para frente, mas que não era relacionado com a sua pessoa. Viu tudo nublado. A estrela funcionava. “Será que realmente não terei mais futuro?” Pensava Walkíria.

;Resolveu entrar em contato com a Esmeralda. Embora as duas não se falassem, mais por falta de oportunidade do que outra coisa, foi muito bem recebida. Contou o que estava acontecendo. Não sabia porque acontecia, mas sabia que havia algo de errado. Esmeralda concordou em ajudá-la. Estudaram o caso a fundo, mas não encontraram a solução. Do lado de cá, no banco, me esforçava ao máximo para influenciar as duas com meus pensamentos. A Walkíria até que captava, de vez em quando, alguma coisa, mas a Esmeralda, nem pensar. Realmente vibrava mais alto do que eu, e isso impedia a minha aproximação.

;Com muita paciência e sempre pensando positivo, a Esmeralda acabou entendendo o que acontecia. Contou para a Walkíria. De imediato abriu o pote e pensou em voltar ao dia em que havia sido quase atropelada. Besteira dela. A única coisa que mudou, foi que o tempo em que permanecia no banco passou a ser menor. Para dizer a verdade, acho que não interferiu em nada Aqui o tempo é muito relativo.

;Pronto: O lapso temporal continuava a mesma coisa. Eu tinha que, de alguma forma, fazer com que desejá-se voltar ao dia em que a sonda entrava em meu quarto. Foram várias e várias as vezes que aconteceu a mesma coisa, sem mudança alguma. Mas a cada vez que voltava para o banco, eu sabia mais. Só não podia escrever, e como já expliquei, enquanto escrevia, embora não acreditasse muito, e encarasse mais como ficção, eu estava bem vivo.

;Porém, em uma dessas vezes em que estava de volta, no banco, uma idéia diferente me ocorreu: E se ao invés de mandar um pensamento para que a Walkíria fizesse alguma coisa, eu não tentasse fazer algo de concreto? Como, por exemplo, uma pequena ação que impedisse que a Esmeralda tomasse a atitude precipitada de desejar a mesma coisa para o pote de cheiro de cebola. Mas o que poderia fazer? Tocar o telefone naquele exato momento seria uma boa idéia! Mas como conseguir isso? Consultando a minha televisão, procurava por crianças que estivessem telefonando naquele exato momento. Encontrei. Bastava agora interferir em seus pensamentos e fazer com que discassem o número certo para quebrar a concentração da Esmeralda e mudar por definitivo o rumo das coisas.

;A criança escolhida em questão, era muito espertinha. Gastei varias e várias passagens para aprender como influenciá-la a fazer algo como eu queria. Não era muito difícil, mas como não sabia como proceder, foi meio complicado a princípio. Bem, resumidamente, depois que enchia a cabeça da criança com meus pensamentos, finalmente discou por engano o número da Esmeralda.

;No apartamento da Esmeralda, no exato momento em que ia abrir o pote para fazer o pedido, toca o telefone. Atendeu e descobriu que foi engano. Ficou furiosa, mas para a minha alegria, deu certo. Esmeralda perdeu a seqüência dos acontecimento e não desejou voltar no tempo, como antes. Refletiu, parecia estar começando a entender o que estava acontecendo. Nada comentou com a Walkíria sobre suas novas idéias. Faltava agora desejar voltar no dia certo. Mandei milhares de pensamentos para a Walkíria mas, era inútil.

;Finalmente, Esmeralda resolveu contar suas idéias a Walkíria. A história começava a tomar um novo rumo. De subto, meus pensamentos entraram nas idéias das duas. Nunca havia acontecido antes, mas agora estava dando certo. Acho que pelo susto que tomara, Esmeralda baixou por alguns momentos a sua guarda. Foi o suficiente para que entendessem o que estava acontecendo.

;Esmeralda abriu o pote e desejou voltar no tempo, mas não sabia em que exato dia. Pensou, pensou e decidiu. Ao dia em que esse pote foi consagrado...

