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A Outra Face do Destino

Romero Evandro Carvalho


 

A Outra Face do Destino
Romero Evandro Carvalho
Fonte digital: Documento do Autor
romeroevandro@hotmail.com
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© 2012 Romero Evandro Carvalho


 

Romero Evandro Carvalho

A OUTRA FACE
DO DESTINO


 

Jalal, Muhammad, Mutanabi, Zayani, Makin, Nasib, Ibn Alawi, Jade, Layla, Antar, Muhamnad Zayani, Banzhir, Rhada, Bellary, Jayadeva, Sankara, Indira e Jamini, são os personagens, árabes e indianos, componentes desse romance.

Desejo inicialmente, agradecer ao leitor ou a leitora, a escolha de “A Outra Face do Destino”. O romance, oferece, diálogos e exposições comuns, e de alguns fatos espirituais, ocorridos no íntimo do lar e, também fora dele, inseridos à parte do texto romanceado dos capítulos, visto à Luz da Doutrina Espírita.

Exemplificando: quando narro diálogos familiares, o assunto ventilado, familiar, que se circunscreve no seio da família, inseridos nos textos dos capítulos, remeto o caro leitor ou leitora, ao entendimento correspondente que dá a Doutrina Espírita, sobre tal assunto ou fato, indicando a obra.

Exemplo citado — a “família”: “...todos os que se ligam numa existência, por empenhos, já viveram juntos...” ( Obras Póstumas – Allan Kardec).

Da mesma forma, quando descrevo no texto sobre: amizade, solidariedade, profissão, amor, fraternidade, sabedoria, orgulho, caridade, médiuns, simpatia, calamidades, pressentimentos, livre arbítrio, egoísmo, oração, trabalho, pensamentos, morte, evolução, reencarnação, encontros, casualidade, beleza, destino, sonhos, felicidade, imortalidade, visão, espírito familiar, encarnação, compreensão, perdão, cólera, acontecimentos, lamentações, flagelos, casamento e futuro.

Todos os ensinamentos que a Doutrina Espírita nos oferece para o nosso bem estar e aprendizado, intercaladas neste romance, foram extraídas dos livros básicos: O Livro dos Espíritos, O Livro dos Médiuns, O Evangelho Segundo o Espiritismo, Obras Póstumas de Allan Kardec, Caminho, Verdade e Vida e Fonte Viva de Emmanuel.

Assim sendo, é desejo do autor, que o leitor ou a leitora, não fiquem apenas na superfície das conceituações e ensinamentos aqui gravados, mas que, se aprofundem nos estudos sistemáticos das Obras Básicas do Espiritismo, que com absoluta certeza, obterão respostas convincentes para as possíveis dúvidas, que de alguma modo, ainda tenham, sobre alguns pontos nebulosos, que persistem em suas vidas, não esclarecidos.


 

 

Capítulo – I

 

Jalal al Azis, saudita, crescera numa região agrícola, nas fraldas das montanhas de Asir.

Voltados para as atividades puramente agrícola, seus familiares cultivavam em terraços: a cana-de-açúcar, o sorgo, o café e uma planta denominada “qat”, com alto teor analgésico e que se consumida em excesso, causava euforia.

Ele estava sempre a escutar dos seus familiares uma previsão de que as terras da propriedade estavam cada vez mais pobres em nutrientes e, como conseqüência, a produção estava diminuindo gradativamente.

Essa preocupação era uma constante, visto que atingiria diretamente a sua família, e muitas pessoas ligadas a essas atividades na região.

Jalal, além de fazer parte do grupo de trabalho no campo, era um bom observador e estudioso. Conhecia bem as fases evolutivas das plantas, assim como, a influência do clima sobre elas. Dentro do seu sentido de observador, aconselhava o seu pai para que providenciasse um rodízio dos cultivares.

Concluída a escola secundária, ele se deparou com uma grande interrogação: O que fazer agora? Devo encerrar o meu ciclo de estudos? Devo ser como os outros, continuar aqui e ver essas terras minguarem? Os dias passavam, e ele estava sempre com estes questionamentos em sua mente.

Certa tarde, quase noite, após o trabalho extenuante no campo, ele estava a descansar recostado numa das tamareiras, que certo dia plantou, quando ouviu alguém chamando-o.


Por motivos de ordem mais geral, o Espírito renasce, às vezes, no mesmo meio, na mesma nação, na mesma raça, por simpatia ou para continuar, com os elementos, já laborados, os estudos a que se dedicou, aperfeiçoar-se, prosseguir os trabalhos começados que a brevidade da vida ou as circunstâncias não permitiram concluir”

(Obras Póstumas – Allan Kardec— Ed. Lake — 11ª ed. – pag.167)

 

— Jalal!

Sentou-se imediatamente, viu que era seu avô, e logo justificou-se.

— Meu neto, não tenho necessidade da sua justificativa. Acho que desse descanso você é merecedor. Pode sentar-se que eu também farei o mesmo. Este lugar é realmente muito aconchegante e propício para viajarmos mentalmente, e a visão que temos daqui é muito bonita. No entanto, se chegarmos perto, notaremos que não é bem assim.

De uns tempos para cá, tenho observado que você, vez ou outra, fica pensativo. Acaso seria alguma coisa ligada ao coração? Afinal, você já é um homem feito!

Eram raras as vezes que seu avô tomava a iniciativa e entabulava uma conversação com ele mais consistente.

— Jalal, sei o que se passa agora no seu pensamento. Realmente, são poucas às vezes que lhe dou a chance e também me dou de termos uma boa conversa. Em decorrência da nossa educação, do nosso modo milenar de agir dentro do meio familiar, no estabelecimento de uma hierarquia rígida, hoje eu acho que perdemos muito no sentido de vivenciarmos juntos, no contato mais estreito com os nossos queridos. Deixamos na verdade, de acompanhar e poder ajudar no desenvolvimento dos nossos filhos, e, até mesmo, de outro modo, recebermos deles este ou aquele conselho. Afinal, devemos entender que somos uma família, uma sociedade que é organizada, e que as relações entre as pessoas têm que ser auxiliadoras, harmônicas e respeitosas.

Só com muitos anos passados, eu consegui vislumbrar e me ater ao que Allah quer nos dizer: que todos nós somos iguais, e que tudo foi e esta doado a todos nós, sejamos, homens ou mulheres. Não há entre nós nenhum indivíduo de primeira classe, segunda classe, terceira classe e assim por diante. Há, sim, aqueles ou aquelas que se destacam e visualizam novos horizontes. Admitir homens mais privilegiados que as mulheres, eu não concordo mais. A meu juízo, acho que o amor, a felicidade, a sabedoria, o conhecimento, o entendimento, as artes, a evolução interior e o progresso exterior, estão ao alcance de todas as criaturas.

 

(“Meus caros condiscípulos, os Espíritos aqui presentes vos dizem, por meu intermédio: “Amai muito, a fim de serdes amados”. É tão justo esse pensamento, que nele encontrareis tudo o que consola e abranda as penas de cada dia; ou melhor: pondo em prática esse sábio conselho, elevar-vos-ei de tal modo acima da a matéria que vos espiritualizareis antes de deixardes o invólucro terrestre. Havendo os estudos espíritas desenvolvidos em vós a compreensão do futuro, uma certeza tendes: a de caminhar para Deus, vendo realizadas todas as promessas que correspondem às aspirações de vossa alma. Por isso, deveis elevar-vos bem alto para julgardes se as constrições da matéria, e não condenardes o vosso próximo se terdes dirigido a Deus o pensamento”

(O Evangelho Segundo o Espiritismo – cap. XI – 10 – Sansão)

 

Acho que já falei muito, mas não se admire, pois nós velhos, quando notamos que temos ouvidos a nos escutarem, e corações a solidarizarem-se com as nossas dores ou com nossos sentimentos e observações, não perdemos a oportunidade e despejamos em nossos ouvintes, o que estava represado em nosso íntimo.

Sabe de uma coisa Jalal: dizem que nós velhos, adquirimos da vida mais sabedoria. Realmente temos! Mas os mais moços, em virtude do seu vigor, da sua vivacidade, não têm paciência de nos solicitar ou de ouvir os nossos conselhos ou as nossas observações. Mas Jalal, diga-me, o que se passa em seu pensamento?

 

(“A solidariedade que é o verdadeiro laço social, não é só para o presente, estende-se ao passado e ao futuro, pois que os mesmos indivíduos se encontram, e se encontrarão para juntos seguirem as vias do progresso, prestando mútuo concurso. Eis o que faz compreender o Espiritismo pela equitativa lei da reencarnação e da continuidade das relações entre os mesmos seres”

(Obras Póstumas – Allan Kardec – E. Lake — 11ª ed.— Espírito Clelie Duplantier— pag.166)

 

— Meu avô, deixe-me antes lhe dizer: nessa minha curta existência, hoje, nesta hora crepuscular, considero ser o melhor momento da minha vida, pois estou embevecido com a sua sabedoria. Vou lhe dizer o que se passa na minha cabeça: eu completei o meu curso secundário e, por força da dedicação aos estudos nos intervalos do trabalho, obtive um bom desempenho escolar e graduei-me em primeiro lugar dentro da minha turma.

Eu penso agora no futuro; no meu futuro, no futuro dos meus familiares, da minha terra onde nasci; no futuro da minha pátria. Tenho anseios de conhecer mais, de estudar mais, de conhecer pessoas, de adquirir mais sabedoria e poder assim, trazer para cá, alguma coisa boa para nosso progresso.

— Meu querido neto, acho que esse sentimento no que concerne a nós, seus familiares, a sua terra natal e ao seu país, é enobrecedor. Devemos sempre agradecer as nossas raízes, aos nossos ancestrais e, à terra que nos dá o teto e o fruto. Este é um sentimento importante que deverá estar sempre vivo em nossos corações. Agora, quanto ao seu futuro, isso é uma prioridade. O que desejo lhe dizer é o seguinte: escolha o seu objetivo, trabalhe e alcance-o.

 

Pode pois admitir-se como regra geral, que todos os que se ligam, numa existência, por empenhos comuns, já viveram juntos, trabalhando para o mesmo fim, e encontrar-se-ão no futuro, até que o tenham alcançado, isto é, expiado o passado ou cumprido a missão que aceitaram”

(Obras Póstumas — Allan Kardec— Ed. Lake — 11ª Ed.-Espírito Clelie Duplantier –pag.165/166)

 

— Mas os empecilhos são grandes ; são as muralhas sócio-econômicas que me impedem de sair para continuar os meus estudos em nível superior.

— Jalal, preste bem atenção no que vou lhe dizer: não existe nenhuma muralha que possa impedi-lo de conquistar os seus objetivos. Não incuta isso na sua cabeça. Isso não existe. Afinal, você é um cidadão como qualquer outro, não só em nosso país, como em algum outro, e que não deve considerar-se, nem ser considerado um homem de segunda classe, que não pode ter objetivos maiores. Abra o seu coração comigo. Eu tenho certeza que vou compreendê-lo e que, se eu puder ajudá-lo, eu farei tudo o que estiver dentro das minhas possibilidades de entendimento e aconselhamento, assim como, nos meus meios materiais.

— Vovô, sinto perfeitamente em meu coração a sua afeição por mim, e não tenho a menor dúvida de que, para proteger-me, o senhor, não só se despojará do seu albornoz, ofertando-me, como também irá assentar na minha cabeça a sua linda galabia. Agradeço de todo meu coração a sua atenção para comigo.

— Jalal, meu neto, tenha como certo que de nada me adiantaria esse acúmulo de tempo que tenho experimentado se não fosse para ter no meu coração um sentimento de amor, de fraternidade, de união e de ajuda. Eu sinto, no mais fundo do meu entendimento, que a nossa região não está mais comportar os seus anseios e que você quer, como um pássaro, alçar vôo.

— Quero mesmo... Quero voar... Mas não um vôo recreativo. É minha vontade matricular-me numa Universidade, e cursar a faculdade de agricultura. Essa minha vontade está diretamente ligada a nós mesmos que habitamos essa região. Como o senhor sabe muito bem, devido à sua observação de muitos e muitos anos, as terras agricultáveis da nossa região estão se degradando e, conseqüentemente, as diminuições de cada safra. Quero aprender a cuidar das nossas terras, e poder oferecer ao nosso povo, técnicas novas e, assim possibilitar às gerações futuras, melhores garantias para aqueles que se prestam, gostam e têm a necessidade de viver a ela vinculados.

— Eu não sei se você, em todos esses anos passados, sentiu falta de um diálogo mais estreito entre nós. Mas eu lhe confesso sem nenhum melindre, e me penitencio por não ter provocado mais vezes, esses diálogos há muito mais tempo. Noto nesse momento que, se tivéssemos conversado mais, ambos teríamos aprendido muito. Sem querer demonstrar qualquer ostentação, por todos os meus largos anos de labuta, aprendi muito. Posso dizer que adquiri um pouco de sabedoria com o trabalho e com a observação da vida, de uma maneira geral. Agora, você, embora ainda muito jovem, já revela a sua sabedoria, que vem da sua própria alma; que já nasceu com você.

 

Sendo insuficiente uma única existência corpórea para adquirir todas as perfeições, toma um corpo tantas vezes quanta lhe é necessário, trazendo, quando se reencarna, o adiantamento adquirido nas anteriores existências e na vida espiritual”

(Obras Póstumas – Allan Kardec – Ed. Lake – 11ª – pag. 153)


 

 

Capítulo — II

 

— Jalal, nós temos um parente em Djedda, é o meu irmão Makin, portanto, seu tio-avô, que trabalha no ramo do comércio de tapetes, e também tem uma função na administração do porto. Eu pretendo ir a Meca no próximo mês. Gostaria que você fosse comigo, pois quero recomendá-lo ao meu irmão, para que você possa ficar sob a sua guarda e matricular-se na faculdade.

— Mas eu tenho que falar com papai e pedir a sua permissão.

— Quando você for fazer isso, eu quero estar na sua companhia.

— Vovô, que eu saiba, em Djedda, não tem a faculdade que eu quero cursar. A faculdade de Agricultura, está em Riyad.

— Mesmo assim, vamos a Djedda. Acho que Makin, por suas atividades, deve ter algum contato que possa nos ajudar. Mas antes, vamos ao encontro do seu pai. Devemos apressar esse assunto.

Antes de se porem, a caminho, foram surpreendidos por Mutanabbi.

— Há tempo que os vejo aqui. O que confabulam?

— Meu pai, queremos mesmo falar com o senhor. Trata-se da continuação dos meus estudos.

E ele contou os seus desejos e as razões deles. Muhammad, avô e pai, também opinou, e prontificou-se em ajudar o seu neto.

— Pelo que posso notar papai, para o senhor, o que pede Jalal, já é algo certo e resolvido!

— Realmente, entre eu e Jalal esse assunto já está resolvido. Mas nós aqui estamos, para pedir a sua permissão e aquiescência ao projeto de vida do seu filho, que no meu entender será de grande proveito, não só para ele próprio, como para a nossa estirpe, e também, para o nosso país, se tudo se desenrolar favoravelmente. Meu filho avalie bem: eu não estou, de nenhum modo, deixando de levar em conta a sua autoridade de pai. Estamos aqui, no desejo de obter a sua permissão e concordância para que o seu filho possa atingir os seus objetivos de estudo. Eu, como você disse, estou plenamente de acordo com as pretensões dele.

Papai, observo, que Jalal é estudioso, e que ele se destacou no curso que concluiu, e que também é um bom observador do nosso trabalho. Acho muito bom, ele fazer um curso superior de Agricultura; ficarei orgulhoso! Mas há uma algo relevante que deveremos considerar: como mantê-lo estudando em Riyad?

— Mutanabbi, não vamos atropelar os acontecimentos. Inicialmente nos diga: você permite que ele vá comigo a Djedda para conversarmos com o seu tio Makin a respeito?

— Permito!

— Então, Jalal, iremos a Djedda o mais breve possível. Lá ficaremos alguns dias, e vamos ver o que Makin tem a nos dizer. O que me parece, é que em virtude das atuações profissionais que exerce, ele possa ter um bom relacionamento com pessoas influentes.

— Papai, eu vou antecipar algumas ordens aqui, pois também quero ir com vocês.

— Ótimo, assim mostraremos que estamos unidos, duas gerações em favor de Jalal, como que, a emancipá-lo, para que ele imprima a sua vontade com determinação, com a simplicidade que nos é peculiar, sem orgulho ou ostentação e, assim, alcance o que deseja e tenha sobre os seus ombros, a responsabilidade pelos seus atos, que se forem honestos, produzirão bons frutos, e os louros serão só seus, mas, se forem perniciosos e áridos, os seus reflexos também cairão sobre as nossas cabeça

 

O orgulho é o terrível adversário da humildade. S o Cristo prometia o reino dos céus aos mais pobres, é porque os grandes da Terra imaginam que os títulos e as riquezas são recompensas deferidas aos méritos e se consideram de essência mais pura do que a do pobre. Julgam que os títulos e as riquezas lhes são devidos, pelo que, quando Deus lhos retira, o acusam de injustiça. Oh! Irrisão e cegueira! Pois, então, Deus os distingue pelos corpos? O envoltório do pobre não é o mesmo que o do rico? Terá o Criador feito duas espécies de homens? Tudo o que deus faz é grande e sábio; não lhe atribuais nunca as idéias qu os vossos cérebros orgulhosos engendram”

(O Evangelho Segundo o Espiritismo – cap. VII )


 

 

Capítulo — III

 

Makin os recebeu efusivamente e, promovendo uma reunião festiva, comemoraram o encontro.

Após o fausto repasto, entabularam conversações a respeito das pretensões do jovem.

O anfitrião lhes respondeu que podia ajudar, pois tinha amizade com um professor da Universidade de Djedda e, imediatamente, por telefone, marcou uma audiência com o mesmo para o final da tarde.

— Enquanto não chega a hora de nos avistarmos com o professor, vamos até a minha loja que eu quero presenteá-los.

— Tio Makin, por favor, nós aqui estamos a lhe pedir um favor, não é justo que nos presenteie — disse Mutanabbi.

— É um prazer, sobrinho. Por favor, recebam os presentes. Esse meu oferecimento, brota do meu coração.

 

Jalal se encantou com a construção soberba da Universidade Real de Djedda.

Frente ao professor, de modo desenvolto, ele expôs as suas pretensões e os objetivos que queria alcançar.

Atentamente ouvido, recebeu do professor elogios e incentivo, para que realmente encarasse os seus desejos com determinação, pois as dificuldades sempre existirão, mas que, deveriam ser ultrapassadas com equilíbrio.

— Jalal — disse o professor — em nossa Universidade, nós não temos o curso que você deseja — Agronomia. Esse curso só é ministrado em Riyad. Mas, se é isso mesmo que quer, eu posso ajudá-lo. Tenho alguns amigos que lá lecionam.

E o professor deu a Jalal uma carta de apresentação, endereçada a um amigo, também professor, solicitando atendimento, para os desejos do jovem, junto à Faculdade de Agronomia.

— Amanhã eu me comunicarei com meu amigo, para que ele o receba. Quando você pretende ir?

— Tenho que acertar essa viagem com o meu pai e meu avô. Talvez dentro de uns vinte dias, não é papai?

— Acho que dentro desse prazo, poderemos adiantar o que tivermos que fazer de mais importante, e viajarmos.

— Ótimo, assim eu já alerto o meu amigo, e ele ficará aguardando-o.

Jalal, agradeceu o empenho do professor em ajudá-lo, e prometeu muito estudo e dedicação para as necessidades do país.

— É isso mesmo que nós, professores, almejamos dos nossos alunos. Muito empenho em favor do nosso povo. - acrescentou o professor.

Makin, Mutanabbi e Muhammad também agradeceram a atenção do professor.

 

— Makin, amanhã iremos para Meca. Temos grandes motivos para com a nossa religião, agradecermos o que conosco está acontecendo. Se você nos permitir, na nossa volta, temos a intenção de ficar uns dois dias aqui em Djedda, para conhecermos melhor a cidade. Gostaríamos então, de usufruir da sua hospitalidade.

— Meu querido irmão, sobrinho e sobrinho-neto, é um grande prazer para o meu coração que isso aconteça. Venham à minha casa quando quiserem e aqui se hospedem o tempo que desejarem. Se por ventura eu aqui não estiver, estarei em negócios em Riyad. E se isso acontecer, deixarei ordens para recebê-los, como se eu aqui os recebesse.

 

Como peregrinos chegaram a Meca.

Após cada um, vestir dois panos brancos sem costura, um enrolado na cintura e outro cobrindo a parte superior do corpo (ihram), percorreram, orando, as sete voltas em torno da Kaaba (tawaf).

Cumpriram outras obrigações religiosas, e depois, deveriam raspar a cabeça ou simplesmente cortar uma madeixa. Jalal raspou a sua cabeça.

 

Espírita é quem aceita os princípios da doutrina e conforma com eles as suas obras.

É uma opinião, como qualquer outra (religião), que todos têm o direito de professar, como tem o de ser judeu, católico, protestante, furierista (Doutrina de Fourier), são-simoniano (doutrina socialista de São Simão), voltariano, cartesiano, deísta e até materialista...”

(Obras Póstumas – Allan Kardec— Ed. Lake – 11ª — pag.198)

 

De volta a Djedda, eles não encontraram Makin. Ficaram dois dias em Djedda, e viajaram para Asir.


 

 

Capítulo — IV

 

Ao retornarem a Djedda, Makin lhes dá uma notícia de que, quando esteve em Riyad, a negócios, estabeleceu contato com um grande comerciante, seu amigo, e que este prometeu ajudar Jalal. Makin, então, escreve uma carta de apresentação, sobre o seu sobrinho-neto, endereçada ao seu amigo, Ibn Alawi.

 

Em Riyad, avistaram-se com Ibn Alawi, grande comerciante. Sem perder tempo, rumaram para a universidade e, mesmo sem marcarem uma audiência, conseguiram encontrar-se com o Reitor.

— Alawi, que surpresa é essa? Não venha me dizer que você quer me vender algo! Eu não estou comprando nada!

— Não, não, meu querido amigo Reitor! Venho aqui, junto com essa comitiva da região de Asir, região agrícola, apresentar-lhe este jovem, que admito, deverá ser um grande promessa profissional para a nossa agricultura. Mas, para isso, nos solicitamos a sua ajuda. Ele deseja matricular-se na faculdade agrícola.

O Reitor, homem experiente, sem valer-se do seu cargo, mirou fixamente os olhos do jovem, sendo por este, correspondido, constatou que a sua frente, estava uma criatura de origem simples, mas, determinada, e que ali, estava respaldada pelo apoio presencial dos seus ascendentes e do seu dileto amigo, o que lhe permitia ponderar, que não estava perdendo tempo.

— Meu jovem, você trouxe o seu currículo escolar?

— Está aqui senhor.

O Reitor examinou-o detidamente e, depois de alguns minutos, perguntou: — Mas meu jovem, porque quer cursar a faculdade agrícola? São poucos os alunos que se interessam por ela. A maioria quer cursar a Faculdade do petróleo, Tecnologia ou Computação.

— Senhor Reitor, é sabido, que a porcentagem da nossa área cultivada, chega a somente um por cento, e, nós importamos oitenta por cento dos alimentos. Li certa vez, que temos um milhão setecentos e cinqüenta mil quilômetros quadrados, e disso, apenas quinze por cento, são terras cultiváveis, e desses, como já disse, apenas um por cento dessas terras, está sendo trabalhada.. Por duas causas isso se justifica atualmente, na minha análise: o nosso território árido e a falta de interesse, que nesse último caso, o senhor já mencionou. Mas se temos uma área territorial difícil, com bastante aridez, a Austrália também a tem em grande proporção, Israel também, se considerarmos o tamanho do seu território, o Egito igualmente, os Estados Unidos, e também, podemos considerar o Brasil, na sua região nordeste, embora a incidência de aridez não seja tão forte. No entanto, de alguma forma, eles estão obtendo sucesso no cultivo de parte dessas terras áridas. Assim sendo, eu penso, pelo menos essa é minha pretensão de colaborar de alguma forma com o nosso país, e incrementar algo para termos mais alimentos para o nosso povo. O senhor sabe que uma boa parcela do nosso povo, está com problemas de desnutrição.

O Reitor, mais uma vez analisou o histórico escolar e observou: Você sempre foi um bom aluno!

— Alawi, você disse que não iria me vender nada, realmente não me vendeu, mas me trouxe, talvez, uma boa promessa para o futuro do nosso país. Eu quero investir na potencialidade desse moço. Mas tem uma coisa que deve ser importante para você — apontando para o jovem — eu vou acompanhá-lo de perto!

— Senhor Reitor, eu agradeço a sua ajuda e lhe prometo muita dedicação.

— As aulas iniciar-se-ão dentro de trinta dias, mas a partir de hoje, você já está matriculado informalmente. No transcorrer desses trinta dias, as matrículas estarão abertas. Nesse período, venha aqui, com todos os seus documentos, que eu o encaminharei para, formalmente, realizar a sua matrícula.

— Amigo Reitor, convido-o para fazer-me uma visita. Temos boas novidades.

— Está bem Alawi, qualquer hora eu passo por lá.

Despediram-se, todos, imensamente agradecidos.

 

Antes de saírem do prédio, Jalal manifestou o seu desejo de avistar-se com o professor para o qual tinha uma carta, de outro professor da Universidade de Djedda. Nesse encontro, Jalal comunicou, provisoriamente já estava matriculado na Faculdade Agronomia.

Foi cumprimentado pelo professor, que se dispôs a ajudá-lo, no que fosse da sua alçada.

 

— Senhores Muhammad, Mutanabbi e meu jovem Jalal, convido-os, para que se hospedem em minha casa, o tempo que quiserem, antes de regressarem a Asir. Assim, Jalal já começa a se acostumar com a capital. Outra coisa , estou oferecendo a Jalal, um emprego na minha loja, como vendedor, desta forma, além dele custear os seus estudos, assim também, vai se aprimorando a vender bem as suas idéias.

— Sabe, Jalal, nessa nossa vida, nós estamos constantemente vendendo alguma coisa; seja algo material ou nossas idéias. E numa loja, você aprende a vender não só a mercadoria, como também, a entender a idéia do comprador. E assim, você oferece o que realmente ele quer, e desta maneira, ficam satisfeitos o comprador e você, que é o vendedor. Dessa maneira, obtém-se o lucro, seja em dinheiro ou em atitudes e a compreensão de outras pessoas com relação a você; em seu favor. Nessa vida, tudo que tivermos em nosso favor, é muito bom! Principalmente, o bom conceito que as pessoas fazem de nós.

Os três, pai, filho e avô, chegaram até a beijar às mãos de Alawi, de tão agradecidos que ficaram, com a atenção que lhes foram dispensadas de forma bondosa e, até caridosa.

 

O aviso do Instrutor Divino nas anotações de Lucas significa : -daí esmola de vossa vida íntima, ajudai por vós mesmos, espalhai alegria e bom ânimo, oportunidade de crescimento e elevação com os vossos semelhantes, sede irmãos dedicados ao próximo, porque, em verdade, o amor que se irradia em bênçãos de felicidade e trabalho, paz e confiança, é sempre a dádiva maior de todas”

(*Fonte Viva – Emmanuel – cap. 60)

 

De volta a Djedda, eles comunicaram a Makin que foram muito bem recebidos por seu amigo, e que Jalal, já poderia considerar-se um universitário e, que também, estava contratado como vendedor, na loja do senhor Alawi.

— Isso então merece uma comemoração. Teremos um grande jantar! Logo mais à tarde, a minha filha estará vindo de Paris, onde lá, cursa medicina.

Durante o jantar, Muhammad dirigiu-se a Nasib: — Você tem um nome muito bonito e expressivo; ele quer dizer: "poema de amor, de ternura e de paz".

— Makin, ela lembra muito a nossa mãe, não acha?

— Obrigada meu tio por esse ensinamento; eu ignorava que o meu nome trouxesse tantas coisas boas; e quanto a ser parecida com a vovó, isso me deixa muito envaidecida.

— Prima Nasib, você já escolheu a especialidade? perguntou Jalal.

— Eu penso em fazer clinica geral e, posteriormente, especializar-me em ginecologia, com ênfase em gestação de risco e obstetrícia. O meu objetivo, também, é inaugurar em Djedda um hospital da mulher, tal qual existe em Paris, só que em menores proporções, pois lá, o hospital é do governo.

— Seus propósitos são ótimos minha filha, pois vão ao encontro das necessidades que enfrentamos. Acho que toda a nossa região, necessita desse tipo de tratamento específico para a mulher — disse sua mãe.

— Quem sabe, minha filha, quando você voltar como médica, com a especialidade que deseja, poderemos de alguma forma reivindicar do nosso governo a construção desse hospital — acrescentou Makin.


 

 

Capítulo — V

 

E Jalal iniciou o seu curso de agronomia.

Realmente, ele constatou o que o Reitor havia lhe dito: não eram muitos os alunos interessados no ramo. Da região de Asir, somente ele.

Como bom observador, notava um clima bem liberal dos estudantes veteranos de outras áreas. Muito embora a disciplina escolar fosse rígida, sempre havia aqueles alunos que faziam questão de serem notados na ostentação da riqueza: carros últimos tipos alemães, japoneses e americanos.

Ele observou essas demonstrações, e logo o seu pensamento se voltou para os menos favorecidos, que com dificuldade levavam a vida muitas vezes desnutridos, com a saúde abalada e com poucos recursos, e ainda, morando muito mal.

Jalal estava sempre em contato com os seus familiares, por meio de cartas, em que nela, contava as amizades firmadas com o Reitor e com o Sr. Alawi, e com outros colegas, principalmente com uma estudante indiana, filha do Vice-Cônsul da Índia.

Dizia ao seu avô que gostava de estar na companhia dela — Bellary — estudante de medicina; era uma moça muito agradável, simpática, além de muito bonita; sendo que ela, prontificou-se a ensiná-lo a língua inglesa, alertando-o que, se ele fosse fazer uma especialização no exterior, deveria conhecer o idioma.

 

Dois seres que se conheceram e se amaram, podem encontrar-se noutra existência corpórea e se reconhecerem?

— Reconhecerem-se, não, mas serem atraídos um pelo outro, sim; e frequentemente as ligações íntimas, fundadas numa afeição sincera, não provém de outra causa. Dois seres se aproximam um ao outro por circunstâncias aparentemente fortuitas, mas que são o resultado da atração de dois Espíritos que se buscam através da multidão”

(O Livro dos Espíritos – Livro II – perg.386)

 

O tempo passava e, a sua amizade pela jovem Bellary, firmava-se. Nos seus estudos, ele desenvolvia com sucesso e, paralelo a isso, cumpria como todo árabe, as normas da religião islâmica, embora a considerasse, particularmente em alguns pontos, muito rígida.

 

No último período de férias, alguns meses antes do término do curso, a faculdade, organizou uma excursão de estudos, ao vizinho Egito, com o objetivo de observar e analisar, como aquele país estava enfrentando as dificuldades para a produção de alimentos.

Jalal conseguiu com o Sr. Ibn Alawi a dispensa do trabalho, por alguns dias, e rumou com outros colegas e professores para a cidade do Cairo.

Lá foram recebidos por uma delegação da Universidade do Cairo, e logo entabularam encontros e estudos a respeito da produção agrícola, assim como, das políticas econômicas direcionadas exclusivamente para a agricultura e, também, analisadas as medidas para as suas eficácias.

Visitaram desde o delta do rio Nilo, até a enorme represa de Assuan, onde observaram as culturas de algodão, arroz, milho, cana-de-açúcar, trigo, cevada, hortaliças, amendoim, gergelim, todas, em regime de cooperativas.

Tamanha era a diversidade dos cultivares, que Jalal ficou entusiasmado, cada vez mais, com a profissão que escolheu. Visualizava grandes possibilidades para ajudar o seu país.

Completados os estudos, observações, demonstrações e relatórios, eles tiveram alguns dias de folga.

No oásis de El Faiyan, que se localiza numa grande depressão no deserto, Jalal ainda se deteve em observar, analisar e anotar o cultivo do algodão, a principal cultura do país, e também do linho. A certo momento, quando estava a admirar a beleza de um grande canteiro de nenúfares, acercou-se dele um senhor de tez escura, maltratada pelo sol, barba volumosa, que lhe dirigiu a palavra em idioma desconhecido.

Jalal virou-se para o seu acompanhante egípcio - técnico agrícola — responsável pela cooperativa local, com um ar de interrogação.

O técnico, em seu auxílio, disse: — Ele fala num dialeto regional, e está a lhe desejar boas vindas a este lugar.

Jalal agradeceu a acolhida e aquele senhor se afastou.

— Quem é aquele senhor? Perguntou curioso.

— Ele tem o hábito ficar por aqui nesta época do ano, por uns dias, depois desaparece; dizem ser um "neviin do deserto"; "neviin" quer dizer , um homem que fala do futuro das pessoas; é também, vidente.

 

Médiuns proféticos – É, em geral, uma variedade dos médiuns inspirados, que recebem com permissão de Deus, mais precisamente que os médiuns de pressentimento, revelação de coisas futuras, de interesse geral, tendo eles o encargo de manifestá-las aos homens para os instruir. O pressentimento é dado à maior parte dos homens, quase que para seu uso pessoal; o dom profético é especial e revela uma missão”.

(Obras Póstumas – Ed. Lake 11ª Ed. – pag. 49)

 

— Interessante — aduziu Jalal.

No momento de despedir-se do técnico, ele escutou: Jalahal...

Era aquele homem novamente — o "neviin".

Jalal, convidou o técnico para ajudá-lo a compreender o que aquele homem desejaria falar, e foram ao seu encontro.

— "Eu só quero dizer, que até hoje, Jalahal, você conseguiu transpor as suas dificuldades com segurança e com a ajuda de algumas pessoas que lhe querem bem, e que estão sempre por perto. Quando você estiver longe deles, sem o apoio amigo, as coisas ficarão difíceis. Você necessitará de muito equilíbrio para enfrentar a vida em outras terras de costumes diferentes. Uma coisa importante que afeta diretamente o seu coração é o amor. Você é diferente de muitos que constituem família, sem um mínimo de amor em seus corações. Hoje você já admite que só se casará quando o amor brotar em seu coração. Isso se realmente acontecer, será uma coisa boa, porque a companheira que for do seu agrado, você também será do agrado dela, e assim sendo uma promessa entre vocês dois se concretizará. Ela será como uma nenúfar que já foi colhida, mas que está no vaso e a sua espera. Meu amigo, o Ser Supremo que nos rege, nos deu a livre escolha em tudo; você escolheu assim; eu, escolhi ser um homem do deserto, não invejo ninguém”.

Paulatinamente, o técnico agrícola, traduzia aquela mensagem, que conforme ia sendo entendida, Jalal ficava pasmado.

Terminada a mensagem, o "neviin" virou-se e foi embora sem se despedir.

O técnico olhou para Jalal e perguntou: — Você entendeu o que ele lhe disse?

— Entendi o que você traduziu!

— Uma vez por ano ele aparece, mas é a primeira vez que o vejo aproximar-se de alguém e falar dessa maneira; foi interessante o que ele lhe disse. O que você achou Jalal?

— Quanto à ajuda, que ele disse que eu tive, realmente até hoje estou tendo. No que concerne a outras terras, eu tenho interesse em fazer alguns estudos complementares em outro país, para o qual ainda não me decidi. Agora, quanto a casar, realmente eu só me casarei se for por amor, e ainda não tenho uma pretendente. Mas, vamos aguardar o que nos trará o futuro! Quem sabe um dia eu volte aqui, para apresentar a minha esposa — nenúfar — a esse meu amigo "neviin".


 

 

Capítulo — VI

 

E Jalal, com distinção graduou-se na faculdade.

Seus pais, seu avô, seu tio-avô e Ib Alawi, estiveram presentes na colação de grau e nas comemorações.

— E agora meu neto, o que vai fazer?

— Vovô, há dois dias, o senhor Reitor perguntou-me se eu queria fazer uma especialização no Brasil. Eu lhe respondi: Porque o Brasil senhor? E ele respondeu: nós mantemos com o Brasil vários acordos, inclusive cultural, com a possibilidade de podermos enviar para lá profissionais para se especializarem. Sugiro que vá ao Brasil pela seguinte razão: é um país continental, que tem diversos tipos de solo, desde o mais fértil até o semi-árido, assim como, tem vários tipos de climas — desde o frio, temperado e quente. É o maior produtor de café e cana-de-açúcar do mundo, e com o domínio da tecnologia na produção do álcool; grande produtor de soja, arroz, milho, feijão, algodão, laranja, limão, sorgo e hortaliças; e está também, com a tecnologia, bastante avançada em irrigação, mecanização, fertilizantes e no manejo da terra. Disse-me ainda, que eu poderia fazer duas opções: freqüentar somente uma faculdade de agronomia, ou três faculdades — uma do sul, outra do sudeste e outra do nordeste, em períodos diferentes. Mostrou-me vários mapas, catálogos, revistas e livros a respeito, que estão em meu poder para estudá-los.

Eu ponderei o oferecimento, projetando até sobre o meu futuro na faculdade, e disse-lhe que aceitava a proposta e agradeci a deferência que me dava; e propus que ele me desse um prazo de seis meses, uma vez que, eu tinha prometido ao meu avô e a todos os meus familiares que, após a minha formatura, eu iria me dedicar à nossa fazenda. Ele concordou e disse que eu poderia ficar até um ano.

— Agora eu lhes pergunto: Papai, mamãe e meu avô, vocês estão de acordo com a minha ida para o Brasil?

— Sentiremos muitas saudades — responderam em um só momento.

— Mas, não vamos pensar nem começar a sentir saudades. Vamos aguardar o momento próprio; tristeza não nos leva a nada, antecipada então, de nada nos servirá — acrescentou o avô.

— Venham aqui todos que eu quero lhes apresentar uma grande amiga, que hoje também está colando grau, só que em medicina.

— Bellary, quero apresentá-la aos meus pais, meu avô, meu tio-avô e meu grande benfeitor aqui em Riyad - senhor Ib Alawi

Ela, muito bonita, com seu sorriso largo e franco, se disse muito prazerosa em conhecer a todos.

E a recíproca foi verdadeira, mesmo porque Bellary, falou fluentemente o árabe. Isso os cativou.

Ela comentou que estava na iminência de viajar para a Índia, por causa dos acontecimentos desastrosos que lá estavam ocorrendo, com grandes precipitações chuvosas, e que, em razão disso, muitas pessoas já tinham perdido a vida em decorrência das enchentes e das doenças que estavam se alastrando na cidade de Bombaim e região. E que agora, como médica, vou me esforçar ao máximo para minimizar o sofrimento daqueles que foram atingidos e, que estão sofrendo todo tipo de dificuldade.

 

Calamidades – Com que fim Deus castiga a Humanidade com flagelos destruidores?

— Para fazê-la avançar mais depressa. Não dissemos que a destruição é necessária para a regeneração moral dos Espíritos, que adquirem em cada nova existência um novo grau de perfeição? É necessário ver o fim para apreciar os resultados. Só julgais essas coisas do ponto de vista pessoal, e as chamais de flagelos, por causa dos prejuízos que vos causam; mas esses transtornos não frequentemente necessários para fazerem que as coisas cheguem mais prontamente a uma ordem melhor, realizando-se em alguns anos o que necessitaria de muitos séculos”.

Deus não poderia empregar, para melhorar a Humanidade, outros meios que não os flagelos destruidores?

— Sim, diariamente os emprega, pois deu a cada um os meios de progredir pelo conhecimento do bem do mal. É o homem quem não os aproveita; então, é necessário castigá-lo em seu orgulho e fazê-lo sentir a sua fraqueza”

(O Livros dos Espíritos – Livro III – pergs. 737/738)

 

— Jalal, tenho quase certeza de que amanhã mesmo, deveremos viajar. Veja, lá vêm papai e mamãe, acho que deveremos ir.

Cumprimentaram-se e em seguida despediram-se, sem antes Bellary, lhe dar o seu endereço eletrônico.

 

De volta para seu país, Bellary, realmente constatou a extensão da catástrofe. Muitas cidades atingidas, estavam alagadas, e com centenas de mortos e milhares de desabrigados. As equipes médicas, numa das quais Bellary se engajou, se esforçavam ao máximo para um melhor atendimento, mas, se a chuva não desse uma trégua, as dificuldades se multiplicariam. Além da falta de acomodações aos desabrigados, eram escassos os alimentos, a água portável e medicamentos. Os hospitais estavam com falta de leitos e, a leptospirose e a leishmaniose estavam no auge do alastramento.

Bellary se desdobrava nos atendimentos; passava noites em claro, nos cuidados daqueles desafortunados. Muitos morriam à sua frente e em seus braços, principalmente, crianças, e ela se abatia, chorava, reconhecia-se impotente frente a tamanha calamidade. Em várias ocasiões, chegava a interpelar, às vezes, com veemência ao seu deus Brahma — que para ela naquela hora de angústia, não ajudava em nada.

Certa vez, Bellary não sabia a quem atender, em decorrência de tanta gente necessitada e, em conseqüência disso, começou a crescer dentro de si um tormento, um desespero, uma vontade de sair em desabalada carreira, quando ela ouviu alguém chamar: — Doutora...Doutora...

Percebeu que a voz vinha de um canto da enfermaria, que estava lotada. Era um senhor idoso, deitado no chão frio, com apenas um lençol muito sujo a cobri-lo.

Olhou para aquele quadro melancólico, consternador, chamou uma atendente para auxiliá-la a acomodar melhor aquela criatura, que já se encontrava com dificuldade de respirar e se mostrava ofegante.

E o velho falou com dificuldade, apoiado nos braços de Bellary: — Não...Não mexam comigo. Acho que chegou a minha hora. O que eu tinha que fazer e sofrer neste mundo, vai se encerrar agora.

Ele fez uma pausa para angariar um pouco mais de forças que ainda lhe restavam, e continuou quase que sussurrando.

— Mas para senhora, doutora, ainda há uma longa estrada de alegria, porque vai curar muitas pessoas. Mas há um caminho de muita tristeza também. Seja forte, firme e equilibrada e, esteja atenta: o lugar calmo, onde estiver, se tornará violento; há muitos loucos e fanáticos soltos pelo mundo, e estão ai só para destruir. Desejo que a senhora seja muito feliz.

E o velho, cerrou seus olhos, seguido de uma pequena agitação por todo seu corpo, e deu-se o desenlace.

— Doutora, disse a atendente — uma senhora bem grisalha: — Nós não poderíamos fazer mais nada por ele, a não ser aquilo mesmo que a senhora fez, que foi aconchegá-lo nos seus braços. A doença minou terrivelmente as poucas forças que ele tinha.

— Mas o que me causou estranheza, foi que ele não se desesperou. Estava resignado, aceitando, até com tranqüilidade, a chegada da morte. E outra coisa, aquelas palavras dirigidas a mim, estão me causando uma grande interrogação no meu interior.

— Doutora, esse homem era um desses “rishisvidentes, que pressentem o nosso futuro — a joia em seu turbante, assim o revela. Se a senhora acreditou no que ele lhe disse, eu também lhe desejo muitas felicidades, e que tudo corra bem em sua vida.

 

Médiuns de pressentimentos – O pressentimento é uma intuição vaga das coisas futuras. Algumas pessoas têm esta faculdade mais ou menos desenvolvida; elas podem devê-las a uma espécie de dupla vista, que lhes permite entrever as conseqüências das coisas presentes e a ligação dos acontecimentos;”

(O Livro dos Médiuns— Pate II – cap.XV – 184)

 

Em Asir, Jalal inicialmente analisou as terras da fazenda, tirou várias conclusões e propôs ao seu pai algumas mudanças que deveriam ser implementadas gradativamente, tais como: a correção do "ph" da terra, e o adensamento do cafezal e da cana-de-açúcar. Propôs também, para o futuro, a montagem de uma pequena usina de açúcar, com possibilidades de também, fabricar álcool para uso medicinal e hospitalar. Aconselhou que se diminuísse a área do cultivo do "qat", para expandir o plantio do arroz, hortaliças e experimento do plantio do trigo, e melhor alinhamento das curvas de nível.

Muhammad ficou radiante com as iniciativas do seu querido neto. Com o tempo, e com critério, as sugestões foram implementadas com sucesso.


 

 

Capítulo — VII

 

Muito embora nas conversações Jalal se mantivesse contente com a evolução satisfatória que estava acontecendo na fazenda, vez ou outra, após a faina diária, recostado em uma das tamareiras do seu plantio, ele era surpreendido com a presença do seu avô.

— Jalal, lembro-me bem, há uns cinco anos, acho até, um pouco mais, quando aqui estávamos admirando a nossa querida propriedade, agora mais bonita e próspera, com você, que me contava das suas aspirações. Seus olhos eram vivos e esperançosos no futuro. Mas hoje eu noto no seu olhar alguma tristeza.

— Vovô, vou lhe contar uma passagem que aconteceu comigo lá no Egito.

E ele discorreu sobre tudo o que aconteceu quando avistou-se com um "neviin".

Um silêncio reinou por alguns instantes, até que: — Jalal, a doutora Bellary é muito importante para você?

— Sim, Bellary é uma ótima moça e, sou grato a ela. Mas como o senhor lembrou dela?

— Não sei... O nome dela veio à minha lembrança... Mas deixe-me dizer algo; é só uma comparação que pretendo fazer dentro da minha observação com referência a natureza dos animais. É uma comparação muito grosseira, mas acho que deverá valer para termos um pouco de entendimento a respeito do ser humano. Eu acho que, se observássemos os animais, nós aprenderíamos muito e melhores seriam as nossas relações em sociedade. Todos nós, que temos experiência no trato com os animais, sabemos que não é sempre que uma égua puro sangue árabe, aceita ser coberta por um potro que nós consideramos ser de alta linhagem. Com isso, eu quero lhe dizer que cada um de nós, tem a sua individualidade, tem a sua livre escolha e, em conseqüência disso, só nós somos responsáveis pelos atos que praticamos, ou não praticamos.

 

O homem tem o livre arbítrio nos seus atos?

— Pois se tem a liberdade de pensar, tem de agir. Sem o livre arbítrio o homem seria uma máquina”

O homem goza do livre arbítrio desde o nascimento?

— Ele tem a liberdade de agir, desde que tenha a vontade de fazer.Nas primeiras fases da vida a liberdade é quase nula; ela se desenvolve e muda de objeto com as faculdades. Estando os pensamentos da criança em relação com as necessidade da sua idade, ela aplica o seu livre arbítrio às coisas que lhe são necessárias”O Livro dos Espíritos — pergs. 843/844

 

— O que o senhor quer dizer também, além da liberdade que todos temos da livre escolha, é que Bellary pode ter um objetivo do qual eu não faço parte?

— Isso realmente pode acontecer por vontade dela, ou por imposição da sociedade em que vive. Afinal, o seu pai é um representante do governo indiano, pertence a uma classe muito alta, são orgulhosos e, por ter lido em algum lugar, são também, de uma certa forma, egoístas, não se importando e nem se comunicando com outras castas inferiores. A sociedade indiana, é constituída de várias castas. O povo das castas inferiores, serão sempre, pessoas inferiores.

Eles são mais ou menos, como nós mesmos somos; muito egoístas e orgulhosos. Por exemplo, quanto a nós, no que tange à religião. Somente nós muçulmanos podemos visitar as cidades de Meca e Medina; enquanto que qualquer um pode visitar Jerusalém, pode ir ao Vaticano, pode ir a China visitar os seus templos religiosos, pode ir ao Tibet, enfim, a qualquer lugar, seja lá qual for a prática religiosa, desde que tenhamos respeito. Acho que essa é uma situação que nos desfavorece, pois se fossemos uma sociedade mais aberta, receptiva e sem privilégios, com certeza teríamos progredido mais, seríamos mais cultos, não teríamos preconceitos, seríamos menos desnutridos e mais saudáveis.

Mas, meu neto, penso que eu e você, somos um nada frente à grande maioria. No entanto, eu o aconselho: Seja um homem feliz! Porque foi para isso que viemos viver na Terra. Sermos felizes e sermos propiciadores da felicidade.

Jalal entendeu perfeitamente o que ele quis dizer.

 

Entre os vícios, qual o que podemos considerar radical?

— Já dissemos muitas vezes: o egoísmo. Dele deriva todo mal. Estudai todos os vícios e vereis que no fundo d todos existe o egoísmo. Por mias que luteis contra eles não chegareis a extirpá-los enquanto não os atacardes pela raiz, enquanto não lhes houverdes destruído a causa. Que todos os vossos esforços tenda para esse fim, porque nele se encontra a verdadeira chaga da sociedade. Quem nessa vida quiser se aproximar da perfeição moral deve extirpar do seu coração todo sentimento de egoísmo, porque é incompatível com a justiça, o amor e a caridade: ele neutraliza todas as outras qualidades”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 913)

 

Todos os homens são iguais perante Deus?

— Sim, todos tende para o mesmo fim e Deus fez as suas leis para todos. Dizeis frequentemente: “O sol brilha para todos”, e com isso dizeis uma verdade maior e mais geral do pensais. Todos os homens são submetidos às mesmas leis naturais; todos nascem com a mesma fragilidade, estão sujeitos às mesmas dores e o corpo do rico se destrói como o do pobre. Deus não concedeu, portanto, superioridade natural a nenhum homem, nem pelo nascimento, nem pela morte: todos são iguais diante DELE”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 803)

 

A data para ir para o Brasil, já estava marcada e, através do e-mail, comunicou a Bellary, e ela lhe respondeu: "Desejo-lhe muito sucesso. Seja muito feliz. O povo daquele país é muito liberal e alegre, assim me disse papai, quando esteve por lá em missão econômica. Nós também viajaremos para o Cairo. Papai foi designado para lá. Eu gostaria de ir para a Espanha, para fazer especialização em oncologia, mas a minha vontade ainda é cerceada para algumas coisas".

 

No aeroporto em Riyad, na companhia do Reitor, ele aguardava a hora do vôo que procedia de Nova Delhi, com destino a São Paulo.

Acomodou-se na classe econômica, e tentou se preparar psicologicamente para uma longa viagem, pois o vôo teria escala no Cairo, Atenas, Roma, Madri, Brasília e finalmente, São Paulo.

Na primeira escala, no Cairo, sentado que estava ao lado da janela, Jalal viu Bellary. Desejou descer, mas foi impedido.

Pensou: "Ela disse que viria com a família para o Cairo". Como o destino é caprichoso... Estávamos no mesmo avião; agora, cada um vai para o seu destino, cumprir os seus objetivos. Neste instante, lembrou-se do seu avô, dos seus conselhos, das suas afirmações e das suas comparações.

 

Em São Paulo, um funcionário do Consulado Saudita o aguardava.

Uma semana após a sua chegada, Jalal se apresentou na secretaria da faculdade, onde já era aguardado, e imediatamente iniciou os seus estudos. E assim foi: muito estudo em salas de aulas e muito esforço nas atividades de campo, e tudo completado com extensos relatórios.

E assim passou o ano...

 

Durante as férias, Foi para Asir; estava com saudades.