;Eu estava em meu quarto, a nave se dirigia para o meu guarda roupas, corri em sua direção, apanhei a caixa que continha o pote e a estrela, que não sabia para que é que servia, e impedi que a sonda a sobrevoasse. Daí para frente, no dia certo morri, estive temporariamente no banco e parti em direção a uma luz que se fez presente para mim.

;Agora a questão é a seguinte: Morri de verdade. Não tem herança e, como não posso mais voltar no tempo, não posso mais escrever. Então, adeus. Fim.

;PS: Só mais uma coisa: Quem escreveu estas últimas linhas, se estou morto?


 

 

Último Aviso

 

É chegada a hora da sua grande prova. Se você está realmente disposto e preparado para prosseguir, vá adiante, mas lembre-se, não terá mais retorno. Se acha que não tem capacidade para tal, feche este livro e vá fazer qualquer outra coisa. Esse negócio de desafio não deve ser para você, mesmo.

;Quer um conselho: desista! Isso vai de certa forma, deixar você mais calminho. Melhor não prosseguir. Sabe o que te espera? O incrível. Aquilo que pode não parecer verdade, mas é.

;Desista! Essa é a sua última oportunidade.

;Mas, se insiste em prosseguir, vá mais adiante e não diga que não foi avisado. De agora em diante, apenas o final da última página poderá interessar a você. Se prosseguir, terá que ler até a última linha, para que seus pensamentos não fiquem vagando erroneamente pelo espaço, e com isso, fazendo com que uma armadilha seja montada para você.

;Sua sorte está lançada, e sua capacidade de compreensão sobre os fatos narrados anteriormente será colocada a prova. É você quem decide o seu futuro. Quer ter um? Avante, que o mundo é ainda muito elegante!


 

 

B) Segundo Tempo

 

 

1. Caso Sombra

 

Oi, tudo bem? Deixem que me apresente, antes de começar a escrever. Sou a sombra do Darlin, e de agora em diante estarei escrevendo para esclarecer a todos o que realmente aconteceu. O finalzinho da última parte quem escreveu fui eu. Acho que já perceberam.

;Pois bem. Sabem qual é o meu compromisso? Desmentir o Darlin, linha por linha sobre o que disse. Não acreditaram que realmente estava perdido no tempo, acreditaram? Não sejam crianças. Esse Darlin é realmente bem convincente. Tem uma lábia... mas não me engana. Aquele cretino! Que mentiroso!

;Pelo menos uma coisa foi dita com muita verdade. Lembram de quando foi revelado sobre não acreditar nas pessoas? Muito bem, esse sujeito é um deles. Não se iludam! Onde já se viu? Querem saber de uma coisa? Vamos começar explicando como funciona esse “treco” de tempo. É meio complicado, mas acho que consigo.

;Começarei por dizer que é muita presunção esperar que uma cheirada em um pote com bafo de cebola de um famoso anônimo pode fazer com que as pessoas tenham seus desejos realizados. Vocês, que estão lendo, acreditam em papai Noel, também? Mas já devem ter ouvido o coelhinho da páscoa dizer que o bom velhinho não existe. Mas esta é a realidade: Tudo “papo furado”!

;Acreditar, também, que uma estrela nojenta e pegajosa pode ter poderes anormais, além daqueles de causar náuseas, é muita infantilidade. Não se deixem enganar. Tudo mentira! E o pior de tudo é que acreditaram que o tempo vai e vem que nem iô-iô. Que tolice! Está certo, se trata de uma obra de ficção, mas ate aí, acreditar em homenzinhos verdes? Isso já é demais!


 

 

Hora da verdade

 

Se neste exato instante, você está com vontade de torcer o pescoço do autor, sente uma profunda decepção, ou está muito surpreso, então devo dizer que foi magistralmente derrotado. Foi avisado, mas parece que não se importou muito. Eu venci. Você perdeu.