Após por em dia os assuntos com seus familiares, Jalal demonstrou a vontade de reunir-se com os agricultores da região para passar a eles alguns conhecimentos adquiridos, que poderiam ser utilizados no campo. E assim foi; visitou por vários dias as áreas cultivadas.

Certa noite, em casa, reunido com os seus familiares, ele tomou conhecimento de um atentado ocorrido no Egito, onde morreram dezenas de pessoas que estavam num lugar de turismo.

— Vocês lembram de Bellary, aquela moça indiana. Ela foi morar no Egito.

— Lembramos sim — respondeu seu avô. Mas será que aconteceu alguma coisa com ela?

— Espero que não! Ela me ajudou muito, sendo minha professora de inglês, durante quatro anos. Lá no Brasil, eu só consigo entender e ser entendido através da língua inglesa. A língua portuguesa é muito difícil, mas vou me esforçar para aprender um pouco.

— Vou tentar me comunicar com ela. E Jalal tentou por três vezes, mas não conseguiu, pois as mensagens eram recusadas.

Ele não se conformava com a falta de notícias, então, recorreu ao seu Reitor para que este solicitasse informes no consulado indiano em Riyad.

As informações obtidas foram: que a consulesa ficou gravemente ferida, e que o Cônsul e sua filha estão bem de saúde, e que retornaram a Índia.

Antes de voltar para o Brasil, o Reitor solicitou para que Jalal comparecesse na universidade para tratar de assunto do seu interesse. Na presença do Reitor, este lhe disse: — Jalal, todo material que nos enviou está sendo sistematicamente estudado e com boa avaliação. Assim, isso me dá respaldo para convidá-lo, após a conclusão do seu estágio, para vir aqui lecionar. Estamos com uma vaga aberta.

Exultante, e em agradecimento, abraçou o seu Reitor, beijou-o, e aceitou o convite.

Ainda em Riyad, Jalal tentou conseguir notícias no consulado indiano sobre o paradeiro da família de Bellary, mas as informações foram recusadas por medida de segurança. Assim, ele ficou sem ter notícia alguma.

Frustrado, mas compreendendo que este era um meio de dar um pouco de segurança para a família do Cônsul, rumou para o Brasil.

O ano de Jalal se arrastou, com muito estudo e trabalho. Nos seus poucos momentos de lazer, conheceu algumas belezas naturais do país, mas mesmo assim, Belllary estava com alguma constância em seus pensamentos.

O período de estudo foi completado, e ele regressou com fartos subsídios que, com certeza, iriam auxiliá-lo a dar à política agrícola do seu país um salto de qualidade e de fartura. Ele estava certo disso.

Na universidade, em diálogo com o Reitor, recebeu ordens de que, como professor, deveria preparar o seu currículo, e organizar o seu material de trabalho para ser apresentado aos professores dirigentes da Faculdade Agronomia.

Assim, solicitou um prazo de dez dias, uma vez que pretendia ir a Asir, ao encontro dos seus familiares.

Antes de se despedir, o Reitor perguntou: — Você já teve notícias da doutora?

— O senhor está perguntando sobre a doutora Bellary?

— Sim!

— Não senhor Reitor.

— Depois daquele seu pedido, eu tentei mais algumas vezes, mas não consegui nenhuma informação.

— É, infelizmente eu acho que a nossa amiga doutora não quer mais saber de nós. Eu desejava muito agradecer a sua ajuda pessoalmente, mas, não sendo possível, aqui fica, então, em forma de pensamento, o meu agradecimento. Se, de fato, o pensamento tem força e pode navegar no espaço, eu desejo que a doutora Bellary receba o meu abraço amigo e meu agradecimento sincero por tanta ajuda que me proporcionou.

— Você acredita na força do pensamento?

— Senhor Reitor, acho que isso é algo que não devo descartar, assim como outros acontecimentos que ocorrem, que é difícil não acreditar.

Certa vez, senhor Reitor, quando estive lá no Egito...

E ele discorreu com detalhes tudo o que aconteceu.

— Pela sua descrição, ele previu que você viajaria para um país de costumes bem diferentes do nosso. Mas, quanto ao amor, parece que ele deixou dúvidas. Você já tem uma pretendente?

— Não senhor. Ainda não tenho.

Mas o Reitor, acostumado no trato com as pessoas, lia na fisionomia de Jalal, uma resposta não muito afirmativa.

— Jalal, você agora vai viajar para Asir. Na sua volta, quer passar uma semana de férias e espairecer um pouco na Índia? É um país muito interessante; uma civilização muito antiga, de cultura milenar e cheia de mistérios. Lá, você bem sabe, eles também cultivam em terraços. Acho que pode ser interessante conhecer. Quanto aos gastos, não se incomode, a universidade se responsabilizará. Só queremos no final, uma prestação de contas.

Jalal ponderou a oferta e a intenção do Reitor, e aceitou o convite.

 

Logo que chegou em Nova Delhi, solicitou uma audiência no Departamento de Relações Exteriores. No setor de Relações Públicas, indagou pelo Cônsul Sr. Banzhir. De imediato, foi levado para uma sala, e foi interrogado. Assustado com esse procedimento, explicou que conhecia o Cônsul e sua família, quando eles residiam em Riyad. Disse ainda, que pretendia encontrar a sua contemporânea de universidade, a Dra. Bellary Benares Banzhir.

— Sr. Jalal, após o atentado que eles sofreram, nosso procedimento para com as pessoas que procuram pelo Cônsul e seus familiares, é esse. Esperamos não tê-lo constrangido demais. Por favor, nos desculpe! Agora, com referência aonde encontrá-los, não temos permissão para lhe falar.

— Mas os senhores poderão me dizer se eles estão bem de saúde?

— Com exceção da esposa, que está sob cuidados médicos, ainda um pouco abalada; o senhor Cônsul e sua filha estão bem.

— É meu desejo então, que os senhores recebam e encaminhem os meus votos de rápido restabelecimento para a senhora consulesa, e que sejam portadores do meu abraço fraterno e amigo para o senhor Cônsul e sua filha Bellary.

A vontade de Jalal era voltar imediatamente para Riyad.

Quando caminhava a esmo, ficou de frente para uma casa de turismo. Entrou e comprou um pacote turístico para a cidade e região adjacente.

Nova Delhi, com soberbas construções dos seus templos, entusiasmou Jalal, que tentou avaliar a religiosidade daquele povo, e sua cultura milenar. Ele fotografou tudo. Chegou a visitar uma região agrícola onde se cultivava o arroz em terraço. Anotou todos os procedimentos, desde as técnicas de plantio até o armazenamento do produto, além de adquirir uma boa quantidade de sementes para plantar como experimento em Asir, e recolher várias receitas para o consumo.

Ao se despedir do seu interprete, este lhe disse: — Amanhã, o senhor deverá voltar para o seu país. Então, Sr. Jalal, o senhor vê aquele pequeno templo? Entre lá, e faça o seu pedido. Creia senhor, que tudo, em oração, com fervor, que pedir em seu favor, ou em favor de alguém, se for um desejo bom, ainda que demore, o senhor ou outra pessoa, receberão o que foi pedido, se tiverem merecimento.

E Jalal se viu sozinho dentro daquele templo aconchegante. Diante de uma grande estátua lindamente dourada, fez o seu pedido: "Bellary, meu desejo é que no seu caminho você encontre sempre a saúde e a felicidade".

 

Pode-se orar utilmente pelos outro?

— O Espírito daquele que ora está agindo pela vontade de fazer o bem. Pela prece, atrai a ele os bons Espíritos que se associam ao bem que deseja fazer. Possuímos em nós mesmos, pelo pensamento e a vontade um poder de ação que se estende muito além dos limites de nossa esfera corpórea. A prece por outros é um ato dessa vontade. Se for ardente e sincera, pode chamar os bons Espíritos m auxílio daquele por quem pedimos, a fim de lhe sugerirem bons pensamentos e lhe darem a força necessária para o corpo e a alma. Mas ainda nesse caso a prece do coração é tudo e a dos lábios é nada”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 662)

 

Ao término das pequenas férias, o trabalho e os estudos o aguardavam sem demora. Extensos relatórios e várias planilhas foram produzidas e apresentadas ao setor competente da faculdade agrícola. De todos esses trabalhos compilados, um livro foi editado para fazer parte do acervo didático do curso.

O tempo de Jalal estava totalmente preenchido. Nas raras horas de lazer, ele ia visitar o Senhor Alawi, na loja onde trabalhou, e conversar sobre a economia do país, uma vez que o comércio era o melhor termômetro para essa averiguação. Além do que, o senhor Alawi era uma excelente companhia, e que sabia de quase tudo sobre o que acontecia de mais importante em Riyad. A cada trinta dias, Jalal viajava para Asir.


 

 

Capítulo — VIII

 

O ano fluiu com celeridade. Após uma reunião de avaliação do ano letivo, o Reitor convidou Jalal para uma reunião particular no seu gabinete.

— Sente-se, e me diga: Como está se sentindo neste primeiro ano como professor titular?

— Senhor Reitor, primeiramente, mais uma vez, quero agradecer tudo o que fez por mim, desde o primeiro dia que nós nos entrevistamos, até este momento, do qual privo da sua inteligente companhia como Reitor, e se me permite considerá-lo como meu amigo. Na titularidade como professor, confesso ao senhor, que o que eu faço, faço com o maior prazer, com gosto, com empenho, com interesse para que o meu ouvinte capte o que de melhor ele achar nas minhas explanações.

— Ótimo professor. Fico muito contente com o seu relato, e muito feliz por você ter-me dado a oportunidade de um dia, de alguma forma tê-lo auxiliado. Então, agora, vamos tomar um chá de alecrim, para comemorar; além de ser um chazinho gostoso, ele é muito bom para revigorar o nosso coração.

— Mas o senhor tem problemas no coração?

— De certo modo, meu caro professor, analisando e respondendo com liberdade esse seu questionamento, sobre horizonte bem largo, amplo, eu acho que todos nós temos problemas de coração. Uns, com problemas diretamente ligados ao órgão, outros, problemas alheios a ele, mas, quando esses problemas calam fundo em nosso peito, dizemos que estamos com o coração dorido. Eu os tenho, acho que por minha idade; e com todos esses anos de atividade constante na vida profissional, sofrendo pressões, as mais diversas; e em contrapartida, pressionando também, para ver satisfeitos os meus objetivos e cumprir as metas propostas pela universidade, acho que isso, fez com que houvesse um desgaste natural do órgão. Essa é a opinião de um leigo. E você Jalal, que ainda é jovem, não tem problemas para aquelas questões direcionadas ao lirismo, à afetividade, ao amor, que tocam as fímbrias do coração?

Jalal olhou bem para o seu amigo Reitor e respondeu: - Tenho-os sim, e admito que, por enquanto, eles estão no plano da insolubilidade.

— Escute bem o que vou lhe dizer, com base no que vi e ouvi. Por sinal, os meus familiares são as únicas pessoas que tem conhecimento do fato, e que agora, você também, terá oportunidade de saber: professor, eu admito, sem nenhuma reserva, que em nossas vidas, tudo pode ter uma solução, pode ser reversível, pode ser mudado, pode ser alterado, admitindo-se que a morte não existe!

— Mas senhor Reitor...!

— É isso mesmo. A morte não existe!

— Mas, senhor Reitor, se todos nós vamos para o fundo da terra, como é que a morte não existe? Não consigo entendê-lo!

— O nosso corpo, Jalal, é que vai para baixo da terra, e se decompõe: vira comida para os vermes. Essa é a verdade. Eu também tive muita dificuldade para entender tal fato. Só com o passar dos anos, com as observações do cotidiano, com a análise dos nossos próprios pensamentos, e pelo que vi e ouvi, eu admito que todos nós, indistintamente, temos algo que não morre, e que está sempre em evolução: é uma chama que está sempre viva, crepitante. Observe e reflita sobre a sua própria vida até este momento. Você, componente de uma família modesta de agricultores, que com esforço, estudou e formou-se num curso superior e, com destaque, fez também um curso no exterior. Voltou para o seu país de origem, e aqui leciona — é professor universitário, catedrático. A sua evolução educacional, cultural e material foi muito grande. Você teve a oportunidade de fazer tudo isso; com seu esforço, não resta dúvida. Mas as oportunidades existiram e você soube abraçá-las, com sua vontade e com a ajuda de outras pessoas!

Agora, meu amigo, vamos pensar naqueles que não têm oportunidade nenhuma, não têm o estimulo, são desnutridos, fazem parte de uma sociedade de cultura rudimentar; que vivem precariamente sem um mínimo de higiene; vamos pensar naqueles que vivem embrenhados nas matas, como são os indígenas lá do Brasil; ou como vivem os aborígines australianos, ou aqueles indígenas que vivem em algumas ilhas do arquipélagos das Filipinas, ou ainda, esses povos sofridos, que na África amargam a falta de alimentos, de melhores condições de moradias , higiene e saúde, onde a AIDS campeia de forma devastadora, eliminando milhares e milhares de pessoas de todas as faixas etárias.

É justo, meu amigo, que esses indivíduos não tenham a chance, de uma vida melhor, mais cômoda, próspera e saudável?; de não terem sequer, uma única oportunidade para conseguirem uma evolução material, objetivando um futuro profícuo para si e os seus?; de não terem a oportunidade de conhecerem e estudarem os grandes sábios da humanidade como nós tivemos e estamos tendo? Por que só nós somos privilegiados, e termos todas as possibilidades que desejamos, e eles não as terem?

 

Nada de criaturas privilegiadas ou mais favorecidas que as outras; os anjos são almas elevadas à perfeição, depois de terem passado, como as outras, por todos os graus de inferioridade”.

(Obras Póstumas – Allan Kardec – Doutrina Espírita)

 

O que você acha de tudo isso? Para mim, eu acho que há muita coisa a ser entendida a esse respeito.

Eu não posso admitir que Allah, que me possibilitou ter tudo o que eu desejei nesta vida, em todos os sentidos, não dê condições para que esses povos, algum dia também consigam chegar onde a nossa sociedade estagia, embora ainda, com grandes defeitos.

Então, acreditando nesse Ser Supremo, do qual somos todos filhos, homens e mulheres, todos nós, temos possibilidades iguais para evoluir. Eu não acredito que, como filho desse Ser Supremo, que me deu a chance de ser o que sou — longe de mim o orgulho — ter adquirido um bom lastro de conhecimentos, os mais diversos, apenas nessa existência, isso tudo que está armazenado no meu cérebro, possa se perder por entre as areias do deserto. Como eu, aqui e agora, não quero perder nenhum ente querido, o Ser Supremo do qual sou filho, admito, que não quererá me perder! Meu corpo será enterrado, mas os meus conhecimentos, a minha inteligência, enfim, a minha chama de vida, com tudo de bom e, também com todos os problemas que não pude resolver, não se apagarão e, em outra vida, a chama continuará a brilhar e, terei oportunidade de solucionar os problemas mal resolvidos. Com isso, quero lhe dizer, que tudo tem a sua solução e, aquele que não teve sorte na vida, por inúmeras questões, terá também a sua chance de evoluir.

 

Comentando o assunto portas a dentro do esforço cristão, somos compelidos a reconhecer que os negadores do processo evolutivo do homem espiritual, depois do sepulcro, definem-se contra o próprio Evangelho. O Mestre dos Mestres ressuscitou em trabalho edificante. Quem, desse modo, atravessará o portal da morte para cair em ociosidade incompreensível? Somos almas, em função de aperfeiçoamento, e, além do túmulo, encontramos a continuação do esforço e da vida”.

(Caminho, Verdade e Vida— Emmanuel – 68)

 

Então, Jalal, se nós estamos nesse estágio atual, os nossos beduínos que hoje só vão de oásis em oásis, peregrinando pelos desertos, também terão o direito de progredir em suas vidas e, acredito, renascendo, e cada vez mais evoluindo sempre, espiritualmente e materialmente e, também chegarem a ter uma vida como nós atualmente, temos, senão até melhor.

 

Sendo insuficiente uma única existência corpórea para adquirir todas as perfeições, toma um corpo tantas vezes quanta lhe é necessário, trazendo, quando reencarna, o adiantamento adquirido nas anteriores existências e na vida espiritual. Quando adquiriu no mundo tudo o que se pode aí adquirir, deixa-o, para subir a outros mais adiantados intelectual e moralmente, e menos materiais. Assim chega a criatura à perfeição de que é susceptível.”

(Obras Póstumas – Allan Kardec – Doutrina Espírita)

 

— Senhor Reitor, acho que para completar o seu pensamento da tese que expõe, falta dizer o que é, quando afirma que "viu e ouviu"..

Sim, é isso mesmo! Eu vi e ouvi, algo que vem reforçar e provar o que lhe digo — que nós não morremos!

Certa vez, aqui na Universidade, um jovem universitário desmaiou num dos corredores; e quando voltou a si falava coisas que ninguém entendia. Trouxeram o moço à minha presença; fiz com que ele se sentasse nessa cadeira onde você está, e perguntei: — "Você pode me dizer o que aconteceu? Ele respondeu, mas tive dificuldade de entendê-lo. Então solicitei que falasse um pouco mais devagar. E assim ele fez. Falava em francês. Eu entendi. Ele dizia que tinha sido um engenheiro, e que tinha morrido num acidente na barragem de Assuan, e que o seu nome era Didier Falayeg.

Perguntei em que cidade havia nascido, e ele respondeu que tinha nascido em Alexandria, no ano de 1930, mas que tinha sido educado na França.

Disse a ele, que eu não duvidava da sua identidade e nem daquela manifestação, mas que, em virtude daquela ocorrência ser inédita, eu necessitava de mais algumas informações, e se ele poderia dar.

Respondeu que sim.

"— O senhor disse que morreu num acidente em Assuan". Poderá, nos fornecer mais alguns detalhes?

— Foi em 1968, em um acidente ocorrido na barragem.

— Senhor Didier, como o senhor está falando da sua morte, eu penso então que o senhor não morreu? Pois quem morre não fala mais nada!

— Eu também pensava assim, mas o lado de cá é bem diferente; ninguém morre.

— Nós podemos saber o que o senhor deseja, ao estar falando através desse jovem?

— Se não fosse por culpa dele, eu não teria morrido.

— Culpa de quem senhor Didier?

— Culpa desse, por quem eu falo. Ele era o meu ajudante de campo.

— Mas, senhor Didier, ele também morreu no acidente?

— Morreu!

— E como era o nome dele?

— Jhafyr.

— Então, senhor Didier, como o senhor nota, não existe a morte, e o nosso jovem que naquela época se chamava Jhafyr, e que hoje chama-se Farud, também como o senhor não morreu, mas ele está aqui conosco, em uma nova vida. Teve a possibilidade, entendo, de ter nascido de novo, e aqui está estudando conosco, para se formar em engenharia.

Perguntei ainda a ele, se teria condições de acrescentar mais alguma coisa àquela situação inédita, mas ele nada mais respondeu.

 

A sobrevivência da alma prova-se de maneira irrecusável e por assim dizer palpável pelas comunicações espíritas. A sua individualidade demonstra-se pelo seu caráter e qualidades próprias a cada uma; essas qualidades, distintas umas das outras, constituem a personalidade; se se confundissem em um todo comum, as qualidades de todos seriam uniformes. Al´m dessas provas, ainda temos a material das manifestações visuais ou aparições, que são tão freqüentes e tão autênticas a ponto de não deixarem a menor dúvida.”

(Obras Póstumas – Allan Kardec – A alma sobrevive ao corpo e conserva a individualidade depois da morte)

 

Depois de alguns instantes, o jovem Farud teve um tremor, tive que segurá-lo, pois quase caiu da cadeira e, despertou bem assustado. E eu, fiquei pasmo com aquela situação. Ao final de alguns minutos, eu lhe perguntei: — Meu jovem, você tem consciência do que ocorreu?

— Senhor Reitor, só me lembro de que, a caminho da sala de aula, tive uma forte dor de cabeça.

— E agora, você está bem?

— Sinto que estou com um peso enorme na nuca. Mas por que estou aqui na sua sala senhor Reitor?

— Você foi acometido de um mal estar: talvez tenha sido aquela dor de cabeça, e desmaiou; e aqui está! Quando quiser, pode vir que conversaremos mais.

— Está bem senhor Reitor e muito obrigado pela ajuda.

Depois de alguns dias, com aqueles acontecimentos ainda na minha cabeça, tomei uma resolução e fui para o Egito. Primeiramente, fui a Alexandria e, de fato, constatei o assentamento de nascimento do senhor Didier Falayeg, e também averbação do seu falecimento. Depois, viajei até Assuan, e junto à administração da represa, fui informado que realmente houve um acidente em 1968, no qual faleceram os senhores Didier e Jhafyr.

Então, Jalal, está ai a constatação de que a morte não existe, e que há o renascimento. Se todos nós temos a possibilidade de evoluir sendo filhos de Allah, já renascemos várias vezes, e outros tantos renascimentos teremos. Não há como desacreditar! Se o Jhafyr, esteve aqui conosco, agora, com o nome de Farud, nós também, após a nossa morte.igualmente, já tivemos e teremos uma outra oportunidade de vida, para mais uma ou várias experiências na Terra, como , com certeza, também deve ter tido o senhor Didier, em algum lugar.

Isso tudo, foi o que deduzi, depois que resolvi pesquisar sobre o assunto – renascimento. Constatei, Jalal, que já há relatos muitos antigos, e que essa idéia é aceita – renascimento da alma.

Alguns estudiosos, dos quais me vali para sedimentar a minha constatação, afirmam que esse entendimento tem raízes nos primórdios da civilização humana. Muitos deles, dizem, que a origem desse saber, foi plantado no Egito antigo. E outros ainda, sustentam que esse conhecimento, já era estudado na civilização da Atlântida. Mas, é o Egito que retém escritos, os mais antigos a esse respeito.

Muitos pesquisadores, se referem, sobre esse assunto, tendo por base o “Papiro de Anana”, que acredita-se, tenha sido escrito, conforme a datação do carbono, em 1320 a.C., no qual, traz no seu bojo, afirmações “que uma pessoa pode viver várias vezes, retornando à Terra em novo corpo e, sem ter a lembrança das suas vidas anteriores”.

Há também, registros sobre esse assunto, na obra poética dos Vedas, que é composta de 1200 hinos, nos quais, proclamam os seus deuses. Isso, Jalal, há 1500 a.C.

Como não deixaria de acontecer, também , no berço da civilização, a Grécia, com Pitágoras e seus seguidores, Sócrates, Platão, Apolônio, Empídocles e outros, igualmente, não tiveram dúvidas sobre nossas outras vidas, visando a evolução da alma.

E agora, mais recentemente, na França, na cidade de Lyon, em 1857, um eminente professor, discípulo de Pestalozzi, cujo o nome era – Léon-Hippolyte-Denizart Rivail, que se cognominou, Allan Kardec, lançou um livro, intitulado “O Livro dos Espíritos”, do qual, ainda estou estudando, que trata, entre muitos assuntos, da reencarnação do Espírito.

Jalal, toda essa literatura, eu tenho em minha biblioteca. Se desejar se inteirar sobre esse assunto e outros, pode ir consultar. Assim, possamos nos dois discutir sobre eles.

Isso então — continuou o senhor Zayani — me dá a possibilidade de crer, que não existem coisas ou situações irreversíveis. Se, em algum momento das nossas vidas, alguma coisa nos é negada à conquista, é possível que em outra experiência de vida, nós a conquistemos. Eu entendo que nesse retorno que todos deveremos ter a uma nova vida, muitas coisas podem ser vistas e revistas, e os conhecimentos podem ser adquiridos, mas nunca perdidos. Eu não tenho o domínio dessas situações novas, mas gostaria de me aprofundar nesse assunto; acho apaixonante.

 

— Senhor Reitor, confesso que isso tudo me deixa, não confuso, porque os seus relatos são convincentes, mas me deixa meio atônito. As manifestações de perdas de entes queridos, que comumente ocorrem, são muito ostensivas. Se todos nós tivermos o entendimento de que a morte de um ente querido não existe, e que em algum dia ou em algum lugar nós nos encontraremos, não teremos que sofrer tanto com a separação, a não ser, ficarmos um pouco saudosos pelo convívio.

— Bem, Jalal, vamos deixar esses assuntos de lado, não poderemos resolver nada a não ser aquilo que se põe a nossa frente, como palpável. E o que é concreto é este chá de alecrim, e que você está convidado a ir amanhã à minha residência. Eu quero comemorar com os meus familiares e alguns amigos, meus quarenta anos de dedicação à educação. Não aceito negativa da sua parte!

 

E a noite chegou, e Jalal compareceu.

— Meu jovem professor, não se sinta inibido entre nós mais velhos e já com tempo de aposentadoria. Estamos todos no mesmo trapiche, e cada um com a sua bagagem, aguardando o dia da viagem maior.

Todos riram das afirmações jocosas do Reitor.

— Senhor Reitor, não estou inibido. Este é o meu feitio, estar sempre reservado, e este, é o momento, mais para isso mesmo, pois, é da observação e atenção junto aos senhores, que eu tenho a oportunidade primorosa, de um grande aprendizado.

— Aproveitaremos todos, Jalal, esses momentos de convívio, que nada mais são do que uma coexistência; que é o que se realiza ao mesmo tempo; é simultâneo. Então estamos aqui numa troca simultânea de conhecimentos; entre nós, idosos e você jovem, que todos admiramos muito pela grande dedicação que se propõe a favor da faculdade de Agronomia.

— Senhor Reitor, os benefícios que estão acontecendo, que por mim foram implementados, são da minha obrigação como professor e educador. Nada mais que isso.