;Mas, se pelo contrário, já esperava por isso, coisa que eu duvido, a não ser que já tenha sido esclarecido por terceiros, o que configura uma trapaça, e se trapaceou, perdeu também. Mas, se realmente já estava pronto para o que viria, parabéns, você é digno de ser considerado um vitorioso.

;O mais interessante é que o juiz de todas estas partidas é quem lê, pois a sua consciência é quem dirá se perdeu ou ganhou. Para mim, pouco importa saber, sei apenas que sou vitorioso, afinal!


 

 

Continuação... O Sombra

 

Vou, então, colocar de forma bem clara as explicações necessárias para que se convençam de que realmente Papai Noel não existe e que tudo não passou da pura imaginação do cretino do Darlin. Isso, pelo menos, tenho que admitir: imaginação fértil, tem demais! Mesmo assim, não o suficiente para me ludibriar...

;Voltar no tempo! Significa que tudo que já aconteceu deverá acontecer de novo. Um vácuo se cria e nada mais progride. Dizem os cientistas que um dia o sol irá explodir. Nesse caso, se acreditarmos na conversa fiada do Darlin, jamais acontecerá isso. Já imaginaram uma coisa: Todo o Universo parado por causa de um pote de cebola? Só por causa de uma cheiradinha? Seria cebola mesmo no pote? Não dá para paralisar o tempo só em um lugar, teria que parar tudo que existe. Que idiotice! Será que Darlin era tão ingênuo assim que acreditou que as pessoas realmente acreditariam nisso?

;Bem, há uma questão mais interessante ainda e se for verdade o que estou escrevendo, então me digam, como uma sombra pode escrever? Sem corpo sólido, para não dizer físico, porque ficaria parecendo coisa de religião. Aqui, apenas trataremos de coisas científicas, como o poder de uma sombra para relatar fatos.

;O Universo inteiro parado, indo e voltando... Darwin adoraria poderia estudar os “atóis” eternamente. Não existiria mais as fases da lua e viveríamos em uma eterna lua cheia. Que “babaquice”! Jamais deixem que um otário qualquer os engane. Já aconteceu uma vez, e tomem cuidado para que não aconteça de novo.

;Prosseguindo com o desmascaramento de Darlin, o falsário... Lembram-se de uma carta que Darlin escreveu, dizendo que era para a Walkíria? Bem, vou contar a verdade, pois sou uma sombra bem “dedo duro”. Aconteceu o seguinte: Darlin ficou mesmo bem apaixonado e desesperado porque a Walkíria queria porque queria ter um filho. Darlin, a princípio, até que topou, mas não conseguiu. Era estéril como um tubo de ensaio saído da estufa! Como resolver isso agora? Muito fácil para a Walkíria: deu um tremenda fora nele.

;Já devem ter percebido que apenas relatou fatos a seu favor, mas eu, "a sombra que vem para iluminar" vou esclarecer a verdade. Como pode uma sombra vir para trazer a luz? Acho que ainda não estou muito bem! O sujeito ficou tão decepcionado com o “fora” da Walkíria que não aceitava de forma alguma e fazia de conta que nada estava acontecendo. Era como um namoro eterno! Só para o Darlin, é claro. O mundo do faz de conta... A morte dele foi até bom demais, porque pelo menos, ficou fora de circulação, já que aqui ninguém deu por sua falta.

;O dia em que resolveu escrever a carta, já estava mais com um pé na cova do que outra coisa, e parecia mesmo não ter mais vontade de viver.

;Mas essa coisa toda tem um ponto de contradição bem estranho, embora seja até que meio engraçado. Lembram da Esmeralda? Pois bem. Aquela conversa do cretino, dizendo que acabou se separando dela por causa da menininha foi, tudo mentira também. A verdade era que queria ter um filho com a Esmeralda e a dita cuja não quis. Boba, se aceitasse! Um “pé de chinelo” o cara. Sobre isso também não li uma única linha a respeito. Nunca tinha tentado com a Esmeralda, e nem com ninguém então, não poderia saber que era estéril. Que decepção para a Esmeralda, se tivesse tentado... Ainda bem que não tentou mesmo.