 

Em certo momento da conversação, o senhor Reitor, dirigiu-se a uma moça que passava em um ambiente contíguo, e chamou-a : — Layla, por favor, venha até aqui, que eu quero lhe apresentar o nosso professor de agronomia - Sr. Jalal.

A moça, muito bonita e simpática, com um belo sorriso largo , cumprimenta àqueles que já conhecia, e foi apresentada a Jalal.

Ficou ali por alguns instantes, mas logo, retirou-se, visto estar atarefada nos preparativos para o jantar.

Durante o jantar, um dos participantes disse: — Senhora Jade e senhora Layla, o jantar que prepararam está delicioso, e sem sombra de dúvidas, está mais para um banquete, o qual, muito bem o nosso Reitor merece.

Opinião que foi acompanhada por todos.


 

 

Capítulo — IX

 

Jalal, em seu apartamento, sentou-se à sua mesa de trabalho, e foi acometido de uma onda forte de saudades dos seus entes queridos. Diante da fotografia do seu avô, ele lembrou aquela figura afável, compreensiva e amorável que tanto lhe ajudou e que continuava ajudando, como um exemplo a seguir para toda vida.

Na cadeira executiva, ele reclinou-se, relaxando, e dormiu. Acordou assustado, na alta madrugada, com o telefone tocando. Atendeu, era seu pai, que lhe disse: "— Jalal, meu filho, papai não está passando bem de saúde. Venha o mais rápido que puder. Nós estamos levando-o para Djedda."

Não tendo mais condições de conciliar-se com o sono, e diante da fotografia do seu ícone, seu pensamento percorreu milhas e milhas com o desejo ardente de que o seu querido avô se recuperasse do mal que o acometia. Mas, um expressivo pressagio lhe revelava, que teria chegado o momento do seu querido avô partir; Jalal, já por algumas razões, tinha certeza que o seu avô, iria somente deixar esse convívio terreno, indo habitar em outro plano após o desenlace.

Com o raiar do dia, ele entrou em contato telefônico com o Reitor e comunicou o acontecido, e que iria viajar para Djedda.

Nessa mesma manhã, ele viajou. À noite, Jalal está no saguão do hospital, onde encontrou o seu pai. Abraçaram-se, e lágrimas rolaram.

— Jalal, acho que nós perderemos aquele que foi, e continuará sendo, o nosso maior entusiasta. Papai, como disse o médico, teve um acidente vascular cerebral expressivo; ele está muito mal, e tem poucas chances para que o quadro se reverta.

Ainda abraçado com o seu pai, Jalal chorou convulsivamente.

Passados alguns instantes, mais equilibrado, Jalal dirigiu-se ao seu pai: — Papai, por todo esse tempo, o senhor sempre esteve bem próximo do vovô, nos momentos, os mais diversos. Então, como o caso dele é muito grave, vamos solicitar ao médico que transfira-o para um quarto comum, mas com todos os cuidados, e aí teremos a possibilidade de mais uma vez, ficarmos juntos com Muhammad Al Azis, e, por derradeiro, sentirmos, ainda que seja pouco o seu calor, e compartilharmos as nossas energias, amando-o e agradecendo a figura impar de homem que foi e que continuará sendo em nossas lembranças.

 

Após o funeral, todos muito tristes, reuniram-se, e cada um contou essa ou aquela passagem que tiveram com o senhor Muhammad, e todas coincidentes, no que diz respeito a sua bondade,afabilidade e doçura para com todos; sempre havia em suas palavras, um ensinamento de bom ânimo.

 

A benevolência para com os seus semelhantes, fruto do amor ao próximo, produz a afabilidade e a doçura, que lhe são as formas de manifestar-se.”

(O Evangelho Segundo o Espiritismo— cap. IX)

 

Jalal, a certo momento, pediu a atenção de todos, e começou a narrar um fato, que o seu Reitor lhe contou sobre a morte.

— Meu filho, isto é algo inusitado, mas que bem analisado, sem paixões, sem fanatismo, poderemos concluir acreditando; ainda mais, sendo relatado por uma pessoa de grande credibilidade. Portando, acho que não devemos duvidar. Certa vez, eu ainda era jovenzinho, e presenciei um encontro de sua avó com um "neviin", quando do falecimento da minha irmã – sua tia. Mamãe estava inconsolável, quando se acercou dela um homem dizendo: "— Ela está indo, mas irá voltar muito longe daqui".

Acho que minha mãe não deve ter entendido o que aquele homem disse; e nem eu. Mas, agora com esse relato sobre o jovem Farud, que morreu lá no Egito e tornou a nascer aqui no nosso país, acho que o "neviin", desejou dizer que a minha irmã nasceria em outro lugar, longe do nosso convívio. E se um dia ela vier, será que vamos reconhecê-la? Seria muito bom que ela viesse ter conosco.

Mas vamos mudar de assunto, que isso é muito complicado. Há quase sessenta anos que tudo isso aconteceu e, até agora, não sei se minha irmã nasceu de novo ou não; se ela nasceu, será muito bom que o destino nos mostre e, a gente venha a saber e a conhecê-la, e assim vivermos, quem sabe, numa mesma família. Isso será muito bom! Ela era bonitinha...

— Jalal, papai deixou algumas coisas escritas que ele me recomendou que fossem conhecidas por nós, somente após a sua morte. E aqui estão!

— Papai, ao senhor compete romper o lacre e ler.

O manuscrito de apenas duas laudas em síntese trazia, além de algumas recomendações, muitos agradecimentos a todos os familiares por terem tido com ele paciência em suportá-lo nas suas rabugices. Trazia também o manuscrito, a sua vontade de que alguns dos seus objetos pessoais fossem destinados às pessoas que ele ali indicava. A cada um dos familiares foi ofertado algo. A Jalal, coube ser agraciado com o albornoz negro com detalhes bordados com fios de ouro, e uma vistosa galabia.

Jalal, aconchegou-se ao albornoz, apertando-o contra seu peito, deixando rolar muitas lágrimas.

— Eu choro, mas não é um choro de tristeza; é um choro de saudades, pois já não mais terei fisicamente essa figura de homem notável, que tanto me ajudou a ser um homem íntegro. Mas tenho certeza de que, pela força da atração dos pensamentos, ele estará conosco em todos os momentos: alegres ou tristes.


 

 

Capítulo — X

 

Dentro da normalidade, em Riyad, Jalal voltou à sua vida acadêmica. O tempo correu, e muitas atividades curriculares ocupavam o seu dia por inteiro. Como professor titular, além das atividades pertinentes ao departamento agrícola, ele estava sendo muito solicitado para auxiliar o governo na elaboração dos planejamentos da política agrícola. Isso para ele, era extremamente importante, pois vinha ao encontro de seu grande desejo para que o país produzisse mais e melhor, suprindo as necessidades de uma grande maioria do povo.

Certa tarde quando estava a caminhar com pressa para avistar-se com o Reitor, casualmente, encontrou a Layla.

 

Dois seres que se conheceram e se amaram, podem encontrar-se noutra existência corpórea e se reconhecerem?

— Reconhecerem-se, não, mas serem atraídos um pelo outro, sim; e frequentemente as ligações íntimas, fundadas numa afeição sincera, não provém de outra causa. Dois seres se aproximam um ao outro por circunstâncias aparentemente fortuitas, mas que são o resultado da atração de dois Espíritos que se buscam através da multidão”

(O Livro dos Espíritos – Cap. VII – pergunta 386)

 

— Como vai Layla? Vejo que igualmente você está com pressa?

— É isso mesmo, professor. Estou indo ao encontro de papai.

— Eu também estou indo ao encontro do senhor Reitor. Posso acompanhá-la?

Com muito prazer!

Sem que houvesse alguém na ante-sala para anunciá-los naquele instante, Layla abriu a porta do gabinete do seu pai, devagar...

— Dá licença!

— Filha... Entre querida!

Cumprimentaram-se, e, em seguida ela disse: — Trouxe uma companhia, que encontrei nos corredores. Professor, por favor, entre!

— Ah! Layla, posso dizer que foi um bom achado. Como vai, Jalal?

— Muito bem senhor Reitor.

— Vejo que está bastante atarefado com esse maço de papeis.

— Realmente senhor. Estou aqui para colher a sua opinião.

— Papai, eu também estou aqui para ter a sua opinião sobre o meu trabalho, mas como ele não faz parte do currículo da universidade, deixarei para outro dia...

— Não, Layla, por favor, você tem preferência. Eu estou aqui todos os dias, poderei ter a opinião do senhor Reitor em outra oportunidade.

— Vamos fazer o seguinte: Layla, leve o seu texto para nossa casa, e lá, nós estudaremos com mais folga. E quanto a você Jalal, amanhã vá a minha casa que nós veremos o que poderemos fazer, e se eu posso lhe ajudar em alguma coisa. Agora, sentem-se que eu vou lhes servir um chá, e vamos conversar.

— Papai, posso descobrir-me?

— Fique à vontade, minha filha.

Num gesto calmo, ela retirou o manto que pousava sobre sua cabeça, e com as duas mãos, mergulhou seus dedos na sua vasta, linda, reluzente e negra cabeleira, movimentando-a com leveza, deixando repousar sobre seus ombros as madeixas. Recostada na poltrona, mas com elegante postura, Layla, se revelou aos olhos de Jalal, uma mulher de uma beleza admirável. Seus traços eram suaves; sua testa acentuada, revelava ser uma mulher inteligente, trazendo sobre o nariz escultural, óculos de grau, que lhe davam um ar um pouco austero. No entanto, isso se quebrava quando dos seus róseos lábios, um sorriso luminoso se estampava, pondo à mostra, dentes alvíssimos e bem alinhados.

 

Proclamemos, porém, desde hoje, que a ciência no-lo permite já, o fato capital e consolador do progresso, lento mas seguro, de nosso tipo físico para este ideal entrevisto pelos grandes artistas através das inspirações, que o céu lhes envia para nos revelar os segredos. Esse ideal não é um produto enganador da imaginação, um sonho fugitivo destina a dar, de tempos em tempos, descanso às nossas misérias; é um objetivo assinado por Deus ao nosso aperfeiçoamento, objetivo sem limites, sem fim, porque, em todos os casos, só o infinito pode satisfazer-nos o Espírito e oferecer-lhe uma carreira digna de si.

Resulta dessas judiciosas observações que a forma dos corpos tem-se modificado, em determinado sentido e segundo uma lei, à medida que o ser moral se há desenvolvido; que a forma exterior está em constante relação com o instinto e os apetites do ser moral; que quando os seus instintos se aproximam da animalidade, tanto mais aquela forma se lhe aproxima igualmente; enfim, que à medida que os instintos materiais se estiolam e dão lugar aos sentimentos morais, o invólucro exterior, que não tem mais que satisfazer a necessidades grosseiras, reveste formas cada vez mais leves, delicadas, em harmonia com a elevação e delicadeza dos pensamentos.”

(Obras Póstumas— Allan Kardec – Teoria do Belo)

 

— Professor Jalal, sei que o senhor não é um meteorologista, mas, a sua disciplina de uma certa forma está relacionada ao tempo. O senhor não acha que estamos tendo um calor excessivo para essa época do ano?

— Realmente isso está acontecendo, e a nossa lavoura já está acusando esse fenômeno. A camada de ozônio que nos protege dos raios solares mais intensos está sendo danificada pelas grandes potências, que lançam na atmosfera toneladas e toneladas de gases que danificam aquela camada protetora, e os raios solares nos atingem fortemente; ficamos expostos, e isso causará, também, muitos problemas para a saúde, originando a grave doença de pele, que é o câncer.

— É o tal monóxido de carbono que está agindo contra nós, não é?

— É, esse é um dos gases que infelizmente, nós colaboramos para que ele se propague quando nós utilizamos os nossos automóveis.

— O problema então, não é de fácil solução, pois sem automóveis nós não ficaremos.

— Nós já estamos tão acostumados com essa facilidade, que não andamos nem poucas quadras, se não formos com ele; isso é um mal costume, pois sabemos que o caminhar, é um grande remédio para o nosso coração, veias e artérias. Mas, se me permite, quero mudar de assunto. Você está escrevendo um livro?

— É possível que, com a conclusão favorável da minha tese, eu edite um livro. O meu trabalho é sobre literatura, que direciono para os antigos contadores de histórias que nunca deixaram nada escrito, e que muitos escritores espertos tomaram-nas como sendo de suas lavras. Está sendo uma pesquisa muito difícil. Já fui ao Egito, ao Irã, a Jordânia, a Turquia e a Síria, para pesquisar e compilar subsídios. Deixei de ir ao Iraque, porque o clima lá é de muito beligerância. O agradável de tudo isso é que tenho viajado bastante e conhecido culturas variadas, muito embora sejamos todos árabes e também, muito preconceituosos em relação ao meu trabalho, sendo mulher.

— Eis aqui o nosso chá! Tenho certeza que vocês nunca provaram deste.

— Papai, desse aqui eu nunca provei mesmo. Que delícia!!!

— Realmente ele é muito gostoso! Completou Jalal.

— Sabe de onde vem? Lá do Brasil! Ontem, esteve aqui fazendo-nos uma visita, um ex aluno, bacharelado em comércio exterior, e que está trabalhando na nossa embaixada no Brasil e, me fez de presente, uma caixa — aqui está — com vários tipos de chá. Este, que estamos tomando, é um chá calmante — chá de melissa.

— É uma delícia, papai!

— Acho que vou precisar do endereço desse seu amigo. Ando um pouco tenso com essas obrigações que o governo está me impondo — disse Jalal.

— Não... Não é tanto assim. Com o tempo você se acostuma. Comigo também, há tempos atrás, as solicitações deles eram quase diárias. Apareça amanhã lá em casa, venha jantar conosco que depois eu lhe oferecerei mais um chá de melissa.

— Obrigado, senhor Reitor.

 

A noite estava amena. Jalal foi recebido por Layla. Estavam a conversar no jardim interno da residência. Trocavam assuntos os mais diversos, até que Jalal deixou escapar uma pergunta: — Layla, você nunca desejou casar?

No mesmo instante, Jalal percebeu a sua indiscrição, emendou: — Por favor, Layla, me perdoe pela minha falta de educação e imperdoável indiscrição. Não responda por favor; me desculpe!

— Professor, não se desconcerte. Essa é uma pergunta normal entre duas pessoas que estão se tornando amigas. Eu vou responder.

— Layla, por favor, diga-me: você realmente não se achou incomodada com a pergunta, cujo assunto compete somente a você?

— Não, professor!

— Layla, quero que você saiba e tenha a certeza de que a curiosidade que invadiu o meu íntimo, e que fez com que eu lhe fizesse essa indiscreta pergunta, se prende ao fato notório de você ser uma mulher muito inteligente, elegante e muito bonita! Quero também lhe pedir, já que estamos sedimentando uma amizade, que me trate somente de Jalal.

— Obrigada Jalal pelos predicados e adjetivos que toda mulher gosta de ouvir. Devo a tudo isso, a minha linha hereditária. E, quanto à sua pergunta, me aguarde um instante que vou lhe responder em parte.

Layla se ausentou por alguns instantes, mas logo estava de volta, e de braços com um jovem.

— Antar, meu filho, quero que conheça o professor Jalal, amigo do seu avô.

Cumprimentaram-se, trocaram alguns assuntos, e a eles, juntou-se o Reitor Zayani, que veio com o convite: — O jantar está servido. Vamos!

Após, reuniram-se na biblioteca, e o Reitor pediu que Jalal apresentasse o seu trabalho.

— Senhor Reitor, resolvi trazer somente uma síntese. Dessa forma, acho que não tomarei demais o seu tempo no convívio dos seus familiares. Assim, farei uma pequena explanação do que pretendo desenvolver.

E assim foi feito.

— Jalal, acho que o seu trabalho está ótimo, muito embora eu não entenda nada de agricultura, mas com referência a estrutura da sua explanação, ele está consistente. Nós passamos aqui quase duas horas, e não ficamos sonolentos, e isso é muito importante; é um bom sinal, pois acho que os seus ouvintes ficarão atentos. — disse Layla.

— Se isso ocorrer, eu já me dou por satisfeito. Senhor Reitor e Layla, acho que abusei demais das suas hospitalidades, atenções e amizades. Já é hora de ir, mesmo porque, está adiantada a hora. Meu muito obrigado, tenham um bom sono e um excelente fim de semana.

— Jalal, o que você vai fazer neste fim de semana?

— Senhor reitor, acho que vou estar bastante ocupado. Preciso digitar esse trabalho. Estarei na faculdade.

Depois que terminá-lo, se quiser venha; estaremos aqui — disse Layla

— Obrigado, Layla. Vou fazer todo possível para apressar a digitação do meu texto. O convívio com vocês é muito agradável. Mais uma vez, obrigado!


 

 

Capítulo — XI

 

Mais um período escolar se findou, e Jalal, programou passar alguns dias em Asir e levar para a sua família a novidade, que tinha conseguido com o Ministro da Indústria, autorização para construir uma pequena usina de açúcar e destilaria de álcool para uso medicinal e hospitalar.

Alguns dias antes, mais uma vez, teve um encontro com Layla nos corredores da universidade.

— Que interessante Layla! Eu estava andando por um outro corredor e tentava lembrar de um sonho, do qual você fazia parte e, em vez de continuar por ele, que vai em direção ao estacionamento, resolvi vir por este, que tem a direção contrária, de onde deixei o meu carro. Será que a isso, pode se ajustar, aos que afirmam , ser esse acontecimento, como a força do destino, ou força do pensamento?

 

No estado errante, antes da nova existência corpórea, o Espírito em consciência e previsão do que lhe vai acontecer durante a vida?

— Ele mesmo escolhe o gênero de provas que deseja sofrer; nisto consiste o seu livre arbítrio”

(O Livro dos Espíritos— pergunta 258)

 

Não é Deus que lhe impõe as tribulações da vida, como castigo?

— Nada acontece sem a permissão de Deus, porque foi Ele que estabeleceu todas as leis que regem o universos.Perguntareis agora por que Ele fez tl lei em vez de tal outra!

Dando ao Espírito a liberdade de escolha, deixa-lhe toda a responsabilidade dos seus atos e das suas conseqüências.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 258-a)

 

Por que duas pessoas, perfeitamente despertas, têm muitas vezes, instantaneamente, o mesmo pensamento.

— São dois Espíritos simpáticos que se comunicam e vêem reciprocamente os seus pensamentos, mesmo quando não dormem.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 421)

 

Exercem essa influência de outra maneira, além dos pensamentos que sugerem, ou seja, tem uma ação direta sobre a realização das coisas?

— (...) Assim, por exemplo, eles provocarão o encontro de duas pessoas, o que parece dar-se por acaso; inspirarão a alguém o pensamento de passar por tal lugar; chamarão sua atenção para determinado ponto, se isso pode conduzir ao resultado que desejam; de tal maneira que o homem, não julgando seguir senão os seus próprios impulsos, conserva sempre o seu livre arbítrio.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 525-a)

 

— Jalal, eu não sei como responder. Só sei que queria mesmo encontrá-lo. Amanhã, lá em casa, teremos uma pequena comemoração. Gostaria que comparecesse.

— Layla, você tem tempo para responder-me algumas interrogações que tenho a seu respeito?

Ela, muito bonita, fitou bem o seu interlocutor, ajeitou os seus óculos, adivinhando até o que iria ser perguntado, respondeu: — Claro!

Antes mesmo de Jalal fizesse qualquer pergunta, ela adiantou-se.

— Jalal, você pode me contar o sonho que teve comigo?

— Foi um sonho interessante. Não tivemos nenhum diálogo; nele estava o meu avô, que pelas mãos, trazia você ao meu encontro, e ficamos ali, nós três, sorrindo e felizes.

Layla, por ficou alguns instantes calada e estática.

— Você está sentindo algo que a incomoda, Layla?

— Não. Só estou admirada com tanta coincidência.

— Você pode se explicar melhor?

— Jalal, quando você começou a falar do seu sonho, imediatamente lembrei, que também eu havia sonhado. Sonhei com você e com um senhor idoso, muito simpático, sorridente, vestido com um albornoz negro bordado com fios de ouro, trazendo uma linda galabia , e que segurava a minha mão. Estávamos num lugar muito bonito; numa elevação florida. E nós ficamos ali, todos juntos, felizes... E a outra coincidência foi este nosso encontro. Se você não tivesse mudado de corredor, nós não teríamos tido esse encontro!

 

Durante o sono, a alma repousa como o corpo?

— Não, o Espírito jamais fica inativo. Durante o sono, os liames que o unem ao corpo se afrouxam e o corpo não necessita do Espírito. Então ele percorre o espaço e entra em relação mais direta com os outros Espíritos.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 401)

 

Como podemos avaliar a liberdade do Espírito durante o sono?

— Pelos sonhos. Sabei que quando o corpo repousa, o Espírito dispõe de mais faculdades que o estado de vigília. Tem a lembrança do passado e às vezes a previsão do futuro; adquire mais poder e pode entrar em comunicação com outros Espíritos, seja deste mundo, seja de outro.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 402)

 

— Layla, eu acho que há muita coisa por trás disso tudo; muita coisa boa que ainda não entendemos, mas podemos imaginar o que possa ser. Da minha parte, o que estou constatando já de algum tempo, é que eu estou com constância, pensando em você; nos seus predicados de beleza, de elegância, de inteligência...

— Posso dizer-lhe que eu também, e que nos meus devaneios, na minha fantasia de mulher, você está sempre presente.

— Layla, admito que devemos conversar a nosso respeito.

— Então, Jalal, eu começo a desanuviar a sua interrogação: Hoje, eu sou uma mulher viúva. O pai do meu filho era piloto militar, e num exercício de vôo, ele sofreu um acidente fatal, há muitos anos atrás. Antar mal tinha começado a andar. O acidente ocorreu nas imediações das colinas de Asir.

— Eu me lembro desse acidente; ele ocorreu perto da nossa propriedade.

— De lá, até uns quatro anos atrás, eu dediquei a minha vida centrada na educação do meu filho e, ao estudo da literatura árabe.

— Desculpe-me Layla, se provoco lembranças tristes.

— Não se incomode. Eu aprendi depois de algum tempo, a lidar bem com a minha situação de viúva. As pessoas nascem e morrem, e isso acontece em todas as famílias. Quando ocorreu o acidente, eu era jovenzinha; casei muito cedo. Com o apoio dos meus pais, que são pessoas maravilhosas, a quem serei eternamente grata , fui superando as minhas dificuldades de mãe inexperiente. Foram tempos difíceis que passaram. Hoje, com o que está acontecendo comigo, eu percebo que Allah me dá a vida, e a vida me concede o privilégio de novamente, ingressar no horizonte onde o sol brilha para o meu destino de mulher. Então, o que tenho que fazer é usufruir dessa existência da melhor maneira, sendo útil à sociedade, principalmente aos meus familiares e àqueles que me são queridos. Sabe de uma coisa, Jalal, ao estudar e me aprofundar na literatura árabe, muito diversificada e rica, eu me deparei com os ensinamentos Sufistas. O Sufismo é uma religião árabe-persa, segundo a qual a alma, é emanação de Deus; tem sua origem em Deus; a alma, é uma criação de Deus. Os sultões, divulgadores dessa doutrina, gravaram esses ensinos em versos e peças líricas, propagando primordialmente, a união da nossa alma com o Criador, e que jamais devemos renunciar à Vida que nos é dada a viver.

 

Sem a preexistência da alma, o homem, que crê em Deus, é levado a acreditar que lhe deve singulares vantagens, e o que não crê é levado a atribuí-los a acaso e aos méritos próprios.”

(Obras Póstumas— Allan Kardec – Cap. Egoísmo e Orgulho)

 

Eu não sou adepta a essa seita, mas devo admitir que esse é um ponto que me tocou fundo. Entendo, então, que, a minha alma é uma emanação de Deus, e eu, estou em união com Ele que é imortal. Eu sou filha Dele; portanto, ampliando esse conhecimento para mim, eu também sou imortal; eu não morrerei; eu continuarei a existir, com todos os meus conhecimentos, a despeito do meu corpo ser consumido nas areias.

 

A alma conserva a sua individualidade após a morte?

— Sim, não perde jamais. O que seria ela, se não a conservasse?

(O Livro dos Espíritos – pergunta 150)

 

Então, Jalal, eu não devo renunciar à Vida. Eu quero viver plenamente. Nós, Jalal, somos emanações de Deus; Deus é Vida permanente, assim, igualmente, também somos vidas permanentes. Esta é a minha opinião, que também, tem base naqueles acontecimentos que ocorreram com aquele aluno que foi entrevistado por papai — o Farud — lembra? Papai nos disse que contou para você aquele episódio com o jovem estudante. Jalal, o que eu quero dizer, é que nós somos como o sol, que as vezes com muita e outras vezes com pouca claridade, nasce no horizonte, tem um trajeto certo, e desaparece no outro horizonte. E no dia seguinte, lá está ele novamente. Nós também nascemos, temos uma vida com muita ou pouca claridade, e morremos. Mas como o sol, nasceremos novamente e assim vamos indo. Até onde? Não sei! Só sei que, como emanações que somos de Deus, nosso Espírito não pode morrer!

— Bem Jalal, já falei demais. Agora me diga: Você vai comparecer?

— Layla, aprendi muito...Mas por que essa comemoração?

— É que meu filho completa dezoito anos

Ele a acompanhou até o estacionamento, onde um motorista já a aguardava, e despediram-se com olhares de que esse não era o desejo de ambos.

Próximo a uma mureta, Jalal, sentou-se e ali ficou a refletir em tudo o que ela dissera, e em tudo que poderiam ter dito um ao outro.

No meio do período da manhã seguinte, ele fez uma ligação para Layla e perguntou sobre o gosto ou a tendência de Antar, e obteve como resposta, que ele gosta muito de aviões; que ele tem uma coleção enorme dessas miniaturas.