;Algo que ficou pouco explicada foi sobre os poderes da Esmeralda, que de sobrenatural, não tinha nada. Tudo mentiras e mais mentiras, só para ironizá-los. Esse elcara” tá pensando o quê? A verdade era que a Esmeralda mandava nele, e pronto. Era Esmeralda quem dava as cartas. Darlin, só obedecia. Cordeirinho...

;Pensa que me enganava? Coisa nenhuma! E depois, o mais importante era que parecia gostar de ser mandado. Quem nasceu para escravo... escravo será! Como não sou, resolvi deixar para lá o Darlin. Não poderia mais prosseguir com aquele sujeito mesmo, sem corpo, sem sombra... E agora, o que será de mim?

;E por falar nisso, parece que ainda não entenderam bem a minha situação. Sou uma sombra boa e bem comportada. Mas como toda sombra que se preze, tenho meus problemas e não são poucos. Por exemplo: Na escuridão, acabo desintegrando e perco por completo a minha personalidade. Fico sem saber quem sou realmente. É como se fizesse parte de algo maior, mas não tenho forças para dominar mais situação alguma. Mas quando aparece a luz, posso me fazer presente. Daí, sou eu novamente. Pena sempre ter que estar atrás de um corpo em relação a luz. Mas melhor assim. O que gostaria mesmo é de estar na frente da luz. Meio difícil... Além de todos esses problemas, ainda tenho mais um... Não consigo transpor objetos e nem minha presença sobre eles causa qualquer inconveniente físico, a não ser, é claro, no caso de fermentação, onde a minha presença muda tudo. A única coisa que faço é impedir que a luz chegue com mais desenvoltura a um determinado local, Mas nunca recebi reclamação sobre isso. Já pensaram em um dia de sol escaldante, sem uma sombra amiga? Que terror! Tenho também os meus privilégios. Acompanho a todos, ricos, pobres, altos, baixos. O Darlin era tão baixinho que nem para fazer uma sombra de verdade, prestou.

;Mais uma coisinha a respeito da Esmeralda: Sempre mantinha uma certa distância do Darlin quando a sua filhinha estava junto deles. Isso fez com que o Darlin se distanciasse dela também, e passaram a ser um casal mais frio a cada dia. Quando Esmeralda tentou reverter a situação, já era tarde. Na verdade, Esmeralda só deu conta disso depois de um bom tempo, mas não foi culpa da menininha dela, e sim de ambos. Esse Darlin, um idiota mesmo!

;Por fim, a Esmeralda acabou programando a própria separação deles. Lamentou um “bocado”, mas já era tarde demais para retrocesso, apesar de não ter dado conta disso. Parece que ainda não atinou para o que realmente aconteceu. A culpa maior da separação foi mais dela do que dele, pelo menos do meu ponto de vista, que é o de uma sombra que só não esteve presente quando a luz era apagada, daí, não posso dizer o que lá acontecia.

;A Esmeralda, boa moça, não soube programar o Darlin corretamente e acabou ficando sem ele. Para a sorte dela, diga-se de passagem, pois o cara não era lá essas coisas.

;Lembram do dia em que Darlin viu os dois corpos no banco do parque e não sabia o que era? Um era o seu próprio corpo de carne e osso e o outro era um corpo que só pode ser visto na dimensão em que me encontro agora e que Darlin esteve preso por um curto espaço de tempo. Esse corpo pode ser descrito como sendo um corpo que não é nem o corpo de carne e osso, de Darlin e nem um espírito. Um meio termo entre os dois. Quando Darlin morreu, o corpo de carne e osso deixou de funcionar e deve estar agora desintegrado por completo; o segundo corpo, com o passar do tempo, foi se desintegrando, e o que sobrou de Darlin, realmente, foi só o que estava voando por lá e que ficou temporariamente preso ao banco. Mas isso tudo foi apenas suposição dele. Como poderia escrever se estava morto?