— Layla, ele tem algum modelo de aeromodelismo?

— Não!

— E o que você acha, se eu presenteá-lo com um desses modelos? Não estarei avivando uma tendência forte para a aviação, por causa da qual você sofreu muito?

— Por favor, não pense assim. Se ele quiser no futuro, pender para essa atividade, eu, não interferirei, ao contrário. A prática do aeromodelismo é um lazer. Acho que ele vai gostar.

Um pouco antes das vinte horas, Jalal foi recebido pelo Reitor Zayani. Cumprimentam-se efusivamente.

Antar, que estava recepcionando alguns jovens, aproximou-se, e é cumprimentado e também presenteado. Ficou feliz com o presente — um Tucano-BR, para ser montado.

Layla, muito bonita e a passos ligeiros, veio ao encontro de Jalal. Quando este, virou-se para cumprimentá-la, ela levou um susto e imediatamente lembrou-se da visão daquele homem idoso no seu sonho, com um albornoz negro, com detalhes bordados em fios de ouro.

— Layla, minha filha... Você está se sentindo bem?

— Estou bem papai. O que me leva a ficar assim, até um pouco assustada, é o seguinte: Eu tive um sonho com um senhor idoso, muito simpático, que vestia-se como está o Jalal. Por um momento pensei que estivesse vendo esse senhor.

— Layla, esse albornoz e esta galabia, eu fui agraciado, como herança do meu avô. Resolvi usá-los hoje, para quem sabe, poder mostrar, ou provar... não sei se é isso, que em nossos sonhos, o senhor idoso, era ele. É o que eu deduzo, embora sem conhecer o onirismo.

— Vocês podem esclarecer melhor esta situação e esses sonhos?

E Layla narrou ao seu pai os sonhos coincidentes.

— É... Se podemos realmente dar credibilidade aos sonhos, uma mensagem expressiva, ele demonstra.

No decorrer da festa, Jalal, em particular, dirige-se a Layla: — Amanhã eu irei para Asir, talvez lá me demore por uns dez ou quinze dias. Então gostaria que você soubesse o que manda meu coração, e que nesses dias você pense e depois, responda-me, ao que vou lhe dizer e pedir agora: Quero lhe dizer Layla, que estou enamorado de você. Peço, então, que me aceite como seu pretendente, a um futuro matrimônio.

Com seu sexto sentido, que toda mulher possui, ela já estava aguardando aquele pedido. Mostrou um largo e lindo sorriso, que muito realçava a sua beleza, e respondeu: — Jalal, meu coração me diz que não preciso de quinze dias para avaliar os meus sentimentos com relação a você, e nem preciso de todo esse tempo para lhe responder. Eu aceito que me enamore com vistas ao nosso matrimônio. Espere-me aqui alguns instantes, que eu quero comunicar a nossa resolução ao meu filho.

— Antar, me dê atenção por uns dois minutos. O que ocorre é o seguinte: Eu e o professor Jalal temos conversado e nos entendido, e nisso identificamos que estamos atraídos um pelo outro. Isso quer dizer que a reciprocidade afetiva está se consolidando em nossos íntimos. Posso lhe dizer que nós nos amamos, e estamos com planos para o nosso casamento.

Antar levemente passa a mão na sua testa e pergunta: — Já é uma resolução definitiva?

— É, meu filho...se nada acontecer daqui para frente, que nos separe, é uma resolução definitiva.

— Vovô sempre comenta, que ele é uma pessoa admirável, de raízes simples, que galgou postos com dificuldades, mas que se mantém um homem sem vaidades e sem orgulho; que é um homem trabalhador, estudioso e honesto, e um exemplo a ser seguido. Mamãe deixe-me abraçá-la. Acho que o professor a fará muito feliz, como bem merece.

Ambos chegaram à frente de Jalal de braços dados e, sem nenhuma palavra, os três se abraçam.

— Sejam felizes — disse Antar, que se afastou sorrindo.

— Layla, vamos ao encontro dos seus pais.

— Papai e mamãe, Jalal quer fazer-lhes um pedido.

— Senhor Zayani e senhora Jade, peço os seus consentimentos para namorar a Layla, com o objetivo de num futuro não muito distante, consorciar-me com ela.

— O que me parece — disse o Reitor — é que vocês já se acertaram. E se isso não tivesse acontecido, não seria eu e nem a sua mãe que deveríamos consentir. Layla, minha querida, tenho certeza absoluta que você sabe muito bem a razão desse seu passo que, de uma certa forma, vai ao encontro do meu desejo, pois admiro o homem que escolheu.

— Filha querida, você já falou com Antar? — disse dona Jade.

— Sim mamãe, nós já conversamos e ele nos deu um grande apoio, desejando-nos, muitas felicidades.

— Da nossa parte, Layla e Jalal, nós lhes desejamos que sejam muito felizes, e que o caminho que irão consolidar traga sempre a vontade de unirem-se, cada vez mais por um amor robusto, que seja capaz de enfrentar e ultrapassar quaisquer obstáculos. — aludiu o Reitor.

— Minha filha e Jalal, contem sempre conosco, e que Allah os abençoe!— acrescentou dona Jade.

Abraçaram-se felizes, e dona Jade segurou as mãos de Layla e Jalal, e lhes disse: — Os sonhos coincidentes que tiveram foram verdadeiros e, revelaram para vocês um mesmo caminho a seguir. Agora, vão usufruir desses momentos iniciais de lirismo, pois são momentos poéticos que jamais saem das nossas lembranças.

Sentados no jardim do interior da residência, eles erigiram planos para o futuro. A certo momento, Jalal achou entre as dobras do albornoz um pequeno envelope lacrado.

— Veja Layla o que eu achei neste bolso camuflado!

— E está endereçado a você, Jalal!

Com o envelope junto ao seu peito, Jalal, tem o seu pensamento direcionado a aquele homem que sempre admirou. Rompeu o lacre e leu em voz alta: "Meu neto. O homem de bem, é o guerreiro da luz ao travar o bom combate, longe de alimentar o orgulho ou o egoísmo. Ele distribui seus atos e pensamentos com alegria e amor, proporcionando ao seu próximo a felicidade, não distinguindo este ou aquele, porque todos nós, somos filhos de Allah . Seja feliz, e não meça esforços para que a sua companheira esqueça o acidente e reencontre a felicidade e o prazer da vida ao seu lado. Ela é uma filha muito querida"

Seu avô — Muhammad — 2000

 

— Quando que ele faleceu?

— Em junho de 2002.

Layla ficou admirada com o que descrevia a carta, notadamente no que a ela tocava diretamente — ao acidente.

— Jalal, ao que eu saiba, essas visões e pressentimentos, estão afetas aos "neviins" — os adivinhos do deserto. Ele era um desses?

— Não... Eu acho que não! Ele era um homem simples, mas de muita sabedoria; posso dizer que ele era um autodidata. Não sei lhe dizer se ele tinha esses dons.

— Bom, Jalal, de todo modo, você é meu novo horizonte, e está com a responsabilidade de proporcionar-me ser a mulher mais feliz deste mundo. Veja só a carga que está sobre seus ombros! Disse Layla gracejando.

Outra coisa Jalal, você praticamente sabe de toda minha vida, até esse momento. No entanto, eu nada sei ainda do seu passado, a não ser de parte da sua vida acadêmica.

— Os acontecimentos entre nós estão acontecendo tão rapidamente, que não tive essa oportunidade de falar sobre mim, mas agora, é o momento.

Quando eu era estudante aqui na faculdade, conheci uma estudante de medicina — ela era indiana; bem, acho que ainda é! Ela foi muito importante para algumas conquistas que tive, no que diz respeito a eu poder me relacionar com pessoas no Brasil, quando lá estive fazendo especialização. Ela me ensinou a falar e a escrever em inglês, durante quase quatro anos.

E ele narrou tudo que se relacionava a Bellary, até a facilidade proporcionada pelo senhor Reitor para ir a Índia tentar encontrá-la.

— Jalal, diga-me : Você gostava dela...? Ela era bonita...?

— Sim, eu gostava dela; e ela, era uma moça bonita.

— Você desistiu de procurá-la?

— Na verdade, Layla eu gostaria de encontrá-la, e que você estivesse ao meu lado. Eu sou muito agradecido pela ajuda que ela me deu, e que isso, de certa maneira, frente a tudo que ocorreu, está me proporcionando estes momentos junto a você, o grande prazer para o meu coração. Layla, eu estou plenamente convicto — bhebbik — eu a amo .

— Eu admito, que também o amo — bhebbak — este sentimento que hoje sinto é diferente; é um sentimento muito mais forte, acho que posso dizer que ele é mais quente dentro do meu peito.

Ficaram ali, ainda a sós, até que o Reitor Zayani se aproximou, e perguntou: — Vocês já podem marcar a data do casamento?

— Papai, o senhor nem bem deu o consentimento para o nosso namoro...

— Filha — disse ele brincando— eu estou ficando velho!...

— Velho nada!... O senhor está ainda bem moço!...— respondeu a filha

— Senhor Zayani, amanhã eu irei para Asir, e lá comunicarei aos meus familiares a nossa pretensão, e, acertarei com eles, uma boa data para aqui virem conhecê-los.

A este momento, Antar também participava da conversa: — Mamãe, a senhora também não está em férias?

— Estou!

— Então, por que não viaja com o professor? Aproveite, conheça o pessoal, passeie e descanse.

Jalal, Layla e o Reitor, trocaram olhares e o pai perguntou: — Você deseja ir, Layla?

— Jalal, se eu for não vou atrapalhar?

— Layla, em qualquer situação, você nunca irá me atrapalhar!

Ela, num gesto até infantil, entrelaçou seus dedos contra o seu peito e, dirigiu-se ao seu pai: — Posso ir, papai?

— Claro minha filha! Seja feliz e faça uma ótima viagem.

— Mas eu vou querer uma opinião da mamãe.

— Mamãe! Mamãe! A senhora pode vir até o jardim?

— Sabe o que é, mamãe? E ela contou.

— Layla, minha filha, pode ir que você vai gostar. Asir é uma região muito bonita. E tem outra coisa: Você é uma mãe, que tem um filho que está completando dezoito anos! Ninguém poderá censurá-la por viajar com o seu futuro esposo. Vocês viajarão de carro ou de avião?

— Acho melhor irmos de avião até Djedda; lá, alugaremos um automóvel.

— Então — disse a senhora Jade— peguem o telefone e já reservem as passagens.

— Jalal, é bom ir se acostumando, que mamãe é muito prática e expedita. Já o papai, por força do cargo, as vezes é cerimonioso, e ela, por força de ser dona de casa, é essencialmente pragmática.

Nessa mesma noite, Jalal telefonou para o seu pai, e comunicou que estaria no dia seguinte viajando para Asir, e que, em sua companhia, iria a sua futura esposa.

— Mas o que é isso, filho? Você vai casar?

É isso mesmo que lhe disse: Futura esposa! Amanhã nós contaremos mais detalhes. Boa noite, papai!


 

 

Capítulo — XII

 

A casa de Mutanabbi estava em festa.

Layla, muito bonita e finamente educada, encantou a todos pela sua simplicidade.

O anfitrião, muito feliz com a visita, e empolgando-se com aquele momento, com suas mãos calosas de agricultor e segurando as de Layla, perguntou com singeleza: — Eu vou ser avô?

Ela, sem se abalar, olhou com carinho para Jalal, e voltando-se para o futuro sogro : — Se Deus assim o permitir!

— Como eu gostaria que seu avô estivesse aqui conosco! Ele iria se rejubilar com tanta felicidade que agora estamos todos sentindo — disse Mutanabbi, a Jalal.

— Papai, mamãe e irmãos, cheguem mais perto, que vou lhes contar um sonho que tive. Depois você conta o seu Layla.

E ele descreveu o sonho: que seu avô trazia Layla pelas mãos, e que nós três, ficamos ali, felizes e sorrindo, sem ninguém dizer nada.

— Agora sou eu: Coincidentemente, nesta mesma noite, eu sonhei com Jalal e com um senhor idoso, sorridente, simpático, que vestia um albornoz negro, com detalhes em fios de ouro, e com uma linda galabia, e que segurava a minha mão. E ficamos reunidos, sem dizer uma só palavra, mas estávamos felizes.

Mutanabbi ausentou-se por alguns instantes, mas voltou trazendo uma fotografia do seu pai.

— Layla, era esse o homem que segurava as suas mãos?

Ela pegou a fotografia, olhou fixamente, aconchegou-a junto ao peito, e disse: — Muito obrigado, senhor Muhammad... Muito obrigado por me proporcionar momentos de muita felicidade, junto ao seu neto e a todos os seus familiares que agora, também são meus.

Mutanabbi e sua esposa Jadyra, abraçaram a futura nora e disseram: — Maktub! Al-hamdu lillah!( Graças a Deus) . Você é a filha que não nos foi dado ter. Obrigado por estar aqui conosco!

— Layla, quero que saiba do meu sentimento com relação a você: Filha, lá no fundo do meu coração, eu sinto que você foi uma pessoa muito querida e esperada, e que agora, volta para junto de nós, para nos alegrar — acrescentou Mutanabbi.

— Desejo que todos também conheçam o que sinto neste momento: me parece claramente que estes instantes entre nós todos, já foram momentos vividos, e que tudo isso se repete. E eu, estou plenamente feliz por estar aqui e muito agradecida ao senhor Muhammad, que não mais vive entre nós, mas que, na minha opinião, vive plenamente e, que me proporcionou tamanha alegria, ao revelar para o meu coração, o meu futuro esposo e os seus familiares. Sou uma mulher felicíssima!

Mutanabbi, sentiu-se como que transportado para o passado distante, quando ainda, praticamente menino, tendo a visão da sua mãe chorando a morte, daquela que seria sua irmã, e que um "neviin" lhe disse: — "Ela está indo, mas irá voltar muito longe daqui"

E uma pergunta brotou imediatamente na sua mente: - "Seria ela a minha irmã que estava voltando."

— O que foi, papai? Parece que o senhor estava bem longe! Tudo bem?

— Está tudo em ordem Jalal. Foi só um pensamento que me trouxe a lembrança de minha mãe.

 

Como distinguir se um pensamento sugerido vem de um bom ou de um mau Espírito?

Examinai-o: os bons Espíritos não aconselham senão o bem; cabe a vós distinguir”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 464)

 

E dona Jadyra acrescentou: — Estes são momentos que Deus ainda não nos deu a entender. Mas creio que chegará o dia que as situações dessas lembranças, de impressão simpática ou não, de sentimento de amor ou ódio, de reciprocidade ou aversão, de felicidade, de alegria, ou de tristeza, um dia compreenderemos.

— Vejam só papai e mamãe, o que eu achei num bolso camuflado do albornoz.

Mutanabbi e Jadyra leram a carta e ficaram surpresos.

— Como é que papai iria saber...?

— Isso é um mistério, papai! É bem provável, que vovô tivesse algum dom e, que a nenhum de nós, desejou revelar por alguma razão...talvez, não tivéssemos condições de entendê-lo.

— É, pode ser isso!

 

Layla adorou a estadia na fazenda. Andou pelas plantações, ordenhou uma vaca, chupou cana, ajudou na arrumação da casa, enfim, divertiu-se. Chegou até a ir ao local onde aconteceu o acidente com o esposo.

— Layla, venha aqui que quero lhe apresentar as minhas tamareiras.

— Você pode explicar melhor isso?

— Na verdade, elas são nossas. Eu as plantei quando ainda era jovem, e agora elas estão no auge da produção.

— Que delícia, Jalal. Esta é a primeira vez que saboreio uma fruta logo após ser colhida. Quantas coisas nós não experimentamos nesta vida, simplesmente por recusarmos a conhecer, outras vezes por não acreditarmos, sem um mínimo de razão, outras vezes, ainda, por preconceito ou por fanatismo desmedido que tolhe o nosso entendimento. Quanta coisa ainda temos de aprender!

— Eu concordo com você, meu amor! Mas ao seu lado, as interrogações que a Vida possa me expor, as respostas eu já as tenho, na sua figura linda de minha futura mulher.

Abraçaram-se e beijaram-se, pela primeira vez.

Jalal e seu pai, resolveram escolher o local para erigirem a pequena usina de açúcar em conjunto com destilaria de álcool medicinal e hospitalar

— Filho, o local está escolhido, mas diga-me uma coisa importante: de onde sairão os investimentos?

— Eu já devia ter dito ao senhor. Estou com um financiamento aprovado no Ministério da Agricultura para a importação da destilaria. O nosso governo irá importar em seu nome, responsabilizando-se pelo pagamento, e nós pagaremos ao nosso governo, em prestações mensais, com financiamento de vinte anos, com cinco anos de carência, depois da conclusão da usina.

— E você acha que teremos, de fato, condições para assumir essa responsabilidade?

— Papai, eu já fiz todos os cálculos e projeções; e tem mais: seremos os únicos a produzir álcool medicinal e hospitalar no país, com condições para exportar para os países vizinhos. Este é um incentivo do governo para o começo de uma política agro-industrial. E tem outra coisa papai, o resíduo que iremos produzir servirá como adubo para as nossas plantações e, também, para gerar energia que será consumida pela própria usina. Essa é uma técnica usada lá no Brasil com excelentes resultados.

— Muito bom filho. Estou ansioso para ver tudo funcionando.

— Papai, depois de amanhã, nós regressaremos, mas antes, passaremos em Djedda, e visitaremos o tio Makin. Quero mais uma vez agradecer a sua ajuda, e aproveitar para convidá-lo para o casamento.

— Mas vocês não marcaram a data!

Assim, ele já vai se preparando...

 

A despedida não se revelou triste, mas, sim, foi um marco do reencontro de criaturas que se buscavam e uniram-se afetivamente e, que se comprometeram, a ter muitos encontros felizes.


 

 

Capítulo — XIII

 

Layla, em sua casa, narrou aos seus pais e ao filho as suas impressões.

— Papai, mamãe e meu filho, eu realmente senti nos familiares de Jalal, um laço forte que nos unia, que não sei como descrever e, nem explicar. Foi como se fôssemos conhecidos de muitos e muitos anos. Foi um encontro em que a amizade já veio sedimentada. Houve entre nós, uma ligação recíproca, sincera, de carinho, de atenção, de união, de calor humano. Não houve entre nós, aqueles momentos de nos experimentarmos, como é comum entre pessoas que começam a ter um relacionamento. Fomos absolutamente sinceros, autênticos, verdadeiros e sem subterfúgios. Olhem, há muito, mas muito tempo mesmo, que, além de vocês, eu tenha tido contato com pessoas tão agradáveis. Gostei demais de ter ido a Asir.

— Ótimo filha! Mas para quando que será o casamento?

— Papai! Papai! Por que essa pressa?

— Filha querida, eu estou ficando muito velho...!

— Velho, nada! Não tem nem noventa anos!? Brincou a filha. Mas papai, eu acho que — ainda conversaremos a respeito— não deverá demorar muito para marcarmos a data, afinal nós não somos jovens.

 

E isso aconteceu. Em dois meses estavam casando.

 

Dois anos transcorreram; eram felizes e para acrescentar nesse clima, Layla, ficou grávida, mas algo a incomodava. Vez ou outra, não passava bem. E essa dificuldade foi se acentuando, e alongou-se, embora sob cuidados médicos.

Certo dia, eles receberam a visita daquela que consideravam prima — Nasib.

Jalal, achou a visita da prima, providencial. Ela era ginecologista

— Prima Nasib, Layla não está passando bem nessa gravidez, eu gostaria, se não fosse pedir muito, que você a examinasse e se possível, nos ajudasse.

— Jalal e Layla, estou pronta a lhes ajudar, e isso, eu farei com muito gosto dentro das minhas possibilidades.

Ela examinou Layla detidamente, analisou os laudos do laboratório, e conclui que a prima estava desenvolvendo uma gravidez de risco, e que precisava cuidar-se muito bem para não perder o bebê. Aconselhou que esses cuidados fossem efetuados em um hospital, com toda assistência médica.

— Jalal e Layla, nós temos em Djedda, como vocês sabem, o hospital da mulher, que é voltado para esse tipo de gravidez de risco. Estou à disposição de vocês. E tem outra coisa: está conosco, por um ano, uma médica francesa ligada ao Hospital da Mulher, de Paris. Acho que poderemos dar a você, Layla, todo tipo de assistência de primeiro mundo; estamos muito bem aparelhados, e com todos os profissionais qualificados.

— Mas prima Nasib, Layla poderá viajar sem perigo?

— Sim primo, mas de avião. E eu poderei acompanhá-los.

— Mamãe, o que a senhora acha?

— Layla minha filha, você sabe como eu sou prática. E, nesse caso, além de sermos práticas, deveremos ter confiança e agir com rapidez. Se você está segura de tudo que lhe foi dito, eu lhe dou todo apoio, e prometo que, uma vez por mês, irei visitá-la.

Layla aceitou a assistência médica da prima Nasib, e rumou para Djedda. No aeroporto, um helicóptero a conduziu ao hospital, que estava localizado numa elevação, com frente para o mar Vermelho. Era linda a paisagem e de muita paz.

Jalal licenciou-se da faculdade, e diariamente estava ao lado da sua esposa.

 

Os meses passaram com muitos cuidados médicos, e com muitas apreensões.

Pelos cálculos de Nasib, o nenê, um menino, estava bem, e era bem formado; então, resolveu com uma junta médica fazer o parto— cesariana.

— Layla, querida prima, espero que tenha tido um bom sono. A manhã está linda. Os exames que fizemos ontem, nos revela que o menino está na hora de nascer. O que acha disso?

— Acho muito bom, e que ele venha saudável e chore bem forte.

— Vamos lá, então?

— Agora?

— É...

— E Jalal, onde está?

— Ele está nos esperando lá na sala de operação.

— Então vamos, e que Allah nos abençoe!

 

Tudo transcorreu dentro da normalidade que o caso exigia. O nenê chorou forte — era robusto e perfeito.

Após todos os procedimentos, após a cirurgia, o nenê foi aconchegado nos braços da mãe; eles estavam ótimos.

— Jalal, como será o nome dele?

— Layla minha querida, eu acho que cabe somente a você a escolha. Nós todos devemos a você, à sua disciplina em todo tratamento para essa vida forte e saudável do nosso nenê. Só a você compete a escolha do nome do nosso filho.

— O que você acha se eu lhe der o nome de Muhammad Zayani Al Azis.

— Ótimo, minha querida! Acho, também, que se vovô está conosco, com certeza deve estar muito contente com essa homenagem, não é, papai?

— Realmente, Jalal, ele deve estar todo sorriso. Mas, Layla, querida nora, gostaria de fazer uma oração em favor do nosso neto.

E Mutanabbi aconchegou o seu neto nos braços, voltou-se para Meca, e orou: "Allah, obrigado por nos oferecer esse grande momento de Amor. Rogamos, que proporcione a esta querida criança, uma vida feliz, saudável e próspera".

O avô e a avó, beijaram a fronte do nenê, e devolveram-no a Layla.

Convidados pelo tio Makin, que pôs a sua casa à disposição, eles ficaram em Djedda por um mês.

Nesse período, Jalal teve oportunidade de ir a Asir e constatar, para sua satisfação, a transformação ocorrida na fazenda; a usina tinha o seu funcionamento pleno, e a lavoura estava com excelentes cuidados.

Nas despedidas, mais uma vez, eles agradeceram ao tio Makin, pela solidariedade, pela acolhida e pela receptividade, igualmente, à prima Nasib e à equipe médica, por tudo que fizeram em favor deles.

 

O reino da solidariedade e da fraternidade será necessariamente o da justiça para com todos e o da justiça será o da paz e da harmonia entre os indivíduos, as famílias, os povos e as raças. Chegaremos a ele? Duvidar seria negar o progresso”.

(Obras Póstumas— Allan Kardec – Questões problemas)

 

— Papai e mamãe, acho que ficarei um bom tempo sem poder vê-los. Mas, espero que possam nos visitar em breve – disse Jalal.


 

 

Capítulo — XIV

 

Jalal voltou à sua vida acadêmica, e Layla se dedicou às suas atividades de mãe, auxiliada por dona Jade.

— Layla minha filha, confesso que estava com saudades desse chorinho. Isso representa a vida do lar; mais uma vida que a Allah nos oferece, para que juntos, possamos progredir e aprendermos a conquistar a felicidade.

— Filha, nesse tempo todo que esteve fora, Antar e eu conversamos bastante. E ele tem dúvidas sobre o seu futuro. Sabe, Layla, além daquele avião que Jalal o presenteou, agora ele tem mais dois. Isso vem corroborar a vontade que ele tem de ter como profissão, ser piloto militar, como foi o seu pai. Da minha parte, quero que saiba que eu ainda não o incentivei, mas, também, não fui contra a idéia. Somente comentei que esse era um grupo muito fechado, de pessoas que tinham por trás deles, famílias com muita força política e abastadas; e que a especialização desses pilotos era concluída no exterior.

— Papai, eu sou de opinião que Antar é um jovem bem centrado e que sabe o que quer. Se ele disser que quer ser piloto, vamos incentivá-lo, e deixar por conta dele as conquistas. Serão muitos obstáculos para ser transpostos... se conseguir, ótimo. Eu sei de uma coisa, papai, ele é muito aplicado nos estudos, e pode surpreender os seus concorrentes mais abastados. Primeiramente, ele deverá ser aprovado nos exames preliminares, depois de algum tempo de estudo vai para a simulação de vôo, e depois é que vai para pilotagem. Existirão várias etapas, e todas são eliminatórias. Vamos ver!