;Agora vou explicar o que de fato aconteceu e que, aparentemente, parece ter sido um nó no tempo. Tudo nada mais era do que o próprio Darlin imaginando e procurando uma explicação para o que tinha acontecido, já que não aceitava e se recusava a ter que viver sem a Walkíria.

;O cretino ficou tão chocado com a separação e era tão materialista, embora falasse o contrário, que não conseguia se desligar dos seus bens materiais e nem da própria Walkíria. Sabia que não poderia mais vê-la, e isso o incomodava bastante. Queria porque queria continuar onde estava. Mas de que maneira faria isso? Criou em sua mente um lapso de tempo e tudo parecia não acontecer, dessa maneira ficou eternamente esperando por alguma coisa que mudasse a situação, mas queria de verdade voltar no tempo. Estava preso, sem poder ir para lugar algum, em uma prisão que, por não ser esclarecido, acabou criando para si mesmo.

;O mais importante é que, de fato, tudo foi pura imaginação, como ele mesmo dizia, bastava pensar para que acontecesse... mas só na sua cabeça. Desta forma, o universo inteiro ficou a seu dispor, sem futuro e sem passado, em um eterno momento onde Darlin controlava tudo. Prisioneiro da sua própria ignorância! Até o dia em que um menininho sentou-se ao seu lado no banco da praça e o chamou de tio, não que Darlin fosse realmente tio do menino, mas talvez por ser pequeno demais acabava chamando todo mundo assim. Acho que tinha uns 3 ou 4 anos de idade...

;O garotinho contou como havia morrido: Um dia, brincando no quintal de sua casa, seu brinquedinho caiu dentro do curral. Pulou a cerca para apanhá-lo e um cavalo acertou-lhe um coice, fazendo com que seu pequeno corpo fosse arremessado para longe. O garotinho, assim que morreu, passou a habitar aquele outro estranho e novo mundo, para Darlin. Mas tudo isso não passava de delírios do Darlin, um morto vivo. Esse garotinho foi quem ajudou a encontrar um caminho, mas sobre isso também não falou uma única linha. O garoto que se chamava Julinho, já habitava aquelas paragens por muito tempo. Para Darlin, como não se conformava, o único jeito era ser prisioneiro. Não mudando nada, nada acontecia, e podia ficar vivendo eternamente um momento. Azar o dele, sem progresso todo esse tempo! E o que mais importa é que agora já está longe, em seu devido habitat. Morreu então, o Darlin, de verdade? Sim, claro! Alguma dúvida? Não tenha!

;Mais um porém: quando Darlin escrevia que a Esmeralda sempre dizia algumas mentirinhas, como no dia do “Pizza”, dizendo a todos que estavam comendo pizza, esqueceu-se de mencionar também que era ele próprio quem dava as idéias das mentiras e a induzia a cometer tal ato. E ainda depois a recriminava! que idiota!

;A respeito do que aconteceu com a Walkíria e a Esmeralda, a história foi contada à maneira dele. A versão delas ninguém sabe ainda, mas vou contar a vocês: Um belo dia, vendo que a Esmeralda não queria mesmo ter um filho dele, resolveu que já era hora de tentar um outro caminho. É verdade que separou-se da Esmeralda antes de namorar a Walkíria, e nunca esteve com as duas, ao mesmo tempo, mas uma coisa tem que ser dita aqui neste desmascaramento: Esmeralda e Walkíria nunca se conheceram em momento algum. Darlin era quem somava os sonhos e idealizava esse encontro, pois, naquele lugar, bastava pensar para que acontecesse. Delírio da imaginação?

;Sobre o clube do cachorrão? Nunca existiu! Foi algo que inventou para sentir-se melhor, pois acreditava ser realmente um tremendo cachorrão, embora nesse ponto tenho que concordar com Darlin foi uma baita coincidência! E a mulher do pum? Nunca existiu! Era ele quem tinha problemas de prisão de ventre e por ter vergonha disso, melhor contar como se fosse outra pessoa. Entenderam, não é?

;Das naves espaciais fica um alento mais importante. Afirmar que não existe vida em outros lugares no universo é muita pretensão de qualquer um, principalmente dos que temem perder algum tipo de poder, porém, afirmar que seres extremamente evoluídos perderam tempo com um pote com cheiro de cebola e com uma estrela bem feiosa é acreditar em Papai Noel, também. Darlin aí se deu muito mal, foi além de qualquer expectativa, inventou demais.

;Darlin sempre foi um sujeito que jamais admitiu estar errado. Dessa maneira, sempre colocava a culpa nos outros. Bastava sumir alguma coisa, que ele mesmo colocava em lugar estranho, para atribuir o roubo à empregada. Eram sempre os outros que cometiam erros. Viram o seu relato e podem confirmar isso. Ficou parecendo um herói, mas esqueceu-se de mim, sua sombra que veio para desmascarar o falsário.

;E pensando em falsário, quantos não existem por aí? Conheci um sujeito, uma vez, que sempre dizia ser uma ótima pessoa. Nunca fui sombra dele mas tive bastante contato. Sempre dizendo que era alguém muito justo! Nisso realmente passei a acreditar, até o dia em que conversei com sua sombra. Que decepção! O sujeito tinha que dizer que era bom para parecer bom, pois não era nada disso. Um tremendo de um cretino, como o Darlin. Bom sou eu, uma sombra... que mal posso fazer? Mas é isso mesmo. Quem realmente é alguma coisa, não precisa sair por aí dizendo para todo mundo. Basta saber para si mesmo e pronto. A auto confiança de quem é realmente bom é tão grande que não se prende mais a auto afirmações desconexas.

;Darlin chegou ao extremo quando mencionou a morte de um tal de Seu Antônio, que até agora ninguém sabe por que foi citado nesta história. O caso é que quem estava dentro daquela ambulância era o próprio Darlin, em um estado de nervos tão grande que estava sendo internado. Foi nesse episódio que começou o seu delírio. Triste, muito triste! E ainda contou como se esse tal de Antônio existisse mesmo. Só faltou ter atribuído esse nome a mim.

;E por falar em bondade, devo também esclarecer que embora o danado do Darlin seja um grande mentiroso, não guardo nenhuma raiva ou recentimento dele. Já o perdoei. E isso preciso também explicar melhor. Como sou uma sombra, e sou diferente de vocês que estão lendo, tenho o direito de pensar diferente. Pois bem: Perdoei Darlin, mas isso não quer dizer que não deva pagar pelos seu atos errados. Isso seria mais parecido com impunidade. Então, quer dizer que um sujeito apronta contra um outro, depois é perdoado e fica tudo por isso mesmo? Claro que não! Perdoar significa não gerar mais conflito, ódio, vingança. Mas perdoar não quer dizer tirar a responsabilidade de reparar o erro de quem o cometeu. Não quero aqui fazer apologia ao crime, e por isso acredito que quem errou, sendo perdoado ou não, tem que reparar os seus erros.

;Vejam, por exemplo, quem lhes escreve. Uma sombra. Se um dia causei escuridão a alguma coisa que merecia a luz, mesmo sendo perdoado por essa coisa, tenho que reparar o meu erro, mandando luz para aquele lugar. Mas pensando bem, como pode uma sombra mandar alguma luz para um local?

;Isso ainda vai ter que ser explicado mais adiante. Sombras não mandam luz, causam a escuridão, e não escrevem livros... Sombras são apenas lugares onde a luz não pode chegar com mais eficiência.

;Mas se uma sombra não pode escrever, e sou realmente uma sombra, quem está escrevendo?


 

 

C) Prorrogação

 

 

1. O caso Deus

 

Finalmente me deram uma brecha para poder escrever. Sabem quem sou? Simplesmente Ninguém. É isso mesmo. E vim para terminar essa história e contar a todos a minha versão.