 

A que se devem as vocações de certas pessoas e sua vontade de seguir uma carreira em vez de outra?

Parece-me que podeis responder por vós mesmos a esta questão. Não é a conseqüência de tudo o que dissemos sobre a escolha das provas e sobre o progresso realizado numa existência anterior?

(O Livro dos Espíritos – pergunta 270)

 

Muhammad já estava com quatro anos; era um menino saudável, esperto e falante.

Layla voltou às suas atividades lecionando literatura só para alunas.

Antar cursava o segundo ano da academia militar e, estava empolgado com seu futuro.

O senhor Zayani, agora ex-Reitor, ocupava-se em continuar a escrever sobre educação, tomar conta do neto, e a ser assessor do Ministério da Educação.

Jalal, foi convidado para ser Vice-Reitor, mas recusou a oferta para o momento, uma vez que queria se dedicar mais ao magistério, ao estudo e às pesquisas da ciência agrícola.

 

E o tempo voou nas asas do pensamento de Antar.

Ao concluir a academia, Antar projetou o seu desejo para o futuro de se aprimorar como piloto militar, mas via no seu horizonte profissional, muitas dificuldades. As possibilidades de ir para o exterior estavam sendo fechadas, em decorrência dos atentados havidos nos Estados Unidos da América, na Inglaterra e na França.

— Veja só, vovô, por causa de poucos, todas as nações árabes estão sendo prejudicadas e taxadas como perigosos terroristas — disse Antar irritado.

— Meu neto, acho que não resolve nos irritarmos com essa situação. O que devemos fazer, da nossa parte, é provarmos que somos árabes, sim, mas somos homens de bem; que somos sauditas preocupados não só com o nosso bem estar, como também com todo progresso da nação árabe. Mas filho, eu ainda acho que você tem duas opções: Poderá tentar a Rússia ou o Brasil. A vantagem deste último, é que além de lá existir uma excelente academia de formação de pilotos, o clima é muito bom; não é frio como na Rússia, e é um país tranqüilo. Acho que você, na academia deve ter tido conhecimento sobre a Esquadrilha da Fumaça; são brasileiros esses exímios pilotos.

— É, realmente eles são ótimos.

— Então, acho que não há muito, o que pensar . Converse com Jalal, que ele sabe muito mais do que eu, sobre o Brasil.

— Não vovô, ainda não irei falar com ele, e nem com mamãe. Primeiramente quero me cientificar das minhas possibilidades.

 

O Espírito poderia fazer a sua escolha durante a vida corporal?

Seu desejo pode ter influência. Isso depende da intenção. Mas, no estado de Espírito, freqüentemente vê as coisas de maneira bem diversa. É o Espírito quem faz a escolha. Mas, ainda assim, ele pode fazê-la nesta vida material, porque o Espírito tem sempre os momentos em que se liberta da matéria.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 267)


 

 

Capítulo — XV

 

Muhammad, quando ficava com a dona Jade, era a alegria da casa e também a preocupação, pois ele mexia em tudo que ficava ao seu alcance. As miniaturas de Antar — a coleção de aviões — era o que prendia mais a atenção do menino.

Para cuidar da sua coleção, Antar sentava-se no chão e brincava com o seu irmão.

Numa dessas oportunidades, na ampla sala, a sua atenção voltou-se para um noticiário da televisão: "O Governo dos Estados Unidos da América, cancelou todos os intercâmbios militares e culturais, com os países árabes".

— Vovô....Vovô....O senhor ouviu isso?

E, num gesto rápido e colérico, arremessou uma das suas miniaturas contra a parede. O aviãozinho se estilhaçou.

Muhammad se assustou com o barulho, e se pôs a chorar.

 

“(...) a cólera não exclui certas qualidades do coração, mas impede se faça muito bem e pode levar à prática de muito mal. Isto deve bastar para induzir o homem a esforçar-se pela dominar. O espírita, ao demais, é concitado a isso por outro motivo: o de que a cólera é contrária à caridade e à humildade cristãs.”

(O Evangelho Segundo o Espiritismo— cap. IX – Um Espírito Protetor)

 

O senhor Zayani e dona Jade, pegaram o menino no colo, e admoestaram com veemência a Antar pelo gesto tão desequilibrado e estúpido.

Ainda muito irado, ele desculpou-se, e foi para a rua. Dirigindo-se para a academia, lá encontrou vários pilotos igualmente tristes e decepcionados com a notícia que foi ao ar, atingindo-os e tolhendo os seus ideais.

Layla, ao chegar na casa dos seus pais, tomou conhecimento do ocorrido, e resolveu aguardar algum comunicado do seu filho. Passava das vinte e uma horas, quando tocou o telefone: - Mamãe, eu estou aqui na unidade militar. Vou pernoitar aqui. Amanhã nos conversaremos.

— Você está bem?

— Tudo, mamãe! Boa noite!

— Boa noite, meu filho!

— Acho melhor assim, Jalal. Amanhã, talvez esteja mais calmo e mais compreensivo com a situação. Assim, também com o ânimo mais arrefecido, poderá vislumbrar um outro caminho para a sua vida.

No dia seguinte, Layla e Jalal deixam Muhammad na casa de dona Jade /Zayani, e foram para o trabalho. E como sempre, ele ficava brincando com os aviões.

Antar, entrou na ponta dos pés, aproximou-se e pegou o menino no colo, abraçou-o, beijou-o e pediu perdão.

 

A misericórdia é o complemento da brandura, porquanto aquele que não for misericordioso não poderá ser brando e pacífico. Ela consiste no esquecimento e no perdão das ofensas. O ódio e o rancor denotam alma sem elevação, nem grandeza. O esquecimento das ofensas é próprio da alma elevada, que paira acima dos golpes que lhe possam desferir. Uma é sempre ansiosa de sombria suscetibilidade e cheia de fel; a outra é calma, toda mansidão e caridade”.

(O Evangelho Segundo o Espiritismo— cap.IX)

 

O menino contente e feliz, já pedia para que Antar se sentasse no chão, para brincar. E, assim, eles passam horas, sem que seus avós lhes dirigissem uma só palavra. Até que, Antar retomou o assunto do dia anterior.

— Sabe vovô, com aquela notícia de ontem, um colega de academia me propôs uma sociedade — aviação doméstica — pequenos aviões, com rotas só dentro do nosso país. A minha parte seria de dar manutenção às aeronaves — a pior parte — e, também, pilotar. Fiquei de pensar e resolver sobre a proposta.

Eu penso que entrar nessa sociedade sem dinheiro, só com o trabalho, eu vou ser relegado a empregado com pouco ou quase nenhum poder de decisão, mas com muita responsabilidade. Acho preferível ser somente piloto, empregado, e só responsável sobre os meus atos.

— Mas, Antar, nós não conseguiríamos comprar uma aeronave, e você ser o único dono?

— Os aviões são muito caros!

— Será que eu não conseguiria obter um financiamento?

— Não, vovô! Acho muito arriscado. Com o azar que estou!; e se acontecer algum acidente? Lá se vai o que o senhor construiu em muitos anos.

Esse assunto parou aí. Outros surgiram à baila, como agricultura, economia, petróleo, guerra no Iraque, etc., etc.

À noite, chegaram Jalal e Layla, e o pequeno logo correu para os braços dos seus pais.

— Mamãe, quero que a senhora e Jalal me desculpem pelo dia de ontem. Não agi nem como homem, nem como piloto e nem como militar, que obrigatoriamente tem que ser equilibrado em todas as situações.

— Está bem, meu filho. Fico contente com a sua conscientização. Para quem quer vencer na vida, as ações explosivas não levam a lugar algum. Você sabe que deverá perseguir os seus objetivos, e isso tem que ser feito com determinação e discernimento nas mais diversas situações.

Em uma das minhas viagens, eu tomei conhecimento de um manuscrito; só não posso precisar, em qual viagem . Achei a mensagem tão importante e de elevado ensinamento que copiei, e de tanto ler e reler, eu a decorei; ela se intitula — Força de Vontade — É de autor desconhecido : "Conquistar algo requer força de vontade. Quanto mais determinados formos nesse sentido, muito mais significativas serão nossas conquistas. Mas, deveremos ter, uma análise bem clara, cristalina, para distinguirmos quando estamos determinados, ou quando estamos agindo com teimosia, malhando em ferro frio, pois, devemos estar atentos e receptivos para outras acontecimentos e possibilidades que surgirão em nossa rota de vida. Viver com sucesso é encarar e agregar as várias oportunidades que surgem no nosso dia e, ajustarmos aos objetivos que determinamos, e para isso, devemos ter confiança, fé e disciplina. A Vida sorrirá e se abrirá em oportunidades, se você deixar! A Vida Maior — Deus — estará sempre a nos abastecer, mas é bom que não esqueçamos: Se obstáculos se erguerem em nossa caminhada, desviemos deles para outra rota, que outras chances também promissoras surgirão; e aí, encaremos as mudanças como desafios; deixemos o orgulho de lado e, de peito aberto, aceitemos a nova situação, não como derrota ou ameaça, mas sim, como um outro horizonte que se descortina para nós, como sendo uma coisa certa que Deus está nos proporcionando".

 

Os Espíritos exercem influência sobre os acontecimentos da vida?

Seguramente, pois que te aconselham”.

(O Livro dos Espíritos— pergunta 525)

 

Quando nos acontece alguma coisa feliz, é ao nosso Espírito protetor que a devemos agradecer?

Agradeci sobretudo a Deus, sem cuja permissão nada se faz, e depois aos bons Espíritos que foram os seus agentes”

(O Livro dos Espíritos— pergunta 535)

 

Antar, meu filho, nós nos perderemos no caminho se deixarmos passar à nossa frente o potro puro sangue árabe, selado; se não fizermos nenhum gesto para segurá-lo, ele vai galopar sozinho, e outro poderá laçá-lo. Portanto, analise bem as oportunidades que aparecerem.

— Mamãe. A sua lição é muito expressiva, mas nesse momento não vejo nada de bom no meu horizonte. Vejo sim, uma possível dispensa coletiva de pilotos recém-formados, como eu.

— Meu neto, se isso acontecer, você poderá fazer um curso de engenharia aeronáutica.

— Não sei...não sei se quero...

— Você já deve ter avaliado a possibilidade de ingressar na aviação comercial. É uma boa possibilidade? — argumentou Jalal.

— Filho, está ai, uma boa oportunidade de conhecer o mundo. O foco da sua realização profissional você mantém, que é ser piloto. E há algo que devo acrescentar, o qual, acho muito mais sublime e enobrecedor, que repousa na responsabilidade mais alargada do seu profissionalismo. Pois sob o seu comando, estarão centenas de pessoas. — acrescentou Layla.

 

O tempo passou, e para Antar, outra coisa não aconteceu senão ser dispensado. Sobre ele, se abateu uma nuvem pesadíssima e depressiva.

Com o auxílio constante do seu avô, que foi incansável, assistindo-o com a sabedoria da vida que tinha de sobejo, o senhor Zayani foi conseguindo tirar Antar daquele desequilíbrio depressivo que o envolvia.

Certo dia, pela manhã, Antar chegou, e fez um convite: — Vovô, vamos dar uma volta de avião?

Zayani se entusiasmou com a transformação, e aceitou de pronto o convite.

Em um pequeno avião de turismo, eles fizeram um vôo panorâmico sobre as colinas próximas a Riyad. Antar estava muito disposto, apontando e comentando o que de interessante observavam lá de cima.

Zayani falava consigo mesmo: "A crise passou!"

— O senhor já havia voado por essa região?

— Não. É uma região muito linda!

— É uma delícia voar!

— Realmente, ainda mais tendo você no comando. Estou orgulhoso.

No escritório do aeroclube, para proceder a entrega do avião, chamou a atenção de Antar, uma correspondência aberta à sua frente, da qual constava que: a Indian Airlines estava contratando pilotos, comissários, mecânicos, engenheiros mecânicos, etc. etc.

Durante o percurso na volta para casa, Antar se manteve calado, trazendo uma interrogação ao seu avô.

— Antar, o que você viu naquele escritório que lhe proporcionou uma mudança drástica de comportamento?

— Vou lhe dizer: Eu li, numa carta, escrita em inglês, que estava sobre a mesa... (e ele contou o que leu)

— Será essa a oportunidade a qual mamãe me disse, e para a qual eu deveria estar atento? Será esse o potro puro sangue selado que devo montar? Jalal, também levantou a hipótese sobre a aviação comercial! O que o senhor acha?

— Acho o seguinte: Você é um profissional capacitado para comandar aeronaves, sejam elas pequenas ou grandes. Acho que os princípios são idênticos, o que muda, são alguns detalhes. Eu faço coro junto com as palavras de Jalal e de Layla. Acho realmente enobrecedor a profissão de comandante, não só por levar ao ar um gigante metálico, mas também pela responsabilidade que tem sobre as pessoas que confiam na atuação do seu comandante, para levá-los ao seus destinos.

— É vovô, acho que os terroristas não me derrotaram. Amanhã, logo bem cedo, voltarei ao aeroclube para colher mais informações. Vou confirmar, para ver se a minha leitura foi correta. Por enquanto, vovô guarde segredo. Mais uma coisa: O senhor vai comigo para a Índia?

— Conte comigo!


 

 

Capítulo — XVI

 

Na noite seguinte durante o jantar, Antar comunicou a todos, iria viajar para a Índia na companhia do seu avô.

— Mas o que vão fazer na Índia? É um país maravilhoso, com lindos templos, com uma atmosfera muito mística; é muito interessante. Mas o que os atrai para essa viagem? — perguntou Layla.

Antar, de soslaio, olhou na direção de Zayani, e começou a contar o que ocorreu.

— Acho que ficaremos por lá, uns três ou quatro dias.

— "Eben bhebbak ma'a salaama". "— Vá em paz meu filho".

 

Em Nova Delhi, entrevistado por um funcionário do Governo do setor pertinente, respondeu a vários questionamentos, apresentou documentos, e também, fez perguntas. Por fim, depois de ter o seu nome investigado, foi aceito para fazer uma prova escrita, que se realizaria dentro de trinta dias.

— Vovô, a inscrição para a seleção parece mais um interrogatório . Tive que contar toda a minha vida até esta data. Pediram-me também uma carta de apresentação. Respondi que tinha somente os documentos da academia do nosso Governo.

— Você acha que essa carta é importante?

— Essa não era uma exigência. É possível que, para o meu caso como estrangeiro, esse documento seja importante para a avaliação final.

— Há tempos atrás, eu conheci um professor de lingüística, que esteve na nossa Universidade fazendo especialização. Ele era da Universidade de Nova Delhi. Eu proporcionei a ele algumas facilidades das quais ficou muito agradecido, e se dispôs a retribuir. Vamos tentar achá-lo?

— O que é que o senhor resolve?

— Vamos fazer o seguinte: Vamos nos hospedar e ligar para casa, e pedir para que a sua avó localize na minha agenda, e nos dê o endereço e o telefone dele. Assim, ainda hoje, ligaremos, e se ele nos atender, marcaremos uma audiência. Espero que ele tenha alguma recordação dos nossos encontros.

 

O professor Jayadeva recebeu Zayani de braços abertos. Para comemorar esse encontro, serviu aos visitantes chá verde, o qual, disse o anfitrião, era um excelente anti-oxidante. Relembraram várias passagens, até que chegou o momento dos diálogos, que muito interessava a Antar.

— Professor Jayadeva, estamos aqui no seu lindo país e na sua querida Nova Delhi, para que o meu neto, Antar, possa se inscrever para uma seleção de pilotos, que o seu Governo está proporcionando. Ele é piloto oficial militar na nossa terra, mas, por forças das circunstâncias do nosso governo, juntamente com outros, foi obrigado a dar baixa da carreira militar. O atentado ocorrido nas Torres Gêmeas em Nova York desencadeou uma série de cancelamentos nos acordos bilaterais entre os nossos países, inclusive, o de aperfeiçoamento de pilotos militares. Ele pretendia fazer lá, uma especialização de táticas militares, mas com aqueles acontecimentos, as suas pretensões ruíram. Como o senhor sabe, nós, sauditas, não fomos os causadores daquela tragédia, mas, os reflexos para as nações árabes foram imediatos. Então, ele está mudando o seu foco para a aviação comercial, que é o objetivo dessa seleção. O que está faltando a ele, é uma carta de apresentação. Eis aqui, meu amigo, os documentos, que comprovam a sua formação e capacidade profissional.

O professor examinou detalhadamente todos os documentos, e em seguida, convocou um dos seus auxiliares e solicitou que se fizesse a carta de apresentação dirigida ao Departamento de Aeronáutica.

Passaram toda manhã conversando, e os visitantes conhecendo todos os departamentos da Universidade. E, por fim, no gabinete do professor Jayadeva, responsável pelo Departamento de Lingüística, este, fez oficialmente um convite ao professor Zayani para que viesse incorporar-se no seu grupo de trabalho.

— Como o senhor disse, professor Zayani, por lá já se aposentou. Não sei se sua vaga foi preenchida a contento. Para nós, a sua idade não é motivo de aposentadoria; a sabedoria que senhor acumulou, não poderá ficar restrita a quatro paredes; ela tem que se expandir em todas as direções como se estampa a rosa dos ventos. A sabedoria do ancião é imprescindível para alimentar a sabedoria do jovem que é o futuro de uma nação.

— Meu amigo, fico envaidecido e sinto-me até robustecido com a energia que me transmite, mas o compromisso que assumi com o meu Governo me impede de aceitar o seu convite. Mas, estarei sempre à sua disposição para alguns dias de palestras. Virei com muito prazer. E lá na minha terra, estarei sempre de braços abertos para recebê-lo.

Abraçaram-se efusivamente, e despediram-se, prometendo mais encontros.

Completada a documentação da inscrição de Antar, voltaram para Riyad, já com a data marcada para o teste escrito.

 

Classificado que foi no exame escrito, Antar estava no aeroporto de Nova Delhi para submeter-se ao exame prático. Ele, dos doze pilotos examinados, foi o último a fazer o teste.

A decolagem foi perfeita. O avião era de trinta lugares. As manobras solicitadas através do rádio foram efetuadas com perfeição. Ordenado que foi para pousar, Antar direcionou o avião, e acionou o dispositivo do trem de aterrissagem; mas o painel, logo acusou uma pane mecânica. Calmamente, entrou em contato com a torre de controle, comunicando o problema. Por várias vezes acionou o dispositivo, mas a resposta mecânica do trem de pouso, não aconteceu.

— Torre de controle. Eu tenho combustível para mais dez minutos. Vou consumir esses galões, e fazer um pouco de "barriga".

Zayani ficou desolado com a notícia; não se conformava com o que de pior poderia acontecer. O seu pensamento viajou rapidamente para o passado quando aconteceu o desastre de avião com o pai do seu neto. Dirigiu-se ao banheiro, e enquanto lavava seu rosto, ouviu uma voz: "Zayani, fique calmo que nada de mal acontecerá com o nosso jovem"

Rapidamente, Zayani olhou no espelho e viu a imagem de um ancião parecido com a descrição, de que um dia, lhe falou Layla, quando de um sonho.

 

Aquele a quem o Espírito aparece pode manter uma conversa com ele?

Perfeitamente, e é mesmo o que vocês devem fazer sempre em tais casos, perguntando ao Espírito quem é, o que deseja e o que podem fazer para lhe ser úteis. Se o Espírito for infeliz e sofredor, a comiseração que se lhe demonstra, conforta-o; se for um Espírito benévolo, pode vir com a intenção de dar bons conselhos.

Como, neste caso, o Espírito pode responder?

Fá-lo algumas vezes por sons articulados, como o faria uma pessoa viva; as mais das vezes há transmissão de pensamentos.”

(O Livro dos Médiuns – cap. VI- Manifestações Visuais – item 11)

 

Mais que depressa virou-se, mas ninguém, além dele, estava ali. Olhou para todos os lados, entrou em todos os banheiros. Ninguém. Em frente ao espelho, mais uma vez, olhou-se na tentativa de talvez visualizar aquele homem, mas nada... Um cheiro de alecrim, pairava no ar. Zayani se acalmou imediatamente, sem compreender aquela situação.

E Antar pousou o avião de "barriga" com a perfeição que a situação exigia.

Posteriormente, em contato com o comandante chefe e outras autoridades, num inglês fluente, lamentou os prejuízos materiais.

— Meu jovem, não lamente. É muito melhor termos perdas materiais do que perdas humanas que, no episódio atual nós é que perderíamos muito, com relação a você, que demonstrou com sua determinação, serenidade, segurança e perícia, ser um piloto experimentado, embora jovem. Você está aprovado! Parabéns!

"Jad al-hamdu lellah"! "— Vovô, graças a Deus!"


 

 

Capítulo — XVII

 

Antar estava felicíssimo. A sua atuação profissional como comandante de aeronave civil preencheu todo o seu ser, proporcionando até mesmo, o esquecimento de que desejava ser piloto militar. Mas, por essa formação, que lhe tinha dado os sentidos da disciplina e da responsabilidade mais aguçados, agradecia.

Sua cotação junto aos seus superiores cada vez mais se alicerçava, e isso, sobejava aos tripulantes e passageiros que com ele voavam.

Certa vez, em conversa com a sua mãe, ele disse: — Mamãe, sou feliz por estar no comando, não só de um potro puro sangue, mas de centenas deles, que sendo metálicos e obedientes, respondem à minha determinação.

 

E o tempo voou nas asas da aeronave de Antar sobre a Índia.

Sendo o mais bem conceituado comandante, e mesmo assim, mantinha-se frente a todos, indistintamente, sem afetação, orgulho, vaidade ou egoísmo; ele angariava para si, as atitudes e gestos simpáticos das pessoas. Transmitia para todos os seus companheiros, pilotos, as suas atuações bem sucedidas no comando da aeronave.

“O egoísmo e o orgulho têm origem num sentimento natural: o instinto de conservação. Todos os instintos têm razão de ser e utilidade, pois que Deus não faz coisa inútil. Deus não criou o mal; é o homem que o produz por abuso dos dons divinos, em virtude do livre arbítrio.

 

Este sentimento contido em justo limite é bom em si; a sua exageração é que o torna mau e pernicioso. O mesmo acontece às paixões, que o homem desvia do seu fim providencial. Deus não criou o homem egoísta e orgulhoso, mas simples e ignorante; foi o homem que, ao malversar o instinto, que Deus lhe deu para a própria conservação, se tornou egoísta e orgulhoso”

(Obras Póstumas – cap. Egoísmo e Orgulho)

 

Há certo tempo, houve a necessidade da aviação militar da Índia adquirir aviões de treinamento, e ele, pelo seu currículo, foi convocado para fazer parte da comitiva que iria ao Brasil para conhecer o parque aeronáutico e os aviões ali produzidos.

— Antar, você vai adorar aquele país, que tem belezas naturais incrivelmente belas; você vai adorar - disse-lhe Jalal.

No Brasil, o que cabia a Antar, na parte prática, opinar e fazer, ele cumpriu.

Comentando com um piloto brasileiro, quando praticavam algumas manobras, ele disse: "Quando eu completei dezoito anos, ganhei um aeromodelismo — Tucano BR — igual a este. Nunca imaginei que um dia teria a felicidade de voar e pilotar um. Ele é ótimo!

No aeroporto, para regressar, outra comitiva de indianos estava aguardando na sala de embarque. Eram médicos e médicas, que tinham participado de conferências e estudos sobre medicina cancerológica, com profissionais da área, das Américas.

A longa viagem de retorno, possibilitou a Antar e a uma jovem doutora — Rhada — que dialogassem sobre assuntos profissionais, e outros também, ligados aos pessoais.

A doutora era uma jovem muito bonita, de postura elegante, de voz suave e palavreado bem articulado, que demonstrava ser uma profissional determinada, e que transmitia confiança.

Entre ambos, estabeleceu-se uma simpatia evidente, até mesmo comprometeram-se a trocar "e-mail".

 

Além da simpatia geral, determinada pelas semelhanças, há afeições particulares entre os Espíritos?

Sim, como entre os homens. Mas o liame que une os Espíritos é mais forte na ausência do corpo, porque não está mais exposto às vicissitudes das paixões.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 291)

 

“Dois Espíritos simpáticos são complementos um do outro, ou essa simpatia é o resultado de uma afinidade perfeita?

— A simpatia que atrai um Espírito para o outro é o resultado da perfeita concordância de suas tendências, de seus instintos; se um devesse completar o outro, perderia a sua individualidade”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 301)

 

A afinidade necessária para a simpatia perfeita consiste apenas na semelhança dos pensamentos e sentimentos, ou também na uniformidade dos conhecimentos adquiridos?

— Na igualdade dos graus de elevação”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 302)

 

Em Nova-Delhi, despediram-se.

Muito embora com o tempo todo tomado no comando das aeronaves, em suas viagens, a figura da sua mãe, Layla, em sua mente, era uma constante; estava sempre saudoso da mulher carinhosa, atenciosa e resoluta.

Certa vez, em Bombaim, sem possibilidade de levantar vôo para cumprir a rota programada em conseqüência do mau tempo, Antar aguardava. Eram dezesseis horas e seu celular tocou.

— Antar meu filho, aqui é Jalal. Preciso que você venha. O seu avô está em casa e adoentado. Ele manifestou o desejo de vê-lo.

— Mas diga-me: Ele está muito doente?

— Ele está com problemas respiratórios.

— Amanhã estarei ai!

 

Naquela mesma noite o senhor Zayani faleceu em decorrência de complicações cárdio-respiratórias.

 

Qual a causa da morte, nos seres orgânicos?

— A exaustão dos órgãos”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 68)

 

Layla, que já vinha sofrendo com dores abdominais, suportáveis, tanto é que, ainda não havia consultado um especialista, sentiu a sua situação se agravar.