;Na verdade a verdade não existe! E já explico: A verdade é algo relativo, também. Acreditar que existe uma verdade absoluta é admitir que o conhecimento tem um ponto de maior limite, onde, supostamente, Deus é o retentor dessa sabedoria primordial. Mas, acreditando nisso, posso afirmar que um dia, talvez daqui a alguns trilhões de anos, poderei ser tão inteligente e ter tanta sabedoria quanto Deus. Isso, se acreditam em reencarnação! Pois, se não acreditam, não faz o menor sentido isso tudo, e a morte é o fim de algo que não serviu para nada, apenas para cultuar a matéria, já que nesta esfera onde vivemos, a matéria parece ser o mais importante. Se assim for, o homem é dispensável e não precisa existir. Mas se existe, é apenas para ser o guardião de máquinas e mais matéria. Apenas escravos de matérias. E como acredito que Deus não faria isso comigo, pois sou seu filho, essas últimas afirmações não fazem o menor sentido também.

;Pois bem, voltando ao caso de Deus, se realmente a verdade for absoluta, então um dia seremos todos deuses, de um Olimpo qualquer quem sabe... Mas, se acreditarmos que a verdade se transforma, dependendo do nível de atuação intelectual de um indivíduo, Deus também está em permanente evolução.

;Isso pode parecer uma resposta para as coisas que disse anteriormente, mas de verdade, se é que a verdade existe, isso pode levar a uma conclusão ainda pior. Sabem qual é? Se acreditarmos que Deus também esta se aprimorando a cada dia, é a mesma coisa que dizer que Deus não é perfeito. E se Deus não é perfeito, como foi que criou o Universo tão perfeitamente? Ou será que o Universo também está em progressão, de maneira que se adapta e se aperfeiçoa a cada instante?

;A verdade, desta maneira, não pode ser conhecida. Acredito que o não conhecimento da verdade, como é, realmente explica mais do que dizer que verdades não existem de forma absoluta.

;Mas vim para explicar, e vou começar. Darlin existiu e ficou tão paranóico com sua separação da Walkíria que acabou enlouquecendo. Não morreu, é claro, mas se transformou em um alucinado. Escreveu a parte que lhe cabia. A sombra que escreveu este último capítulo simplesmente não passava de um disfarce de Darlin para poder falar mal dele mesmo. Sua dupla personalidade... Quem gosta de falar mal de si mesmo? Ninguém! Essa foi a forma que Darlin encontrou para revelar a sua Segunda verdade. A que Darlin mesmo descobriu depois que começou a se recuperar. Como iria parecer um idiota desmentindo tudo que escreveu anteriormente, resolveu assumir a idéia de uma sombra falante. Até que ponto isso é verdade, fica a critério de vocês decifrarem, pois há uma versão que explica cada ponto bem pormenorizadamente, depois tens uma outra versão que contradiz a primeira em muitos aspectos, e agora uma terceira versão, que tenta amenizar as coisas e dar um sentido para tudo.

;E agora, qual é a verdade? Existem sempre três verdade: A minha, ou seja, naquilo que realmente acredito, a Segunda verdade é a sua, ou seja, aquilo que você realmente acredita, e por final, a terceira verdade, que é o fato como realmente aconteceu. E isso, só quem pode dizer como foi, é ninguém...

;Já ouviram dizer que quem conta um conto aumenta um ponto? É como se cada coisa acontecesse para cada pessoa da mesma forma, mas dependendo do desenvolvimento de cada um, parece acontecer de uma maneira diferente.

;Interessante isso! Muito, mesmo! Mas a que conclusão chegamos ao final? Vou lhes contar agora: Conhecem a verdade de Darlin. Conhecem a verdade da Sombra. Conhecem agora a verdade de Ninguém. E a conclusão fica a critério de seu próprio desenvolvimento. Dependendo do grau de sua instrução e capacidade de entender e compreender fatos tão conflitantes, poderá chegar a conclusões diferentes. O importante não é o que todos entenderam, mas saber se entendi mais do que os outros. O fato que mais importa é aquilo que acredito, por isso, jamais poderá ser derrubado. Mata-se um homem, mas não se derruba seu ideal.

;Querem mais um exemplo de contradições que podem ser perfeitamente explicadas?