Antar, na presença do seu avô, inerte, sem vida, chorou convulsivamente, ladeado por Jalal e a senhora Jade, que embora abatidíssima, mas interiormente forte, dirigiu-se ao seu neto: — Antar, hoje, estamos perdendo a presença física e atuante de um grande homem, companheiro, amigo, marido fiel e responsável, detentor do sentimento humano igualitário, preocupado com a família no sentido mais abrangente na sociedade, mas, nós o teremos sempre a sua presença protetora, na forma de luz a nos guiar e iluminar. Fique certo disso.

— Vovó, querida, eu sei que a essência grandiosa do vovô não está ai nesse corpo; a sua presença, a sua voz firme, austera e bondosa, não teremos mais. Mas mesmo compreendendo, isso deixa um vácuo profundo, e a dificuldade para aceitar, que não mais teremos a possibilidade de encontrá-lo. Vai ser difícil admitir isso!

— Mas, onde está mamãe, vovó?

— Layla tomou um sedativo, e está acamada. - respondeu Jalal.

— Mas qual é o problema de saúde dela?

— Ainda não sabemos. Amanhã nós a levaremos ao médico.

— Mas Jalal, por que só amanhã? Indagou Antar.

— Porque somente hoje é que ela nos revelou que sente fortes dores abdominais.

Ao velório, compareceram muitas autoridades, amigos e familiares.

— Nasir, agradeço muitíssimo a sua solidariedade para conosco neste momento triste — disse a senhora Jade.

— Senhora Jade, não há nada que me agradecer, pois a minha presença prende-se ao fato de eu admitir que vocês, são para mim, meus parentes queridos.

— Obrigada minha filha!

— Mas, senhora Jade, eu até agora não vi a Layla.

— Ah! Minha filha...Layla não está bem...Está acamada...Estou preocupada com ela!

— Posso vê-la?

— Jalal, por favor. A Nasir quer ver a Layla.

— Prima, muito obrigado por ter vindo. A sua estada aqui está sendo providencial. Layla está com fortes dores no abdome, mas somente hoje é que ela está reclamando.

— Vamos, Jalal!

— Layla querida prima...

— Nasir...Veja só... Não posso nem estar com o meu pai nesse último dia conosco

A doutora, levemente, mas com acuidade, tocando o abdome de Layla, pressentiu no tato, algo de anormal. Sem alertar a prima, recomendou que se levantasse somente por necessidade. E que, no dia seguinte, iria acompanhá-la para todos os exames.

E assim foi feito, com resultados positivos da doença.

Em particular, para Jalal, Nasir se disse preocupada.

Infelizmente, a má notícia a respeito de Layla se concretizou. A doença já tinha se alastrado o suficiente para não dar mais oportunidade de qualquer intervenção cirúrgica. A única coisa a ser feita foi tentar diminuir as dores.

A família ficou desolada. Não se conformavam com mais essa perda que seria irremediável.

Layla faleceu após três meses da constatação da doença.

Muhammad, com apenas onze anos, chorava e se revoltava, ainda sem poder compreender o porquê, ficou sem o seu avô e sem sua mãe.

— Jalal, meu filho — disse Mutanabbi — Eu e sua mãe sentimos muito não podermos fazer quase nada para amainar a sua dor e a do nosso neto. Mas, se vocês forem, juntamente com a dona Jade, lá para nossa casa; seria bom para espairecer, e sair desse clima triste.

— O senhor volta amanhã?

— Sim! Pretendemos.

— Vou deixar passar alguns dias, depois eu falo com eles. O que resolverem, eu lhes comunico.

 

Alguns dias depois, Jalal dirigiu-se a Antar e, lhe comunicou: — O senhor Zayani, por vontade própria, deixou um testamento sobre os seus bens. Esta propriedade, ele legou a Layla; e na falta dela, você é o beneficiado.

— Jalal, guarde esse documento. Em outra oportunidade você me dá. Agora, tem uma coisa que lhe peço e desejo firmemente que aceite cumprir o meu pedido: mude-se para cá; venha morar aqui com a vovó; ela necessita da companhia de vocês. Eu prometo que, logo que eu me desligar das minhas responsabilidades lá na Índia, eu virei embora.

— Não se preocupe. Não interrompa a sua caminhada para a realização profissional que todos nós almejamos um dia conquistar. Vou contratar duas auxiliares para ajudarem a senhora Jade na administração da casa. Fique certo que eu e Muhammad viremos morar aqui.

 

Antar, voltou para a Índia muito triste.


 

 

Capítulo — XVIII

 

Como Vice-Reitor, Jalal foi para o Egito, em excursão, com um grupo de técnicos agrícolas. Lá, no oásis de El Fayum, onde já havia estado anteriormente, teve novamente um encontro com um "neviin", que lhe chamou pelo nome — Jalahal!

— Será crível que isso está me acontecendo outra vez? É o passado que retorna...?

— Não...Não é o passado que vem para o presente. Em nossa mente, os acontecimentos passados estão sempre presentes. Somente em nossas retinas é que o passado é só passado — afirmou o "neviin".

— Desta vez, eu estou entendendo tudo — disse Jalal.

— O pensamento é poliglota. Mas o tempo, agora, é muito importante Jalahal. Desanuvie a sua mente. A sua companheira está a caminho da evolução do seu espírito. Você, aqui na Terra, tem outro caminho a seguir; é um outro caminho afetivo e que não lhe é desconhecido, e que será muito bom para o seu filho, e para você também, assim como, para ela.

 

Comunicação dos Espíritos bons: Caracteres gerais. Predomínio do Espírito sobre matéria; desejo do bem. Suas qualidades e seu poder de fazer o bem estão na razão do grau que atingiram: uns possuem a ciência, outros a sabedoria e a bondade; os mais adiantados juntam ao seu saber a qualidades morais. Nõ estando ainda completamente desmaterializados, conservam mais ou menos, segundo a sua ordem, os traços da existência corpórea, seja na linguagem, seja nos hábitos, nos quais se encontram até mesmo algumas de suas manias. Se não fosse assim seriam Espíritos perfeitos”.

(O Livro dos Espíritos— pergunta 107)

 

Passaram alguns instantes, e Jalal encontrou-se sozinho no meio dos nenúfares, e se perguntando: "O que eu faço aqui, quase todo molhado, no meio dessas flores?"

Ao técnico, aquele mesmo de outros tempos, Jalal, indagou se ele viu aquele mesmo "neviin", daquele passado distante.

— Há vários anos que ele não aparece. Você lembra... Ele era bem velho. Acho que vivendo da maneira que vivia, não deve ter durado muito tempo.

Jalal, cerra seus olhos, leva as suas duas mãos no rosto e, falou, quase gritando: — Mas eu vi e falei com ele!?

Dirigindo o seu olhar para aquela plantação de nenúfares, tirou os óculos, mais uma vez, passou a mão no rosto e sobre os olhos, e respirou fundo e não disse mais nada. Só seu pensamento voou na direção dos seus familiares, quando alguém, com insistência, chamou a sua atenção para o tamanho incomum de uma tâmara.

O técnico agrícola, ficou calado com aquela manifestação de Jalal.

Mas o espírito do "neviin", e seus conselhos, não saia da sua mente; só que ele o viu, com uma aparência mais jovem e mais bem vestido.


 

 

Capítulo — XIX

 

Antar voltou às suas atividades, muito embora sem aquele entusiasmo original; havia perdido o objetivo de ser um vencedor. Estava quase certo para si que aquele seria o último ano que ficaria fora do seu país.

Indagava para si mesmo: " — Se não tivesse vindo, teria tido mais tempo de convivência com a minha mãe e meu avô; teria sido mais feliz e proporcionado a eles..."

Quando uma grande interrogação assaltou os seus pensamentos: "Será que eu os faria mais felizes com os meus reclamos, lamentações e insucessos? Será que eu os faria realmente felizes mostrando a eles, diariamente a minha infelicidade?"

 

Raros homens se tocam da “tristeza segundo Deus”. Muito poucos contemplam a si próprios, considerando a extensão das falhas que lhes dizem respeito, em marcha para a restauração da vida, no presente e no porvir. Quem avança por esse caminho redentor, se chora jamais atinge o plano do soluço enfermiço e da inutilidade, porque sabe reajustar-se, valendo-se do tempo, a golpes benditos de esforço para as novas edificações do destino.”

(Caminho, Verdade e Vida – Emmanuel – 130)

 

Só, no seu apartamento, cansado, depois de uma viagem que exigiu dele muita atenção, em virtude do mau tempo, jogou-se numa poltrona, em frente da televisão, ligou-a, e no noticiário, lá estava a doutora Rhada sendo entrevistada.

E com seus botões, ele falou: "— Como ela é bonita e cativante! Será que é comprometida? Com certeza deve ser; nenhum homem, por mais bobo que seja, não deixaria de tentar conquistá-la. Sempre tive vontade de me aproximar mais dela, mas, com essa vida de piloto que vive mais no ar do que em terra, fica difícil."

Em certo momento, Antar lembrou-se que tinha o endereço eletrônico da doutora.

Revirou alguns papéis, e achou a sua agenda. Tomou coragem e enviou uma mensagem: "Dra. Rhada, assisti a sua entrevista. Achei muito elucidativa para nós que somos leigos no assunto. Parabéns pela forma didática que tratou o assunto tão penoso para nossa aceitação, principalmente para pessoas que, como eu, perderam entes queridos nessa situação." Abraços — Antar.

No dia seguinte, muito cedo, pois tinha uma viagem na sua escala para Calcutá, resolveu, antes de ir, abrir a sua caixa de mensagem.

"Comandante Antar. Há tempos que estou aguardando o seu contato. As nossas conversas naquela viagem, foram muito francas, abertas e sem nenhum subterfúgio; eu gostei daquele encontro. Quando vier a Bombaim, apareça no hospital, que lá estarei. Rhada"

 

Das qualidades particulares de cada fluido resulta, entre eles, uma espécie de harmonia ou de desacordo, uma tendência a unirem-se ou a evitarem-se, uma atração ou repulsão, em uma palavra, as simpatias ou antipatias, que se sentem, sem causa conhecidas.”

(Obras Póstumas— Allan Kardc – Introdução ao Estudo da Fotografia e da Telegrafia do Pensamento)

 

Ele, gostou do que leu, em seguida respondeu, e comunicou que iria para Calcutá, mas que, talvez, na escala da semana seguinte, iria para Bombaim.

Um novo ânimo tomou conta dele. Até o seu co-piloto observou a transformação, e comentou: - Comandante, confesso que estava preocupado com o amigo. Notei que não tínhamos mais assunto, e as nossas viagens estavam se tornando monótonas e cansativas demais; não tínhamos mais diálogos. Admito que o quadrante que passou, com a perda dos entes queridos, foi muito dolorido para o seu coração. A lembrança que sentimos dos nossos entes queridos, os quais não mais veremos, é muito forte. Mas, Comandante, o que morre é o nosso corpo, que no nosso caso, aqui na Índia, é cremado. O ser espiritual que somos, este, não morre e está sujeito, como todos os seres que vivem na Terra, ao "punajarman" — renascimentos sucessivos e a evolução.

 

Não podendo o Espírito adquirir em uma única existência corpórea todas as qualidades intelectuais e morais, que devem conduzi-lo ao fim para que foi criado, precisa, para conseguir esse fim, de uma série de existências, em cada uma das quais adianta um passo nas vias do progresso e se limpa de algumas imperfeições.”

(Obras Póstumas – Allan Kardec – Criação)

 

— Amigo, qualquer dia você me ensina mais sobre o que disse. Por hora, quero lhe dizer que realmente tenho saudades dos meus entes queridos, mas digo-lhe, também, que hoje não estou triste. Estou muito feliz!

— Outra coisa, Comandante: a nossa cultura religiosa nos ensina que o destino do homem não depende de nenhum dos deuses, mas do esforço de cada um, da nossa própria escolha, objetivando para nós, homens e mulheres, uma melhor evolução, pela qual iremos construindo através do "karma", que cinge-se, somente a nós, por vários renascimentos, com a esperança de atingirmos uma casta mais elevada para nossa vida material e espiritual. Isso é a prova do grande amor que o nosso Criador tem para conosco. O hinduísmo, já de algum tempo, através dos "gurus", tem emprestado da doutrina de Jesus Cristo, o contexto do Sermão da Montanha, que entre outros ensinos, nos disse: "Bem-aventurados os que choram porque serão consolados". Eu entendo que este consolo, nada mais é do que, uma nova possibilidade que poderemos ter no futuro.

— Amigo Sankara, por tudo que me fala, cada vez mais eu o aprecio e considero, pois noto que o seu coração é uma possante turbina de amor; amor amigo, verdadeiro e solidário. Numa outra oportunidade, sem estarmos nessa cabina, gostaria conversar mais, tendo essas bem-aventuranças como tema. Mas, por enquanto, vou reafirmar que estou muito feliz!

— Comandante Antar, comparando-me com você, possuo, só um pouco mais de experiência de vida e com isso, eu me arvoro em lhe dizer: Essa sua felicidade tem uma única origem — numa mulher muito especial!

Antar, que tinha o seu olhar na amplidão à sua frente, virou-se para o seu co-piloto e amigo, e somente sorriu.


 

 

Capítulo — XX

 

Com a aquisição de quinze dias de férias, Antar, já no primeiro dia, estava em Bombaim, pela tarde.

Recordou que a doutora Rhada havia lhe comunicado que estaria no hospital.

O encontro se deu no saguão do hospital.

— Comandante, o senhor não me avisou que viria!

— Desculpe-me, doutora só quis fazer-lhe uma surpresa. Mas não se prenda por mim. Os compromissos que assumiu, pode cumpri-los, que não me sentirei de nenhuma forma, desapontado. Não se culpe nem um pouco por isso; a culpa é toda minha. Eu, não a avisei.

— Não, Comandante. Não há como cogitarmos em culpa. Eu só fiz uma observação sem qualquer outra conotação. Estou muito contente com a sua visita, e tem mais, não tenho outros compromissos que não este aqui no hospital.

Conversaram por algum tempo, quando a doutora foi solicitada para acompanhar uma intervenção cirúrgica que já tinha sido programada.

— Comandante, gostaria muito de ficar dialogando com o senhor, mas, essa é uma cirurgia que vai me acrescentar muito. Mas, convido-o para ir à minha casa; irá para jantar. Aqui está o meu cartão. Esteja lá às dezenove horas.

No horário estabelecido, Antar se encontrava em frente da casa de Rhada. Abordado por guardas de segurança, identificou-se e foi introduzido na residência. Ela o recebeu com um sorriso acolhedor.

— Seja bem-vindo, Comandante!

— Obrigado, doutora pela acolhida; estou muito feliz e agradecido pelo convite. Confesso que há muito tempo não me sentia tão bem.

— A visita que me faz Comandante, é muito prazerosa. Sempre que o senhor vier a nossa cidade, terei muito prazer em recebê-lo.

— Gostaria que toda vez que eu aqui fizesse escala, tivesse tempo para vê-la, mas o intervalo entre aterrissar e decolar, é de um tempo muito curto. Mas, a minha estada aqui na sua cidade, dessa vez, será de uma semana.

— Isso vai ser muito bom, pois teremos mais tempo para conversarmos, e ainda, terá a chance de conhecer a minha prima, dona desta casa. Ela está na França, terminando uma especialização em oncologia.

— Família de médicas! Na minha família, eu é que estou destoando: meu avô era professor — Reitor da Universidade de Riyad — , minha mãe, era professora de Literatura Árabe e meu padrasto é professor de Agronomia. Mas, eu me inclinei pela profissão do meu pai, que era piloto militar.

— Então agora o senhor só tem o seu padrasto?

— Tenho também um meio-irmão e minha avó.

— Doutora Rhada, o jantar está servido! - anunciou uma senhora muito simpática.

Antar, num gesto cordial, ofereceu os braços para a doutora, que aceitou.

As horas passaram sem que percebessem, de tão agradável que foi o encontro.

Ele tinha em sua mente muitas perguntas, mas que não as fez; elas se relacionavam com aquela linda mulher à sua frente.

Ela era uma jovem de porte esguio, gestos elegantes, voz bem postada, inglês fluente, sorriso largo e franco, com a cabeça descoberta, deixava à mostra seus lindos cabelos lisos e negros. Ele estava extasiado!

Trocaram muitos assuntos, mas, era chegada a hora de se despedirem.

— Comandante, o meu motorista vai levá-lo de volta ao hotel. Amanhã, entre doze e treze horas, irei almoçar, se nada urgente acontecer. Aqui tem o meu telefone; ligue-me.

 

A semana passou. Chegou a hora da despedida.

— Doutora, posso lhe dizer que os dias que aqui passei, foram ótimos. Confesso que a cada encontro que tivemos, a felicidade tomou conta do meu coração. Nas horas que antecediam aos nossos encontros eu vibrava, meu coração parecia querer saltar, eu ria sozinho como um jovenzinho que pela primeira vez vai encontrar-se com a sua primeira namoradinha, e quando chega perto dela, não sabe o que fazer ou conversar, e quando fala, diz muito pouco do que realmente sente. Gostaria de ficar mais alguns dias e conhecer a sua prima, mas, por seu intermédio, diga-lhe que num futuro não muito distante terei muito prazer em conhecê-la pessoalmente.

Mas, Doutora, quero revelar-lhe o que se passa em meu coração com relação a você, se assim me permite tratá-la.

— Comandante, desculpe-me interrompê-lo, mas acho que devemos abolir estas formalidades entre nós. Eu sou Rhada e você é o Antar.

— Rhada, o que eu quero lhe dizer é que estou enamorado de você. Quero lhe dizer que já tive dias de muita felicidade, mas como esses que aqui tive a oportunidade de usufruir na sua companhia, é a primeira vez que eu experimento. A felicidade que sinto, que brota em meu coração é forte. Posso lhe dizer, que eu a amo!

Mas, por favor, Rhada, não me diga nada a respeito. Se me permite, somente deixe-me abraçá-la. Quero levar comigo o seu calor e o seu perfume para que eles possam preencher a sua ausência física junto a mim.

— Antar, os nossos sentimentos estão no patamar dos sentimentos recíprocos; acho que desde que nós nos conhecemos, nós estamos enamorados. O tempo que correu entre o primeiro dia que nos conhecemos até agora, só fez sedimentar os nossos sentimentos. Também quero lhe dizer que o que sinto por você é algo muito forte, e que não tenho dúvidas, que é um sentimento de amor. Assim, meu Comandante Antar, faça uma ótima viagem, com o meu desejo de que encontre os seus queridos familiares saudáveis e felizes e, volte a Bombaim, que temos muita coisa a conversar. Estarei esperando-o, ansiosa, como se eu fosse ao primeiro encontro com o meu jovenzinho namorado.

 

Quem não conhece a força da atração, que nasce nas aglomerações, onde há homogeneidade de idéias e de vontades?

Mal podemos calcular a quantas influências somos de tal modo submetidos, malgrado nosso. Essas influências ocultas não poderiam ser a causa provocada de determinados pensamentos, de pensamentos que nos são comuns, instantaneamente, com os de certas pessoas, desses vagos pressentimentos, que nos levam a dizer que alguma coisa há no ar, pressagiando tal ou qual acontecimento? Enfim, não serão efeitos da reação do meio fluídico, em que nos achamos, dos eflúvios simpáticos ou antipáticos que recebemos, que nos envolvem, com as sensações indefiníveis de bem ou de mal-estar, de alegria ou de tristeza?

(Obras Póstumas – Allan Kardec – Introdução ao Estudo da Fotografia e da Telegrafia do Pensamento)

 

Ambos, num abraço aconchegante, riram.

Antar beijou o rosto da sua linda namorada, e apressou-se, já um pouco atrasado, para seu embarque rumo a Riyad


 

 

Capítulo — XXI

 

Em Riyad, Jalal, Muhammad e dona Jade atravessavam os dias com seus ânimos tristes. A alegria deixou de ser a tônica daquela casa. Com a vinda de Antar, o clima desanuviava-se um pouco. Embora nenhum deles reclamasse da vida, Antar notou que , à exceção de Muhammad, feliz com a vinda do irmão, Jalal e sua avó, tinham ares sempre pesarosos.

Com aquele clima nebuloso dentro daquela casa, incompatível com o sentimento feliz que vivia o coração de Antar, ele resolveu, certo dia, convidar para uma conversa na biblioteca da casa, a senhora Jade e Jalal, e lhes falou: — Eu me considero uma criança frente a vocês. Não tenho a sabedoria dos muitos anos experimentados por vovó, nem a sabedoria dos anos e dos muitos livros lidos e escritos por você, Jalal, que considero, meu pai. O que tenho somente de conhecimento, que posso oferecer a alguém, é ensinar a pilotar avião. Nessa atividade, a gente aprende que, se puxar o manche, o avião sobe, e se empurrá-lo, o avião desce. Então, sob o meu comando, ele me obedece. Na cabina do avião, eu e ele somos um. Eu acho que assim somos nós. Se o nosso pensamento acionar o comando da tristeza, com certeza mergulharemos numa atmosfera depressiva e, em contrapartida, se acionarmos o nosso pensamento para coisas ou acontecimentos positivos, o nosso horizonte se desanuviará e mergulharemos num clima de felicidade, o que, para o nosso caso, seria muito bom para Muhammad.

Eu lhes confesso, meus queridos, que estou vivendo num clima de muita felicidade, muito embora, sinto a falta da minha mãe e do meu avô. Os fatores que me fazem estagiar nessa atmosfera de felicidade que estou atravessando são: o primeiro, é o ensinamento que assimilei, que a morte não existe; ninguém morre; o nosso "eu" não morre; o nosso espírito não morre, e tem a possibilidade de renascer. E sendo assim, um dia encontrarei o meu pai, minha mãe e meu avô. O segundo fator, que no momento me dá também muita felicidade, é o instante que estou vivendo com vocês, e também, por ter encontrado uma mulher que estou realmente amando. Eu a conheci lá no Brasil; ela é uma indiana, chama-se Rhada; é médica.

Acho que entre nós os acontecimentos vão ser muito rápidos. Assim sendo, meus queridos, se tudo se desenhar como eu desejo, preparem-se para viajar para a Índia. Não sei se me precipito, mas esse é o meu desejo.

Tudo o que Antar lhes havia dito no que diz respeito a posicionarem-se melhor, com os seus pensamentos, eles já tinham o entendimento, mas estavam aceitando passivamente a amargura, a tristeza e a depressão, sem nada fazerem para saírem dessas situações.

Foi mais uma chamada de alerta, para que eles encarem a vida com mais alegria.

— Vocês se lembram quando a mamãe me disse sobre o cavalo puro sangue árabe que passa a nossa frente? Então, vamos aproveitar e montá-lo, que ele nos levará para a Felicidade. Eu estou montado nele, e gostaria que vocês viessem para esse clima comigo.

— Você tem razão, meu neto: eles estão vivendo lá, e nós, enquanto não cumprirmos o que viemos fazer aqui, temos que viver com saúde, paz e alegria. Deixe-me dar um abraço, e dizer-lhe que estou muito feliz por você ter encontrado a sua companheira; desejo-lhes muitas alegrias em suas vidas.

Nesse instante entrou na biblioteca, Muhammad, com um aviãozinho na mão — vuuuuummmm!

— Antar, eu posso ser piloto?

— Claro que pode meu querido irmão; pode também ser um médico, um professor ou um administrador da usina de álcool da família em Asir.

— Posso mesmo, papai?

— Claro que pode!

No dia seguinte, o clima na casa já era outro. Um cantarolar, ainda meio tímido, já se ouvia. Antar ficou contente, e avaliou que os seus argumentos não foram em vão.

Com o desejo de ficar um dia inteiro em Bombaim, Antar telefonou para Rhada, e combinou um encontro. Desta maneira, ele antecipou a sua volta em um dia, para a Índia, mas com a promessa a Muhammad que não demoraria a voltar.

— Muhammad, a partir de hoje, a minha coleção de aviões, é toda sua!

— Oba! Obrigado — e o menino enlaçou-se no pescoço de Antar.


 

 

Capítulo — XXII

 

No encontro dos enamorados, felizes, ambos se declararam saudosos.

— Antar, eu conversei com a minha prima sobre nós; disse-lhe, que estávamos enamorados, enfim, contei tudo, desde o dia que nos conhecemos lá no Brasil. Ela perguntou-me o seguinte: "Rhada, desde o ocorrido com seus pais, meus tios, e que você veio morar nessa casa, eu a adotei como minha irmã, e desejo de todo coração que você seja muito feliz. Agora, me fale: Qual a sua intenção nesse relacionamento?

Sem titubear, lhe respondi: É meu desejo casar com Antar!

Nós nos abraçamos, com ela me falando aos ouvidos: Seja Feliz!

E você, Antar? Disse ela rindo — você vai me pedir em casamento?

— Minha querida, eu antecipei a minha viagem justamente para concretizar essa minha vontade, e de tê-la num futuro bem próximo, como minha esposa.

Eles se abraçaram e se beijaram. Com Rhada ainda em seus braços, pergunta: — A sua prima está ai no hospital?

 

O casamento, ou seja, a união permanente de dois seres é contrário à lei da natureza?

— É um progresso na marcha da Humanidade”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 695)

 

Qual seria o efeito da abolição do casamento sobre a sociedade humana?

— O retorno a vida dos animais”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 696)

 

— Não, ela viajou para a Cachemira. Foi compor-se com um grupo de médicos voluntários e ajudar os sobreviventes da catástrofe que abalou e destruiu aquela região. Creio que, pelo tamanho nefasto dos acontecimentos, ela deverá demorar por lá.

 

A destruição é uma lei da natureza?

— É necessário que tudo se destrua, para renascer e se regenerar; porque isso a que chamais de destruição não é mais que a transformação, cujo objetivo é a renovação e o melhoramento dos seres vivos”.

(O Livro dos Espíritos – pergunta 728)

 

A necessidade de destruição existirá sempre entre os homens na Terra?

— A necessidade de destruição diminui entre os homens à medida em que o Espírito supera a matéria; é por isso que ao horror da destruição vedes seguir-se o desenvolvimento intelectual e moral.”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 733)

 

Deus não poderia empregar, para melhorar a Humanidade, outros meios que não os flagelos destruidores?

— Sim, diariamente os emprega, pois deu a cada um os meios de progredir pelo conhecimento do bem e do mal. É o homem quem não os aproveita; então, é necessário castigá-lo m seu orgulho e fazê-lo sentir a sua fraqueza”

(O Livro dos Espíritos – pergunta 738)

 

— Realmente, aquele povo deve estar precisando muito de médicos e remédios. Acho a atitude dela muito louvável, caritativa, que merece todos os nossos elogios pelo seu desprendimento.

— Ela é assim mesmo. Nas horas de folga do hospital, aqui em Bombaim, ela as preenche consultando gratuitamente as pessoas pobres que moram na periferia.

— Essa é uma atitude de muito desapego das coisas materiais; é uma atitude de desprendimento; de caridade mesmo. Ela deve ser uma pessoa muito especial. Sem estar em erro no meu julgamento, ela deve ter como seu ícone, a grande mulher que foi a Madre Teresa de Calcutá.

— Você tem toda razão. A minha prima, realmente é muito especial. É um exemplo a ser seguido.

— Então, Antar, não vai ser desta vez que você vai conhecê-la.

— Mas não me faltará oportunidade, pois penso firmemente em vir trabalhar aqui em Bombaim. Não poderei ficar longe de você por semanas. Quero ser o seu esposo diuturnamente.

— Pode ter certeza, meu querido, que é isso mesmo que eu quero.

— Bem, Rhada, vou fazer uma pesquisa no mercado de trabalho da cidade, para avaliar as minhas possibilidades. Como está a sua agenda aqui no hospital?

— Com a viagem da minha prima, os meus horários de consulta estão todos tomados.

— Então, doutora, não quero tomar mais o seu precioso tempo. Eu vou me hospedar, dar uma volta, e especular, e quem sabe com sorte consiga algo.

— Doutora Rhada, o seu paciente das catorze horas já chegou — disse uma enfermeira.

— Querida doutora, posso vir ao seu encontro às dezenove horas?

— Isso. Venha mesmo, que iremos jantar lá em casa.

Despediram-se.

 

Às dezenove horas, lá estava ele no saguão do hospital. E não demorou, ela chegou, linda e maravilhosa.

— Doutora, vou lhe dizer algo muito importante: Eu estou apaixonado!

No mesmo tom, ela respondeu: — Comandante, quero lhe afirmar que essa prerrogativa não é só sua. Eu também estou apaixonada!

Beijaram-se, e, em seguida, Rhada tomou a palavra: - Antar, hoje à tarde, eu fui ajudar numa cirurgia. Transcorreu tudo muito bem. Já sabíamos que o cisto era benigno. Após, no diálogo que mantive com o esposo da paciente, pessoa do relacionamento da minha prima, entre outros assuntos, ele discorreu sobre a sua dificuldade de estar melhorando a atuação da sua empresa de navegação, no sentido de ter ao seu lado um funcionário com experiência em estabelecimento de rotas e movimentação de cargas.

Eu percebi, "que um elefante estava passando à nossa frente, ajoelhando-se para nós montarmos". Então, eu tomei a liberdade e falei sobre você, que talvez pudesse lhe ser útil; falei também do nosso objetivo. Ele deu-me este cartão, e disse para nós, irmos esta noite, na sua casa e, que nós estávamos convidados para jantar. O que você acha?

— Eu acho o seguinte: Lá na minha terra, nós dizemos que o cavalo selado, passa à nossa frente uma vez só. Aqui, é o elefante. Vamos lá, minha querida, e muito obrigado pela grande ajuda que está me dando.

— Então vamos logo para casa, assim eu me arrumo melhor, e de lá, nós iremos à casa do senhor Jamini.

Foram recebidos com entusiasmo pelo anfitrião e seus jovens filhos.

Rhada, comunicou-lhes, que ligou para o hospital, que conversou com a senhora Indira, esposa e mãe, e que ela estava passando bem.

O senhor Jamini, ao ser apresentado a Antar, lembrou-se que o mesmo foi notícia de jornal, a respeito da compra de aviões.

No transcorrer das conversações, Antar falou do seu currículo, discorreu sobre os seus estudos e experiências na área de logística no setor militar, e pôs-se à disposição do anfitrião para auxiliá-lo.

 

E Antar, se engajou na marinha mercante como executivo; auxiliar direto do senhor Jamini.

Rhada e Antar, muito embora com pouco tempo de namoro, marcaram a data do casamento.

Ela comunicou a sua prima, que ainda estava na Cachemira, a data do casamento, e teve como resposta que, no dia das bodas, Bellary presente.

 

E chegou o dia.

Rhada pediu ao oficial, que não iniciasse a cerimônia, ainda. Solicitou que aguardasse a chegada da sua prima, que era a sua benfeitora, após o acidente automobilístico, em que faleceram os seus pais.

A senhora Jade, Muhammad e Jalal, estavam felizes com Antar, que era todo sorriso.

Passados quinze minutos, todos, um pouco apreensivos..

— Bellary minha querida...

— Você está linda, prima! Desculpem o atraso. Muito prazer senhor Antar. Eu já o conhecia muito, de nome. Sempre que me comunicava com Rhada, ela falava do senhor.

— Bellary Benares Banzir?

— Sim! Sou eu!

Ela virou-se para o lado, de onde vinha aquele chamamento e por instantes examinou aquele homem maduro, tipicamente árabe, com um vistoso albornoz e linda galabia, bigodes grisalhos, olhos expressivos...

— Jalal Al Azir?

Com um gesto afirmativo, inclinando a cabeça: — Yes!

Uma grande interrogação povoou os pensamentos dos noivos que entreolharam-se.

O silêncio foi cortado com a voz do oficial: - Podemos começar?

Após a cerimônia, uma pequena comemoração foi oferecida aos poucos convidados na casa da doutora Bellary.

Como sendo um filme, as cenas de um passado distante projetam-se na mente de Bellary: como estudante, e como professora de inglês para Jalal.

A certo momento da festa, quando restavam apenas familiares, Rhada e Antar, para satisfazerem as suas curiosidades, interrogaram Bellary e Jalal.

— Prima e senhor Jalal, nos estamos curiosos para sabermos de vocês?

— Rhada, nós nos conhecemos há muitos anos atrás, quando eu estava estudando em Riyad. Fomos contemporâneos.

— Eu estudava agronomia, e por aconselhamento dela, comecei também, a estudar inglês; e quem me dava essas aulas, particularmente, era ela. Ter aprendido a língua inglesa, foi muito útil como auxiliar para a minha formação.

Entre outros assuntos ventilados, apresentações, perguntas e respostas de ambos, Bellary, notando que Jalal estava ali somente na companhia do seu filho e da sua sogra, pergunta: — Só vieram vocês?

— A nossa família agora, se resume em nós quatro. O meu sogro, você conheceu, o Reitor Zayani; ele faleceu, e também a minha esposa, Layla. Estou viúvo.

Oh! Desculpe-me, Jalal. Sinto muito.

— Já tivemos, no passado não muito distante, atravessando um quadrante difícil. Mas, de algum tempo para cá, estamos usufruindo de um bom momento, que como esse, vem coroar a nossa felicidade, desanuviando totalmente os nossos horizontes.

E você... Os seus pais... Eu estive aqui certa vez perguntando por vocês.

— Eu fiquei sabendo...

— Bellary, com essa resposta, você me deixa uma enorme interrogação.

— Jalal, desculpe-me. Eu tive, e ainda tenho problemas familiares. Se eu tiver oportunidades e se nós nos encontrarmos novamente, eu lhe conto.

— Desculpe-me... Não tive e não tenho nenhuma intenção de fazer-lhe nenhuma cobrança a respeito. Mas diga-me, Bellary, como está a vida de doutora?

— Atualmente, estou trabalhando como voluntária na Cachemira. Faço parte de uma equipe de “Médicos Sem Fronteiras”. Após os terremotos que destruíram cidades inteiras, dizimaram centenas de vidas, há muitos feridos, e a assistência médica é primordial, e em todas as especialidades. Embora a assistência médica seja exercida de forma precária, em locais inadequados, com a falta de muitos medicamentos, ainda assim temos que assistir aquele povo sofrido. E a situação vai piorar um pouco mais, porque o inverno está chegando. Nós estamos vendo que a situação vai se agravar, mas também, estamos notando que a melhora vai ser muito lenta, e sabe por que? Porque as autoridades constituídas acham que a Índia não necessita da ajuda de ninguém para sair dessa situação calamitosa. Esse orgulho só promove uma coisa: muitas mortes!

Mas, mesmo assim, eu vou voltar. Quero fazer a minha parte. Não quero que a minha consciência me acuse no futuro de ter sido omissa. Da minha parte, farei tudo que for possível para amenizar as dores daquela gente. Logo que Rhada regressar da viagem de núpcias, eu vou voltar.

— Acho louvável essa sua atitude caridosa. Eu a admiro muito Bellary!

Mudando de assunto, a nossa Universidade vai fazer uma série de eventos; vai comemorar a sua fundação, e estará também homenageando os formandos. Logo que eu tenha as datas dos eventos, eu lhe comunicarei. Para isso preciso do seu endereço eletrônico; o meu, é o mesmo.

— Vai ser muito bom esse congraçamento. Espero ter a oportunidade de ir.

O encontro entre Bellary e Jalal deixou muitas perguntas, que ficaram somente no desejo da indagação. Seus olhares revelavam que necessitavam estar a sós para porem em dia os assuntos entre eles, que ficaram no passado.

Jalal teve a certeza de que Bellary estava solteira. Só não sabia, e não teve coragem de perguntar se ela havia casado.

— Vocês ficarão mais alguns dias? Indagou Bellary.

Infelizmente, não. Tenho que voltar o mais breve possível, pois estamos em época de provas. Voltaremos amanhã


 

 

Capítulo — XXIII

 

A vida voltou a normalidade para todos. Antar, trabalhando na marinha mercante, Rhada, clinicando, Bellary voltou para Cachemira, Jalal estava na Vice-Reitoria, Muhammad, estudando e dona Jade, já bem idosa, com seus afazeres domésticos.

 

Certa manhã:

— Senhor Jalal...Senhor Jalal, por favor corra aqui. A senhora Jade não me responde!

O médico da família é chamado, mas, o que pode fazer foi só constatar o óbito.

— Vamos orar — disse Jalal — "Senhor Onipotente, rogamos que a sua misericórdia, receba a nossa querida Jade, nos páramos da sua Luz. Que nesse desenlace, seus parentes queridos que a antecederam, possam abraçá-la e ampará-la com muita alegria, cercando-a de muita paz. Sabemos, Senhor, que não somos perfeitos, mas da nossa parte, na deficiente visão que temos, julgamos que a senhora Jade foi uma alma luminosa em nossos caminhos. Assim, Deus Criador, perdoe as suas possíveis faltas, e a acolha em seu colo de Amor"

Lágrimas rolaram em abundância.

 

Imediatamente Jalal ligou para Antar, mas quem atendeu foi Rhada.

— Rhada, por favor, Antar está?

— Senhor Jalal, o Antar está em viagem para a África do Sul; viajou ontem.

— Por favor, se você puder, comunique-se com ele, e diga que a senhora Jade faleceu. Pensando melhor, Rhada, você acha conveniente comunicá-lo?...Ele está tão longe... Não poderá fazer nada...E acho que nem chegaqrá em tempo para o féretro...

— Pode deixar senhor Jalal. Antar, deverá ligar-me ainda hoje. Eu irei avisá-lo; acho melhor assim. Ele tinha comentado comigo sobre a longa idade da dona Jade. Estava até sonhando com ela. Ele tinha consciência de que mais dia, menos dia, esse seria o desfecho. Mas, senhor Jalal, da minha parte, receba os meus sentimentos, estendendo-o a Muhammad.

— Obrigado, querida nora!

 

Agora, a preocupação de Jalal, voltou-se para o seu filho.

— Muhammad, meu filho, sente-se aqui perto de mim - abraçou o filho — a vovó não está mais entre nós.

— Ela viajou sem nos avisar?

— É, acho podemos dizer que ela viajou; viajou sem nos avisar. Ela faleceu!

O jovenzinho abraçou forte o seu pai, e chorou muito.

— Filho, a vovó, infelizmente, não andava bem de saúde, embora estivesse medicada. Você já sabe; nós já conversamos a respeito. Quando chega a hora... a situação é irreversível...não há jeito. Foi o seu avô, a sua mãe, o meu avô, e agora, a sua avó. Devem estar todos juntos. A sua mãe, sempre nos dizia: que de nós, humanos, o que morre é o corpo e, a alma, permanece viva. Então, acho que estão todos unidos e felizes.

Sua avó era uma pessoa que eu admirava muito. Era uma mulher positiva, muito prática, que encarou a sua viuvez e logo em seguida, a falta da Layla, com coragem, com uma grande força interior do seu espírito. Realmente era uma mulher admirável. Eu sempre tive essa convicção, mas, não me perdôo por nunca ter dito isso a ela. Ela foi incansável na assistência quando você ainda era bebê.

— Papai, como iremos fazer sem ela?

— Filho querido, vamos deixar esse assunto para outro dia. Por hora, vamos prestar a dona Jade a nossa homenagem e nossos agradecimentos por ela ter-nos proporcionado a sua companhia calorosa e amorosa por todos esses anos. Vamos orar e pedir para que a sua mãe e seu avô a ampare, recebendo-a de braços abertos nessa hora que, calculo seja difícil, tal qual é difícil, comparado a um bebê, ao nascer. Assim avalio... não sei...

A noite, Antar ligou, e chorou ao telefone. Estava inconformado por não ter podido despedir-se da sua querida avó..

Jalal, sem muito argumento, tentou consolá-lo.

 

O terceiro dia estava passando, quando Antar e Rhada chegaram.

Dona Jade deixou três cartas: para Jalal, Antar e Muhammad.

Ao lado de Rhada, Antar leu em voz alta: "Querido neto. Quero agradecer a oportunidade que me deu, de ter convivido com você por muitos anos. Nos nossos relacionamentos, creio que pude transmitir a você aquilo que em mim era uma pequena virtude — ser pragmática. Continue assim, mas sem ser por demais arrojado. O bom senso, aliado à praticidade, acho que seja um ótimo meio para se viver bem. Por falar em viver bem, cuide da sua linda esposa como se fosse aquela louça raríssima, oriunda dos fornos de Ching-te Chen, que por muitos anos foi protegido pelo Imperador Ming, no século XIV. Proteja-a! Eu gosto muito dela, embora nunca tivéssemos tido a oportunidade de aprofundar os nossos relacionamentos; mas, querido neto, acho que você já sentiu isso: aquele sentimento gostoso de estar perto de uma pessoa e você não querer se afastar, e desejar continuar ali, perto dela. A Rhada emana amizade, doçura, sinceridade, simpatia, alegria e, a grande virtude: ela emana, o Amor. Seja feliz, e faça a sua companheira também, muito feliz!

Ah! Não esqueça de me dar netos e netas.

Um grande abraço e muitos beijos para você e a Rhada. Jade"

Terminada a leitura, a carta estava toda salpicada de lágrimas.

— Rhada querida, esta era a minha avó. Mulher de uma alma esplendorosa, amiga, complacente, sem deixar de ser austera nos momentos certos.

— Avalio, só acrescentando — ela era uma mulher culta.

— Ela era uma autodidata. Valeu-se da enorme biblioteca do seu marido — acrescentou Jalal.

Jalal, começou a ler a sua carta: "Querido genro. Acho que você não conseguiu perceber, mesmo porque, antes de você se relacionar com a Layla, o clima da nossa casa era difícil. A partir do momento em que Layla o conheceu, ela se iluminou, e isso sobejou para todos nós. Por isso, e pela sua integridade, honestidade, e empenho, pelo seu amor dedicado a ela, e também a todos nós, eu lhe agradeço e o abraço com meu espírito de mãe.

Agora, querido genro, você sabe, e já teve algumas experiências, que a vida continua, tanto aqui, como no Éden, onde estão meus queridos: Zayani e Layla. E aqui, Jalal, você tem ao seu lado essa criatura que, embora jovenzinho, traz uma luz imensa no seu peito, a qual tem que ser cultivada e aumentada. As crianças, Jalal, necessitam de pais — pai e mãe — para se desenvolverem bem. Portanto, o homem, como você, que tem um filho, precisa de uma mulher para si, que vai ser a mãe do seu filho, e que juntos o educarão. O homem precisa de uma esposa, para desenvolver bem o seu trabalho, e manter o seu equilíbrio emocional; ela será a companheira de todas as horas, promissoras ou não; será a testemunha direta dos seus pensamentos, dividindo as responsabilidades e dando opiniões. A nossa sociedade não aceita que a mulher seja atuante, mas, aqui nesta casa, você notou, que tudo foi diferente. Bem, mas não é isso que agora interessa.

Acho que você está entendendo aonde eu quero chegar. Pela minha longa vivência, eu consegui, por dádiva de Deus, perceber e tirar só para mim, uma rústica análise das pessoas. Jalal, não quero com o que vou lhe dizer, que você não teve um sentimento puro de amor para com a minha filha. Eu sou prova de que você se dedicou inteiramente a ela, com muito amor. O que eu desejo lhe dizer, sem medo de errar, e se me permite, com a minha aprovação, é que você, desde um passado bem recente, quer ser enlaçado pela emanações delicadas da doutora Bellary.

Meu querido genro, tenha a absoluta certeza de que de todo o meu coração e entendimento, eu estarei abençoando essa sua união com essa moça, que avalio, seja uma ótima criatura, e que certamente, será uma ótima esposa e mãe exemplar para Muhammad.

Aquele encontro com ela em Bombaim foi muito revelador, e isso enche o meu coração de muita alegria. Desejo que você seja muito feliz, e que o meu neto, também seja, ao lado de vocês dois.

Um grande abraço — Jade"

 

Jalal, agora recostado na poltrona, com os olhos fechados, passou a mão na testa, nos cabelos, tirou os óculos, endireitou-se, olhou para as três testemunhas queridas, e disse: — Vamos ver o que nos reserva o futuro!

 

— Abra a carta para mim, papai!

— Filho, o que tem aí dentro é uma mensagem só para você. Está em você querer abrir e ler!

 

"Querido Muhammad Zayani.

 

Você se lembra daquela história, do homem que, sedento, vinha pelo deserto, e encontrou uma tenda toda iluminada. Lá dentro, estavam um homem e uma mulher. Ele foi convidado a entrar e, como mágica, ele se transformou numa criança. Depois de algum tempo, os três empreenderam uma nova caminhada por outro deserto, mas aí, veio uma forte tempestade de areia, e a mulher se perdeu. Ficaram o homem e o menino, tristes e choroso, andando tontos pelo deserto, até que encontram um oásis. E lá, enquanto saciavam a sede, da placidez das águas cristalinas, formou-se a imagem de uma linda mulher, e o menino gritou: — Papai...papai... olhe a deusa das águas; é a nossa salvação; ela que nos dará de beber para sempre! Orando fervorosamente, ambos vêem aquela imagem concretizar-se. E para mais um deserto, caminharam felizes.

 

A perfeição da forma é, a conseqüência da perfeição do Espírito, podendo-se concluir que o ideal da forma deve ser a que reveste o Espírito no estado de pureza – a que imaginam os poetas e os verdadeiros artistas, porque penetram pelo pensamento nos mundos superiores”

(Obras Póstumas— Allan Kardec– Teoria do Belo)

 

É assim a vida meu querido neto. Temos um deserto após o outro para atravessar. Sem medo, vamos encará-los com determinação e humildade que com certeza encontraremos pessoas queridas, e nós, nos sustentaremos mutuamente, nessa caminhada que a Vida está a oferecer para o nosso aprimoramento.

E eu lhe dizia: que eu, iria andar junto com você até vir uma nova tempestade de areia, e que iríamos encontrar a "deusa das águas" Lembrou?

Neto querido, ajude o seu pai; ele necessita do seu apoio! — Sua Avó.

— Papai, eu lembro bem quando estava sentado no colo da vovó, e ela me contava essa história. Agora eu penso: Aquela mulher que se perdeu no deserto, será que foi a minha mamãe? E agora, a outra mulher — a deusa das águas, quem será; poderá ser a dona Bellary, que a vovó fala na sua carta?

— Não sei Muhammad; não posso lhe responder agora. Vamos aguardar, pois o futuro é um grande benfeitor.

 

Entretanto, se lhe é dado conhecer a intenção e prever-lhe as conseqüências, a alma não pode determinar o momento, em que tais conseqüências se darão, nem precisar minúcias ou mesmo afirmar que se darão, porque podem sobrevir circunstâncias que modifiquem o plano e a disposição.

(...)Quando um acontecimento depende do livre arbítrio de alguém, os videntes podem pressenti-lo porque está no pensamento que eles vêem; mas não podem afirmar que ele se dê, de tal maneira e em tal momento. A maior ou menor exatidão nas previsões dependem também da extensão e da clareza da vista psíquica”

(Obras Póstumas – Allan Kardec – Introdução ao Estudo da Fotografia e da Telegrafia do Pensamento)

 

Mas, Muhammad, com os seus treze anos, volta ao assunto dizendo: — Mas eu gostaria que fosse ela! Ela é muito bonita; como a mamãe!


 

 

Capítulo — XXIV

 

O tempo correu célere.

Antar desenvolvia um ótimo trabalho e com excelentes resultados.

Rhada, também feliz, suportava bem a sua gravidez de seis meses.

Bellary já tinha regressado da Cachemira. Estava exausta e deprimida, com tanta desgraça que presenciou. Resolveu então, tirar umas férias, e viajou para o Tibet, para aproveitar os ares místicos daquela região, e refletir sobre a sua vida presente e, tentar esquadrinhar seu futuro.

Jalal, era a preocupação constante do jovem Muhammad. Sua vida era de casa para a universidade, e vice-versa. Não pensava em outra coisa; nem na destilaria de álcool que agora, também, produzia açúcar demerara.

Certa manhã, Muhammad lhe diz: — "Ab"- Papai, eu quero estudar música; quero ser um maestro.

Jalal se ajeitou na cadeira, cotovelos na mesa, mão no queixo, indicador entre os lábios — olhou bem para o seu filho, e falou: — Muhammad, as boas escolas de música estão fora do país!

— Eu até sei disso. Mas o senhor também não estudou fora do nosso país?

— Você tem razão. Mas acho que deve começar por aqui. Vamos ver por onde você vai começar e quando.

A noite, nesse mesmo dia, após o jantar, Jalal se retirou para a biblioteca do seu sogro, e ficou ruminando os seus pensamentos; estava cansado e dormiu na poltrona.

Tocou o telefone, e Muhammad atendeu:

— Alô, aqui é Muhammad.

— Muhammad, aqui quem fala é a doutora Bellary.

— É a doutora Bellary, da Índia?

— Sim, sou eu mesma. Como você vai?

— Eu estou bem!

— E o seu pai está bom?

— Ah! Ele anda... Não sei, se muito triste ou preocupado.

— Ele está em casa?

— Está sim, senhora...

— Então, por favor, diga a ele que eu estou aqui no aeroporto de Riyad. Fale para ele vir me pegar.

— A senhora, está aqui mesmo?

— Estou!

— Então, está bem. Eu vou com ele...

— Venha... estou esperando.

Muhammad, se arrumou, e saiu correndo à procura do seu pai.

— Papai...Papai... — gritou o filho — Acorde, acorde, que temos que ir ao aeroporto buscar a doutora Bellary.

— Mas o que é isso? Você está bem?

— Ela acabou de ligar do aeroporto. Ela está aqui na nossa cidade. Vamos...vamos...

— Pare...pare...pare...

— Papai, eu não estou maluco! Vamos!

— Mas ela está aí mesmo?

 

— Vamos, vamos logo...Mas olha aqui, vai devagar, com muita calma nesse trânsito, que temos que trazer para nossa casa a "deusa das águas".

Jalal, de soslaio, olhou para o seu filho, e ambos riram.

E lá estava a "deusa das águas" da história da dona Jade — Bellary.

Os três, sem pronunciarem uma só palavra, se abraçam longamente.

 

FIM

 

Autor: Romero Evandro Carvalho
(romeroevandro@hotmail.com)


 

 

Bibliografia

 

O Livro dos Espíritos — Lake-Livraria Allan Kardec Editora — 34ª edição — 1975.

O Livro dos Médiuns — Lake-Livraria Allan Kardec Editora — Edição Comemorativa do Centenário do Livro dos Médiuns e do 25º Aniversário da Lake — 30/10/36 — 30/10/61.

O Evangelho Segundo Espiritismo — Federação Espírita Brasileira — Departamento Editorial — 84ª edição — Trad. Guillon Ribeiro.

Obras Póstumas — Lake-Livraria Allan Kardec Editora — 11ª edição — Trad. João Teixeira de Paula

Fonte Viva — Emmanuel — psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Caminho, Verdade e Vida – Emmanuel — psicografia de Francisco Cândido Xavier.

Grande Enciclopédia Delta Larousse.

Enciclopédia Mirador Internacional.


 

©2012 — Romero Evandro Carvalho

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Outubro 2012

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