;Pois bem, eis mais algumas linhas. Vou falar a respeito da coragem e do medo.

;Só tem coragem quem tem medo. Pode parecer estranho, mas é isso mesmo, do meu ponto de vista. Podem discordar e até dizer que é mentira, mas não sem antes lerem a minha explicação, pois não podem contestar aquilo que não conhecem. E vou lhes apresentar esta interessante questão.

;Imagine alguma coisa que não tem o menor significado para você, como uma formiga, ou um outro inseto inofensivo, como uma pulga. Pode ser repugnante, mas é insignificante. Uma formiga, se anda pelas nossas pernas, simplesmente a enfrentamos sem o menor receio, sem a menor hesitação. Isso não é uma coisa que requer coragem para ser feita. E pode ser considerada um ato comum. Pois bem, chegando ao cerne da questão, vamos agora imaginar uma barata. Muita gente tem medo de baratas, bicho repugnante! Ou então, pensem em alguma coisa que realmente lhe dá muito medo. Continuando a admitir que barata é uma coisa de que se tem muito medo, enfrentá-la é um gesto de bravura. Precisa de coragem para enfrentar uma barata quando temos medo dela. Aí fica explicado porque a coragem depende do medo. Não tenho medo de baratas... assim, enfrentá-las, é um simples gesto, sem a menor importância. Mas para quem tem medo de baratas, enfrentá-la requer muita coragem. Entenderam agora o porquê do medo ser tão ligado a coragem?

;Quem poderia de verdade afirmar que realmente não foi visitado por naves extra terrestres?

;Já ia me esquecendo. Lembram da Mariazinha? A mulher para quem a Esmeralda ia telefonar? Pois é, nunca existiu também, e se não existia não poderia aparecer na história dele. Confuso? Deixa eu ver se entendo: Darlin não mencionou nada a respeito da Mariazinha por que não existia nenhuma Mariazinha. Mas, e o resto da história que inventou? Não faz sentido, mas o que é que vocês queriam que fizesse? Lembrem-se, Darlin estava em um estado de total e absoluta demência. E quem se encontra neste estado pode dizer coisas confusas e coisas verdadeiras, ao mesmo tempo, que façam sentido.

;A verdade sobre essa historia toda é a seguinte:

;Quem é responsável pela escrita deste livro?

;Finalmente acho que compreenderão, e assim, vou explicar mais uma vez, em definitivo.

;Darlin ficou seriamente doente. Escreveu a primeira parte, alucinadamente. Quando começou a se recuperar, escreveu a parte do Sombra, e por fim, quando estava já com cem por cento das suas faculdades mentais em bom estado, escreveu a parte de Ninguém, que é esta que você está lendo.

;Agora resta só um porém: Perceberam como quando Darlin estava debilitado mentalmente teve muito mais facilidade em enganar as pessoas de bem, que são perfeitamente normais? É, isso é coisa muito séria para se pensar a respeito...

;Atenciosamente,

Simplesmente,

Dr. Ninguém.


 

 

Esclarecimentos

 

Com uma nova proposta de entretenimento, o autor vem até o leitor de maneira prática expor sua obra.

;Com o desejo de que seja lido indiscriminadamente, este livro foi colocado gratuitamente a todos que estejam interessados.

;Divulgar e apresentar estas páginas a outras pessoas caberá a você leitor, que, se gostou da história, com certeza irá comentar com os amigos.

;Partindo deste princípio, o da propaganda boca a boca, idéia tão boa para o leitor, para o autor trás alguns inconvenientes.

;Inconvenientes como não saber ao certo quantas cópias já foram distribuídas e não ter a menor idéia do trajeto que elas tomarão.

;Tentando traçar uma rota, gostaria de receber notícias de quem já leu, gostou ou odiou. Sua localização, e como recebeu o livro.

;Portanto, agora é a hora da vingança: Se perdeu, poderá chorar as mágoas diretamente com o autor. Se ganhou, venha contar vantagens!

;O autor agradece.

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Maio 2001

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